2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.4 DESENVOLVIMENTO REGIONAL
2.4.2 Sistemas regionais de inovação– sri
Inicialmente, esse tópico apresentará a inovação de forma introdutória, para mostrar
sua relação com os sistemas de inovação. Seguindo a lógica do desempenho da inovação, os
arranjos produtivos locais serão apresentados. Em seguida, apresentar-se-ão os sistemas
setoriais de inovação e os elementos de fronteiras geográficas e tecnológicas, para então
constituir os conhecimentos sobre sistemas regionais de inovação.
A literatura da área de inovação tem afirmado que esse é um dos vetores de
competitividade e sucesso. Para Valladares, Vasconcelos e Di Serio (2014), os fatores
determinantes da capacidade de inovação estão diretamente associados à liderança
transformadora, à intenção estratégica para inovar e à gestão de pessoas para inovação.
Assim, parece que inovação e competitividade estão vinculadas em um percurso
natural. Vasconcelos e Cyrino (2000) concordam com os autores supramencionados ao
afirmar que inovação se associa às estratégias organizacionais, baseadas em processos que
fomentam a evolução da inovação.
Os processos de inovação, apesar de apresentados inicialmente de forma linear, não
estão vinculados a um padrão universalizável. Esse aspecto contingente garante a vida e
pesquisa da inovação em diferentes setores. A linearidade da inovação pela perspectiva
tecnológica a partir da visão dos desenvolvedores, pioneiramente elaborada por Bush (1945),
vislumbrava, genericamente, a pesquisa, aplicação e distribuição da inovação.
No entanto, autores como Freeman (1982, 1987), Lundavall (1992) e Malerba (1999,
2002, 2005) desafiaram esta linearidade, destacando a dinâmica das partes interessadas, mais
especificamente, os atores, no processo de geração e difusão da inovação.
Inovação ocorre em diferentes setores em termos de recursos, atores e instituições.
Essas diferenças são importantes para a compreensão de como o conhecimento, tecnologia,
atores, redes e instituições empreendem os processos de mudança e transformação por meio
da co-evolução de seus elementos. (MALERBA, 2002).
Uma das consequências naturais da inovação parte da concepção e desenvolvimento
de arranjos produtivos locais. Essas aglomerações produtivas nutrem o compartilhamento de
informações, recursos e ação conjunta de variados agentes, tornando a inovação uma questão
estratégica (MULLER et al., 2008). Os arranjos produtivos locais são conjuntos de variáveis
econômicas, políticas e sociais, centradas em um mesmo território, desenvolvendo atividades
econômicas correlatas e com conexões de produção, interação, cooperação e aprendizagem
(MYTELKA; FARINELLI, 2005).
Os arranjos produtivos locais podem evoluir para outros sistemas de inovação. A
cultura cooperativa estimulada pelos processos de aprendizagem possibilita a transferência do
conhecimento dos arranjos locais e o fomento da inovação sustentada nestes ambientes com
todas as partes interessadas (MYTELKA; FARINELLI, 2005). Nesse sentido, segundo
Malerba (2005), os aspectos analíticos que afetam os sistemas de inovação são: conhecimento
e domínio tecnológico, atores e redes e instituições. O último, no entanto, recebe o reflexo dos
atores nas práticas e rotinas institucionais.
Outra possibilidade são os sistemas setoriais de inovação, vinculados às questões
técnicas e tecnológicas geradas em seus contextos. Em outras palavras, e concordando com
Silvestre (2006), esses sistemas estão focados em um setor específico que não precisa
apresentar uma delimitação geográfica. Os sistemas de inovação, entretanto, podem
apresentar fronteiras tanto geográficas quanto tecnológicas, conforme apresentado no quadro
3.
Quadro 3 - Fronteiras, abordagens e enfoques dos sistemas de inovação
Fronteira Tipos de abordagem Enfoque
Geográfica
Regional - Supranacional O foco nas fronteiras geográficas de mais
de um país (MERCOSUL, por exemplo).
Nacional O foco nas fronteiras geográficas de um
país (Brasil, por exemplo).
Regional - Subnacional
O foco nas fronteiras geográficas de uma
região dentro de um país (ex. Sudeste do
Brasil).
Local
O foco direcionado para as fronteiras
geográficas de uma localidade (Sul
fluminense, por exemplo).
