2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.2 INTER-RELAÇÃO DAS UNIVERSIDADES COM ATORES REGIONAIS
As universidades apresentam potencial de desenvolvimento regional, e inovação e
conhecimentos possuem papéis fundamentais. Nesse sentido, Sanchez-Barrioluengo e
Benneworth (2019) desenvolvem a ideia de uma universidade empreendedora, que integre e
explore os papéis da universidade internamente ao mesmo tempo em que contribui
estrategicamente para o desenvolvimento das regiões onde se encontram inseridas.
Nesse sentido, as universidades têm integrado o conceito da terceira missão aos seus
interesses. De forma primária, as universidades estão vinculadas a duas missões específicas:
ensino e pesquisa (PERKMANN et al., 2013). No entanto, o desenvolvimento junto aos atores
regionais tem se apresentado como a terceira missão das universidades (ETZKOWITZ;
LEYDESDORFF, 2000).
A terceira missão da universidade tem sido encarada como emergencial. Os atores
regionais, ávidos por desenvolvimento e inovação, têm buscado soluções para seus problemas
nas universidades (WANG; VALLANCE, 2015). Contudo, a interação entre a universidade e
a região ainda é comprometida pela ausência de engajamento (GODDARD; VALLANCE,
2011). Assim, universidades aliadas às indústrias como parceiras externas (SANTOS;
BENNEWORTH, 2019) são as que mais contribuem para a inovação, devido ao seu network
global de cientistas.
Ao responder aos estímulos da pesquisa, as universidades se posicionam como
mediadoras na produção e difusão de inovação. Ao produzir conhecimento e inovação
aplicáveis aos atores regionais (COHEN; NELSON, WALSH, 2002), as universidades
promovem o desenvolvimento regional. Segundo Santos e Benneworth (2019), isso se
concretiza por meio de profissionais altamente qualificados formados pelas universidades e de
pesquisas básicas como fonte de conhecimento especializado.
Há vários modelos explicativos das redes de cooperação entre universidades e
empresas. Destacam-se os modelos estadista, laissez-faire e hélice tripla. O modelo estadista
apresenta o governo como intermediador entre a indústria e universidades (SANTOS;
BENNEWORTH, 2019), conforme apresentado na figura 4.
Figura 4 – Modelo estadista
Fonte: Adaptado de Etzkowitz (2003)
No modelo estadista, o governo direciona as interações entre indústria e universidades.
O modelo coloca a visão do governo como imperativa para a cooperação entre indústria e
universidade, com o governo como fiscalizador nessas interações. Santos e Benneworth
(2019) elucidam a utilização desse modelo pelos Estados Unidos da América em épocas de
guerras, assim como pelo Brasil durante grande parte do regime militar. Por essa razão,
segundo Noveli e Segatto (2012), esse modelo está vinculado à antiga União Soviética e a
outros países orientais participantes do que se tornou conhecido como socialismo existente.
O modelo laissez-faire faz distinção entre os papéis do governo, da indústria e das
universidades. Ainda que o governo esteja na esfera superior, averiguando as relações entre
indústrias e universidades, há uma clara distinção entre as responsabilidades de cada um, uma
vez que cada esfera se mantém afastada das outras (SANTOS; BENNEWORTH, 2019).
Nesse sentido, a partir dos produtos educação (fornecendo mão de obra especializada) e
pesquisa (avanço da ciência e inovação), as universidades promovem um ambiente fértil para
o desenvolvimento das indústrias (ETZKOWITZ, 2013) e, portanto, das regiões que esses
produtos universitários alcançam. A figura 5 apresenta esta configuração.
Figura 5 – Modelo laissez-faire
Fonte: Adaptado de Etzkowitz (2003)
O modelo de hélice tripla apresenta uma relação de interdependência entre as esferas.
A figura 6 apresenta esta inter-relação. Segundo Etzkowitz e Leydesdorff (2000), a dinâmica
da infraestrutura do conhecimento gerado pelas interações entre governo, universidades e
indústria busca o desenvolvimento regional.
