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Inteligibilidade e reciprocidade

No documento Lúpus – “só quem tem é que sabe”. (páginas 113-123)

CAPÍTULO 2. A CONVIVÊNCIA ENTRE IGUAIS COMO ESTRATÉGIA

2.1. Alguns detalhes sobre a LOBA

2.1.2. Inteligibilidade e reciprocidade

As reuniões presenciais observadas foram parte de um processo de estímulo vivido entre iguais que buscavam compartilhar suas experiências. Muitas vezes deixaram claro que certas situações de dificuldades mais particulares em alguns momentos não permitiam terem uma maior proximidade e contato, por isso achavam muito relevante a interação nas reuniões quando falavam de problemas relacionados aos lúpus na maioria das vezes ouvidos por outros, mas pouco compreendidos.

Elas pontuaram a importância dos encontros, com pessoas que poderiam sentir na pele os problemas, essa era uma explicação recorrente observada em diversas situações, muitas das vezes ratificada com a frase na qual tomaram como bandeira no enfrentamento das dificuldades: “lúpus, só quem tem sabe o que sente”.

Em uma de suas conversas foi percebido o papel da inteligibilidade e compreensão mútua nas reuniões, isso ocorreu quando fazíamos o trajeto até o ponto de ônibus. Começaram a olhar uma das colegas, caminhando com bastante esforço, em passos mais lentos e conversando com Jacira mais atrás. Joaquina já havia chamado a minha atenção desde o momento de sua chegada, quase no fim da reunião, quando esta explicou que seu problema na perna não estaria permitindo que fizesse as coisas como desejava, sendo tudo muito mais demorado, levando mais tempo para executar suas atividades, e em sua ida para a reunião não era diferente. Ela não fazia parte das frequentadoras mais assíduas, e logo na sua chegada Jacira falou: “é essa aqui gente, a pessoa que eu falei que tava vindo, que me ligou, eu já tava até preocupada, uma hora dessa e nada dela chegar!”.

Jacira foi caminhando mais atrás e explicando algumas coisas que tinham ocorrido na reunião e ela havia perdido ao chegar atrasada. E enquanto Joaquina caminhava, uma das mulheres que vinha mais à frente comentou compreender bem aquela dificuldade de locomoção e muita dor na perna, pois teve problemas nos ossos da

bacia com o uso de alguns medicamentos, complicando bastante a sua mobilidade e outras questões do cotidiano. Esta era Bianca e em suas falas nas reuniões, como em conversas mais informais, contou ter tido muitas limitações depois da chegada da doença, resultando em sua aposentadoria por invalidez, a frustração por não poder executar suas atividades (esporte, trabalho e coisas domésticas) como ela gostaria, inclusive ocorrendo a desistência do sonho de faculdade, e muitas outras questões mais detalhadas no próximo subtópico. Naquele momento ela continuou dizendo às colegas como seria importante dar atenção aos problemas da doença e, levando em conta sua experiência, procurar um médico, para avaliar melhor o caso e não ter aquela situação piorada, com um sofrimento ainda maior:

No meu caso foi assim, primeiro comecei usando uma muleta e depois a médica disse: você vai ter que usar duas. Pra eu conseguir andar era difícil, às vezes eu tava andando assim e de repente dava um estalo, um negócio assim e eu não conseguia me apoiar, era uma dor insuportável. Eu entendo essa dor que ela tá passando.

Ao final de sua fala outra mulher continuou: “É uma luta! Cada um sabe de sua luta, não é brincadeira, não!” Julieta era uma mulher de meia idade, técnica de enfermagem, que teve de ser afastada de suas atividades laborais por causa dos problemas nas articulações (causando dores e complicações na perna), além de trabalhar em um ambiente de maior propensão a contrair vírus e bactérias, sendo de grande risco, e naquele momento estava sendo amparada pelo auxílio doença.

