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Instrumentos de Políticas Públicas e as Concessões Florestais no Brasil

CAPÍTULO III AS CONCESSÕES FLORESTAIS NO BRASIL

3.1 Instrumentos de Políticas Públicas e as Concessões Florestais no Brasil

A preocupação acerca da proteção das florestas no âmbito legislativo e constitucional é relativamente recente no ordenamento jurídico brasileiro: a Constituição da República de 1881 e o Código Civil de 1916 tinham uma visão liberal, privilegiando o direito do proprietário sem mencionar a proteção das florestas. As constituições de 1934 e 1937, igualmente, não definiram uma política de proteção florestal, embora ambas tenham atribuído à União a competências para legislar sobre florestas. A constituição de 1937 atribuiu competência complementar aos estados, na ausência de regulação federal. A constituição de 1949 manteve a lógica da carta de 1937. Em 1967/69, a constituição imposta teve caráter centralizador, atribuído exclusivamente à União a gestão pública dos recursos naturais e florestais (VIANA, 2004).

A partir da Constituição Federal de 1988, em vigor, voltando a uma perspectiva constitucional descentralizadora das competências, o tema florestal ganha relevo muito maior ao das constituições antecedentes. O artigo 23 do texto constitucional afirmou que a proteção ao meio ambiente, o combate à polução e a preservação das florestas, da fauna e da flora são de competência comum da União, dos Estados, do DF e dos Municípios. Além disso, União, Estados e DF tem competência concorrente para legislar sobre “florestas, caça, pesca, fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do meio ambiente e controle da poluição” (BRASIL, 1988).

Para além de registrar a competência comum sobre a matéria, o Meio Ambiente recebeu tratamento em capítulo constitucional específico, sendo declarado o direito de todos “ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” – Art. 225 (BRASIL, 1988).

Pouco antes da promulgação da Constituição Federal diversas iniciativas infraconstitucionais disciplinaram a proteção e a preservação das florestas, como por exemplo: o Código Florestal de 1965, que tratou da Área de Preservação Permanente e da Reserva Legal; e a Lei 6.938/81, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação, e instituiu o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA e o Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA.

O SISNAMA é composto por órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental. O CONAMA é o órgão que tem, entre outras competências, a responsabilidade de estabelecer normas e critérios para o licenciamento de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras, bem como normas, critérios e padrões relativos ao controle e à manutenção da qualidade do meio ambiente, levando em conta o uso racional dos recursos ambientais (BRASIL, 1981).

A Lei 6.938/1981 enumera em seu artigo 9º treze instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente. O último deles foi introduzido pela LGFP, em 2006, que definiu as concessões florestais como sendo um instrumento da Política Nacional do Meio Ambiente de natureza econômica.

Quadro 6. Instrumentos da Política Nacional de Meio Ambiente.

INSTRUMENTOS DA POLÍTICA NACIONAL DE MEIO AMBIENTE

1 O estabelecimento de padrões de qualidade ambiental. 2 O zoneamento ambiental.

3 A avaliação de impactos ambientais.

4 O licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras.

5 Os incentivos à produção e instalação de equipamentos e a criação ou absorção de tecnologia, voltados para a melhoria da qualidade ambiental.

6 A criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público federal, estadual e municipal, tais como áreas de proteção ambiental, de relevante interesse ecológico e reservas extrativistas. 7 O sistema nacional de informações sobre o meio ambiente.

8 O Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental.

9 As penalidades disciplinares ou compensatórias ao não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção da degradação ambiental.

10 A instituição do Relatório de Qualidade do Meio Ambiente, a ser divulgado anualmente pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA.

11 A garantia da prestação de informações relativas ao Meio Ambiente, obrigando-se o Poder Público a produzi-las, quando inexistentes.

