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3 A DEFESA DO DEVEDOR NO PROCESSO DE EXECUÇÃO

3.1 Impugnação ao cumprimento de sentença

O cumprimento de sentença é modalidade de execução destinada a efetivar pretensão reconhecida em título executivo judicial, cujo início depende de pedido do exequente nos mesmos autos da ação de conhecimento.

Já antes do CPC/2015, com a reforma processual realizada pela Lei 11.322/2005, promoveu-se o sincretismo entre cognição e execução, tornando desnecessária a instauração de novo processo para a execução do título judicial consubstanciado na sentença (RIBEIRO, 2009). O Novo Código de Processo Civil aperfeiçoou o sistema, regulando o cumprimento de sentença relativa a várias obrigações, mormente aquela que reconhece a exigibilidade da obrigação de pagar quantia certa. Embora as disposições estejam na parte que trata do procedimento comum, há de se ter em conta que são igualmente aplicáveis as regras contidas na seção que trata do processo de execução, já que as disposições sobre o cumprimento de sentença são apenas gerais e se referem ao momento inicial de instauração dessa fase processual, não cuidando dos atos executivos cabíveis.

Além da sentença transitada em julgado, principal objeto da fase de cumprimento, a decisão impugnada por recurso sem efeito suspensivo também pode ser executada por meio do cumprimento provisório previsto nos arts. 520 a 522. Ou seja, existe a execução provisória e a definitiva dos títulos judiciais.

No tocante ao cumprimento definitivo de sentença, especificamente relativa à obrigação de pagar quantia certa, depois de requerido o cumprimento pela parte vitoriosa no processo judicial, o executado terá prazo de 15 dias para realizar o pagamento voluntário, cujo término dá início ao prazo para impugnação, também de 15 dias. Na prática, o prazo total para a apresentação da impugnação é de 30 dias úteis, contados da intimação do executado. As regras são aplicáveis também para o cumprimento provisório.

No código processual vigente, durante a fase de cumprimento de sentença, permite-se, pelo art. 518, que todas as questões relativas à validade do procedimento de cumprimento da sentença e dos atos executivos subsequentes possam ser arguidas pelo executado nos próprios autos do cumprimento de sentença, sendo decididas pelo juiz. Trata-se de dispositivo que é visto pela doutrina como o permissivo legal para a apresentação da chamada exceção de pré – executividade, a qual será tratada em momento oportuno.

Para Donizetti, a impugnação ao cumprimento de sentença possui caráter duplo: consiste em defesa e em ação. Defesa por ser um “meio pelo qual o devedor, na própria

relação processual, opõe resistência ao modo e aos limites da execução” (2017,p.684). Ação por veicular pretensão declaratória ou desconstitutiva, a despeito de ser incidente processual. Já no entendimento de Didier Jr. (2017), a natureza da impugnação é somente de instrumento de defesa do executado, através do qual se instaura um incidente processual cognitivo na execução. A cognição é limitada e exauriente, por ser restrita às questões elencadas no art. 525 §1º do CPC/2015, embora admitindo ampla instrução probatória. A decisão que julga a impugnação é de natureza interlocutória e, portanto, recorrível por meio de agravo de instrumento.

Ainda que a impugnação esteja inserida na seção destinada ao cumprimento de sentença que reconheça a obrigação de pagar quantia certa, no art. 525, é perfeitamente aplicável o dispositivo para outras modalidades de obrigações, bem como para o cumprimento provisório. Quando ocorre a impugnação pelo executado no cumprimento provisório e o juízo acolhe as alegações apresentadas, as partes são restituídas ao estado anterior e eventuais prejuízos são liquidados nos mesmos autos, após a decisão que modifica ou anula a sentença objeto da execução,

No art. 525, parágrafo §1º, são elencadas as matérias que podem ser alegadas pelo executado com vistas a se defender dos atos expropriatórios promovidos no cumprimento de sentença. Inclusive, a Fazenda Pública poderá arguir praticamente as mesmas questões se estiver na posição de executada, exceto a alegação de penhora e avaliação incorretas, uma vez que, regra geral, os bens públicos não são suscetíveis de penhora.

Da leitura do rol exemplificativo, depreende-se que o CPC/2015 permite ao executado a oposição por meio de objeções processuais (incisos I a VI) e objeções substantivas (inciso VII).

Art. 525 [omissis]

§ 1º Na impugnação, o executado poderá alegar:

I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia;

II - ilegitimidade de parte;

III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação; IV - penhora incorreta ou avaliação errônea;

V - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções; VI - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução;

VII - qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença.

A apresentação de impugnação, por si só, não tem o condão de impedir a prática de atos executivos, não existindo, portanto, efeito suspensivo automático com a impugnação,

do mesmo modo como ocorre com os embargos do executado. No entanto, permite o CPC/2015 que seja atribuído tal efeito desde que haja requerimento nesse sentido, acompanhado de penhora, caução ou depósito suficiente, consistindo assim, em efeito suspensivo ope judicis. Em relação a sistemática do CPC/1973, o legislador beneficiou o executado ao tornar desnecessária a prévia garantia do juízo para apresentação de impugnação, mas, por outro lado, condicionou o efeito suspensivo da impugnação à prévia penhora, caução ou depósito (DONIZETTI, 2017).

Além desses requisitos objetivos, é indispensável que seja demonstrada a probabilidade de grave dano de difícil ou incerta reparação, com exposição de fundamentação relevante. Contudo, observa Theodoro Junior (2018) que as matérias suscitáveis na impugnação versam preponderantemente sobre a ausência de pressupostos processuais ou de condições de procedibilidade, as quais podem ser conhecidas a qualquer tempo ou fase do processo, sem necessidade de penhora. São matérias de ordem pública, as quais também podem ser alegadas por meio de exceção de pré – executividade.

Destarte, a impugnação não se presta a discutir questões de mérito, já decididas na ação de conhecimento que culminou na formação do título judicial. Matérias de mérito somente podem ser alegadas nesse incidente processual se estiverem relacionadas a fatos supervenientes à prolação da sentença que possam afetar a dívida, como os elencados no inciso VII, §1º do art. 525.

Entre as alegações permitidas ao executado, cumpre destacar a possibilidade de arguição de inconstitucionalidade da lei que fundamentou o título executivo judicial. (art. 525 §12º) com base em decisão em sede de controle de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal. No escólio do processualista Humberto Theodoro Jr., “assim como a lei inconstitucional é irremediavelmente nula, também a sentença formalmente transitada em julgado não tem força para se manter, quando prolatada contra a vontade soberana da Constituição.” (2018, p. 105). Em relação ao dispositivo semelhante contido no CPC/1973, houve acréscimo do controle difuso, como pontua Donizetti (2017). Calha ressaltar, porém, que a decisão do Supremo Tribunal Federal em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso deve ser anterior ao trânsito em julgado da decisão exequenda para que possa ser arguida na impugnação ao cumprimento de sentença. Caso contrário, caberá ação rescisória, cujo prazo terá como termo inicial o trânsito em julgado da decisão proferida pelo STF (art. 525 §15).

Somente no caso de arguição de inconstitucionalidade e de falta ou nulidade de citação permite-se a discussão de matérias que poderiam ter sido apresentadas na fase de conhecimento do processo, limitação que decorre da coisa julgada e da eficácia preclusiva (DINAMARCO, 2017). A necessidade de se restringir as matérias se justifica pelo processo de formação do título executivo judicial, muito mais complexo em relação ao dos títulos extrajudiciais, porquanto só ocorre após a realização do contraditório e ampla produção de provas, existindo maior certeza quanto ao direito do exequente.