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Importância da integração de inter-relações CTS em contextos de

C) Leveduras em processos de fermentação alcoólica

2.3. Trabalho prático em educação em ciências e formação de professores

2.3.7. Perspectiva investigativa de trabalho prático em educação em ciências

2.3.7.1. Importância da integração de inter-relações CTS em contextos de

Nas últimas décadas, os avanços científico-tecnológicos verificados em biologia, sobretudo em biotecnologia, assim como o impacto que esses conhecimentos poderão ter na sociedade, mostram “que a Biologia ensinada em contexto escolar está desarticulada da realidade social” (Martins et al., 2000, p.177). Assim, a “exigência de uma reforma curricular nesta área, resulta de uma consciência pública de que o que aparece nos currículos, não reflecte a Biologia actual, com as suas dimensões pessoal, social e económica” (Ibid.).

Os resultados da aplicação de anteriores reformas na educação em ciências marcaram o contexto de emergência de inter-relações CTS, caracterizado pela insatisfação com a “incapacidade da maioria dos alunos [revelada] sobretudo na utilização das informações recebidas durante as aulas e na utilização dos processos científicos treinados e supostamente aprendidos nos laboratórios escolares, em contextos diferentes daqueles onde foram originalmente objecto de tratamento e de aplicação” (Canavarro, 1999, p.118-119). A incapacidade dos alunos para “lidar com a ciência e com a tecnologia em proveito da sociedade” (Canavarro, 1999, p.119) foi o ponto de partida de abordagens CTS em reformas do ensino das ciências nos EUA.

Atendendo aos reduzidos níveis de literacia da população, em geral, o ensino de ciências tem sido objecto de críticas por educadores e investigadores em educação em ciências, devido aos resultados das aprendizagens de ciências escolares estarem longe de satisfazer as necessidades das sociedades actuais (Martins, 2002). Neste quadro, torna-se claro que a actual educação em ciências não pode guiar-se por orientações do passado, pois os avanços científicos e tecnológicos repercutem-se na sociedade e influenciam também “o que nela [escola] se ensina e o modo como se ensina” (Martins, 2002, p.29).

Educação CTS visa promover a alfabetização científica e tecnológica, de modo a capacitar os cidadãos para participarem em processos democráticos de tomada de decisões informadas e de acções responsáveis, com vista à resolução de problemas da sociedade relacionados com ciências e tecnologias (Acevedo-Díaz et al., 2003; Cabo- Hernández et al., 2006; Magalhães & Tenreiro-Vieira, 2006; Membiela, 2000). Nesta

perspectiva, a alfabetização científica consiste, nomeadamente em saber usar as ciências em situações da vida quotidiana com propósitos cívicos e sociais, pelo que o seu ensino deve ter “auténtica relevancia social para el alumnado, incluyendo los valores éticos y democráticos que se ponen en juego cuando intervienen la ciencia y la tecnología en la sociedad” (Acevedo-Díaz et al., 2003, p.82). A inclusão da perspectiva social de ciências e tecnologias em educação em ciências, com o objectivo de promover uma orientação mais adequada para a alfabetização científica e tecnológica de todas as pessoas (Acevedo-Díaz & Alonso, 2003; Acevedo-Díaz et al., 2003), corresponde ao melhor contributo para o desenvolvimento de cidadãos do século XXI (Acevedo-Díaz et

al., 2003).

Nos últimos anos, a “necesidad de una alfabetización científica y tecnológica como parte esencial de la educación básica y general de todas las personas” marca as finalidades da educação em ciências (Acevedo-Díaz, 2004, p.7). Esta preocupação é igualmente referida no âmbito de políticas educativas de organismos internacionais, como o International Council for Science (UNESCO-ICSU) e a Organización de Estados

Iberoamericanos para la Educación, la Ciencia e la Cultura (OEI, 2001). Nos EUA, as

reformas do Project 2061, propostas pela American Association for the Advancement of

Science (AAAS), descritas nos relatórios Science for All Americans (AAAS, 1990) e Benchmarks for Science Literacy (AAAS, 1993), e o documento intitulado National Science Education Standards do National Reserch Council (NRC, 1996), têm por

objectivo comum promover a literacia científica de todos os alunos.

A integração de inter-relações CTS nos currículos de ciências, ao promover uma educação de cariz mais humanista, pela ligação a contextos reais (Martins, 2002) e aos interesses e experiências pessoais e sociais dos alunos, visa desenvolver a compreensão pública das ciências e tecnologias (Acevedo-Díaz, 2004; Acevedo-Díaz et

al., 2003). Educação em ciências de cariz humanista (Acevedo-Díaz, 2004; Martins,

2002) deve ser “capaz de preparar melhor os alunos para a compreensão do mundo e das inter-relações do conhecimento científico e tecnológico na sociedade” (Martins, 2002, p.30). Gordillo (2003) resume a educação CTS em dois propósitos: “mostrar que la ciencia y la tecnología son accesibles e importantes para los ciudadanos (por tanto, es necesaria su alfabetización tecnocientífica) y propiciar el aprendizaje social de la participación pública en las decisiones tecnocientíficas (por tanto, es necesaria la educación para la participación también en ciencia e tecnología)” (p.389).

