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2. O SETOR ELÉTRICO BRASILEIRO E A REESTRUTURAÇÃO

2.4 O Setor Elétrico Brasileiro

2.4.1. Histórico do Setor Elétrico Brasileiro

De acordo com Godoy (2000), a história do setor elétrico no Brasil caracterizou-se por algumas iniciativas isoladas e pioneiras, como em 1879, quando D. Pedro II, Imperador do Brasil, que normalmente se interessava por novas invenções e descobertas, concedeu a Thomas Edson o direito de introduzir no Brasil processos e aparelhos para geração de eletricidade, e inaugurou o primeiro sistema elétrico do país para iluminação da antiga Estação da Corte da Estrada de Ferro Central do Brasil (Estação D. Pedro II nos dias de hoje).

Em junho de 1881, o mesmo D. Pedro II mandou instalar um sistema de iluminação elétrica no Campo da Aclamação (Praça da República). Já em 1883, Campos no estado do Rio de Janeiro, tornou-se a primeira cidade do Brasil e da América do Sul a receber iluminação pública elétrica.

Até o inicio do século, várias usinas de pequeno porte foram sendo instaladas no Brasil. Posteriormente, o grande potencial hidráulico brasileiro atraiu investimentos estrangeiros para o setor e várias companhias de energia elétrica foram se instalando no

pais, porém a falta de regulamentação permitia que as mesmas não investissem parte do lucro obtido na modernização das suas instalações, e deste modo a demanda começou a apresentar crescimento superior à oferta.

A partir da revolução de 30, surgiram várias medidas administrativas que visavam modificar significativamente as condições de prestação dos serviços de energia elétrica no país.

Em 1934, foi criado o Serviço de Águas, ligado ao Ministério da Agricultura e que viria a ser a primeira semente do atual Ministério de Minas e Energia. Ainda em 1934, institui-se o Código de Águas pelo Decreto nº 24.643 de 10/07/1934, que deu ao país uma legislação específica quanto aos aproveitamentos hidrelétricos para a produção de energia.

Em 1948, a fim de aproveitar o potencial hidráulico do Rio São Francisco e levar energia elétrica a todo o Nordeste, é criada a Companhia Hidro Elétrica do São Francisco - CHESF que viria a se tornar um marco de desenvolvimento para toda a região.

No inicio da década de 50, o setor estava sob o comando da iniciativa privada, tendo participações importantes de empresas estrangeiras, como a Power Brascan Limited (Canadá) e American Foreign Power Company - Amforp (Estados Unidos).

A partir da década de 50, a história do Setor Elétrico no Brasil passa por importantes transformações, com uma sucessão de marcos históricos, fundamentais para o desenvolvimento do setor elétrico no Brasil.

Em 1952, foi criada a CEMIG para eletrificar todo o estado de Minas Gerais e em 1957, numa parceria governo em conjunto com a iniciativa privada (Light e Amforp), é criada Furnas Centrais Elétricas com o intuito de construir uma usina hidrelétrica no Rio Grande, entre Minas Gerais e São Paulo e que levaria energia aos estados da região Sudeste do país.

A constituição da empresa Furnas é um exemplo que ilustra o desinteresse do capital estrangeiro na expansão do Setor. A Light e a Amforp participaram, inicialmente, com 60% do capital da empresa, mas em menos de quatro anos esta participação reduziu-se a apenas 2%, devido aos constantes investimentos necessários à construção da usina e das linhas de transmissão para Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro (Contrim, 1994).

Durante os anos 60, o Estado assume a responsabilidade pela reorganização do setor, com a criação:

 em 1960, do Ministério de Minas e Energia (MME) que viria a ser o responsável pela política energética do país entre outras atribuições ligadas a essa área;

 em 1961, promulga-se a lei de criação das Centrais Elétricas Brasileiras S.A. – ELETROBRÁS (que viria a se constituir como empresa em 11/06/1962), que passou a atuar inicialmente na implantação da política tarifária definida pelo MME e pelas aquisições dos direitos e ações das concessionárias estrangeiras até então atuantes no país.