12 O Cadastro Técnico Federal de atividades potencialmente poluidoras e/ou utilizadoras dos recursos ambientais.

13 Instrumentos econômicos, como concessão florestal, servidão ambiental, seguro ambiental e outros.

(Elaborado pelo autor com base em Brasil, 1981)

Segundo Barbieri (2011) os instrumentos 1, 2, 3, 4, 6 e 9 listados acima são tipicamente de comando e controle, na medida em que limitam ou condicionam o uso de bens ou a realização de atividades e o exercício de liberdades individuais em prol da sociedade. Os

instrumentos 7, 8, 10, 11 e 12 têm caráter administrativo e relacionam-se às atividades dos órgãos estatais. Os instrumentos 5 e 13 são econômicos, traduzidos na forma de incentivos fiscais, financiamentos, subsidiados e outros benefícios aos particulares. Eles caracterizam a transferência de recursos do setor público para o privado e vice-versa. O instrumento 11 embora apresentado acima com de caráter administrativo também tem forte relação com a educação ambiental, outro instrumento de políticas públicas.

Conforme indicado acima, a concessão florestal é apresentada na lei e na literatura como instrumento econômico. Todavia, a despeito de seu caráter inicialmente econômico - caracterizado pela transferência de recursos naturais públicos para execução do manejo florestal sustentável por agentes privados, com o incentivo da longa duração dos contratos - é uma atividade altamente regulada. Há também nas concessões o estabelecimento de padrões e condutas, normas que limitam e condicionam o uso de bens, a realização de atividades e o exercício de liberdades individuais, denotando um misto de instrumento econômico com instrumento regulatório.

Tal como nas categorias internacionais apresentadas no capítulo anterior, o Brasil apresenta uma escala de maior para menor proteção das Unidades de conservação. A Lei Federal n. 9.985/2000 faz distinção entre dois grupos de unidades de conservação: i) Unidades de Proteção Integral e ii) Unidades de Uso Sustentável.

Quadro 7. Grupos nacionais de unidades de conservação .

NÍVEL DE PROTEÇÃO NOMENCLATURA MAIOR MENOR Estação Ecológica Proteção Integral Reserva Biológica Parque Nacional Monumento Natural Refúgio de Vida Silvestre Área de Proteção Ambiental

Uso Sustentável Área de Relevante interesse Ecológico,

Floresta Nacional Reserva Extrativista Reserva de Fauna

Reserva de Desenvolvimento Sustentável Reserva Particular do Patrimônio Natural

(Elaborado com base em BRASIL, 2000)

A Floresta Nacional - Flona, subcategoria de Unidades de Uso Sustentável, é legalmente definida como uma “área com cobertura florestal de espécies predominantemente nativas e tem como objetivo básico o uso múltiplo sustentável dos recursos florestais e a pesquisa científica, com ênfase em métodos para exploração sustentável de florestas nativas”. A lei também estabeleceu que: as Flonas são de posse e domínio públicos; as populações tradicionais podem residir em seu interior; a visitação pública é permitida, seguindo as normas estabelecidas para o manejo da unidade; o plano de manejo da unidade de conservação tem sempre assegurada a participação da população residente; a pesquisa na unidade é permitida e incentivada, mas demanda autorização da administração da unidade; a Floresta Nacional tem um conselho consultivo, composto por representantes de órgãos públicos, organizações da sociedade civil, populações tradicionais residentes e presidido pela administração da unidade (BRASIL, 2000).

Quando criada pelos estados e municípios é denominada, respectivamente Floresta Estadual e Municipal. Dadas as características estabelecidas em Lei, as Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais constituem o espaço ideal para implantação de atividades de manejo florestal sustentável reguladas na LGFP.

No Brasil, antes da LGFP, na ausência de um instrumento normativo mais robusto a exploração das florestas públicas ocorria de forma mais tímida e não necessariamente sustentável. Segundo Gonzáles e Bacha, 2007, até então a exploração nas florestas públicas ocorria mediante a expedição de licenças, em caráter experimental e com um prazo de vigência que seria incompatível com as técnicas de impacto reduzido do manejo florestal sustentável. A nova lei, por sua vez, concede à iniciativa privada o direito de explorar floretas públicas com a condição de que sejam adotadas práticas de uso sustentável, em período longo o suficiente a permitir a regeneração das áreas manejadas.