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II 4.3 TIC: OBJECTO OU INSTRUMENTO PEDAGÓGICO?

O título desta secção poderia ser “da disciplina de TIC às TIC nas disciplinas” [Duarte, 2006]. O

conceito de Tecnologias de Informação e Comunicação atingiu, nestes últimos anos, uma ênfase muito acentuada em vários sectores da sociedade. No contexto escolar, TIC é por um lado tecnologia educativa e instrumento pedagógico e por outro, o nome da disciplina de informática recentemente implementada nas escolas, que traduz este acrónimo em objecto pedagógico. Se educar significa ensinar, doutrinar ou instruir e disciplinar, tecnologia, do grego technê (arte, ofício) e logos (estudo de), refere-se à técnica e ao estudo das máquinas. Apesar da relação do homem com a natureza ter sido desde sempre mediada pela tecnologia, só na década de oitenta, com o desenvolvimentos das então novas tecnologias da informação – computadores, vídeo e hipermédia – surge TIC enquanto tecnologia educativa e instrumento pedagógico. A tecnologia em si não é “Educativa” nem “Des-educativa”. Ela aparece no contexto de que o homem deve ser educado para actuar conscientemente num ambiente tecnológico mas também como uma ciência aplicada capaz de contribuir para tornar o processo educativo mais eficaz e assim melhorar a

aprendizagem [Blanco et al., 1993]. A investigação em tecnologias educativas reflecte várias etapas

da evolução deste conceito. Blanco [Blanco, 1983], na figura 1, esquematiza três etapas: a da

ênfase colocada na modernização (ajudas para o ensino), à optimização do processo (ajudas para a educação) até aos processos de mudança (focagem sistemática).

Como se verifica na tabela 5, Elias Blanco e Bento Silva [Blanco et al., 1993] identificaram três momentos na evolução das TIC enquanto instrumento pedagógico em Portugal desde os anos 60 aos anos 90.

Graças à Internet e à sua “filosofia”, TIC foi ganhando outros contornos enquanto instrumento pedagógico. A pouco e pouco foram surgindo novas formas de tecnologias educativas que originaram o que hoje se pode designar de serviços educativos da Web (ex.: os serviços de comunicação como os chats).

Década de 60 até meados de 70: “Arranque”

Meios audiovisuais como auxiliares das actividades lectivas do professor. Difusão do ensino através de programas de rádio e televisão (1964: a Telescola)

Meados da década de 70 e anos 80: “Afirmação”: Ensino por computadores

Integração da Tecnologia Educativa nos currículos de Formação de Professores (com início em 1975 com a leccionação da disciplina nos curso de formação inicial e integrada de professores para o ciclo preparatório e secundário criados nas Universidades de Aveiro e do Minho)

Projecto Minerva lançado em finais de 1985 com a finalidade de conduzir à “introdução, de

forma racionalizada, dos meios informáticos no ensino não superior, num esforço que permita valorizar activamente o sistema educativo em todas as suas componentes e que suporte uma dinâmica de permanente avaliação e actualização de soluções.” (despacho 206/ME/85 de 15

de Novembro.)

Os trabalhos da Reforma Educativa (1987/1988) que contribuem para a sedimentação das Tecnologias Educativas no seio do sistema educativo prenunciando a próxima fase. (ex: promoção da dimensão educativa da comunicação social, criação de rádio e televisão educativa, generalização do recurso às tecnologias áudio e vídeo e a promoção da utilização das tecnologias de comunicação multimédia, produção de documentação pedagógica de grande difusão pelo sistema escolar e educativo.)

Finais da década de 80 e 90: “Desenvolvimento”: Tecnologias da Comunicação

Resultado das propostas das Reforma do Sistema Educativo; a Tecnologia Educativa está presente em todas as modalidades de formação de professores.