Gerar conhecimento, dentro do modelo da hélice tripla, é fundamental para o
desenvolvimento regional. Segundo Etzkowitz (2005), esse conhecimento gera inovação e
cria novas configurações entre as esferas institucionais. Nesse contexto, Santos e Benneworth
afirmam que esse modelo tem sido utilizado “como forma de ampliar e diversificar a
compreensão dos fenômenos estudados” (SANTOS; BENNEWORTH, 2019, p. 119). Assim,
universidades precisam produzir capital social por meio de suas pesquisas, ou seja,
conhecimento aplicável e necessário às regiões onde estão inseridas, capitalizando e
empreendendo a partir deste conhecimento (NOVELI; SEGATTO, 2012).
Figura 6 - Modelo de hélice tripla
Fonte: Adaptado de Etzkowitz (2003)
Existem duas abordagens para a capitalização do conhecimento pelas universidades. A
primeira refere-se à capacidade dos acadêmicos de empreender por conta própria por meio de
suas descobertas (ETZKOWITZ, 1998), ou de cooperar e se articular com a indústria sem
necessidade de intermediários (NOVELI; SEGATTO, 2012). O destaque em preto do modelo
da hélice tripla, conforme apresentado na figura 6, mostra a interconectividade entre essas
esferas que, de acordo com Etzkowitz (2005), funcionam com relativa autonomia. Dito de
outra maneira, as esferas, ainda que existam de maneira independente, podem e devem
cooperar, com o objetivo de alcançar o desenvolvimento regional.
A universidade deve assumir papel protagonista no processo de desenvolvimento
regional. Com a ampliação da missão da universidade para propulsora do desenvolvimento
regional, ela evolui para o patamar de empreendedora (ETZKOWITZ, 2005). O
empreendedorismo da universidade deve ser visto como uma extensão do ensino e pesquisa, e
não percebido como algo contrário ou antagônico a suas missões primárias (CHATTERTON;
GODDARD, 2000). Empreender segue o fluxo inovativo, comum ao ambiente das
universidades (SANTOS; BENNEWORTH, 2019).
Assim, uma região baseada no modelo da hélice tripla é fomentada por universidades
empreendedoras. Por meio de universidades empreendedoras, as regiões inovam e se renovam
(ETZKOWITZ, 2005). O processo de inovação e conexão com as esferas do modelo de hélice
tripla, além de criar redes trilaterais, ou seja, oriundas das esferas e suas particularidades
(NOVELI; SEGATTO, 2012), também origina organizações híbridas, fruto das interações e
do desenvolvimento das esferas em direção ao desenvolvimento regional (ETZKOWITZ;
LEYDESDORFF, 2000).
O papel das universidades para o desenvolvimento regional é contraditório. Ainda que
as universidades recebam financiamento de recursos públicos, não são agências de
desenvolvimento regional (BENNEWORTH; FITJAR, 2019). Entretanto, universidades têm
enfrentado pressões para incorporar às suas demandas a missão de engajar atores regionais
rumo à inovação e desenvolvimento (BENNWORTH; PINHEIRO; KARLSEN 2017). Essa
missão poder levar as universidades ao esgotamento de responsabilidades (DE BOER;
ENDERS; LEISYTE, 2007) ou ao questionamento do porquê ela deveria assumir esta
responsabilidade (BENNEWORTH; FITJAR, 2019).
A dualidade de pensamentos a respeito do papel das universidades em relação ao
desenvolvimento regional pode levar a tensões e contradições. De um lado, os interesses,
muitas vezes divergentes, do governo, da indústria e das universidades (VAN DEN BROEK;
RUTTEN; BENNEWORTH, 2019); de outro, a postura da universidade frente à pressão para
o desenvolvimento regional, a mobilidade de carreira por acadêmicos, e a expectativa de
contribuições no longo prazo (BENNEWORTH; FITJAR, 2019).
