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Gestão de projetos sociais: novas abordagens considerando a participação dos stakeholders

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.3 Gestão de projetos sociais: novas abordagens considerando a participação dos stakeholders

Quatro estudos científicos de caráter teórico-empíricos, relacionados com essa pesquisa, foram selecionados para discutir as novas abordagens em relação à gestão de projetos sociais. Estudos encontrados a partir de buscas pelo Google Scholar. O web of science não retornou resultados diretamente relacionados a essa tese (Ver APÊNDICE A).

O primeiro deles é o de Santos (2004), que traz um ensaio que analisa a maneira de mensurar valor e desempenho na gestão e prestação de contas de projetos sociais. Ele discorre sobre o valor contido na ação social e a performance da organização que a oferece. Os conceitos de valor e performance contidos na gestão de projetos sociais permitem para o autor avaliar o impacto social relacionando-o com as ações que esses projetos proporcionam como benefícios à comunidade. A mensuração de impactos em projetos sociais deveria ser a preocupação central dos gestores, uma vez que Roche (2000) coloca que os impactos causados por um projeto social trazem mudanças significativas ou permanentes nas vidas dos beneficiários a partir de uma ação ou de uma série de ações.

Ainda utilizando as ideias de Roche (2000) e Santos (2004), é possível expor quatro elementos chaves da avaliação de impacto em etapas específicas do ciclo de projeto: revisão, identificação, implementação e avaliação. A revisão deve ser feita antes, durante e após o projeto, a fim de avaliar a performance e o impacto da ação. A identificação é uma análise inicial da situação histórica, de tendências e do impacto esperado das intervenções, permitindo a criação de indicadores. A implementação é a coleta e a análise de indicadores. Por fim, a avaliação é a revisão detalhada da performance, dos custos, dos benefícios e do impacto da ação social proposta. Roche (2000) e Santos (2004) ainda colocam que os projetos não repetem o mesmo ciclo, continuamente, já que há contínuas melhorias advindas do aprendizado organizacional e constantes aperfeiçoamentos dos processos gerenciais.

Outro estudo é o de Coutinho, Soares e Silva (2006), que apresenta um modelo de gestão de projetos sociais corporativos, sendo um de seus principais constructos a satisfação dos stakeholders, ou seja, a comunidade local, a equipe do projeto, os colaboradores da empresa até o poder público. Para os autores, essa satisfação é entendida como o “grau de

satisfação dos diversos públicos afetados pelo projeto, com relação aos resultados obtidos”,

embora o diálogo entre organização e beneficiários finais, no que diz respeito à gestão participativa do projeto social, não seja mencionado como fator relevante.

O terceiro estudo a abordar a gestão ou avaliação de projetos sociais sob o ponto de vista da inclusão e participação das partes interessadas é o de Salazar, Husted e Biehl (2012),

que traz a visão de que tanto organização quanto beneficiários dos projetos sociais podem se valer dos aprendizados relevantes gerados durante e após a implementação dos mesmos. Eles argumentam que a melhoria da gestão dentro da responsabilidade social da empresa se dá por meio de projetos sociais, principalmente ao avaliar seus impactos.

Os autores perceberam, inicialmente, que as abordagens atuais para gestão de projetos sociais ocorrem, predominantemente, de forma quantitativa, escondendo as reais relações entre a atividade social e suas consequências para o desempenho da empresa e de seus projetos. Tal distorção pode ser reduzida ao propor um número maior de projetos sociais em diferentes áreas dentro da organização como meio de diluir possíveis riscos que alguns projetos possam apresentar. Impactos positivos de alguns projetos poderiam compensar os impactos negativos de outros (SALAZAR, HUSTED & BIEHL, 2012).

