• Nenhum resultado encontrado

2. Barcelona Festival of Song®

2.1. História e criação do festival

O Barcelona Festival of Song (BFOS) foi criado em 2005 por Patrícia Caicedo, colombiana, médica e soprano residente em Barcelona há vários anos. Como nos foi dito pela própria na entrevista que realizamos, e que está transcrita nos anexos desta dissertação, apesar de ser médica a música sempre fez parte da sua vida e sempre foi uma paixão. Estudou música desde os cinco anos e após terminar o curso de medicina continuou a dedicar-se ao estudo do canto e da música. Durante vários anos conciliou a medicina com a música e ao longo desse processo foi-se apercebendo que a música a fazia feliz e aos poucos começou a surgir a ideia, e a possibilidade, de se dedicar a ela por completo e a tempo integral. Foi um processo lento e “orgânico” como a própria diz, mas quando finalmente chegou o momento de ter de escolher entre a medicina e a música, o amor pela música falou mais alto. Acabando até por academicamente se focar na música. Patrícia completou no início de 2013 o doutoramento em musicologia na

Universidad Complutense de Madrid.

Ao longo dos seus estudos e da sua carreira musical, Patrícia sempre se debruçou sobre a música clássica, principalmente sobre o repertório vocal da América Latina e da Península Ibérica. Desde que começou a estudar música, Patrícia apercebeu-se que havia um nicho no mercado relativamente à música da América Latina e da Península Ibérica. Normalmente todos aqueles que estudam e interpretam música clássica cingem- se aos repertórios mais famosos, o italiano, o alemão, o francês, entre outros, mas pouco ou nada havia dedicado ou centrado na música clássica produzida nos países da América Latina e da Península Ibérica. O repertório destes países, apesar de pouco divulgado é bastante extenso e rico.

26

Este repertório não inclui apenas criações e obras compostas durante e após a colonização europeia, integra também várias composições anteriores a isto, composições ainda feitas pelos indígenas muito antes da chegada dos colonizadores. Com a chegada destes, as composições sofreram alterações, começaram inevitavelmente a ser influenciadas pelas correntes e instrumentos trazidos da Europa pelos colonizadores, os sons e os temas adaptaram-se mas nunca perderam a sua identidade. Uma época especialmente marcante, que o foi não só para a música mas para todas as artes, foi o período das lutas pela independência dos impérios europeus, nomeadamente do Português e do Espanhol. Em que todos os artistas falaram, pintaram, cantaram e compuseram sobre o nacionalismo, o amor à pátria, as raízes e sobre as próprias lutas pela independência.

Assim Patrícia, que é uma cidadã do mundo mas continua a ter as suas raízes muito ligadas a uma ex-colónia espanhola, Colômbia, a sua terra natal, sempre teve um vínculo e um apreço muito grande por este repertório. E, como já referimos anteriormente, ao longo do seu percurso foi-se apercebendo que este repertório era praticamente ignorado por todos, não por falta de interesse, mas principalmente por desconhecimento, porque nunca foi devidamente divulgado. Patrícia atua quase exclusivamente em espanhol, português (principalmente português do Brasil), catalão e em duas línguas nativas, quéchua e nahuati. A sua formação foi, como é habitual para qualquer pessoa que estuda música clássica, centrada no repertório francês, italiano e alemão. Mas por sua própria vontade sempre estudou e procurou obter formação no repertório que realmente a apaixonava, o latino-americano e ibérico.

Como referimos no parágrafo anterior, a mentora do festival é uma cidadã do mundo, a sua vida, quer a nível pessoal, quer a nível profissional levou-a a viver e a viajar por várias partes do mundo. Patrícia que agora vive em Barcelona há mais de dez anos, já

27

viveu em Miami, em Nova Iorque e São Francisco e já lecionou e atuou, além das cidades já referidas, no Texas, em Bogotá e em países como Itália, Rússia, Alemanha, Dinamarca, Portugal e Brasil, entre outros.

Ainda quando vivia nos Estados Unidos, Patrícia apercebeu-se “de que os cantores líricos viajavam para a Europa para estudar o repertório tradicional da ópera e da lied e não existia nenhum espaço dedicado ao meu repertório” (Caicedo, entrevista: 2013). Quando já estava a viver em Barcelona, a vontade de Patrícia de fazer alguma coisa relativamente ao facto de o repertório que tanto a apaixonava ser tão desconhecido, não só do público em geral, mas também dos profissionais da área, dos cantores, dos músicos e dos compositores, passou a ser ainda mais forte. Assim começou a ser cada vez mais persistente e urgente a ideia de criar um espaço específico não só para a divulgação deste repertório, mas também um espaço onde cantores e músicos pudessem aprender e aprofundar o seu conhecimento sobre o mesmo. Assim surgiu, em 2004, o

Barcelona Festival of Song sob a direção de Patrícia Caicedo e produzido e organizado

pela Mundo Arts, uma empresa sediada nos Estados Unidos e dirigida também pela mesma. Um ano antes da primeira edição do BFOS, em 2004, Patrícia deu início à sua preparação. Foi um processo longo e demorado, tudo estava por fazer, desde a escolha do nome do festival, à procura de parceiros e patrocinadores, encontrar lugares para realizar os concertos, divulgar o festival ao público e aos possíveis participantes. Como nos conta a organizadora na entrevista que nos concedeu, “o festival não recebe dinheiro de nenhuma instituição, mas recebe ajuda em géneros de instituições públicas” (Caicedo, entrevista: 2013), por exemplo o governo da Catalunha através do seu Departamento de Cultura disponibiliza alguns espaços públicos, como a biblioteca da Catalunha, para a realização de concertos, outras entidades disponibilizam também os seus espaços para a realização de concertos, workshops e aulas. Outras instituições

28

apoiam também o BFOS, por exemplo a TMB – Transports Metropolitans de Barcelona que nas semanas anteriores ao festival passa o spot promocional do mesmo na sua rede de televisão nas estações de metro e nas carruagens. Ainda que com todas as ajudas, o festival tem elevados custos financeiros, principalmente no que se refere ao alojamento dos participantes, alunos e professores e o aluguer do piano utilizado nas aulas e nos concertos (apesar de a entidade que aluga o piano fazer um preço especial numa tentativa de ajudar o festival, o custo é bastante elevado).

Financeiramente o festival é sustentado principalmente pelas propinas pagas pelos alunos que se inscrevem para participar no festival. Este ano, pela primeira vez na história do festival, a sua diretora na apresentação de cada um dos concertos atreveu-se a apelar à generosidade do público e colocou um cartaz (em anexo – ilustração 4) e uma caixa de doações na entrada do espaço para que os presentes pudessem deixar alguma contribuição, uma vez que todos os concertos são completamente grátis para o público. Infelizmente Espanha, tal como Portugal, não está a passar por momentos muito fáceis a nível económico, assim que nem sempre as contribuições foram as esperadas. Mas de qualquer forma a recetividade do público a este atrevimento foi bastante positiva.