Estas tensões podem ser aliviadas, segundo Benneworth e Fitjar (2019), a partir de
quatro aspectos. O primeiro diz respeito ao trabalho especializado, que provê suporte para
indústrias emergentes. Evers (2019) identifica que as universidades podem contribuir
significativamente para o desenvolvimento regional, a partir da entrega de mão-de-obra
qualificada que pode ser absorvida pelas regiões. Nesse sentido, ao citar regiões periféricas, o
autor argumenta que essas contribuições não são significativas, devido à tendência de
migração de mão-de-obra especializada para grandes centros. Esses dados são corroborados
pelos achados de Germain-Alamartine (2019) em seu estudo na região da Catalunha.
O segundo aspecto indica que acadêmicos de classe mundial podem contribuir nas
redes de inovação regional no local onde atuam. Benneworth e Fitjar (2019) sugerem que,
nesses casos, os acadêmicos precisam permanecer nas regiões que os receberam tempo
suficiente para contribuir para o engajamento entre universidade e indústria. Ainda,
Atta-Owusu (2019) indica que acadêmicos em trânsito promovem acesso a uma rede internacional
de pesquisadores que podem contribuir de forma significativa para problemas regionais,
criando, assim, fluxo de conhecimento.
O terceiro aspecto revela que universidades precisam criar estruturas que promovam o
desenvolvimento regional. Segundo Salomaa (2019), essa estrutura se baseia no conceito de
arquitetura empreendedora, estabelecendo, portanto, uma universidade empreendedora,
anteriormente apresentada neste tópico. Isso se torna necessário, uma vez que, segundo Cinar
(2019), há possível divergência entre as necessidades e agendas das universidades e as
necessidades regionais.
Por fim, as universidades podem aumentar a qualidade dos processos de inovação,
servindo de anteparo às necessidades regionais e assumindo papel fiscalizador. De acordo
com Fonseca (2019), a colaboração das universidades nas políticas regionais ativa processos
de aprendizagem necessários para as demandas regionais. No entanto, Benneworth e Fitjar
(2019) alertam que é necessário entender como as necessidades das universidades podem se
integrar de forma orgânica às necessidades regionais. A figura 7 sumariza esses
conhecimentos.
Figura 7 - Tensões e contradições entre universidades e desenvolvimento regional
Fonte: Adaptado de Benneworth e Fitjar (2019)
Observando a figura 7, percebem-se possibilidades de alívio das tensões e
contradições entre universidades e desenvolvimento regional. Uma contribuição é o trabalho
especializado, que será descrito no tópico 2.3.3 como um produto universitário, como
determinado por Lendel (2010). Em seguida, há a atuação de acadêmicos oriundos de outras
regiões, mas em trânsito em outras universidades, o que pode contribuir de forma sistemática
para as demandas regionais. A criação de estrutura para desenvolvimento pelas universidades
pode despertar a cultura empreendedora na comunidade acadêmica, o que pode explicar os
produtos universitários no framework proposto por Lendel (2010). Por fim, surge a concepção
da universidade como anteparo e como fiscalizadora dos pontos de convergência entre
governo e indústria. Nesse sentido, Benneworth e Fitjar (2019) questionam o motivo pelo
qual as universidades iriam querem se engajar nessa missão.
As universidades, de fato, têm opção de não se engajar com as necessidades da
sociedade? Etzkowitz argumenta, ao apresentar a evolução da universidade desde o
isolamento do conhecimento até o modelo linear de doação do conhecimento, dizendo que “a
universidade atualmente está assumindo um papel mais fundamental para a sociedade, que a
torna crucial para a inovação futura, criação de empregos, crescimento econômico e
sustentabilidade” (ETZKOWITZ, 2005, p.7). Nesse sentindo, as universidades ao
acompanharem as transformações na sociedade, se viram emergidas em sua terceira missão
(TRENCHER et al., 2013).
Na realidade, as universidades foram pressionadas a implementar a terceira missão.
Assim, universidades precisam, de alguma forma, beneficiar as regiões que as hospedam,
desenvolvendo-as a partir de conhecimento e de pesquisas produzidas (ZOMER;
BENNEWORTH, 2011). Ainda que a ideia atual da terceira missão tenha sido identificada
pela OECD CERI em 1982, Zomer e Benneworth, (2011) afirmam que esse conceito emergiu
nas próprias universidades europeias, motivadas por diferentes vetores, conforme apresentado
no quadro 1.