A conclusão dos autores mostra que diferentes projetos sociais podem oferecer diferentes aprendizados, permitindo que o gestor mantenha aqueles que apresentaram resultados sociais positivos e descartem ou aperfeiçoem outros que não corresponderam às expectativas esperadas inicialmente. Para eles, a avaliação do gestor para os projetos deve se dar analisando todo o conjunto de projetos oferecidos à comunidade e não avaliando cada um isoladamente. Também é defendido pelos autores que os resultados das várias edições de um mesmo projeto social sejam comparadas entre si, de modo a perceber o progresso ou retrocesso que as mesmas vem apresentando.

Ao mesmo tempo em que a gestão dos projetos sociais é analisada no todo, ignorando aspectos qualitativos de cada um deles, Salazar, Husted e Biehl (2012) também afirmam que a opinião do beneficiário e da comunidade envolvida também é parte da gestão e impacta na avaliação desses projetos e, portanto, deve ser considerada pelo gerente de projetos da organização. A análise da situação socioeconômica dos beneficiários, antes e após a implementação do projeto, também é importante, já que ela indica possíveis melhorias nas condições de vida das pessoas envolvidas.

As ideias colocadas pelos autores se mostram divergentes ao reconhecerem a importância da opinião dos beneficiários nos projetos sociais, como defende Freeman (1984), e tratarem esses projetos como se fossem negócios com fins lucrativos, incluindo-os e excluindo-os conforme os interesses da organização. Tal postura é criticada por Rodrigues (2010).

O quarto trabalho, de Valdes-Vasquez e Klotz (2013), aborda a avaliação de projetos sustentáveis, também sob a perspectiva dos beneficiários. Ele aborda a sustentabilidade em sua dimensão social, sendo esta definida pelo engajamento entre todas as partes interessadas como forma de assegurar que as necessidades da população atual e futura sejam satisfeitas

(HERD-SMITH & FEWINGS1, 2008 apud VALDES-VASQUEZ & KLOTZ, 2013). As ideias de Hammond e Peterson (2007) e Hammer (2009), expostas no trabalho de Valdes- Vasquez e Klotz (2013), mostraram que, na percepção dos especialistas, muitos benefícios sociais, embora intangíveis, são tão importantes quanto outros de caráter financeiro e ambientais na vida dos usuários dos projetos.

Sendo um estudo aplicado dentro da construção civil, os autores desenvolveram um questionário na qual foi respondido por 25 peritos entre especialistas acadêmicos, agentes do governo e profissionais da construção civil. Foram apresentados seis constructos dentro da avaliação de projetos sustentáveis no setor da construção civil: 1) Engajamento dos stakeholders; 2) Considerações sobre a opinião dos beneficiários; 3) Formação de equipe; 4) Considerações gerenciais; 5) Avaliação de impacto; 6) Contexto do lugar e da comunidade.

Esses constructos e variáveis possuem diversos pontos de contato com a teoria dos

stakeholders e com as hipóteses desta tese, servindo de fonte inspiradora para o desenvolvimento

dos constructos e variáveis colocados neste trabalho, aplicáveis a projetos sociais. As cinco proposições postas neste trabalho pelo autor são: (1) o engajamento dos stakeholders asseguraria a formulação e o desenvolvimento de projetos sociais corporativos com o envolvimento de gestores, funcionários e beneficiários; (2) uma maior consideração da opinião dos beneficiários também contribui para a formulação e o desenvolvimento desses projetos com o envolvimento de gestores, funcionários e beneficiários, (3) o envolvimento desses atores seria alcançado através da boa gestão de stakeholders internos, (4) espera-se que esse mesmo envolvimento seja alcançado por meio da avaliação de impactos e resultados desses projetos sociais e (5) a consideração da comunidade e de atributos ligados a essa por parte da organização contribuiria para o envolvimento desses gestores, funcionários e beneficiários nos mesmos projetos.

Tais pontos em comum são vistos na consideração da opinião dos beneficiários na gestão de projetos e na importância atribuída ao engajamento dos stakeholders nos projetos, indicando a possibilidade de utilização desses constructos e variáveis em projetos sustentáveis, dentre eles os projetos sociais, e não apenas aplicados na área da construção civil. As variáveis relevantes da gestão participativa de projetos sociais são apresentadas no figura 2 desta pesquisa. Na figura 2, são observados os pontos de contato com os trabalhos de Valdes-Vasquez e Klotz (2013) e de outros autores das áreas de RSC, da Teoria dos Stakeholders e de gestão de projetos sociais.