Segundo a mesma, executar suas atividades do dia a dia era bastante difícil, por isso ela contava com a ajuda de seu filho já adolescente, facilitando em algumas circunstâncias (como na faxina da casa). Disse haver dias em que ela não conseguia fazer nada e não fazia, deixava tudo do mesmo jeito, “quando dá eu limpo, mas quando não dá eu deixo lá, a gente que mora em frente de rua não adianta, você tira a poeira e daqui a pouco tá tudo do mesmo jeito”. Diversas eram suas dificuldades, considerando- se mais ativa antes do lúpus. Julieta continuou:

A gente sabe qual é a nossa luta, e a necessidade de a gente tá se encontrando é por isso, é como tá escrito nessa camisa aí atrás ó, só quem tem sabe o que

sente. Por que às vezes a gente até pode se desabafar sobre nossos problemas do dia a dia, das nossas dificuldades e a pessoa pode até prestar atenção ali ó, mas por dentro às vezes nem tá acreditando naquilo que a gente tá dizendo, ela ouve ali só por educação, mas às vezes nem acredita.

Mais uma intervenção ocorreu por outra participante do grupo, era Miriam, uma jovem aparentando 30 e poucos anos. Esta era sempre muito calada nas reuniões, pois achava “muito chato ter que ficar repetindo toda vez a mesma coisa”, mas nas conversas informais entre nós às vezes deixava escapar algo. Contava sobre suas dores intensas, fazendo com que muitas vezes tivesse de dormir sentada, numa única posição em que conseguia “cochilar”, pois dormir seria “algo raro”. Além disso, ela tinha uma ferida na perna que nunca secava, este era o problema que a incomodava, muitas vezes impedindo-a de sair de casa e limitando suas passadas, havendo períodos de grande inchaço da perna.

Contou ficar triste com seus familiares, que não entendiam seus problemas, dando pouco apoio emocional. Expressou então sua opinião naquela discussão: “Às vezes a gente conta nossos problemas, mas ninguém quer saber não, acha que é fingimento, minha irmã mesmo já chegou pra mim e disse que não acreditava em nada do que eu dizia sobre minhas dores”. E Bianca finalizou:

É por isso que é importante esses nossos encontros, porque aqui a gente tá no meio de pessoas que realmente a gente pode falar e entender o que a gente fala, porque sente os problemas. É diferente de falar pra uma pessoa que não tem a doença, porque pode até ouvir, dizer que entende, mas não entende.

Todas concordaram com sua afirmação, dizendo que nos encontros era o momento de conversarem entre si e desabafar os problemas com pessoas que não iriam minimizar as dificuldades encontradas por elas e nem discriminá-las.

A falta de compreensão de outros foi bastante destacada nas diversas discussões entre elas, como em outro exemplo descrito em outra reunião por uma delas, contando sobre o descaso dado na sua tentativa de divulgação da doença no posto de saúde próximo à sua residência:

Lá no posto eu fui entregar o panfleto de lúpus, você acredita que eu cheguei assim e falei assim: você tá com essa roupa branca é o que? É médica? É enfermeira? É o que? Porque nem todos que usam branco é enfermeiro. Ela respondeu: eu sou enfermeira. Aí eu disse: ah tá, eu posso entregar esses papelzinho aqui? Ela falou: é sobre o que? Eu disse: você já ouviu falar de lúpus? Ela respondeu: ah, já. Assim com aquela cara assim esnobando, aí eu falei, você já ouvi falar e qual foi sua reação sobre isso? Aí ela disse: não entendi muito bem, não. Eu disse: quero deixar aqui esse panfleto, você pode ler aqui e você vai entender muito bem. Aí eu falei: Bom, eu posso deixar aqui? Aí ela falou: Pode. Quando foi de tarde eu voltei pra pegar os remédios, você acredita que tava tudo no balde lixo? No posto de vida nova, no balde lixo! Sabe o que foi que eu fiz? Aí eu olhei, aí peguei [aumenta o tom de voz]! Aí eu falei: ó gente obrigado, viu? Obrigado! Eu peguei do lixo e levei pra casa, eu falei assim: ó gente muito obrigado, viu, e fui embora.

Ao contar sobre o acontecido todas ficaram bastante indignadas, houve uma discussão sobre a possibilidade de ela fazer uma denúncia, mas, ao contrário das colegas, ela não tinha a mesma opinião, não quis se indispor naquele momento constrangedor além do que já havia feito, pois era um posto que sempre frequentava e precisaria voltar para busca de remédios e outras formas de cuidado de saúde.

