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Por volta do ano de 1875, houve um crescimento significativo da colônia alemã, situada na cidade de São Paulo, cerca de 2.000 alemães91. Tal fato se deu, devido ao desenvolvimento das relações comerciais entre Brasil e Alemanha. Os alemães aqui residentes manifestavam o desejo de criar, assim como fora feito no Rio Grande do Sul, um órgão de imprensa em língua alemã. No interior da Sociedade Germania92

, a idéia se fortaleceu e, através de cotas de participação, os associados conseguiram reunir o capital necessário para a publicação em 1878, do primeiro jornal em língua alemã do estado de São Paulo, denominado Germania.

Os membros fundadores e cotistas, em sua maioria, integravam também outras associações alemãs, como por exemplo, a Comunidade Luterana fundada em 1872, a Sociedade Beneficente de 1865 e a primeira escola alemã de São Paulo. A veiculação do jornal Germania trouxe resultados relevantes para a comunidade alemã de São Paulo, transformando-se em um órgão de união, integração e comunicação entre os membros residentes na cidade, e outras províncias do Império.

Desde o começo das publicações, o Germania poderia ser adquirido e assinado no Rio de Janeiro, Porto Alegre e Salvador e em cidades do interior

91 KOETHE, op. cit., p. 14.

92 Sociedade fundada em 1868, que tinha por objetivo: “Sociedade alemã para recreio,

canto e propagação de conhecimentos geraes e úteis, principalmente de conhecimentos industriaes, por meio de jornais discursos e huma biblioteca. Funciona na rua do Ouvidor, nº 58, está aberta todos os dias das 8:00 às 00:00 horas. Tem um vasto salão para recreio e leitura, encontrando-se ali os principaes jornaes, revistas alemãs e outras, uma biblioteca com mais de 3000 volumes e dous bilhares. Número de sócios 100.” DAESP, Almanak para a província de São Paulo para o anno de 1884.

paulista como Santos, Sorocaba e Campinas. Dez anos após sua data de fundação, o jornal ampliava consideravelmente sua área de veiculação, chegando a cidades como Amparo, Araras, Botucatu, Campinas, Curitiba, sendo vendido até mesmo na Argentina.93

Certos de que o fluxo migratório seria um processo constante para o Brasil, os redatores do jornal buscavam constantemente auxiliar os imigrantes recém-chegados, desde o desembarque na cidade de São Paulo até sua locação em residências.94

Ao se analisarem as publicações, nota-se que o jornal abordava temas bem dicotômicos, discutindo desde a política externa alemã até os problemas enfrentados pela comunidade alemã paulista, podendo-se destacar alguns desses artigos. Em janeiro de 1889, apareceu, como matéria da capa, a seguinte problemática “Quem deve migrar para São Paulo, colônias do governo? Colônias Particulares? Ou trabalhadores nas fazendas?”95. Tal indagação advém das dificuldades impostas pelo sistema de imigração. Em 1889, manifestou-se positivamente em prol da obrigatoriedade da naturalização dos alemães, como maneira de inserção social96. Por fim, nos últimos anos do Império, o jornal se posicionou a favor da liberdade religiosa e da legalidade do casamento civil97.

Em meados da década de 1880, assumiu a direção do Germania, o Sr. Eppstein, que se identificava com as linhas políticas adotadas pelo Imperador alemão Guilherme I, e apresentava uma postura conservadora98. Entretanto,

93 Segundo o Jornal Germania, 04/04/de 1888, p. 2. 94 Ribeiro, op. cit., p. 169.

95 Jornal Germania, 03 de janeiro de 1889, Matéria da Capa. “Wer soll nach São Paulo

auswander, Regierrungskkolonieen? Privatkolonieen? Oder Plantagenarbeiter?”.

96 Jornal Germania, 18 de dezembro de 1889. Matéria da Capa “Die Grosse

Naturalisation”. Procuramos reproduzir o termo inserção social.

97 Jornal Germania, 20/03/1887. Vale lembrar que o catolicismo era institucionalizado pelo

Estado, e os alemães eram em sua maioria pertencentes a outros credos, sobretudo protestante. Com relação ao casamento, este só era institucionalizado pela igreja Católica, sendo assim, os imigrantes alemães não eram considerados casados.

