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HABEAS CORPUS Nº 126.292/SP E A AUSÊNCIA DE SEGURANÇA JURÍDICA

3 ACESSO À JUSTIÇA NO DIREITO BRASILEIRO

4 TEORIA DOS QUATRO STATUS DE GEORGE JELLINEK E O PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA

4.3 HABEAS CORPUS Nº 126.292/SP E A AUSÊNCIA DE SEGURANÇA JURÍDICA

Diante de tais entendimentos, oportuno trazer à baila a atual manifestação do Supremo Tribunal Federal no que tange ao entendimento firmado pelo seu órgão máximo – pleno –, acerca da execução provisória de acusado em ação penal, quando confirmada sentença penal condenatória por Tribunal de segundo grau de jurisdição.

Passemos a analisar um embaraçoso caso de insegurança jurídica, desprovido de qualquer ratio decidendi que permita a adoção ou fundamentação razoável acerca das técnicas existentes de modificação, alteração ou distinção de precedente judicial. A saber.

No Habeas Corpus nº 126.292/SP125, em votação unânime, foi decido pela 2º Turma do Pretório Excelso que o julgamento do mandamus, por sua relevância e repercussão geral, seria afeto ao Plenário da Corte para julgamento. Em 17 de fevereiro de 2016, por 07 (sete) votos contra 04 (quatro), após longa discussão acerca da extensão e aplicação do princípio da presunção de inocência previsto no artigo 5º, inciso LVII, da Carta Magna a Corte maior de justiça do país chegou a um consenso.

Discutiu-se e assentou-se no referido feito que os acusados em ação penal que tenham sentença e/ou acordão penal condenatório confirmada por Tribunal de 2º instância estão sujeitos à execução provisória da pena, devendo o réu considerado culpado ser recolhido ao cárcere, tendo em vista a conclusão de que tal medida não violaria o princípio da presunção de inocência. Dentre os fundamentos, verificou-se a menção de que tal interpretação estava condizente com o Direito comparado, a exemplo de países como Portugal, Espanha e Estados Unidos, o que ensejaria, também, no conhecimento geral do grau de reprovabilidade por parte do Estado em face daqueles que cometiam um tipo penal incriminador.

Cogitou-se também, na esfera penal, além das observâncias de direitos e garantias processuais fundamentais, a duração razoável do processo seria fator essencial para extinguir o sentimento de impunidade que assola a sociedade, sendo o caso de tal interpretação um típico caso de mutação constitucional.

Não vamos, tampouco é objetivo deste trabalho, adentrar ao mérito do decisum proferido pela Suprema Corte brasileira, contudo, não se pode olvidar que 04 (quatro) meses mais tarde, em sede de decisões monocráticas, os Ministros Celso de Mello e Ricardo Levandowski126, em completa inobservância do precedente judicial firmado pelo plenário do Supremo Tribunal Federal, deferem liminares para suspender a execução provisória da pena em 02 (dois) processos distintos.

E não foi só. Na mesma linha de comportamento, o Min. Marco Aurélio de Melo também profere decisões destoante do quanto decidido no órgão plenário, gerando, desta forma, uma verdadeira instabilidade e ausência de confiabilidade perante a jurisdição estatal, de onde deveria advir confiabilidade e estabilidade no que tange à todo o processo discursivo,

125 Ementa: CONSTITUCIONAL. HABEAS CORPUS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (CF, ART. 5º, LVII). SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA CONFIRMADA POR TRIBUNAL DE SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. 1. A execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo artigo 5º, inciso LVII da Constituição Federal. 2. Habeas corpus denegado. (HC 126292, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 17/02/2016, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-100 DIVULG 16-05-2016 PUBLIC 17-05-2016).

persuasivo, com observância das garantias processuais, da dimensão dinâmica da segurança jurídica.

Mas esta novela ainda não se esgotou. No dia 05 de outubro de 2016, data em que se comemora a promulgação da Constituição Federal de 1998, o plenário do Supremo Tribunal Federal, mais uma vez, colocou em pauta o julgamento de ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs nº 43/DF127 e 44/DF128, esta última tendo como advogado do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Lênio Luiz Streck), para discussão do mesmo tema, sendo decidido por 06 (seis) votos a 05 (cinco) – haja vista a mudança de entendimento do min. Dias Toffoli – que cabível a execução provisória da pena que tenha sentença e/ou acordão penal condenatório confirmada ou proferida por Tribunal de 2º instância. Entretanto, a ratificação do entendimento já esposado 05 (cinco) meses atrás não convenceu o min. Marco Aurélio em deferir, no dia 07.10.2016, medida cautelar em sede de habeas corpus, suspendendo a prisão – diante da confirmação de sentença penal condenatória em 2º grau de jurisdição –, autorizada pelo Superior Tribunal de Justiça.

Nesse diapasão, oportuna a descrição de trecho da fundamentação utilizada pelo nobre ministro, ao deferir a medida cautelar. In verbis:

Ao tomar posse neste Tribunal, há 26 anos, jurei cumprir a Constituição Federal, observar as leis do País, e não a me curvar a pronunciamento que, diga-se, não tem efeito vinculante. De qualquer forma, está-se no Supremo, última trincheira da Cidadania, se é que continua sendo. O julgamento virtual, a discrepar do que ocorre em Colegiad, no verdadeiro Plenário, o foi por seis votos a quatro, e o seria, presumo, por seis votos a cinco, houvesse votado a ministra Rosa Weber, fato a revelar encontrar-se o Tribunal dividido. A maioria reafirmou a óptica anterior – eu próprio e os ministros Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e Dias Tóffoli. Tempos estranhos os vivenciados nesta sofrida república! Que cada qual faça a sua parte, com desassombro, com pureza d´alma, segundo ciência e consciência possuídas, presente a busca da segurança jurídica. Esta pressupõe a supremacia não de maioria eventual – segundo a composição do Tribunal -, mas da Constituição Federal, que a todos, indistintamente, submete, inclusive o Supremo, seu guarda maior. Em época de crise, impõe-se observar princípios, impõe-se a resistência democrática. A resistência republicana.

Qual a segurança jurídica e respeito ao precedente judicial – obrigatório - estabelecido em decisão colegiada pelo órgão máximo de justiça do país? Nenhuma.

Num Estado Democrático de Direito divergir de entendimento firmado pelo maior órgão jurisdicional do país, sem a observância de qualquer técnica de superação, modificação ou

127 Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 43/DF, min. Relator Marco Aurélio, 05.10.2016, DJ em 11.10.2016.

128 Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 44/DF, min. Relator Marco Aurélio, 05.10.2016, DJ em 11.10.2016.

distinção do precedente firmado, é colocar o princípio da segurança jurídica no status de mera norma decorativa, desprovida de qualquer característica cogente, colocando à margem da jurisdição a confiabilidade e estabilidade necessárias à pacificação social.

Não se está discutindo aqui o acerto e justiça da decisão proferida no referido mandamus pelo Órgão Plenário do STF. Até porque, divergências doutrinárias têm para todos os gostos, mas como conferir um grau de confiabilidade e segurança jurídica se membros da própria corte não respeita as decisões proferidas pelo órgão plenário?