Observamos que a valorização de seus problemas dependia de uma comunicação a partir de uma compreensão mútua, além disso, formas particulares de convenção ou invenção são empregadas para garantir certos fins expressivos ou comunicativos, mas o sucesso dessas formas verbais depende de seu desempenho em contextos de copresença (GIDDENS, 1999, p.313). A relação com outros que não se identificavam e compreendiam bem seu engajamento naquela situação mostrou-se bastante precária, por isso preferiu se resguardar na medida em que não era dada a devida atenção ao seu problema. No grupo, questões relacionadas à doença eram vistas de forma diferente, onde os participantes “compartilham formas de conhecimento mútuo”, em um dado contexto de interação (GIDDENS, 1999, p.316).

Por saberem que também tinha lúpus estava implícita a vivência de certos problemas inerentes à doença, e em muitas ocasiões foi requerida de mim uma participação mais ativa, seja nas conversas, no uso da camisa, muitas delas me perguntaram: “porque você não veio com a camisa hoje?”. Apesar de minha posição como pesquisadora, ter a mesma doença crônica me colocava no patamar de insider, com legitimidade para interagir nas conversas caso quisesse e também certas cobranças para atuar em defesa da causa do grupo.

Nunca ficou muito clara para essas mulheres a minha distinção como pesquisadora no espaço de encontro para relatos sobre suas experiências ou algum evento mais aberto para reivindicação de direitos. Ter a doença me colocava como “igual”, em todos os sentidos, nas dores e lutas, inclusive certa vez recebi um convite para participar na diretoria, e expliquei a minha impossibilidade de envolvimento como mobilizadora das atividades do grupo enquanto estivesse fazendo a pesquisa. Eu conseguia entender seus pontos de vista, elas tinham como referencial um mundo de doença crônica no qual viviam. Apesar de não estar envolvida nas mobilizações do grupo, e nem na diretoria, fui presenteada com uma camisa e usei algumas vezes, inclusive na participação da caminhada em celebração ao dia internacional de atenção a pessoas com lúpus.

Significação e referência em geral aparecem combinadas na conversa não porque haja uma orientação sobretudo para a descrição, mas porque é praticada e organizada dentro de contextos práticos de ação. Ou seja, “a significação se sustenta pelo contexto constante entre a conversa e modalidades de experiências cotidianas” (GIDDENS, 1999, p.314). As significações sociais atribuídas por elas partem de uma síntese entre a história individual e a história coletiva e as tipificações utilizadas no seu cotidiano são forjadas pelas experiências diretas do eu e pelos vários processos de socialização. As tipificações estão intimamente unidas às interações sociais e os níveis de interação vão depender da intimidade e do interesse que o indivíduo oferece ao outro. Mesmo com todas as tentativas para busca de delimitação e/ou distinção pesquisadora-paciente em muitos momentos nas suas conversas, com a troca de informações, encontrei diversos elementos de proximidade e reciprocidade, podendo compreender aquilo que diziam tendo como base a minha vivência.

A percepção dessa circunstância, em que era insider nesse processo, colocava- me numa situação ambígua, atestada pelos convites e questionamentos de algumas pessoas grupo, e pensava sobre minha condição de dever manter-me neutra como finalidade prática de pesquisa, apesar de não ser neutra. Era também necessário entender que “ser capaz de se colocar no lugar do ator é importante para a clareza da compreensão, mas não é uma condição prévia absoluta para a interpretação de sentido” (WEBER, 1987, p.10).

De certa forma, os casos compartilhados no grupo não deixaram de me afetar, não se pode negar que “igualmente entendemos as ações de uma pessoa que tenta alcançar determinada meta escolhendo os meios apropriados, se os fatos da situação em que se baseia para fazer sua escolha nos são familiares” (WEBER, 1987, p.11).

No âmbito geral, pude notar que o vínculo entre as pessoas no grupo poderia ser entendido à luz do papel que os encontros e as conversas desempenhavam na geração de sentidos relacionados à doença em contextos de ação prática e copresença. Elas tratavam de temas nos quais partilhavam ou tentavam entender, numa vida sociável, tendo seu discurso não no seu sentido naturalista, e sim como uma “arte de conversar” (SIMMEL, 2006).

