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Valéria Trezza

QUESTÃO 5: A imunidade protege toda a OSC e não pode ser fracionada

PROCESSO: REsp 1.120.001

O REsp 1.120.001 discute a imunidade de sindicato ao IR sobre aplicações financeiras, considerando a disposição da Lei nº 9.532/1997 que excepciona esse imposto da abrangência da imunidade.34 O objeto da

discussão já foi resolvido com o julgamento da ADI 1.802. No entanto, op- tou-se por incluir essa decisão em razão da discussão sobre a prevalência da regra isentiva subjetiva em detrimento da regra objetiva de tributação.

A imunidade prevista no art. 150, VI, “c”, da Constituição tem caráter subjetivo, ou seja, está relacionada ao sujeito beneficiado pela hipótese: os partidos políticos, sindicatos e instituições de educação e assistência social, sem fins lucrativos. Já a norma de tributação tem cunho objetivo, incide sobre o rendimento, o serviço, o bem imóvel, o automóvel e assim por diante.

Quanto a isso, o relator do REsp 1.120.001, ministro Mauro Campbell Marques, afirma que “o prestígio da regra isentiva subjetiva em detrimento da regra objetiva de tributação” apoia-se em preceden- tes do STJ e do STF, que “reconheceram a incidência das imunidades das entidades referidas no art. 150, VI, ‘c’, da CF/88, apesar de haver regra objetiva determinando a tributação na fonte dos rendimentos de aplicações financeiras”. Além disso, argumenta que “[e]sses preceden- tes indicam que diante de uma regra de isenção ou imunidade de cará- ter subjetivo em conflito com uma outra regra de tributação de caráter objetivo há que prevalecer a primeira, posto que especial por se apegar ao titular do benefício”.

Essa decisão é interessante quando se nota que, não raramen- te, o Fisco reconhece a imunidade de uma OSC em relação a alguns fa- tos, mas não a outros. Como exemplo, pode-se citar decisão da Secreta- ria de Finanças do Município de São Paulo que reconhece a imunidade ao ISS sobre apenas alguns dos serviços prestados por organização sem fins lucrativos.35 A mesma decisão indeferiu o pedido de reconhecimen-

to de imunidade tributária do ISS, exercícios de 2013 e 2014 “para todos os códigos de serviços, haja vista a constatação de que neste período houve a preponderância das atividades de assessoria, consultoria e de- senvolvimento de projetos”, que não fazem jus à “imunidade tributária, a qual é estritamente relacionada às atividades assistenciais e educa- cionais, nos termos do artigo 150, ‘c’, da Constituição Federal de 1988”. Vale dizer que, se a imunidade do art. 150, VI, “c”, é subjetiva, não cabe esse tipo de separação, pois o benefício é concedido em razão da natureza da OSC, não dos serviços prestados por ela. É coerente, dessa forma, o entendimento manifestado na decisão sob exame de que a regra isentiva subjetiva prevalece sobre a regra objetiva de tributação.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O ITCMD é um imposto de grande impacto para as OSCs, tendo-se em vista que grande parte delas subsiste das doações que recebe. Como visto nos capítulos anteriores, a disciplina legal do IT- CMD permanece confusa, pois não há ainda uma lei complementar que regulamente as questões gerais do imposto, de modo que cada estado possui legislação própria, o que inclui um grande contingente de regulamentação infralegal.

Além disso, os poucos benefícios previstos para as OSCs (ape- nas as instituições de assistência social, saúde e educação têm direito à imunidade e somente nove estados concedem isenção) são muitas vezes tolhidos pela interpretação restritiva do Fisco em relação aos re- quisitos para gozo de imunidade e isenção. Daí resulta a busca de solu- ção de controvérsias no Judiciário, onde as OSCs enfrentam a ausência de uniformidade da jurisprudência dos tribunais estaduais. Todo esse cenário demonstra a importância do tratamento dado pelos tribunais superiores em relação à tributação de doações a OSCs no Brasil.

A pesquisa revelou claros limites em relação à atuação do STF e do STJ, podendo ser destacados dois principais: primeiro, identifi- cou-se uma grande quantidade de decisões que não julgam o mérito das questões por motivos processuais (por não tratar de matéria de competência, exigir análise fático-probatória ou da legislação local ou, ainda, por ausência de prequestionamento); além disso, nas decisões em que há julgamento do mérito, encontrou-se pouca fundamentação que contribua para o entendimento da motivação que levou ao resul- tado, principalmente no STJ.

No entanto, de forma geral, vê-se uma tendência, em especial no STF, de assegurar a efetividade da imunidade das instituições de assistência social e educação, interpretando-a da maneira mais ampla possível. Três exemplos relevantes nesse sentido podem ser dados: (i) quando dá maior extensão ao termo “finalidades essenciais”; (ii) quan- do reconhece que todos os impostos se enquadram entre os incidentes sobre patrimônio, renda ou serviços; e (iii) quando toma como pressu- posto que as OSCs destinam seus bens e patrimônio às suas atividades essenciais, cabendo ao Fisco comprovar o contrário.

na presente pesquisa merecem ser citadas: (i) De quem é o ônus da comprovação dos requisitos para o exercício da imunidade: da OSC ou do Fisco?; (ii) É legítima a exigência de reconhecimento administrativo prévio para fins de gozo da imunidade?

Essas e outras questões abrem-se a futuras pesquisas a partir da exploração realizada neste estudo, que deu apenas o primeiro passo nesse sentido.

Valéria Trezza

Valéria Trezza é mestre em Administração Pública e Governo (FGV, 2007) e bacharel em Direito (USP, 1996). Integrou a equipe de pesquisa sobre “A tributação das organizações da sociedade civil”, publicada pelo Ministério da Justiça e Ipea na série Pensando o Direito (n. 53).   

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