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Identidade e docência coletiva na EaD

2.4 IDENTIDADE E FORMAÇÃO DE PROFESSORES: PRÁTICA

2.4.3 Identidade e docência coletiva na EaD

A noção de identidade social e grupal na perspectiva que aqui tomaremos para entender a ação dos grupos na estrutura institucional foi inicialmente desenvolvida por H. Tajfel, no início dos anos 70. Tajfel entende a identidade social como a percepção de pertença a um grupo e de não pertença a outro, ou seja, como: “[...] aquela parte do autoconceito do indivíduo que se deriva do reconhecimento de filiação a um (ou vários) grupo social, juntamente com o significado emocional e de valor ligado àquela filiação” (1981, p.63). A importância desse conceito é que ele enfatiza as lógicas internas dos grupos, como eles constroem uma relativa coesão e os indivíduos passam a se reconhecer uns nos outros e isso passa a ser percebido também pelo meio em torno deles o que nos possibilita a análise desse sujeito professor dentro da instituição.

A identidade social de um indivíduo decorre da resposta a seguinte pergunta: “Quem sou eu?”. Como as pessoas, dentro de uma percepção da realidade social, estão organizadas em grupos ou categorias, parte da resposta a essa questão deve prover da associação entre o eu e suas diversas categorias sociais. A partir do momento que o indivíduo está associado a um determinado grupo ou categoria, tem-se uma nova questão: “O que significa pertencer a este

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grupo?” Associada à resposta a esta questão estão normas, símbolos, crenças e valores que tornam distintos os grupos que os indivíduos associaram a sua autoimagem (VALA, 1997).

Pimenta afirma que a identidade profissional docente

[...] se constrói, pois, a partir da significação social da profissão; da revisão constante dos significados sociais da profissão; da revisão das tradições. Como, também, da reafirmação de práticas consagradas culturalmente e que permanecem significativas. Práticas que resistem a inovações, porque estão prenhes de saberes válidos às necessidades da realidade. Do confronto entre as teorias e as práticas, da análise sistemática das práticas à luz das teorias existentes, da construção de novas teorias, constrói-se, também, pelo significado que cada professor, enquanto ator e autor conferem à atividade docente no seu cotidiano a partir de seus valores, de seu modo de situar-se no mundo, de sua história de vida, de suas representações, de seus saberes, de suas angústias e anseios, do sentido que tem em sua vida: o ser professor (1997, p.3)

Considerando o contexto da pesquisa, educação a distância mediada pelas TICs, trago também as reflexões apresentadas por Bauman sobre a construção de identidade na sociedade pós-moderna.

Para Bauman (2005) em nossa época líquido-moderna a identificação, antes predeterminada e inegociável, se torna cada vez mais importante para os indivíduos que buscam desesperadamente um “nós”, um pertencimento. Os grupos a que os indivíduos tentam fazer parte, hoje em dia, tendem a ser eletronicamente mediados. A esses grupos, Bauman denomina de frágeis “totalidades virtuais”, em que é fácil entrar e ser abandonados. Diante desse mundo fluido as identidades estão em um processo contínuo de construção. Muitas são construídas e logo à frente se desfazem acompanhando o ritmo da modernidade líquida.

O mesmo autor se refere à construção da identidade pessoal (ou identidades pessoais) como um quebra-cabeça incompleto, ao qual faltam muitas peças (e jamais se saberá quantas). Um quebra-cabeça que não parte de uma imagem pronta que sirva de modelo a ser montado, mas que possui uma imagem, uma biografia a ser construída. Para construção da identidade, segundo Bauman:

Não se começa pela imagem final, mas por uma série de peças já obtidas ou que pareçam valer a pena ter, e então se tenta descobrir como é possível agrupá-las e reagrupá-las para montar imagens (quantas?) agradáveis. Você está experimentando com o que tem. Seu problema não é o que você precisa para “chegar lá”, ao ponto que pretende alcançar, mas quais são os pontos que podem ser alcançados com os recursos que você já possui, e quais deles merecem os esforços para serem alcançados (BAUMAN, 2005, p. 55).

Uma determinada identidade é construída a partir do pertencimento de um sujeito a um grupo. Suas várias identidades é que o constituem enquanto sujeito. Dessa forma, temos

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que a construção da identidade é algo definido sócio-historicamente. Bauman afirma que: “As identidades flutuam no ar, algumas de nossa própria escolha, mas outras infladas e lançadas pelas pessoas em nossa volta, e é preciso estar em alerta constante para defender as primeiras em relação às últimas” (2005, p. 19). É com base em seu sistema de crenças e valores que um sujeito busca pertencer ou não a um determinado grupo.

