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3 PRINCIPAIS IMPLICAÇÕES DAS NOVAS TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO SOBRE O TRABALHO

3.5 Implicações das novas tecnologias da informação sobre a subjetividade

A relação entre subjetividade e trabalho remete à análise da maneira como os sujeitos vivenciam e dão sentido às suas experiências de trabalho (Nardi et al, 2002, p.302). Esta análise coloca duas dificuldades: a primeira é a definição da noção de subjetividade; e, a segunda é a compreensão de uma relação que se encontra em permanente transformação. Estas dificuldades nos colocam frente à especificidade histórica assumida pela relação entre sujeitos e o trabalho em cada contexto espaço-temporal. Deleuze16, citado por Nardi et al (2002, p.303) afirma que “as mutações do capitalismo engendram a produção de uma nova subjetividade, pois cada mutação social implica em uma reconversão subjetiva com suas ambigüidades, assim como seu potencial de resistência e transformação”.

De acordo com Martins, J. (2000, p.10), “a noção de subjetividade é constituída pelos elementos de natureza particular, relativos à biografia da vida de cada indivíduo, e o conjunto

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das relações sociais gerais presentes na história na qual o indivíduo está inserido”. Para Seve17 citado por Martins, J. (2000, p.10), “esta dupla determinação da subjetividade traduz uma tensão entre os aspectos universais e particulares que estruturam a personalidade”. Pois, tudo que o indivíduo experimenta em sua vida constitui o universo dos seus valores, princípios e visão de mundo. As determinações particulares (biografia) e aquelas de natureza mais geral (história) constituem os registros pelos quais o indivíduo desenvolve a forma específica e singular de significação do mundo que o cerca. Esta forma singular de significação do mundo, que o indivíduo desenvolve, é mediada por um universo intenso de experiências, que revela, ao mesmo tempo em que oculta, o conjunto de conflitos e contradições que o indivíduo está sujeito. De acordo com Martins, J. (2000, p.11), isto implica, portanto, que a dinâmica entre história e biografia é mediada pela noção de experiência.

Para explicar a noção de experiência, recorremos a Martins, J. (2000, p.11) e a Leite (1994, p.30); esses autores empregam a noção de experiência de E. P. Thompson, a qual “traduz a dinâmica de conflitos, contradições e estranhamentos através dos quais se constroem não só os elementos do geral como também do particular. As experiências ocorridas no cotidiano imbricam-se nas condições de desenvolvimento tanto da biografia quanto da história”.

Isto implica que as contradições e conflitos experimentados são expressão do particular (biografia) e do coletivo (história). Os conflitos, os estranhamentos, os inconformismos diante da dor e do incômodo da exploração experimentados abrem a possibilidade de cada um conhecer melhor a sua condição de vida e desenvolver uma consciência (Thompson18 citado por Martins, 2000, f.12).

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SÉVE, Lucien. A personalidade em gestação. In: SILVEIRA, P.; DORAY, B. (orgs.). Elementos para uma teoria marxista da subjetividade, São Paulo: Vértice, 1989.

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THOMPSON, E. P. La sociedad inglesa del siglo XVIII: lucha de clases sin clases? In: Tradicion, revuelta y consciência de clase. Barcelona: Critica, 1984.

O discurso de um trabalhador possui a marca e o registro do particular e do geral, do singular e do universal. Sua vida (experiências, representações e identidades) é marcada pela singularidade da sua história, da sua biografia, das relações sociais a que esteve sujeito, do bairro onde mora, das brincadeiras da época de infância e adolescência, da profissão dos pais, assim como pelo registro econômico/geral/material/estrutural das suas condições materiais de vida. O trabalho é, portanto, um ato que enuncia tanto o singular (o individual) quanto o universal (a classe) presente na orientação para a ação do trabalhador (Martins, J., 2000, f.13). A dinâmica das relações intersubjetivas permitem um processo interativo, através do qual se cria uma série de representações simbólicas determinantes na estruturação dos sentidos da vida e dos motivos de ação.