Em 1964, o governo brasileiro concluiu a compra das concessionárias de energia elétrica atuantes no Brasil e pertencentes ao grupo AMFORP. Tais empresas passaram a assumir a condição de empresas subsidiárias da ELETROBRÁS que passou definitivamente a exercer o seu papel de holding no setor com grande autonomia administrativa.

Com a gestão do Fundo Federal de Eletrificação, a ELETROBRÁS passou a ser a principal agência de financiamento para o setor no país.

Nesse período, o Departamento Nacional da Produção Mineral, criado nos idos dos anos 30 (e que controlava o serviço de águas no país), passa para Departamento Nacional de Águas e Energia – DNAE e posteriormente em 1968 passou a se chamar Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica – DNAEE sendo o responsável pelo planejamento, coordenação e execução dos estudos hidrológicos em todo o território nacional, além de realizar a supervisão, fiscalização e controle dos aproveitamentos das águas que alteram o seu regime e os serviços de eletricidade em todo o país.

Destaque também nesse período para a criação das subsidiárias da região sul, Centrais Elétricas do Sul do Brasil – ELETROSUL (1968), e da região norte, Centrais Elétricas do Norte do Brasil – ELETRONORTE (1973).

Ainda em 1973, a ELETROBRÁS, em conjunto com a empresa de energia elétrica estatal do Paraguai, Administración Nacional de Eletricidad, estabeleceu o acordo visando a construção da usina hidrelétrica de Itaipu na fronteira entre os dois países e que seria uma obra de responsabilidade dos mesmos.

Assim, na década de 70, a ELETROBRÁS controlava as quatro grandes empresas regionais de produção e transmissão de energia elétrica (ELETRONORTE, CHESF, FURNAS e ELETROSUL) além de coordenar o planejamento e o atendimento ao mercado de energia elétrica como um todo. Para isso ela definia critérios e

procedimentos para a operação do sistema elétrico nacional, deixando as tarefas executivas a cargo das empresas regionais controladas por ela.

É importante ressaltar que, algumas concessionárias locais e estaduais, notadamente nas regiões sul e sudeste, como a COPEL no Paraná, a CEMIG em Minas Gerais e a CESP em São Paulo, também possuíam algumas centrais de geração. Nas demais regiões, as empresas concessionárias locais e estaduais se encarregavam apenas da subtransmissão e da distribuição da energia elétrica em suas áreas de concessão.

Esse modelo centralizado, segundo Ferreira (1999), poderia ser considerado como o modelo mais eficiente para o sistema brasileiro, tanto sob o ponto de vista técnico quanto do econômico, além de se ajustar ao modelo de crescimento impulsionado pelo Estado que prevaleceu no Brasil após a 2ª Guerra Mundial, quando o país fez uma transição de uma economia agrícola de exportação para uma nova economia industrializada.

No final dos anos 70, todas as empresas de energia elétrica atuantes no Brasil possuíam capital nacional. Em 1979, a política energética nacional passou a ser afetada pelos impactos do segundo choque do petróleo e pela elevação das taxas de juros internacionais, eventos que se somados aos novos episódios da década de 1980 (desvalorizações cambiais, crise mexicana) levaram o país para um grave cenário de crise cambial e inflacionária, contribuindo para uma discussão quanto ao papel do Estado intervencionista na economia, em função da incapacidade de produção das respostas necessárias ao enfrentamento do cenário econômico internacional (que reverteu o ciclo de crescimento) e de representação dos interesses econômicos e sociais da nação brasileira.

O esgotamento do modelo estatal a partir da década de 1980 teve sua origem, em boa parte, na Crise Econômica Mundial (segundo choque do Petróleo e a crise do México) e suas conseqüências na economia brasileira (Vance, 2000).

