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CAPÍTULO 1 EMBASAMENTO TEÓRICO

1.2 Teoria da Atividade

1.2.4 Historicidade

1.2.4.1 Historicidade do ensino superior privado

O grande marco do início do ensino superior no Brasil é a vinda da família real portuguesa em 1808. Até aquele momento, apenas a classe privilegiada se formava nesse nível de ensino, em universidades na Europa, principalmente em Portugal. Dom João IV, então, inicia a implementação de escolas superiores no Brasil, como a Escola Médica da Bahia (1808), a escola de Medicina no Rio de Janeiro (1809) e a Escola Nacional de Engenharia (1810).

Já o setor privado de educação superior teve como sua certidão de nascimento, segundo Boas (2005), a Constituição de 1891, visto que esta afirmava que o ensino era livre à iniciativa privada, ratificando a proposta de Leôncio de Carvalho, feita em 1879, de abertura da educação à iniciativa privada durante o período Império. Os cursos poderiam ser ministrados por pessoas naturais e jurídicas de direito privado e não havia currículo mínimo, método de ensino único e controle de qualidade. A União tinha direção nacional sobre o ensino superior, mas os Estados eram livres para criar faculdades, com dinheiro público, privado ou ambos.

Entre 1891 a 1918, 56 novas escolas de ensino superior foram criadas, na sua maioria privadas. Já em 1930, eram 72 estabelecimentos de ensino superior que superavam as dificuldades de um ensino superior, segundo Boas (2005, p. 30), “burocratizado e ilusório”, e que caracterizavam um início de república que não teve o planejamento para uma transformação educacional, apesar de sua expansão, que uma democracia precisa.

Apesar de o governo manter vários estabelecimentos públicos de ensino superior com aumento no número de matrículas, o crescimento do número dessas instituições era baixo, o que indica a tendência de criação de estabelecimentos maiores. Por outro lado, o setor privado era dominado por escolas isoladas e pequenas, o que justifica, segundo Durham (apud BOAS, 2005), a estabilidade no número de matrículas entre os anos 30 e 60 nesse setor. Entre 1900 e 1930, o número de IES subiu de 24 para 133, sendo que 86

27 Saliento que a maior parte da retrospectiva histórica relacionada ao ensino superior privado foi baseada

em Boas (2005), mas optei por não fazer referência indireta ao autor em todos os parágrafos para não tornar o texto repetitivo.

foram criadas nos anos 20. Em 1933, o ensino privado já era responsável por 60,4% das IES e por 43,7% do total de matrículas (o que se manteve estável até 1960).

Apesar de ainda só haver duas universidades no Brasil (a do Rio de Janeiro e a de Minas Gerais), em 1931, durante o governo Vargas, foi instituída a Reforma de Francisco Campo, a qual apresentava regulamentos para universidades (Estatuto das Universidades Brasileiras). Essa reforma favorecia o sistema universitário, em detrimento às escolas profissionais, e estabelecia que o sistema superior de educação deveria ser ministrado em universidades. Segundo Boas (2005), o intuito não era reprimir o ensino privado, mas essa reforma acabou representando um desafio para esse setor e essa parece ser uma das razões para a relativa estagnação no número de matrículas entre os anos 30 e 60.

Seguindo as determinações do Estatuto das Universidades Brasileiras, as universidades particulares foram criadas na década de 40 e começam a se consolidar no Brasil, entre outros fatores, por meio do impulso das IES católicas. Em 1960, já havia 33 universidades: 23 públicas (federais ou estaduais), nove particulares católicas e uma particular presbiteriana (Mackenzie). O ensino superior, então, crescia ainda que lentamente e sem uma política de incentivo explícita.

No período de 1930 a 1960, então, a pequena expansão do ensino superior privado “foi uma resposta à demanda que emergia de diferentes setores da sociedade por cursos mais especializados ou mesmo novos, ocupando as lacunas deixadas, pelo poder público, impondo agilidade no sistema” (BOAS, 2005, p. 64).

Já no período de 1960 a 1987, ocorre a grande expansão do ensino superior privado, que inicia a interrupção do caráter concentrador, excludente e restritivo desse nível de ensino. Esse setor era responsável por absorver os excedentes, dando oportunidade de acesso a famílias mais modestas por meio da criação de mais escolas e de cursos noturnos, e respondendo à demanda de diferentes setores da sociedade. Isso se deve, principalmente, à criação da Lei de Diretrizes Básicas (LDB) de 1961 e a Reforma Universitária de 1968.

