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Implicações práticas para o desenvolvimento da autonomia na aprendizagem

CAPÍTULO 4 – ANÁLISE E DISCUSSÃO DE DADOS

4.3 CRENÇAS E AÇÕES DAS PARTICIPANTES SOBRE O

4.3.4 Implicações práticas para o desenvolvimento da autonomia na aprendizagem

No contexto da escola pública, Louíze aponta como empecilho para o desenvolvimento da aprendizagem autônoma do aprendiz, as dificuldades relacionadas à restrições por falta de interesse dos alunos e a variedade de estilos de aprendizagem de língua inglesa e a restrições em considerar a identidade e a diversidade cultural em que os alunos estão inseridos, o que causa apatia pelo assunto (LEFFA, 2003). Fato que é retratado no trecho a seguir:

[53] “o que mais me desencoraja é perceber que é a base que eles não têm, a base da língua inglesa que eles parece que vão levando e levando, e parece que não tão aprendendo muita coisa. Até porque também eles só veem a língua inglês na escola. Em casa, em outros lugares eles não conseguem observar, e até algumas coisas que eles têm, por exemplo no uso da internet, eles meio que deixam de lado, assim...só olham pra isso. E eu ensino que seria bom. Eles não se esforçam, eles não têm muita...eh... vontade mesmo”. (ES, 31/07/14, Louíze)

A análise desse último excerto traz uma preocupação da participante Louíze sobre a dificuldade de desenvolver, junto aos alunos, estratégias metacognitivas que os ajudem a perceber e reconstruir processos a partir do conhecimento que eles já têm sobre o inglês (LLITTLEWOOD, 1996), já que, estando no ensino médio, todos devem ter recebido alguma instrução anterior. Outra consideração evocada pela fala da participante é a necessidade de se instaurar estratégias de gestão de recursos (CABANACH et al., 2002) que auxiliem os alunos a administrar tempo e ambiente para estudos, além de poder solicitar a ajuda de outras pessoas.

Como implicações para o desenvolvimento de aprendizagem autônoma, a participante Letícia aponta questões práticas relacionadas, primeiramente sobre onde aplicar, referindo-se ao complexo e diversificado contexto da escola pública, e segundo, às exigências demandadas pelo desenvolvimento da autonomia do aprendiz sobre o processo de formação do professor, o que é dificultado pelo excesso de horas de trabalho. Reflexão inferida a partir do seguinte trecho:

[54] “Talvez seria a questão do onde aplicar. Infelizmente depois que a gente aprende, tipo eu como professora, a gente aprende, só que o nosso aprendizado vai ficando... a gente acaba fossilizando ele um pouquinho uma vez que, tipo, eu venho pra escola... não tem com quem eu desenvolver a minha fluência, né, o speaking, o listening fica um pouquinho pra trás porque eu acabo trabalhando mais com ah... reading e o writing [...] tanto trabalho pra fazer que quando a gente procura tempo pra... gerir um pouco mais essa nossa formação e ir um pouquinho mais adiante acaba complicando, exatamente pela falta de tempo. Tanta coisa pra fazer, principalmente quando a gente trabalha ah... em escolas diferentes, tantas... trabalhos diferentes pra fazer, projetos diferentes, acaba sobrecarregando. Então essa... como gerir, na verdade, esse conhecimento que a gente tem e agregar um pouco mais, fica um pouquinho mais defasada, fica mais complicada”. (ES, 22/07/14, Letícia)

De acordo com a passagem a participante demonstra certo desconforto em trabalhar o aspecto da autonomia do aprendiz. Em parte, esse desconforto se baseia na baixa expectativa da participante quando ao trabalho na escola pública, principalmente, em metodologias voltadas ao treino de habilidades linguísticas – “eu venho para a escola... não tenho com quem eu desenvolver minha fluência” – e, por outra parte, está relacionado ao acúmulo de atribuições que a participante tem – “Tanta coisa pra fazer, principalmente quando a gente trabalha ah... em escolas diferentes” – o que relega o desenvolvimento do aprendiz autônomo a atitudes de interesse pessoal e não mais a um

objetivo proposto pelo professor via aplicação de tarefas e discussão de estratégias de aprendizagem.

Mesmo assim, a participante Letícia acredita que, por meio da motivação, estratégias de aprendizagem autônoma podem ser impulsionadas, principalmente, observando mudanças no perfil dos alunos que estão ingressando no ensino médio, trazendo novas perspectivas para o aprendizado de inglês, conforme descreve no excerto abaixo:

[55] “Parte sempre da motivação, né, porque eles têm... eu sinto que eles tão chegando com mais vontade de aprender e eles tão... eles têm aquela crença infelizmente que o inglês é chato, mas é aquela questão do tradicional, né, e eles acabam... não sei... em certos momentos da vida deles trabalhando com inglês apenas a questão da tradução exatamente de textos. Então acaba sendo um... algo chato, e a gente sabe que tradução é complicada, não simplesmente dá um dicionário ao menino e mandar se vira aí fulano pra traduzir esse texto. Então quando eu mostro algumas estratégias de como tá entendendo um texto, sem necessariamente saber todas as palavras que estão ali e sim, através do que sabe tá aprendendo ou deduzindo o significado de uma outra palavra ele já pensa, poxa, pode ser diferente, pode ser o caminho”. (ES, 22/07/14, Letícia)

Nesse novo caminho, Letícia aponta a abundância de recursos que podem ser utilizados para ajudar o aluno a refletir sobre seu aprendizado em inglês, apoiando a construção de estratégias que respeite suas variações de estilo e seus objetivos de estudo, o que pode ser observado na seguinte transcrição:

[56] “E também como eles tão... tão ligados aí nesse mundo da tecnologia, eles escutam músicas em inglês, então eu mostro, vem cá fulano, se você gosta tanto daquele cantor, você escuta a música dele, mas na verdade talvez o que você encontre na internet não seja exatamente uma tradução da letra e sim, uma versão, será que você não teria interesse de entender realmente... ah... o que diz aquela letra que você tanto curte. Aquele seriado que você mais gosta de assistir, você assiste ele na língua portuguesa? Dublado? Será que não seria interessante aquele ator que você tanto gosta, daquele seriado, você escutar na própria língua original? Então, através do que eles gostam, [...] mostrar pra eles que não é tão difícil, não é tão ruim e, na verdade, pode ser até importante e prazeroso pra eles estarem aprendendo essa língua. Então, através da motivação, acho que eles podem desenvolver essa autonomia de tentar, querer e poder sim, aprender uma outra língua”. (ES, 22/07/14, Letícia)

As reflexões dispostas neste excerto apontam para manifestações da participante Letícia quanto à motivação do estudo de inglês, fator que, no seu entender, estaria ligado a uma sensação de prazer que conduziria ao desenvolvimento de comportamentos autônomos, uma vez que o aprendiz orientaria seu processo de aprendizagem de língua estrangeira por uma perspectiva que contemple seu rol de interesses, gerando satisfação e, por consequência, compromisso com sua aprendizagem.

Contudo, os dados coletados nesta seção apontam para uma inquietação sobre o que pode ser feito para que o aprendiz se torne mais autônomo, pois se percebe que o processo de mudança relacionado ao papel do professor e do aprendiz representa uma possibilidade de gerar condições metodológicas mais condizentes com a realidade multifacetada, vivenciada nas salas de aula de inglês, no contexto da rede pública de ensino, mas, por outro lado, implica numa mudança de filosofia sobre a prática de ensino e de aprendizagem de línguas estrangeiras.