A troca de informações nesse processo e todas as “formas de interação da conversa, que de resto estão a serviço de inúmeros assuntos e finalidades das relações humanas têm aqui seu significado em si mesmas, quer dizer, no estímulo do jogo da relação que elas estabelecem entre indivíduos que se unem ou se separam, que vencem ou subjugam-se, recebem ou dão” (SIMMEL, 2006, p.75).

O compartilhamento de informações entre elas, acontecido de forma intensa nos encontros do grupo, dava vazão à apresentação de traços individuais e singulares que se moldavam por uma situação de influência recíproca, ao mesmo tempo em que cada caso exigia uma percepção relativamente independente (SIMMEL, 2006). Importante perceber que as reuniões não deveriam ser consideradas apenas como espaços onde algumas pessoas falavam sobre suas experiências de doença, indicando valores que deveriam ser incorporados sem nenhuma percepção crítica de seus problemas. A situação de encontro permitia a cada uma compreender novos modos de lidar com a doença na interação com outros, num ambiente em que podiam falar o que pensavam.

Se, por um lado, havia maior possibilidade de se abrirem, o inverso acontecia com seus parentes e amigos, estes não se manifestavam nas reuniões, permanecendo sempre calados18, apenas diziam seus nomes nas apresentações e seu grau de proximidade com aqueles a quem acompanhavam, mas nunca contaram sobre a real

18 Na dinâmica estabelecida nas reuniões no período observado a fala de parentes e amigos se relacionava

a questionamentos sobre procura para internamento ou vaga para atendimento ambulatorial mais rotineiro, reclamavam não haver vaga e esperavam conseguir algum tipo de encaminhamento da LOBA para facilitar o acesso ao que procuravam.

experiência de ter um amigo ou parente com lúpus, o que achavam sobre a doença e/ou as dificuldades causadas pela mesma.

No período observado houve uma pequena apresentação feita por Vanessa (filha de uma ex-integrante do grupo), que participou apenas de uma reunião juntamente com outras colegas de faculdade e sua professora de patologia, convidadas por Jacira. Na sua fala ela reconhecia não ter compreendido os problemas vividos por sua mãe, e refletia sobre suas ideias e atitudes na convivência com esta:

Eu sou Vanessa, sou estudante de enfermagem na Unijorge, minha mãe é portadora de lúpus, já fez parte da LOBA, e hoje ela não mora em Salvador, mora em morro do chapéu, mas eu sei um pouco do que vocês passam porque eu sei assim... Na realidade o que é essa doença, porque eu sei assim o que vocês passam. Às vezes tudo caía da mão dela, ela não segurava direito e eu às vezes achava que era coisa dela, às vezes assim ela só ficava na cama, com muita dor. Às vezes eu achava que era sabe? Nada [pausa, fica em silêncio]. Jacira: Pode falar.

Hoje eu vejo que isso é uma doença que realmente deixa a pessoa um pouco debilitada mesmo [silêncio e pausa].

Jacira: Mas não pense que lúpus é só isso aqui não, pra quem tá vendo o lúpus não é só isso aqui não!

Frequentemente não havia intervenções nos momentos de depoimento, mas com a opinião de Jacira naquela hora todas falaram ao mesmo tempo: “não é só isso não”. Faziam bastante barulho, as conversas se davam mutuamente (juntamente com o som ao fundo de latido do cachorro muito alto), abafando os diversos comentários. E Jacira continuou dizendo: “o lúpus sério é aquele que coloca a pessoa internada mesmo! (...) Mas sim, minha filha, continue”, e Vanessa seguiu com sua fala:

E assim um pouco, um pouco não, o que eu acompanhei um pouco de minha mãe, assim ela passou por vários profissionais, somente uma médica assim direcionou ela pra fazer um diagnóstico de lúpus, aí deu positivo, foi aí que ela foi encaminhada pra fazer todo o tratamento.

Jacira: E aí ela tá bem?