A LDB de 1961 continuou garantindo a existência do ensino superior privado, mas não definiu que ele se organizasse necessariamente em universidades. Ademais, ela não prevê um currículo fixo e rígido para todo o território nacional e permite que os Estados organizem o ensino, do primário ao superior. Ela ainda estabelece que as IES deveriam receber, até 1970, metade dos alunos que terminavam o colegial.

Nos últimos anos da década de 60, o governo ainda tinha que lidar com o alto número de alunos excedentes, ou seja, haviam concluído o colegial e sido aprovados no vestibular, mas não havia vagas públicas suficientes para estudarem. Ainda que fosse necessário impor ordem, o governo militar não se interessava pelo ensino superior e focava apenas a educação fundamental e o ensino técnico, já que o país apresentava altos índices de analfabetismo e mão de obra desqualificada (BOAS, 2005). Contudo, Sampaio (2000) afirma que isso não quer dizer que não houve crescimento do ensino superior público no período militar.

O governo, não podendo atender à solicitação dos estudantes, decidiu motivar o desenvolvimento das instituições particulares, apoio manifestado principalmente pela LDB de 1961 e a Reforma Universitária de 1968. O setor privado passa a se organizar e ocupar lacunas. Na educação superior, a situação se desenvolve da seguinte maneira:

O setor privado de educação acabou se beneficiando indiretamente dessas medidas e se tornou uma “alternativa fácil” para os governos

da época. Se a rede pública “não poderia por si só atender todas as necessidades”, o papel dos empresários da educação seria o seguinte:

complementar o ensino superior público, desafogar os cofres do governo e absorver a demanda reprimida dos excedentes. Logo, a iniciativa privada não-confessional, que já vinha atuando fortemente no primeiro e segundo graus, assumiu o papel de carro-chefe daquele momento histórico de expansão do terceiro grau. (BOAS, 2005, p. 80)

No final da década de 60, é implementada a Reforma Universitária de 1968, a qual determinava que o ensino superior era “indissociável da pesquisa, que deveria ser ministrado em universidades e, excepcionalmente, em estabelecimentos isolados, organizados como instruções de direito público e privado” (BOAS, 2005, p.81). Essa preferência, contudo, só era aplicada à rede pública e uma série de decretos, resoluções e portarias facilitaram a criação de faculdades isoladas.

Com isso, afirmava-se que estava havendo a privatização do ensino superior, uma vez que o ensino privado crescia em detrimento do público. De fato, o Conselho Federal de Educação, órgão que regulamentava o ensino superior, havia aprovado quase todos os pedidos de abertura de cursos em 1970. Enquanto as universidades públicas eram, a maioria, de grande porte, com número maior de cursos, mas com menor capacidade para receber alunos, o ensino privado crescia por meio de estabelecimentos de pequeno porte, não-universitários e isolados.

O boom das instituições particulares aconteceu, primeiramente, com cursos da área de humanas, que são mais teóricos, não precisam de muitas instalações e podem ser ministrados em apenas um turno. O seu crescimento se deu mais fortemente nas regiões mais desenvolvidas do país e absorveu alunos que não conseguiam passar no vestibular ou não podiam estudar no período diurno, mas que buscavam profissionalização por meio de cursos tradicionais ou novos. Da mesma forma, acolheu pessoas acima de 40 anos que não tiveram oportunidade para estudar e mulheres que também buscavam formação no ensino superior, mas sem se afastar de suas famílias.

Para Sampaio (2000), o governo não entregou o ensino superior à iniciativa privada, mas preservou as universidades públicas de uma massificação, o que iria contra o princípio da pesquisa da Reforma de 1968, e expandiu o ensino público em regiões menos favoráveis ao financiamento privado.

A década de 1970 ficou conhecida, então, como a grande virada do ensino superior privado. Entre 1961 e 1980, o número de matrículas no ensino superior sobe de 98,8 mil para 1,34 milhão, sendo que, em 1961, o número de matrículas em IES privadas correspondia a 44% do total de matrículas, em 1970 (a grande virada), correspondia a 50,5% e, em 1980, a 63,3% das matrículas. Em relação ao número de estabelecimentos, eram 639 ao todo no ensino superior em 1971, sendo 539 particulares e, dessas, apenas 16 eram universidades. Em 1977, 80,7% das IES eram faculdades isoladas.

Desse modo, diferentemente do que propunha a Reforma de 1968, as instituições isoladas eram a regra, e não a exceção, e foram o embrião de muitas universidades particulares existentes hoje, o que é ignorado, segundo Boas (2005), por aqueles que acreditam que IES particulares mercantilizaram o ensino ao invés de promover acesso ao nível superior.