O quadro 1 mostra os vetores diversos que contribuíram para a emergência de
contribuições das universidades para o desenvolvimento regional. O primeiro foi a crise
perpétua de fundos, limitando as pesquisas nas universidades em um ambiente de escassez
(Martin, 2003). Assim, universidades precisaram buscar fundos externos; no entanto,
tornaram-se vinculadas aos interesses desses, ou seja, deveriam resolver problemas dos seus
financiadores (ZOMER; BENNEWORTH, 2011).
Outro vetor foi a liberalização e mercantilização do conhecimento científico. Políticas
públicas colocaram em pauta os interesses nacionais e vincularam financiamentos para
pesquisas acadêmicas, vislumbrando possíveis soluções (NEAVE, 2000). Zomer e
Benneworth (2011) complementam, afirmando que as universidades europeias aceitaram esse
desafio, vinculando-se a clientes (financiadores) que pressionavam por resultados.
Quadro 1 - Inter-relações entre pressões sociais e o despertar da terceira missão na Europa
Mudança na sociedade Despertar da terceira missão
Crise perpétua de fundos Pressão de investidores para diversificação das atividades das
universidades.
Liberalização e
mercantilização do
conhecimento
Busca de posições de privilégio, criando novos sistemas de
gerenciamento e relacionamento.
Mudança da natureza de
produção do conhecimento
Papéis não claros na produção de conhecimento com vistas a
especialização individual e complexidade de problemas para
novas disciplinas.
imperativo de uso urgentes da sociedade.
Fonte: Adaptado de Zomer e Benneworth (2011)
A mudança da natureza da produção do conhecimento se apresenta como outro vetor.
A pressão por resultados levou a academia à especialização das disciplinas, tornando-as muito
específicas e complexas e com pouco tempo disponível para maturá-las (ZOMER;
BENNEWORTH, 2011). Nesse sentido, a evolução da terceira missão universitária implica
em uma relação multidisciplinar com a inclusão de atores não acadêmicos (BONACCORSI,
2008).
Competitividade e o urgente imperativo de uso se apresentam como a última mudança
na sociedade na evolução da terceira missão universitária. Nesse momento, políticas públicas
e atores regionais já reconhecem as contribuições das universidades para estímulo da
inovação (BENNEWORTH, 2007). Portanto, a terceira missão universitária apresenta,
segundo Zomer e Benneworth (2011), respostas e soluções aos problemas dos atores
regionais, criando valor e uso prático de suas saídas.
A terceira missão das universidades brasileiras se deu como uma onda. Embaladas
pelas mudanças nas universidades europeias, as universidades brasileiras, movidas por
acadêmicos em trânsito, seguiram o mesmo fluxo. Nesse sentido, o governo regulamentou a
terceira missão das universidades a partir da Lei de Diretrizes Curriculares, nº 9.394/1996,
Art. 43, inciso VI, que afirma que as universidades devem “estimular o conhecimento dos
problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços
especializados a comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade”.
Ainda que, no caso brasileiro, a terceira missão esteja regulamenta por lei, ela ainda
apresenta uma conceituação difusa, complexa, e em desenvolvimento, conforme apresentado
no quadro 2.
O quadro 2 mostra a evolução do conceito da terceira missão da universidade. Em um
sentido mais amplo, segundo Kerr (1963), as universidades, devido a sua centralidade,
assumem compromisso com a sociedade no que se refere aos serviços por ela ofertados. Esses
serviços se traduzem em conhecimento produzido pelas universidades e distribuído como
capital social.
O modelo da hélice tripla de Etzkowitz e Leydesdorff (1997), debatido nos parágrafos
anteriores, eleva a discussão do desenvolvimento das universidades no âmbito social a partir
dos vetores do governo e da indústria. Seguindo este argumento, a terceira missão da
universidade se perfaz a partir da interação desses vetores em conformidade com as demandas
sociais, transformando as universidades em centros empreendedores.