Depois disso, todas esperaram que algo mais fosse dito (olhavam fixamente para ela), mas a jovem permaneceu calada, isto era o máximo que conseguia, sua voz expressiva e forte transformou-se em titubeante, pois aquilo contado demonstrou sua condição restrita em relação ao conhecimento real sobre a doença (apesar de afirmar seu maior entendimento da doença depois de entrar na faculdade). Ou seja, sua fala reconhecia sua incompreensão sobre a vivência de um paciente de lúpus, apesar do contato diário com sua mãe; em muitos momentos a invisibilidade da doença se afirmou pelo seu descrédito em relação às vicissitudes e sintomas, o lúpus e seus sintomas era um “nada”.

Outro fator que contribuiu para sua mudança de tom de fala foi a agitação de todas ao dizerem “não é só isso não”, demonstrando que os problemas vividos pelos parentes e amigos sempre seriam compreendidos por uma nuance diferente, para elas seria necessário ter a doença para saber, principalmente em momentos mais críticos.

Apesar de eu ficar calada e atenta às falas, algumas pessoas com lúpus sempre me perguntavam se eu tinha a doença, e na minha resposta afirmativa além de perguntas corriqueiras sobre tempo de doença e estado de saúde, havia uma contagem de algum problema, mesmo que de forma sucinta.

Dou o exemplo de minha interação com Brigite, sentada ao meu lado nesta mesma reunião em que Vanessa participou. Ao me perguntar se eu tinha lúpus, e sendo minha resposta afirmativa, Brigite se sentiu à vontade para falar de si, ao mesmo tempo em que ouvia o que era dito na reunião, deu sua opinião sobre a relação com sua sogra, sentada um pouco mais afastada.

Segundo ela, assim como o caso contado por Vanessa, depois da chegada da doença ela começou a ter problemas com suas mãos, havendo dias em que não conseguia fazer as atividades domésticas, não lavava roupa, colocava sua filha de 05 anos para dormir e se deitava quando as dores no corpo eram insuportáveis. Contou que muitas vezes estendia a roupa sem torcê-la, retirando diretamente do tanquinho e colocando na corda para escorrer, sendo criticada por muitas pessoas, principalmente seus parentes e sua sogra.

Neste dia minha filha estava presente e interagindo durante toda a manhã, conversando comigo, me pedindo massas de modelar, lápis de cor, papel, mostrando

como organizava seus bonequinhos no batente onde ela estava sentada, pedindo balas, para ir ao banheiro, etc. A minha interação com ela fez Brigite suscitar certas perguntas: como eu fazia minhas atividades de casa no dia a dia? Meus parentes me ajudavam ou apenas me julgavam? Como fazia para cuidar dela?

Sem entrar muito em detalhes, respondi que executava minhas atividades quando era possível, em alguns dias fazia apenas o necessário, dava banho, comida, algumas vezes quando me sentia exausta comia na casa de minha irmã que morava no andar de cima, também havia colocado minha filha na creche e escola, o que a ocupava durante todo o dia, e assim podia trabalhar (apesar da fadiga e dores não estava em crise e pude trabalhar nesse período na secretaria de educação do estado, no setor de coordenação de projetos de arte e cultura em escolas públicas) e estudar. Brigite sorriu e balançou a cabeça, demonstrando compreender o que eu estava dizendo.

Finalizamos a conversa, pois a fala de Vanessa chamava a atenção de todos, ao falar sobre si e sua mãe, de seu lugar como parente que questionava uma provável existência de problemas, surgiram muitos murmurinhos. Ao ouvir o relato de incompreensão de Vanessa, Brigite olhou em direção à sogra e disse em voz baixa: “tá vendo aí?” Mas sua sogra apenas ficou quieta, continuou sem se manifestar, apenas ouvindo os comentários, não balançou a cabeça, nem demonstrou desagrado em ser chamada atenção (ainda que baixo, no meio de outros), ficou paralisada, apenas ouvindo. Ela me chamou mais uma vez e disse que sua sogra a ajudava bastante com sua filha pequena, mas às vezes recebia críticas.

De fato, a comunicação nas reuniões fazia parte de um processo de entendimento recíproco entre as pessoas, servindo para transmitir e renovar seu conhecimento comum, mas em contextos de ação prática, “a comunicação por intermédio da conversa sempre

No documento Lúpus – “só quem tem é que sabe”. (páginas 113-123)