Tabela 5 – Origens e evolução das Tecnologias Educativas em Portugal – Adaptado [Blanco et al., 1993]

Jonassen fala em “aprender com tecnologias” [Jonassen et al., 1999]. Segundo este autor, as

tecnologias facilitam o pensamento crítico, permitindo uma aprendizagem significativa, envolvendo de forma activa os alunos na construção, na conversão, na articulação, na colaboração, na reflexão e não na reprodução, recepção, repetição, competição ou prescrição do processo de ensino-aprendizagem. Esta interpretação ajuda a compreender não só os diferentes tipos de utilização possíveis em função da forma de encarar a aprendizagem, mas também o tipo de trabalho que com elas pode efectivamente ser realizado e as formas adequadas de preparar os

professores para mais um desafio [Costa, 2004] que assenta nas TIC. Ainda no contexto da

mundo virtual propiciador de experiências reais no desenvolvimento de novas formas de universalizar o conhecimento humano. Este autor acredita que a capacidade do ser humano em apreender a lidar com as TIC é adquirida em menos tempo do que o necessário para aprender a ler, escrever ou contar. TIC é ainda instrumento pedagógico sob várias versões: online ou offline, síncrona ou assíncrona, promotor do ensino individualizado ou colectivo e presencial ou não presencial. Fernando Costa [Costa, 2001] distribui, na figura 2, as diversas formas que TIC pode assumir enquanto tecnologia educativa e instrumento pedagógico.

Figura 2 – Classificação das Tecnologias hoje disponíveis – Adaptado [Costa, 2001]

Cada vez mais se vêem as TIC adaptarem-se à realidade, ganhando terreno no espaço educativo, enquanto ferramentas de trabalho. Para promover a sua correcta integração no contexto escolar, o Ministério da Educação achou por bem introduzir nos currículos do ensino regular, a disciplina de TIC onde este acrónimo passou a adquirir a vertente de objecto pedagógico, no ano lectivo de 2004-2005.

TIC é para a autora, enquanto docente da disciplina, objecto e instrumento pedagógico. Objecto pedagógico por aquilo que se ensina e estuda e ao mesmo tempo, instrumento pedagógico por permitir a transmissão de conteúdos e aprendizagens dos módulos recorrendo aos computadores em vez dos típicos manuais. O projecto “AntarTIC” é um suporte online, uma tecnologia educativa, cujo enquadramento é o da disciplina de TIC. Em TIC, pretende-se desenvolver competências no uso da informática para que possa ser aceite, pela comunidade escolar, enquanto instrumento pedagógico. Acredita-se que o modelo deste projecto possa vir a ser válido para outras disciplinas, conferindo aí às TIC o papel de instrumento pedagógico, como aconteceu nos anos 80 com o Projecto MINERVA, que introduziu as TIC como instrumento pedagógico nas várias disciplinas.

Sala de aula Manuais, Livros Trabalho de grupo Tutoria Materiais impressos Áudio Vídeo Software educativo Chat Classe virtual Comunicação instantânea Colaboração virtual Conferência web Portais Listas Streamed vídeo Base de dados Sites temáticos Email Fóruns de discussão Textos Laboratórios virtual Espaços de partilha Offline Diferida Síncrona Online

Dos aspectos positivos dessa experiência destacam-se a convivência pedagogia – tecnologia, a introdução do computador como factor de animação pedagógica de mudança e o uso transversal das TIC. Apesar das suas vantagens, este projecto inovador para o seu tempo, não foi aplicado em grande escala, como já se referiu, pelo que teve fraco impacto nas escolas e sobretudo nos currículos. Hoje a intenção de introduzir as TIC no ensino mantém-se e o projecto MINERVA é uma referência e uma alavanca para as medidas em curso. A introdução da disciplina de TIC nos currículos, numa primeira fase enquanto objecto pedagógico permitiu a generalização do uso das TIC, uma vez que todos os alunos já contactam com as tecnologias, o que por sua vez veio diminuir o fosso que separa os info-excluídos. Ao adoptarem esta ferramenta de trabalho no seu dia a dia, na realização de trabalhos para outras matérias, no desenvolvimento de aplicações educativas, na comunicação com os outros, na procura de informação, entre outros, o conceito TIC ganha a vertente de instrumento pedagógico, permitindo que as TIC sejam utilizadas noutros contextos, diferentes da disciplina que o concebe enquanto objecto pedagógico.

