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Implicações sobre a conservação da biodiversidade

Capítulo 3– Biodiversidade no Brasil e a Cana de Açúcar

Capítulo 4 – Esquemas de Certificação dos Biocombustíveis

4.7 Implicações sobre a conservação da biodiversidade

O primeiro ponto a destacar é que as principais normas voluntárias de sustentabilidade aplicáveis aos biocombustíveis abordam as questões mais importantes e tratam das principais preocupações em relação à sustentabilidade. Essas questões são: (i) perda de biodiversidade devido à destruição do habitat, incluindo a ameaça crescente para algumas espécies, (ii) os impactos sobre a biodiversidade, devido à colheita de matéria-prima e conversão de biomassa (e.g. poluição, erosão do solo, etc.), (iii) introdução de espécies exóticas invasoras e (iv) impactos negativos nos serviços ecossistêmicos.

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Considerando-se que um dos objetivos dos esquemas de certificação é disseminar informações ao público, em geral, esta primeira conclusão é positiva do ponto de vista da autora. Isto se deve ao fato de que os esquemas de certificação para biocombustíveis têm sido propostos para cumprir as exigências impostas, principalmente, pela Comissão Europeia, que vem observando as preocupações de parte da sociedade internacional (e.g. da comunidade científica e das ONGs). Um segundo ponto a ser observado é que os esquemas de certificação existentes são mais orientados para a imposição de restrições para a produção de matérias-primas (e.g. áreas onde a produção não deve ser aceitável) e às práticas que devem ser aplicadas (e.g. planos de manejo, o uso de melhores práticas e tecnologias, etc.), em vez de avaliar os impactos sobre a biodiversidade. E isto é compreensível, já que a biodiversidade é um assunto muito complexo e não há consenso sobre o que deve ser avaliado e pouco consenso sobre como avaliar. Em segundo lugar, porque é mais fácil chamar o princípio da precaução e optar por reduzir os riscos. O problema é quem vai definir as áreas que devem ser totalmente protegidas e onde a produção de matérias-primas não deve ocorrer de maneira alguma? Em se tratando de áreas de expansão da produção, estes critérios podem ser extremamente restritivos se as áreas forem definidas na Europa, por exemplo, sem envolvimento dos potenciais produtores. No caso do Brasil, as áreas a serem preservadas estão praticamente definidas pela legislação e regulação.

Ainda em relação ao mesmo ponto, alguma reflexão é necessária sobre a prioridade dada à produção em áreas degradadas. O conceito de área degradada não é consensual, e normalmente são assim consideradas as áreas na quais há baixa produtividade para atividades agrícolas comerciais. Essas áreas são consideradas degradadas por um motivo especial, ou seja, sem investimentos significativos nessas áreas a viabilidade da produção de biocombustíveis pode ser drasticamente reduzida. Como todas as atividades agrícolas, a produção de biocombustíveis requer terra adequada e a utilização de outros recursos naturais. Sem uma produtividade mínima nenhuma atividade agrícola é viável.

Outra questão importante é que os critérios e indicadores devem basear-se no conhecimento científico sempre que possível. Nesse sentido, é importante lembrar uma das conclusões do estudo realizado pela CBD em 2011, que diz que as informações mais confiáveis possíveis sobre espécies ameaçadas devem ser utilizadas e, também, que termos bem aceitos devem ser usados para descrever os impactos e ações, a fim de proteger a biodiversidade.

Porém, como indicadores baseados em monitoramento contínuo são de difícil uso em normas, conclui-se que deve haver base científica, mas que os indicadores não precisam ser – e talvez nem possam ser – baseados em rigorosa ciência.

Além disso, parece fundamental que para definir prioridades com objetivo de reduzir os impactos negativos sobre a biodiversidade, não se imponha ônus econômico ou administrativo. Nesse contexto, o conceito de hierarquia de mitigação - que permite a definição de uma sequência lógica das ações - parece ser um bom procedimento. No entanto, essa questão está, provavelmente, fora do âmbito de esquemas de certificação, uma vez que é quase impossível

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Vale a pena lembrar que um esquema de certificação é um instrumento - voluntário - de mercado, que pode ser muito útil para diferentes propósitos, mas impactos negativos da produção de biocombustíveis sobre a biodiversidade não podem ser evitados apenas através deles. Em particular, mesmo o melhor esquema de certificação não pode substituir políticas e regulamentos. Também, as normas são desenvolvidas por agentes do mercado, diretamente interessados na sua existência e em seu sucesso e, por mais democrático que seja o processo, não refletem necessariamente os ensaios de toda a sociedade. Além disso, com a certificação não é possível avaliar a sustentabilidade em si, mas sim fornecer informações relevantes aos diferentes “stakeholders” a fim de induzir mudanças positivas no comportamento.

É adequado pensar que os esquemas de certificação quanto à sustentabilidade são apenas parte da solução e que esses devam ser combinados com regulação pública, principalmente para que se tenha um melhor planejamento do uso da terra (UNEP-WCMC, 2009), uma vez que a mudança do uso terra é o principal vetor de impacto na biodiversidade.

Levando-se em conta os limites dos esquemas de certificação, a forma como a biodiversidade tem sido tratada nos esquemas existentes para biocombustíveis pode ser considerada satisfatória. Claramente, é necessário levar em conta os limites do que é possível obter com a certificação em curto prazo, e que a melhoria contínua é um objetivo de todas as normas. Obviamente, os esquemas de certificação existentes podem ser melhorados como consequência da experiência adquirida.

Não parece que os critérios e indicadores sobre biodiversidade nos esquemas de certificação existentes são de aplicação difícil pelos novos produtores e/ou por pequenos produtores, em locais onde haja pessoas capacitadas para isto. Em países menos desenvolvidos, a falta de pessoas capacitadas e de estrutura adequada pode dificultar a aplicação dos mesmos critérios e indicadores.

Finalmente, parece prematuro afirmar que os principais objetivos de um programa de certificação, como (i) fornecer informações valiosas para as diferentes partes interessadas, (ii) induzir a adoção de melhores práticas, (iii) diferenciar os produtos e (iv) promover comércio, serão totalmente alcançado. O conhecimento existente é ainda muito limitado para se fazer tal avaliação e poderia abordar conceitos como (i) conectividade, (ii) manutenção de fragmentos florestais, (iii) evitar iLUC, (iv) manutenção e valorização da agro biodiversidade.

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Capítulo 5 – Conclusões