1 HERD-SMITH, A., FEWINGS, P. The implementation of social sustainability in regeneration projects:

Esta seção busca refletir sobre as variáveis relevantes para a gestão de projetos sociais corporativos com responsabilidade participativa.

Buscou-se, a partir das contribuições teóricas das áreas de responsabilidade social corporativa e da Teoria dos Stakeholders fazer um levantamento de variáveis e constructos utilizados nessa pesquisa. Segundo Salazar, Husted e Biehl (2012), houve poucos avanços nos últimos anos em modelos destinados a realizar a gestão de projetos sociais corporativos. Todavia, houve progressos em trabalhos teóricos das área de gestão de Responsabilidade Social Corporativa, além de importantes desdobramentos na Teoria dos Stakeholders: áreas que podem contribuir com conceitos e ideias a serem utilizadas na gestão de projetos sociais corporativos.

Tais áreas apresentam muitos pontos de contato com a área de gestão de projetos sociais corporativos, embora ainda essas interseções pareçam ter sido pouco exploradas na gestão de projetos sociais nas organizações. O nível de análise em que são avaliadas as ações sociais de uma empresa escondem as relações reais entre a atividade social e suas consequências para a organização, além de não revelar os verdadeiros impactos sociais advindos desses projetos sociais (SALAZAR, HUSTED & BIEHL, 2012).

Esse baixo grau de interação, segundo os autores, ocorre porque a gestão de projetos sociais não capta as interações entre beneficiários e a instituição organizadora dos projetos. As inconsistências mencionadas por Salazar, Husted e Biehl (2012) na gestão de projetos sociais privados também são citadas em trabalhos como os de Sulbrandt (1994), Weiss (1998) e Rodrigues (2010). Eles argumentam que os métodos de gestão de projetos sociais corporativos existentes são meramente uma adaptação dos métodos para gestão de projetos empresariais comerciais. Nesse sentido, não são considerados aspectos relevantes tais como a opinião do público beneficiário do projeto sobre o mesmo. Também não são analisadas as interações sociais entre o público beneficiário e a organização privada promotora do projeto.

Dessa forma, a participação das partes interessadas e a opinião dos beneficiários dos projetos parecem ser relevantes para a avaliação de resultados, o que pode trazer um ponto de contato entre as deficiências apresentadas por Salazar, Husted e Biehl (2012), Sulbrandt (1994), Weiss (1998) e Rodrigues (2010) e as soluções de gerenciamento oferecidas pela Teoria dos Stakeholders, de Freeman (1984), que considera a opinião das partes interessadas nos processos de gestão.

Como os atuais métodos de gestão de projetos sociais corporativos desconsideram a principal contribuição verificada na área da Teoria dos Stakeholders, o engajamento (participação dos stakeholders nos processos de gestão promovidos pela empresa), abre-se o pressuposto de que escutar a opinião das partes interessadas poderia ser incorporada como

parte da gestão e impacto de projetos sociais, pois tal atitude se mostra relevante no processo. Essa ideia é apoiada, também, por Mainardes, Alves e Raposo (2011), ao defenderem que a melhor utilização para a Teoria dos Stakeholders é sua aplicação na área de projetos sem fins lucrativos, pois tal teoria se mostra adequada para esse fim ao possibilitar interações entre organização e stakeholders.

Essa discussão teórica é sintetizada pela figura 2 a seguir.

Figura 2 - Variáveis relevantes da gestão participativa de projetos sociais Fonte: Elaboração do autor

A figura 2 identifica variáveis que poderiam contribuir com a gestão de projetos sociais, destacando-se a opinião dos beneficiários e a percepção dos stakeholders. As considerações dessa figura levam a apresentação das hipóteses desta tese.