A Constituição de 1988, além de continuar afirmando que o ensino é livre à iniciativa privada, atesta que esse ensino deve atender à avaliação de qualidade pelo poder público. Assim, “qualidade de ensino, por ser um quesito de difícil objetivação, continuou gerando controvérsias e sustentando argumentos no sentido de frear a ascensão do setor privado” (BOAS, 2005, p. 86-87).

Já quase na década de 90, o objetivo do ensino privado deixa de ser apenas o de preencher lacunas da rede pública e passa a ser um complexo e diversificado sistema de

ensino que permite que milhares de pessoas de média e baixa renda tenham acesso ao ensino superior.

No início dessa década, o MEC recebe um grande número de solicitações para o reconhecimento de IES particulares como universidades. Esse setor passa ser mais heterogêneo e divide-se em IES universitárias (universidades, universidades especializadas e centros universitários) e IES não-universitárias (faculdades isoladas e faculdades integradas). Para Boas (2005), embora os centros universitários fossem entendidos como um demérito na visão de alguns dirigentes, eles se tornaram eficientes, menos burocráticos e autônomos, mas não eram obrigados a realizar pesquisas de ponta, apenas iniciação à pesquisa. Já Saviani (2010) entende que esses centros são universidades de segunda classe, que viabilizam e “democratizam” (grifo do autor) a universidade a baixo custo, enquanto os grandes investimentos são direcionados aos poucos centros de excelência elitistas. Os diferentes tipos de instituições universitárias estão, afirma o autor, em simbiose com os mecanismos e demandas do mercado.

O fato é que, em 2000, o ensino superior brasileiro era formado por 1.180 IES, das quais 1.004 eram privadas, compostas ainda, principalmente, por estabelecimentos isolados. Cabe ressaltar, contudo, que o número de universidades privadas quase quadriplicou entre 1985 e 1996, chegando a alcançar 76 universidades nesse ano, o que demonstra que a iniciativa privada percebe que instituições maiores geram maiores vantagens competitivas na disputa pela clientela de ensino superior. Elas passam, então, a ampliar seu escopo de cursos e aumentar suas instalações (SAMPAIO, 2000).

O aumento, então, do tamanho das instituições particulares é posterior ao das públicas. Até 1985, o setor público concentra as universidades enquanto que a predominância dos setores menores no setor privado está associada a uma preocupação quase que exclusiva com o atendimento da demanda para ensino e não para pesquisa. Essa opção por grandes universidades do setor público, aliando ensino à pesquisa e seguindo as recomendações da Reforma de 1968, gerou aumento dos custos do ensino público, o que limitou sua expansão e possibilitou que o setor privado atendesse à demanda massiva que o estado não conseguia atender (SAMPAIO, 2000).

A Constituição de 1988 e, posteriormente, a LDB de 1996 deram autonomia às universidades, o que permitiu que os estabelecimentos particulares, uma vez reconhecidos como universidades, respondessem de forma ainda mais ágil ao atendimento da demanda de massa, já que se livrava do controle burocrático do

Conselho Federal de Educação e podia criar e extinguir cursos e remanejar o número de vagas oferecidas em cada um deles.

A partir da década de 90 e na virada dos anos 2000, os desafios do setor privado deixam de ser os alunos excedentes, que impulsionaram a ampliação desse setor nas décadas de 60 e 70, e passa a ser o controle de qualidade e as vagas excedentes.

Em 1995, é criado o Exame Nacional de Cursos, conhecido como provão, que representa, apesar das resistências e desconfianças, “o primeiro indicador direto de qualidade na formação superior na história da educação brasileira” (BOAS, 2005, p. 101), já que até aquele momento as indicações de qualidade eram baseadas na titulação dos docentes ou na existência de pós-graduação, por exemplo. Os resultados do provão foram divulgados na mídia e utilizados como ferramenta de marketing pelas instituições, estimulando a concorrência entre elas.

O outro desafio das instituições era o aspecto financeiro. O aspecto demográfico havia sido superado, já que, apesar de continuar atendendo à demanda de massa, o setor privado tinha capacidade para receber praticamente todos os egressos do ensino médio no começo da década de 90. As IES privadas haviam ultrapassado os índices das IES públicas. O número de vagas havia subido de 289.208 para 396.682 entre 1985 e 1994. No entanto, o setor privado depende do pagamento de mensalidades e, portanto, tem que lidar com as possíveis mudanças no poder aquisitivo da população conforme as variações na economia e, consequentemente, com a inadimplência, que, em 2003, dobrou nas universidades privadas no Estado de São Paulo e pode levar a endividamentos e até à falência.