Para promover a alfabetização científica e tecnológica (Acevedo-Díaz et al., 2003) importa orientar a educação em ciências, incluindo problemas reais e actuais (Martins,

2002), através da selecção de temas sócio-científicos, com utilidade para os alunos e relacionados com a vida quotidiana, “a partir dos quais ganha relevância e sentido a aprendizagem dos conceitos científicos” (Martins et al., 2000, p.170), por exemplo, envolvendo-os em trabalho prático numa perspectiva investigativa e de resolução de problemas. Deste modo, as aprendizagens serão mais significativas e duradouras (Canavarro, 1999), deixando “de ter sentido o ensino de conceitos pelos conceitos, não por estes não terem valor intrínseco mas porque a sua importância será melhor percepcionada pelo aluno (…) se eles aparecerem como via para dar sentido aquilo que é questionado” (Martins, 2002, p.30). Os interesses dos alunos devem, pois, ser valorizados, cabendo ao professor diagnosticá-los para em seguida “transmitir conceitos e processos científicos fundamentais, cuja utilidade para a resolução de problemas dos alunos se faça sentir, se possível ao nível pessoal, social e de carreira” (Canavarro, 1999, p.123).

Esta orientação dos programas por contextos CTS, ao tornar mais evidente as ciências na vida quotidiana dos alunos (Acevedo-Díaz et al., 2003), além de os motivar para a sua aprendizagem, promove imagens mais reais, completas e contextualizadas das ciências, contribuindo para desenvolver atitudes mais positivas relativamente às ciências (Chagas & Oliveira, 2000; Magalhães & Tenreiro-Vieira, 2006), a profissões científicas e à utilidade das aulas de ciências (Canavarro, 1999). Pelas mesmas razões, a integração de inter-relações CTS em contextos problemáticos orientadores de trabalho prático investigativo deve constituir ponto de partida no desenvolvimento de percursos investigativos. Assim, situações problemáticas actuais de relevância social, ética e política devem apresentar-se aos alunos para criar oportunidades de reflexão, de formulação de opiniões e de desenvolvimento do pensamento crítico, aspectos considerados fundamentais na formação de indivíduos socialmente intervenientes e com capacidade de resposta aos problemas científico-tecnológicos do mundo contemporâneo (Magalhães & Tenreiro-Vieira, 2006). Ao destacar as implicações das ciências e tecnologias na sociedade, a educação CTS promove o enquadramento social dos conteúdos científico-tecnológicos (Acevedo-Díaz et al., 2003), visando a tomada de decisões de forma mais racional e fundamentada sobre questões científico-tecnológicas de interesse público (Acevedo-Díaz et al., 2003; Magalhães & Tenreiro-Vieira, 2006), no exercício de uma cidadania responsável (Magalhães & Tenreiro-Vieira, 2006). Ajudando os alunos “a avaliar as repercussões sociais da Ciência e da Tecnologia, a compreender a contribuição da Ciência e da Tecnologia para a criação e/ou resolução de problemas

sociais” (Magalhães & Tenreiro-Vieira, 2006, p.88), pode aumentar-se o seu interesse pelas próprias ciências (Acevedo-Díaz, 2004; Acevedo-Díaz et al., 2003).

Os resultados de uma intervenção sobre OGMs, em especial sobre alimentos transgénicos, com alunos do ensino secundário de áreas curriculares distintas (com e sem Biologia), evidenciam o impacto de abordagens de temas de forte cariz CTS (Santos & Martins, 2009). O workshop baseou-se na realização de actividades diversificadas que incluíram desde a leitura de artigos, análise de rótulos de produtos alimentares, pesquisa de informação na Internet, até à realização de actividades prático-laboratoriais de extracção de DNA de tecidos animais e vegetais. A participação dos alunos permitiu-lhes recolher informações para uma escolha mais consciente e fundamentada em tomadas de decisão futuras sobre OGMs. Os resultados mostraram que os participantes consideraram o tema relevante e interessante para ser estudado por todos os alunos e não apenas por aqueles que escolheram áreas científicas com Biologia.

Em suma, investigadores em educação em ciências salientam, cada vez mais, a relevância da discussão, em contextos escolares, de questões sócio-científicas controversas e actuais, que justificam pelas suas potencialidades para: a) aprender conteúdos e processos científicos; b) desenvolver imagens mais reais e humanas relativamente à consecução de actividades científicas, inerentemente complexas; c) promover o desenvolvimento de competências relevantes para a vida; d) promover literacia científica, fundamental na preparação dos alunos para uma participação activa e responsável na sociedade (Reis & Galvão, 2008). Contudo, pese embora o seu elevado potencial educativo, estas actividades não constituem uma prática comum nas aulas de ciências (Cabo-Hernández et al., 2006; Reis & Galvão, 2008), “mesmo quando integram as orientações curriculares e os professores consideram importante a sua realização” (Reis & Galvão, 2008, p.746). De entre as principais causas para a sua não realização apontam-se: a) escassez de materiais curriculares adequados (Acevedo-Díaz et al., 2002; Chagas & Oliveira, 2005); b) falta de preparação dos professores (Acevedo-Díaz et

al., 2002; Reis & Galvão, 2008), quer no que diz respeito à concepção e orientação de

actividades de discussão em sala de aula, quer na carência de conhecimentos necessários à discussão de questões sócio-científicas; c) constrangimentos impostos por programas disciplinares demasiado extensos; d) tipo de exames nacionais, que enfatiza a memorização e não valoriza estes temas, conduzindo a práticas docentes pouco centradas em análise crítica e discussão (Reis & Galvão, 2008).

2.3.7.2. INVESTIGAÇÕES E TRABALHO PRÁTICO ORIENTADO POR