Clark (1998, 2004) aponta para a necessidade de realinhamento das missões
tradicionais das universidades (ensino e pesquisa) aos contextos da sociedade do
conhecimento, evoluindo o conceito de universidade empreendedora de Etzkowitz (2002)
para o de universidade inovadora. Não basta apenas empreender, mas se torna necessário e
vital que esse processo acompanhe a inovação.
Quadro 2 - Conceitos da terceira missão da universidade
Autores Terceira Missão
Kerr (1963) Compromisso com a sociedade: serviços.
Etzkowitz e
Leydesdorff (1997);
Etzkowitz (2002)
Desenvolvimento econômico e social: “Hélice Tripla”, universidade
empreendedora.
Clark (1998, 2004) Realinhamento das missões tradicionais aos novos contextos
(econômicos, sociais, etc.) da sociedade do conhecimento:
universidade empreendedora/universidade inovadora.
Molas-Gallartet al.
(2002)
Quando a universidade interage com a sociedade; quando seus
resultados alcançam comunidades não acadêmicas.
Schoenet al. (2006) Relações da universidade com o mundo não acadêmico: indústria,
autoridades e sociedade.
Laredo (2007) A terceira missão dependerá do posicionamento da universidade em
torno das suas três missões institucionais: (i) levar o ensino superior
às massas; (ii) treinar recursos humanos especializados; (iii) realizar
pesquisa e qualificar pesquisadores.
Jongbloed, Enders e
Salerno (2008)
Não é uma atividade residual, mas um conjunto de atividades
indissociáveis do ensino e da pesquisa.
Montesinos et al.
(2008)
Serviços para a sociedade: dimensão social; dimensão empreendedora
e dimensão inovadora.
Göransson, Maharajh
e Schmoch (2009)
Relações entre o ensino superior e a sociedade em torno da primeira e
da segunda missão.
Zommer e
Benneworth (2011)
Transferência de conhecimento e comercialização de inovação.
European
Commission (2012)
É constituída por três dimensões: (i) educação continuada; (ii)
transferência de tecnologia e inovação; (iii) compromisso social.
Trencher et al (2014) Atividades de transferência de tecnologia e co-criação de
sustentabilidade.
Roessler, Duong,
Hacheister (2015)
Pode ser vista de duas maneiras: (i) separada de ensino e pesquisa;
(ii) embrincada e cumprida por meio de atividades de ensino e
pesquisa
Secundo et al (2017) Corresponde a uma variedade de atividades, incluindo capital
intelectual, humano, organizacional e social.
Fonte: Adaptado de Gimenez e Bonacelli (2015)
As contribuições de Molas-Gallart et al. (2002) correspondem à ideia de que o
conhecimento produzido pelas universidades precisa cruzar as fronteiras acadêmicas. Em
outras palavras, os resultados de ensino e pesquisa precisam alcançar o ambiente externo,
beneficiando-o de alguma maneira. Essa interação, segundo os autores, produz troca de
conhecimento e serve de anteparo para o desenvolvimento econômico e social.
Por outra perspectiva, Schoen et al. (2006) aponta a inovação como diferenciador das
missões de ensino e pesquisa em relação a terceira missão. Ainda que as missões estejam
embrincadas, os autores argumentam que a terceira missão é dinâmica e dependente das
esferas econômica e social, sendo, portanto, promovida por licenças, contratos e interação
com a cultura e sociedade.
Em contrapartida, Laredo (2007) apresenta a terceira missão vinculada à contingência,
ou seja, subjetiva e única em cada universidade. Assim, a condução da terceira missão está
relacionada a como as universidades cumprem as missões de ensino e pesquisa e como se
posicionam na região onde atuam. Isso porque os resultados das contribuições universitárias
(ver produtos universitários no tópico 2.3) são elementos vinculados, em sua grande maioria,
às demandas regionais, e as combinações que as universidades promovem no seu entorno
apresentam características únicas e de difícil replicação.