O cenário de expansão e prosperidade desapareceu na década de 80, a crise do petróleo do início dos anos 80 elevou bastante o endividamento externo do país, o que afetou o desempenho da ELETROBRÁS como agente financiador e suas controladas tiveram que recorrer a ajuda financeira internacional. As dificuldades enfrentadas pela economia brasileira provocaram recessão e um estrangulamento financeiro no setor elétrico que ainda necessitava de grandes obras de geração para o atendimento do aumento do consumo e do crescimento do seu parque industrial.

Em 1988, a nova Constituição Federal Brasileira relacionou como competências da União a exploração dos serviços e instalações de energia elétrica e aproveitamento energético dos cursos de água, diretamente ou sob regime de concessão, permissão (institutos de outorga) ou ainda por meio de autorização.

Com a prática de utilização do setor elétrico, nessa altura já quase todo estatizado, como ferramental de política de governo, dada sua capacidade de gerar reflexos específicos sobre determinados segmentos da sociedade, verificou-se a construção de uma situação paradoxal.

Se, por um lado, como parte do setor produtivo estatal, o SEB poderia ter acesso a diferentes fontes de financiamento que não, necessariamente, se vinculavam aos resultados de uma boa gestão empresarial (dotações orçamentárias federais e estaduais, empréstimos com juros mais baixos), por outro lado a própria função de prover suporte à determinadas políticas econômico-sociais do governo acabava por expor as concessionárias do serviço público de eletricidade a uma condição de desequilíbrio econômico-financeiro.

O Setor Elétrico Brasileiro vivia, naquele momento, a combinação entre a perda de fontes de financiamento, aumento dos custos internos e tarifas que já não refletiam a realidade da concessão, agravando o desempenho financeiro e técnico das empresas. Incapacitadas, de realizar o volume de investimentos necessários para acompanhar a expansão e manutenção dos serviços, as empresas ainda tinham que conviver com:

[...] a fragilidade do órgão regulador (DNAEE), erros de planejamento, interesses políticos locais e pressões de grupos de interesse vinculados às empresas construtoras. Estes elementos induziriam o setor elétrico a sugerir tarifas inadequadas, a aceitar esquemas de financiamento incompatíveis com seu fluxo de caixa e a programar obras que não necessitava, enquanto postergava obras indispensáveis à melhoria do seu desempenho técnico e financeiro (Rosa; Tolmasquim e Pires, 1998, p.156).

A grave crise do setor elétrico evidenciou as limitações dos instrumentos de controle do Estado, a interferência de interesse privados na administração pública e a deterioração das relações entre empresas estaduais, controladas e a ELETROBRÁS, com a eclosão de conflitos de natureza financeira e institucional (Lima, 1995).

No início dos anos 1990, o Estado sucumbe às pressões de organismos internacionais em favor de uma solução reestruturante, promovendo reformas políticas, econômicas e sociais por meio da desestatização e desregulamentação da economia

nacional, privatização das empresas produtivas estatais e sistemas de saúde, educação e previdência, conjuntamente com a abertura do mercado, facilitando negociações e associações de corporações transnacionais e empresas brasileiras (Ianni, 1999).

A crise no Setor Elétrico atravessou toda a década de 1980, chegando a conseqüências alarmantes na década de 1990 com o risco iminente de déficit energético. Na tentativa de solucionar os problemas do Setor Elétrico, o Governo instituiu as leis:

 Lei nº 8.031/1990 criou o Programa Nacional de Desestatização - PND, restringindo a atuação do Estado às atividades como educação, saúde, segurança e regulação;

 Lei nº 8.631 de 1993, com o objetivo de promover a atualização das tarifas, a deseqüalização das tarifas cobradas pelas empresas e extinção do Regime de Remuneração Garantida.

A idéia central da reestruturação do setor elétrico era implantar um ambiente competitivo, onde o preço da energia, agora definido pelo mercado, fosse o principal sinalizador na atração de novos investimentos, que resultassem em decisões mais criteriosas para a expansão do sistema.

2.4.2 PROCESSO DE REESTRUTURAÇÃO DO SETOR ELÉTRICO NO