Se nas décadas anteriores esse sistema havia absorvido alunos que precisavam estudar em cursos noturno e que não conseguiam passar nos vestibulares das IES públicas, agora precisavam atender aqueles alunos que não conseguiam pagar as mensalidades e aqueles que, quando conseguiam concluir o ensino médio, não tinham condições de serem aprovados nos exames de ingressos. A relação candidato-vaga diminuía e o número de vagas excedentes aumentava.

Uma das soluções encontradas pelas IES para diminuir o problema com o baixo desempenho dos candidatos nos vestibulares foi a diversificação dos processos seletivos, os quais passaram a incluir análise do histórico escolar, cartas de recomendação, entrevistas e vestibulares unificados. Ademais, passaram a não cobrar

taxas de inscrição para as provas, a oferecer descontos em cursos de graduação e bolsas de estudos para os primeiros colocados, dentre outros.

Ainda que o pedido de aprovação de novos cursos continuasse, muitos eram derivações de cursos já existentes, mas com mensalidades mais baratas. Essa foi, inclusive, outra medida adotada por algumas instituições privadas: a diminuição do custo de seus cursos, o que só é viável, segundo Moehlecke e Catani (2006), a partir do aumento do número de alunos por sala e da contratação de docentes menos qualificados, o que compromete, assim como as medidas citadas acima em relação aos processos seletivos, a qualidade de ensino.

No intuito de expandir o ensino superior privado, que já não consegue manter-se autonomamente, e “salvá-lo” das vagas excedentes (que chegaram quase a 500 mil em 2003) e dos alunos inadimplentes (30% também em 2003), o governo também investe nesse setor. Há, assim, uma inversão de movimento: a expansão universitária que fora realizado pela iniciativa privada passa a ser impulsionada pela iniciativa pública.

O governo cria o FIES28, tradicional crédito educativo, que é o programa do MEC para financiar a educação superior de alunos de instituições privadas. Segundo Castro (apud Boas 2005, p. 113), se o governo financiar metade de uma mensalidade de R$3.000,00 para alunos necessitados, ele desembolsará R$1.500,00 sem qualquer custo adicional para os cofres públicos. Se ele receber esse aluno dentro de uma instituição pública, o custo será de 15.000,00. Ou seja, “pelo custo de um aluno no público, o MEC pode viabilizar dez alunos a mais no privado”.

Ademais, em 2004, o governo lança o PROUNI29 (Projeto Universidade para Todos) e propõe a isenção de alguns impostos e contribuições federais das IES particulares em troca de parcelas de suas vagas, que serão ocupadas com alunos de baixa renda advindos da rede pública. O governo, então, promove o acesso à educação superior a baixos custos para as contas da União (CATANI; GILIOLI, 2005). O sistema de cotas30 também foi criado pelo governo e reserva uma porcentagem das vagas em universidades e institutos federais para a concorrência entre alunos de escolas públicas.

Nota-se, então que, a partir da década de 90 até os dias atuais, houve, segundo Saviani (2010), uma diversificação nos tipos de instituições no ensino superior e uma

28 http://sisfiesportal.mec.gov.br/index.html 29 http://prouniportal.mec.gov.br/ 30 http://portal.mec.gov.br/cotas/index.html

consequente desaceleração da expansão das universidades públicas e estímulo à expansão das instituições privadas. Essa política foi adotada no governo de Fernando Henrique Cardoso ao ficar claro o déficit na porcentagem de alunos entre 18 e 24 anos com acesso ao ensino superior. Esse déficit foi admitido no Plano Nacional de Educação (2001), que concluiu que para alcançar o patamar de outros países da América Latina (como a Argentina, por exemplo, que tinha 36% da população nessa faixa etária com acesso ao ensino superior) era preciso aumentar para 30%, até 2010, o número de jovens que frequentavam cursos superiores (CATANI, GILIOLI, 2005; SAVIANI, 2010). Era preciso, ainda, responder ao número crescente da demanda por acesso ao ensino superior em razão do aumento de jovens que concluem o ensino médio.