Jongbloed, Enders e Salerno (2008) compreendem a terceira missão como integrada às
atividades de ensino e pesquisa, e não como uma atividade residual. Dessa forma, para que a
terceira missão das universidades seja cumprida, os autores supramencionados concordam
com Laredo (2007), afirmando que as universidades devem estabelecer suas prioridades, seu
público-alvo, e o contexto nacional e/ou regional.
De forma mais pontual, Montesinos et al. (2008) estabelecem uma relação de serviço
da universidade para com a sociedade, envolvendo as dimensões sociais, empreendedora e
inovadora. A primeira dimensão se cumpre por meio dos produtos universitários (LENDEL,
2010), ou seja, cursos, voluntariado, atividades culturais, e outros. A segunda, a dimensão
empreendedora, ocorre por meio de patentes, consultorias, propriedade intelectual. Por fim, a
terceira, a dimensão inovadora, visa a captação de recursos para empreendimentos, parques
tecnológicos e redes de negócios.
Göransson, Maharajh e Schmoch (2009) definem a terceira missão da universidade
como integrada à primeira missão (ensino) e à segunda (pesquisa), o que não está em
desacordo com o que contribuíram seus antecessores (CLARK, 1998, 2004; JONGBLOED;
ENDERS; SALERNO, 2008).
As palavras transferência de tecnologia e inovação passaram a incorporar a definição
da terceira missão universitária em Zommer e Benneworth (2011). Contudo, apenas pelo
European Commission (2012), no centro de estudo do gerenciamento da educação superior, é
que as dimensões da terceira missão universitária ficam mais compreensíveis, a saber:
transferir tecnologia por meio das diversas saídas universitárias (ver tópico 2.3), educação
continuada, ou seja, terreno fértil para a inovação, e, não menos importante, o
desenvolvimento social.
Trencher et al. (2014) associam à universidade e à sociedade um papel de co-criação
para geração de sustentabilidade. Nesse sentido, universidades colaboram com governo,
indústria e sociedade civil para auxiliar no processo de transformação sustentável de
subsistemas sociais em regiões geográficas específicas. Segundo os autores, essa
sustentabilidade é alcançada por meio da colaboração de diferentes atores na criação e
transformação de metas para a materialização de desenvolvimento sustentável em lugar,
região ou setor social específico.
Segundo Roessler, Duong, Hacheister (2015), a terceira missão da universidade pode,
dependendo das especificidades, ser percebida como separada da primeira e da segunda
missão, ou como um produto de ambas. Segundo os autores, a terceira missão pode se
apresentar a partir de formas híbridas das duas abordagens.
Por fim, Secundo et al. (2017) compreendem que a terceira missão é um conjunto de
várias atividades (transferência de tecnologia, educação continuada e desenvolvimento social)
que inclui capital intelectual, humano, organizacional e social. Assim, segundo os autores, a
terceira missão não precisa ser somente cumprida, mas mensurada, para entender como o
desenvolvimento ocorre mediante seu cumprimento. Segundo esses, o cumprimento da
terceira missão leva resultados para departamentos industriais (garantia da qualidade e
avaliação de processos), para a universidade (missão e desempenho) e para a sociedade civil
(desenvolvimento regional e econômico).
Ao final desse item, é importante esclarecer que a inter-relação entre as universidades
e os atores regionais e, portanto, o desenvolvimento regional, se constitui a partir da terceira
missão das universidades. Nesse sentido, esta tese parte da ontologia de que a terceira missão
universitária se concretiza a partir da quantidade e qualidade das saídas das instituições de
ensino superior para a sociedade. Assim, a articulação dos interesses das instituições de
ensino superior com os demais atores sociais promove terreno fértil para o desenvolvimento.
No entanto, o potencial de contribuição para o avanço de uma região é medido pela
capacidade de comunicação entre os atores sociais com vistas ao interesse da região, de forma
que todos possam se beneficiar, respeitado suas caraterísticas singulares. Uma possível forma
de articulação pode ser alcançada por meio dos produtos universitários que serão apresentados
a seguir.
No documento
AUGUSTO FERREIRA RAMOS FILHO
(páginas 34-45)