Belloni (1998) analisa os aspectos relacionados ao uso das TICs e descreve em sua concepção o que chamou de novos atores na educação: o professor coletivo e o estudante autônomo. No caso do professor coletivo evidenciam-se três papéis importantes: o professor responsável pela concepção e confecção do curso e dos materiais instrucionais; o professor responsável pelo planejamento e organização destes materiais; e o responsável pelo acompanhamento do aluno no processo de ensino-aprendizagem (tutoria).

No modelo UAB tem-se esses três papéis muito bem definidos como sendo o professor conteudista, professor formador e professor tutor. E, como já foi dito, a relação que antes existia era a de um professor-para-uma turma, mas nesse contexto da UAB precisaríamos de um professor–para muitas turmas, dada a quantidade de alunos matriculados em um curso. Dessa forma, o fazer docente no modelo UAB passa a ser coletivo. O fazer docente que normalmente é realizado por um professor-para-uma turma, passa a ser realizado por três professores para atender a uma turma (Figura 13).

Evidencia-se que além do conhecimento propriamente dito a respeito do que se pretende ensinar, conhecimento acerca do conteúdo a ser ministrado, é necessário que o professor também tenha um saber pedagógico, um conhecimento sobre como ensinar tal conteúdo, ou melhor, sobre como propiciar a aprendizagem do conteúdo aos seus alunos.

Enquanto professor na EaD partindo da vivência do ensino presencial, enquanto formação e prática docente, muitas são as rupturas e aprendizagens adquiridas pelos professores no exercício da docência na modalidade a distância.

A formação do docente virtual tem se dado por metaformação (“aprender fazendo” ou “se formar formando”), aprendendo a ser professores sendo professores, isto é, por tentativa/erro/reflexão/acerto (MILL, 2012).

Para Mill,

O trabalho prático e reflexivo na EaD, no percurso da metaformação, põe em questão a noção de autonomia docente, o domínio de uma base de saberes docentes, uma visão de todo o processo de produção na educação e na coletividade no trabalho (MILL, 2012, p. 47).

Nessa vivência docente, no ser sendo, é que as aprendizagens vão ocorrendo conforme o amadurecimento da prática, no exercício da função.

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A princípio o docente se vê reproduzindo na modalidade a distância a sua vivência presencial, mas com a prática, ele percebe que se faz necessária uma nova pedagogia. Uma pedagogia que propicie a construção do conhecimento pelos alunos a partir da mediação estabelecida pelo uso das TICs entre o docente, o conhecimento e os alunos.

Nevado, Carvalho e Menezes (2009) falam sobre metarreflexão, capacidade que se aprende, se desenvolve e se constrói em ação. Os autores afirmam que a metarreflexão “[...] se estabelece no trânsito, na conversação e na permeabilidade entre propor, acompanhar, avaliar, reconstruir ou estabelecer o grau otimizado de relevância na prática” (2009, p.86).

Freire afirma que: “[...] a reflexão crítica sobre a prática se torna uma exigência da relação Teoria/Prática sem a qual a teoria pode ir virando blablablá e a prática ativismo” (FREIRE, 1996, p. 12). O professor que se entende nesse processo de formação permanente, contínuo, busca refletir criticamente sobre a sua prática, buscando alternativas para melhorias no processo de ensino e aprendizagem.

Ainda, segundo Freire:

O próprio discurso teórico, necessário à reflexão crítica, tem de ser de tal modo concreto que quase se confunda com a prática. O seu “distanciamento” epistemológico da prática enquanto objeto de sua análise, deve dela “aproximá-lo” ao máximo. Quanto melhor faça esta operação tanto mais inteligência ganha da prática em análise e maior comunicabilidade exercem em torno da superação da ingenuidade pela rigorosidade. Por outro lado, quanto mais me assumo como estou sendo e percebo a ou as razões de ser de porque estou sendo assim, mais me torno capaz de mudar, de promover-me, no caso, do estado de curiosidade ingênua para o de curiosidade epistemológica (FREIRE, 1996, p.18).

A formação do professor perpassa uma reflexão contínua sobre sua prática. Cabe ao professor buscar inovar experienciando outros modelos e práticas, refletindo criticamente quanto ao seu fazer pedagógico.

Além disso, a identidade profissional docente se constrói a partir da sua rede de relações com outros professores (PIMENTA, 1997). Dessa forma, tanto a identidade individual como a construída coletivamente com o grupo de pertença são essenciais para que o professor crie uma autoimagem de si e do grupo.

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