Para alcançar esse objetivo, o Plano Nacional de Educação (2001, p. 41) previa que “o sistema de educação superior deve contar com um conjunto diversificado de instituições que atendam a diferentes demandas e funções” e tinha como uma das metas propostas “diversificar o sistema superior de ensino, favorecendo e valorizando estabelecimentos não-universitários que ofereçam ensino de qualidade e que atendam clientelas com demandas específicas de formação [...]” (p. 44). Entendia, ainda, que:

deve-se planejar a expansão com qualidade, evitando-se o fácil caminho da massificação. É importante a contribuição do setor privado, que já oferece a maior parte das vagas na educação superior e tem um relevante papel a cumprir, desde que respeitados os parâmetros de qualidade estabelecidos pelos sistemas de ensino (p. 42).

O governo Lula continuou o estímulo à iniciativa privada por meio de programas como o PROUNI e o FIES, mas também retomou investimentos nas universidades federais por meio do Programa REUNI31, que objetiva ampliar o acesso e permanência no ensino superior público.

De acordo com Saviani (2010), a expansão avassaladora do ensino superior privado fica clara nos índices quantitativos das instituições e do alunado. Em 1996, por exemplo, havia 922 instituições de nível superior, sendo 211 públicas (23%) e 711 privadas (77%). Em 2005, o número subiu para 2.165, sendo 231 públicas (10,7%) e 1.934 privadas (89,3%). Em 2012, são 2.416 instituições de ensino superior, sendo 2.112 privadas. Em relação ao número de alunos, em 1996, havia 1.868.529 alunos, sendo 725.427 (39,35%) em instituições públicas e 1.133.102 (60,65%) em instituições

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privadas. Já em 2005, o número de alunos era 4.453.156, sendo 1.192.189 (26,77%) no âmbito público e 3.260.967 (73,23%) no âmbito privado. Em 2012, são 7.037.688 alunos matriculados, sendo que 5.140.312 estão em instituições privadas. Nota-se, nas estatísticas apresentadas, que o setor privado absorve, atualmente, 2/3 dessas matrículas. Por um lado, então, ele aparentemente democratiza o ensino superior e oferece educação a pessoas, principalmente das classes C e D, que não tinham acesso a um curso de graduação em instituições públicas e não tinham (antes dos incentivos governamentais) condições financeiras de arcar com mensalidades de faculdades particulares. O vice-reitor da FMU, Arthur Sperandéo de Macedo, por exemplo, afirma, em entrevista ao portal de notícias G1, que o ensino superior privado “é o grande agente desta transformação que está promovendo centenas de milhares de jovens à formação superior que vai fazer uma diferença monumental daqui 20 anos” (G1, 2013).

Por outro lado, de acordo com Catani, Hey e Gilioli (2006), as ações afirmativas, como o PROUNI, por exemplo, apresentam uma noção falsa de democratização, pois continuam salientando a distinção dos estudantes por camada social e mantém, assim, a estratificação social existente. Para Catani e Gilioli (2005), ainda, esse programa alia cidadania e privatização ao incentivar o aumento de matrículas no setor privado, ao invés de fazê-lo no setor público (o que também era determinado pelo Plano Nacional de Educação), e alimentar a mercantilização do ensino superior.

Esse Programa, de caráter “popular, privatista e de baixo custo orçamentário” (CATANI; HEY; GILIOLI, 2006, p. 13), ajudou o governo a cumprir a meta do Plano Nacional de Educação ao possibilitar o acesso ao ensino superior sem, contudo, dar condições para a permanência do estudante nos cursos. Em suma, as autoras afirmam que “além da qualidade questionável dos cursos oferecidos, os beneficiários terão acesso a um ensino privatista e pautado pela falta de condições que garantam sua permanência até a obtenção do diploma” (CATANI; GILIOLI, 2005, p. 65). Questiona- se, então, não mais a insuficiência das vagas, mas a natureza delas e a capacidade dos alunos de ocupá-las.

A mercantilização e a qualidade do ensino superior privado também são questionadas por outros autores. Franco (2008), por exemplo, chama a atenção para o crescimento desordenado dos cursos (como pode ser percebido nas estatísticas já apresentadas), salientando que a sua multiplicação pode gerar fracionamento nos

recursos destinados a cursos já existentes, o que provoca, não raramente, a diminuição no nível de qualidade esperado dessas instituições.

Durham e Sampaio (1995) afirmam que o ensino superior privado se organiza como empresa que objetiva, implícita ou explicitamente, a obtenção de lucro e, por mobilizar recursos privados, “o setor privado é mais dinâmico no atendimento à demanda da clientela. Por isso, ele cresce mais rapidamente e o faz em detrimento de