Aprendizagem gera aprendizagem, nomeadamente quando, por exemplo, se observa os alunos na pesquisa de informação e na sua compilação no formato de apresentação. É frequente, nesta situação, constatar-se a noção de interdisciplinaridade quando os discentes solicitam novas aprendizagens para enriquecer os seus trabalhos para outras disciplinas, nomeadamente, a introdução de vídeos, animações, gravações de sons em apresentações electrónicas. Confrontados com situações do dia a dia, os alunos vão despertando para as várias utilidades da informática. O próprio ciclo de vida e reciclagem da informática, e dos vários softwares, têm criado nos alunos a vontade de aprender, sempre e cada vez mais, na ânsia de saber como manipular o

software e equipamento mais recente. Expondo um caso prático real, quando a autora leccionou

aos alunos do 10º ano de escolaridade o desenho de páginas Web, estes, para quem as apresentações electrónicas eram até então a forma mais apelativa de mostrar os seus trabalhos, revelaram uma grande vontade de aprender este novo conceito passando a descartar “a velha forma” de apresentar trabalhos porque tê-los presentes na Internet, com todas as animações e truques que ela permite, era algo de revolucionário que lhes iria permitir “brilhar” na disciplina em questão. O seu entusiasmo chegou muitas das vezes a criar no próprio docente da disciplina, à qual se destinava o trabalho, curiosidade em aprender com as TIC e verificar a sua real vantagem, enquanto instrumento pedagógico, uma vez que observou na turma um processo de ensino- aprendizagem que resultou. Nesse sentido pode-se dizer que TIC enquanto instrumento pedagógico fomenta TIC – objecto pedagógico e vice-versa. Realça-se, novamente, o papel dos alunos como factor impulsionador da mudança pois ao utilizarem estes recursos numa aula, conseguiram cativar os seus colegas para o próprio processo de ensino-aprendizagem e, ao mesmo tempo, despertar os docentes para estas tecnologias, tornando as TIC uma ferramenta viável com capacidade para melhorar o ensino e manter motivados os alunos. TIC é de facto objecto pedagógico quando inserido no contexto da aula de ITIC/TIC, mas instrumento pedagógico quando é utilizado para promover demais matérias, oferecendo alternativas atractivas, motivadoras, facilitadoras da interiorização de conceitos e enquanto complemento ou substituto de

manuais escolares, passando a ser um instrumento de desenvolvimento cognitivo, que transforma a informação em conhecimento seja ele oferecido online ou offline.

A utilidade das TIC vai mais além no próprio contexto escolar na sua acção pedagógica. O cartão electrónico, ao invés do cartão de cartolina, que identifica e regista a entrada e saída dos alunos, permite adquirir produtos no bar ou papelaria, enquanto moeda electrónica, vem obrigar os alunos a manipular as TIC, em vários recantos das suas escolas, a partir dos terminais “touch screen” – quiosques electrónicos. Para consultar horários, faltas, avaliações e sumários, a escola promove o uso das TIC a outros actores, desde os professores aos Encarregados de Educação, que a pouco e pouco têm a necessidade de se envolverem com as TIC. À medida que os processos passam a ser informatizados, ou a recorrer à informática, todos os actores escolares têm necessidade de interagir com as tecnologias desde o Sistema Integrado de Gestão de Escolas (SIGE), desenvolvido em colaboração com a Universidade de Aveiro, aos sumários electrónicos, ao envio de SMS aos Encarregados de Educação, para avisos de reuniões ou faltas dos seus educandos, entre outros.

Se, por um lado, os alunos fomentaram a mudança ao trazerem para dentro das escolas a informática, por sua vez, hoje, outros actores que não alunos, começam a levar essa mesma mudança de dentro para fora dessas mesmas escolas onde TIC passa a assumir outros papeis que não objecto ou instrumento pedagógico. O fenómeno das TIC está presente apesar de nem sempre se dar conta dele. O certo é que se hoje desaparecesse sentir-se ia a sua falta.