98 GEHSE, H. Die deutsche Presse in Brasileien von 1852 bis zur Gegenwart. Münster in

com a morte do Imperador (1888), e ascensão ao poder de Guilherme II, que, como se conhece, modificou os rumos da política externa da Alemanha em defesa do imperialismo, a postura do jornal Germania também é alterada, Segundo Hans Gehse:

(...) O Germania passou adotar uma postura cada vez mais de ‘livre pensador’ e a fazer uma critica mais aguda das questões da política interna alemã, num sentido democrata radical. (...) em um artigo bastante polêmico, que Epstein escreveu em 1896, resultou no afastamento público da maior parte dos proprietários99.

O ‘artigo polêmico’ o qual se refere a citação, foi publicado no dia 20 de maio de 1896, por ocasião do aniversário do Kaiser alemão, em que Eppstein criticava com veemência a postura política e o comportamento do Imperador. Essas críticas recorrentes ao Imperador alemão o levaram a uma profunda divergência no grupo, que apoiava financeiramente a manutenção do jornal, os alemães pertencentes à classe média urbana.

Tal divergência ocasionou uma cisão entre os membros do Germania, fazendo emergir, sob direção do grupo dissidente, um novo jornal no ano de 1898, intitulado Deutsche Zeitung (Jornal alemão). Hans Gehse traz a seguinte informação:

“Os insatisfeitos se juntaram e reuniram o capital de 100 contos (130.000 marcos-ouro), uma soma bastante considerável para as condições da época. Com isso fundaram Deutsche Zeitung, que apareceu a partir de 1898100.”

Nas décadas seguintes, ficariam evidentes as posições contrárias de ambos os periódicos; se, por um lado, o Germania criticava a política tanto alemã quanto a brasileira em relação ao “perigo alemão”, o Deutsche Zeitung,

Imigrante Alemão na Província de São Paulo - Opinião de Jornais. São Paulo, 1987. Dissertação (Mestrado), Pontifícia Universidade Católica. p. 15.

99 Idem, p. 15. 100 Idem, p. 16.

não abria espaço para polêmicas101, -segundo seus redatores. Acredita-se, que esse posicionamento de “neutralidade” do Deutsche Zeitung advêm de dois motivos distintos, o primeiro corresponde ao apoio financeiro recebido da Liga Pangermânica102, já o segundo:

O jornal Deutsche Zeitung que entre outros através dos artigos de Albert Kuhlmann, passou apoiar a política de imigração do governo iniciada em 1905 – recebeu grande apoio governamental pelo fato de o governo adquirir 500 exemplares do suplemento semanal (Die Hausfreund – O Amigo do lar, que aparecia na mesma editora), que era distribuído na Europa para fins de propaganda103.

Sendo assim, o jornal Deutsche Zeitung apresentava-se em jogo dúbio, por um lado recebia apoio financeiro estatal, com a venda de revistas de propaganda; por outro, era árduo defensor das ideologias da Liga Pangermânica, e, deste modo, tornava-se evidente que o jornal não iria se contrapor às reportagens veiculadas pela imprensa paulista.

Por outro lado, o jornal Germania apresentava uma postura diferente, discutindo o “perigo alemão”, sobretudo por três vieses, sendo estes: o contexto imperialista, o processo de assimilação dos alemães radicados no Brasil, e, por fim, a influência negativa da Liga Pangermânica. A escolha por esse corpus documental se evidencia pelo posicionamento de não-neutralidade e de grande representatividade na colônia alemã de São Paulo ou, como seus redatores se auto denominavam, “A voz da comunidade alemã104

”.

101 Mediante ao balizamento temporal proposto, apenas em um parágrafo se vê o

posicionamento do Deutsche Zeitung, sobre o tema “perigo alemão”, que se resume em evitar polêmicas. Deutsche Zeitung, 1905.

102 MAGALHÃES, M. B. Alemanha, mãe-pátria distante. Utopia pangermanista no sul do

Brasil. Tese de doutorado. Departamento de História (IFCH) da Universidade Estadual de Campinas, 1993, p. 124.

103 GEHSE, op. cit., p. 16. 104 Subtítulo do jornal.