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2.4 IDENTIDADE E FORMAÇÃO DE PROFESSORES: PRÁTICA

2.4.2 Professor reflexivo

O termo reflexivo tem como base as ideias do filósofo, psicólogo e educador norte- americano John Dewey (1859-1952) mais célebre representante da corrente filosófica que ficou conhecida como pragmatismo. Dewey caracteriza o pensamento reflexivo e defende a reflexão, que consiste em examinar mentalmente um assunto e dar-lhe considerações sérias, como fator preponderante para melhoria de práticas profissionais docentes.

Schön influenciado por John Dewey buscou aprofundar a temática formação dos profissionais realizando estudos sobre a educação profissional buscando relacionar teoria e

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prática, ou seja, reflexão a partir da ação. A partir dos anos 80, diversos artigos sobre formação de professores começam a referenciar o autor Donald Schön. Apesar de não se propor a realizar pesquisas diretamente relacionadas a essa temática, Schön buscou investigar três temas muito atuais: o conceito de eficiência profissional; o da relação entre teoria e prática e a temática da reflexão e da educação para a reflexão. Inclusive em sua obra intitulada “Educating the Reflective Practitioner” (1987), Schön sintetiza o seu pensamento pedagógico afirmando que a formação dos futuros profissionais deve incluir uma forte componente de reflexão a partir de situações práticas reais (ALARCÃO, 1996, p.12).

Vale destacar em Schön “[...] uma forte valorização da prática na formação dos profissionais; mas uma prática refletida, que lhes possibilite responder às situações novas, nas situações de incerteza e indefinição” (PIMENTA, 2006, p. 22).

A partir do pressuposto de que: “[...] não se pode ensinar ao aluno aquilo que ele vai ter necessidade de saber, embora se possa ajudá-lo a adquirir esse conhecimento” (ALARCÃO, 1996, p. 21) Schön apresenta três estratégias de formação: a experimentação em conjunto, a demonstração acompanhada de reflexão e a experiência e análise de situações homológicas.

Na experimentação conjunta, partindo da ação realizada pelo formando, com base em uma apreciação analítica e descritiva, são sugeridas outras formas de realizar a mesma ação com o objetivo de aperfeiçoar a prática e obter o resultado desejado. Formando e formador experimentam um processo de ação e reflexão compartilhado. Na demonstração acompanhada de reflexão ocorre quando se faz necessário um papel mais ativo do formador, cabendo ao mesmo realizar uma demonstração, executando a ação e comentando pouco a pouco. Na verdade cabe ao formador demonstrar, descrever o que demonstra, refletir sobre o que faz e o que descreve, e ao formando interrogar-se sobre o sentido da ação observada e descrita. E por último, no contexto homológico estabelece-se uma relação de paralelismo entre as situações de aprendizagem e as situações de prática profissional (ALARCÃO, 1996).

A atividade profissional é apontada por Shön como uma atuação:

[...] inteligente e flexível, situada e reativa, produto de uma mistura integrada de ciência, técnica e arte (...) É um saber-fazer sólido, teórico e prático, inteligente e criativo que permite ao profissional agir em contextos instáveis, indeterminados e complexos, caracterizados por zonas de indefinição que de cada situação fazem uma novidade a exigir uma reflexão e uma atenção dialogante com a própria realidade que lhe fala (ALARCÃO, 1996, p. 14)

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[...] baseia-se na consciência da capacidade de pensamento e reflexão que caracteriza o ser humano criativo e não como mero reprodutor de ideias e práticas que lhe são exteriores. É central, nesta conceptualização, a noção do profissional como uma pessoa que, nas situações profissionais, tantas vezes incertas e imprevistas, atua de forma inteligente e flexível, situada e reativa (2008, p.44).

Diante da complexidade da prática pedagógica torna-se imprescindível que os professores busquem uma postura reflexiva e crítica quanto à sua formação a partir das suas vivências, do seu fazer docente, e na sua relação com o meio e com o outro. Nesse sentido, o professor reflexivo deve ser capaz de pensar, analisar, questionar sua prática buscando agir sobre a mesma.

O ensino como prática reflexiva tem se estabelecido como uma tendência significativa nas pesquisas em educação, apontando para a valorização dos processos de produção do saber docente a partir da prática e situando a pesquisa como um instrumento de formação de professores, em que o ensino é tomado como ponto de partida e de chegada da pesquisa (PIMENTA, 2006, p.24).

Sendo a capacidade reflexiva inata do ser humano esta precisa de contextos de liberdade e de responsabilidade para que seja desenvolvida. Por exigir um pensamento crítico a reflexão é tida muitas vezes como difícil de ser praticada. Alarcão afirma que: “É preciso vencer inércias, é preciso vontade e persistência. É preciso fazer um esforço grande para passar do nível meramente descritivo ou narrativo para o nível em que se buscam interpretações articuladas e justificadas e sistematizações cognitivas” (2010, p.49).