Trata-se, portanto dos motivos que impulsionam as pessoas para a ação, esta ação constitui uma síntese entre os elementos da biografia e da história, mediada pelas experiências, consubstanciada pelas representações simbólicas que orientam e fornecem o sentido e o significado. As representações simbólicas, via de regra estão vinculadas aos ideais, desejos e as esperanças constituídas a partir do imaginário. É através destes ideais, desejos e esperanças, que as pessoas começam a buscar, no imaginário, o conjunto de representações simbólicas que lhes proporcionem uma explicação, um sentido, um significado da sua existência e da forma com que elas se relacionam com o mundo (Bertrand19 citado por Martins, J., 2000, f.14).

Assim, a noção de subjetividade, resultante deste processo, corresponde: a dinâmica entre a biografia e história, mediada pela noção de experiência, que orientam as representações simbólicas presentes na construção dos sentidos da vida e dos motivos da ação.

Os campos subjetividade e trabalho constroem-se, portanto, no tensionamento entre as dicotomias indivíduo-coletivo, objetivo-subjetivo e interior-exterior.

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BERTRAND, Michele. O homem clivado: a crença e o imaginário. IN: SILVEIRA, P.; DORAY, B. (orgs.) Teoria marxista da subjetividade, São Paulo: Vértice, 1989.

Pensar a subjetividade nas suas conexões com o trabalho implica pensar os modos como as experiências do trabalho conformam modos de agir, pensar, sentir e trabalhar amarrados em dados momentos, mais ou menos duráveis, que evocam, a conexão entre diferentes elementos, valores, necessidades e projetos. Do mesmo modo, implica em diferentes possibilidades de invenção e criação de outros modos de trabalhar, na forma de transgressões ou mesmo de resistências- potências na conexão dos diversos elementos e dos modos de produzir e trabalhar (Nardi et al, 2002, p.304).

O processo de reestruturação produtiva, pelo qual têm passado as empresas, a partir da década de setenta tem provocado uma série de transformações na organização do trabalho. Essa reestruturação colocou a necessidade de um novo modelo de trabalhador, com capacidade de lidar com tecnologias e processos mais flexibilizados, o que exige, dos trabalhadores, maior flexibilização, ou seja, maior capacidade de adaptação de acordo com as mudanças da organização.

Essas transformações redefiniram o caráter da qualificação para o trabalho, reincorporando a experiência dos trabalhadores à base técnica, enriquecendo as tarefas, mas também, exigindo a sujeição e adaptação do desejo do trabalhador aos objetivos da empresa. As novas formas de organização do trabalho têm por objetivo a gestão das subjetividades, através de uma internalização forçada das metas e objetivos da empresa. Desta forma buscam negar a exploração da força de trabalho e o conflito capital-trabalho (Nardi et al, 2002, p.305).

A utilização de novas tecnologias, no processo de trabalho, também influencia os trabalhadores nessas novas formas de conceber e organizar o trabalho, pois a informatização transforma os modos de conhecer e organizar os saberes necessários à execução das tarefas. A temática do desemprego, associada à terceirização, à precarização e à informalização do trabalho também Figuram como importantes discussões relacionadas aos processos de subjetivação. A chamada psicopatologia do desemprego (Selligmann-Silva20 citado por Nardi et al, 2002, p.306) atinge não só aqueles trabalhadores fora do mercado de trabalho, mas, também aqueles que nele se incluem em condições de precarização e instabilidade.

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Todas essas questões constroem o campo da subjetividade e trabalho, e buscam elucidar as experiências dos sujeitos e as tramas que constroem o lugar do trabalhador, definindo modos de subjetivação relacionados ao trabalho.

O emprego das novas tecnologias da informação e organizacionais, no processo de trabalho, provoca transformações importantes na organização do trabalho. Essas transformações exigem dos trabalhadores novas qualificações, ao mesmo tempo em que intensificam o ritmo de trabalho, buscam promover novas formas de controle do processo de trabalho e levam o trabalhador à insegurança relacionada ao desemprego e à precarização das relações de trabalho.

Essas transformações estão, também, presentes no trabalho em bibliotecas universitárias, com a utilização de novas tecnologias. Para estudarmos essas transformações, precisamos conhecer a história das bibliotecas universitárias no Brasil, e o histórico do processo de automação pelo qual passaram essas bibliotecas, até o momento.