Nóvoa afirma que a formação pode estimular uma autonomia contextualizada da profissão docente. E que importa valorizar paradigmas capazes de promover a “[...] preparação de professores reflexivos, que assumam a responsabilidade do seu próprio desenvolvimento profissional e que participem como protagonistas na implementação das políticas educativas” (NOVOA, 1992, p.16).

Como forma de praticar a reflexão faz-se necessária a busca de um caráter investigativo por meio da expressão e no diálogo. É importante dialogar consigo mesmo, com os outros que construíram os conhecimentos e que nos servem como referência, e com o próprio contexto. Segundo Alarcão nos contextos formativos com base na experiência:

[...] a expressão e o diálogo assumem um papel de enorme relevância. Um triplo diálogo, poderei afirmar. Um diálogo consigo próprio, um diálogo com os outros incluindo os que antes de nós construíram conhecimentos que são referência e o diálogo com a própria situação, situação que nos fala. (...) Este diálogo não pode quedar-se a um nível meramente descritivo, pois seria extremamente pobre. Tem de atingir um nível explicativo e crítico que permita aos profissionais de ensino agir e falar com o poder da razão (2008, p.49).

Pimenta entende o trabalho e a formação de professores em processo contínuo de formação inicial e contínua. Para a autora “[...] a formação é, na verdade, autoformação, uma

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vez que os professores reelaboram os saberes iniciais em confronto com suas experiências práticas, cotidianamente vivenciadas nos contextos escolares” (PIMENTA, 1997, p.7) e é nesse confronto e a partir de troca de experiências e práticas que: “[...] os professores vão constituindo seus saberes como praticum, ou seja, aquele que constantemente reflete na e sobre a prática” (PIMENTA, 1997, p.7).

Em processo contínuo de autoformação cabe ao professor rever suas concepções sobre ensino, aprendizagem, planejamento, interação com alunos, avaliação etc., como forma de construção de conhecimentos e resignificação de práticas. Dessa forma, entendemos que a formação de professores como prática reflexiva, de caráter contínuo, na e sobre a ação, sobre a prática docente, deve ser exercida como forma de promover a autonomia, a partir de uma prática contextualizada, politicamente situada, voltada para a valorização do desenvolvimento de professores e de instituições de ensino.

Alarcão quer que: “[...] os professores sejam seres pensantes, intelectuais, capazes de gerir a sua ação profissional” (2010, p.50), ou seja, capazes de refletir sobre na/sobre sua ação.

A reflexão na ação acompanha a ação em curso e pressupõe uma conversa com ela. Refletimos no decurso da própria ação, sem a interrompermos, embora com breves instantes de distanciamento e reformulamos o que estamos a fazer enquanto estamos a realizá-lo, tal como fazemos na interação verbal em situação de conversação (...). A reflexão sobre a ação pressupõe um distanciamento da ação. Reconstruímos mentalmente a ação para tentar analisá-la retrospectivamente (ALARCÃO, 2010, p.54).

Para Nóvoa se faz necessária à diversificação dos modelos e das práticas de formação de professores. O autor afirma que: “A formação passa pela experimentação, pela inovação, pelo ensaio de novos modos de trabalho pedagógico. E por uma reflexão crítica sobre a sua utilização” (NOVOA, 1992, p.16).

Considerando a ênfase no professor reflexivo evidenciam-se alguns problemas, tais como: o individualismo da reflexão, a ausência de critérios externos potencializadores de uma reflexão crítica, a excessiva (e mesmo exclusiva) ênfase nas práticas, a inviabilidade da investigação nos espaços escolares e a restrição desta nesse contexto (PIMENTA, 2006, p.45). A mesma autora objetivando a superação desses limites por parte do professor aponta algumas possibilidades, tais como: superar a dimensão individual da reflexão considerando o seu caráter público e ético; da construção de conhecimentos por parte dos professores a partir da análise crítica (teórica) das práticas e da ressignificação das teorias a partir dos conhecimentos da prática (práxis); do professor-pesquisador à realização da pesquisa no espaço escolar como integrante da jornada de trabalho dos profissionais da escola, com a

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colaboração de pesquisadores da universidade; considerar o desenvolvimento profissional como resultante da combinação entre a formação inicial, o exercícios profissional (experiências próprias e dos demais) e as condições concretas que determinam a ambos; da formação contínua que investe na profissionalização individual ao reforço da escola e do coletivo no desenvolvimento profissional dos professores (PIMENTA, 2006).

Com base em uma prática docente reflexiva e crítica, Freire afirma que: “[...] Faz parte da natureza da prática docente a indagação, a busca, a pesquisa. O de que se precisa é que, em sua formação permanente, o professor se perceba e se assuma, porque professor, como pesquisador” (1996, p.14). Ainda, para o autor: “[...] A prática docente crítica, implicante do pensar certo, envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar sobre o fazer” (1996, p. 17).

A análise das diversas contradições presentes na apropriação histórica e concreta do conceito de professor reflexivo reforça a proposta “[...] de superar-se a identidade necessária dos professores de reflexivos para a de intelectuais críticos e reflexivos” (PIMENTA, 2006, p.49).

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