Técnica / Tecnológica Setorial
O foco em dado setor ou segmento
industrial. Não apresenta delimitação
Tecnológico O foco em dada tecnologia. Não apresenta
delimitação geográfica definida.
Corporativo
O foco em uma empresa ou organização.
Não apresenta delimitação geográfica
definida
Fonte: Silvestre (2006)
Frente ao conceito guarda-chuva de sistemas de inovação, encontram-se os sistemas
regionais de inovação. O conceito de sistemas regionais de inovação é novo. Outros termos,
como políticas de inovação regional (ANTONELLI; MOMIGLIANO, 1981), potencial de
inovação regional (MEYER-KRAHMER, 1985), innovative milieux (AYDALOT, 1986),
políticas de tecnologia regionais (ROTHWELL; DODGSON, 1991) e redes de inovação
(CAMAGNI, 1991) apareceram antes do termo sistemas regionais de inovação, cunhado por
Cooke (1992). Os SRIs são integrantes dos sistemas de inovação e suas modulações,
conforme se observa no quadro 3.
Araújo, Dalcol e Longo (2009) afirmam que as abordagens de sistemas de inovação se
destacam por buscar entender o papel de cada ator, individualmente e em relação aos demais,
para a inovação. Ainda, possibilitam a divisão dos processos de inovação em vários níveis de
análise, conforme apresentado no quadro 3. Estas tipologias vão desde sistemas de fronteiras
geográficas (supranacional, nacional, subnacional e local) até os níveis setoriais, tecnológicos
e coorporativos da fronteira técnica e tecnológica.
É importante destacar que há divergências sobre o significado das abordagens entre os
atores em relação aos sistemas de inovação. Asheim, Grillitsch e Trippl afirmam que os
sistemas regionais de inovação “figuram proeminentemente nas discussões acadêmicas sobre
a geografia desigual da inovação e os fatores que moldam as capacidades de geração de
conhecimento e inovação das regiões” (ASHEIM; GRILLITSCH; TRIPPL, 2015, p.1). Por
essa razão, os autores alegam que os contextos locais e regionais são importantes no processo
de transferência de conhecimento. Assim, os enfoques dados por Silvestre (2006) em relação
as abordagens regional e local, conforme exposto no quadro 3, divergem de Asheim,
Grillitsch e Trippl (2015). Para o primeiro, a abordagem local se associa às fronteiras
geográficas de uma localidade, enquanto a abordagem regional às configurações de regiões e
à união de estados. Para os outros autores, região é um termo abrangente e, portanto, flexível.
A divergência, entretanto, é de entendimento conceitual. Enquanto Silvestre (2006)
fragmenta o conceito de região para o conjunto de estados alocados em determinado território,
Asheim, Grillitsch e Trippl (2015) consideram a região como um conceito mais amplo,
englobando o que Silvestre (2006) chama de local e regional.
Sistemas regionais de inovação possuem papel importante para o desenvolvimento
regional. De acordo com Martin et al. (2017) a abordagem de SRI enfatiza a interação entre os
atores locais em uma teia de interdependência, em um contexto social e institucional,
promovendo aprendizagem e inovação. Asheim, Grillitsch e Trippl (2015) salientam que, pelo
fato de as economias regionais não serem autossuficientes e serem dependentes de ligações
externas, ou seja, de outras regiões, se configuram, também, como sistemas abertos.
Asheim, Grillitsch e Trippl (2015) enfatizam a importância da proximidade geográfica
para a transferência de conhecimento e, portanto, para a aprendizagem. Esses elementos,
segundo os autores, legitimam os sistemas regionais de inovação por meio de ações
coordenadas entre organizações (firmas) e governo. Ainda, citam outros elementos adicionais
(indústria, pesquisa e desenvolvimento, entre outros), denominando-os de organizações de
suporte. As universidades, não diretamente citadas pelos autores, são mais do que
organizações de suporte e constituem outro elemento junto às organizações (firmas) e
governo, conforme apresentado no tópico 2.2, com o modelo de hélice tripla.
Ainda sobre a distância entre os atores para a geração de conhecimento, a literatura
apresenta evidências da necessidade de proximidade para a transferência de conhecimento,
uma vez que conhecimento, por ser parcialmente tácito, é de difícil disseminação pela
distância (POLANYI, 1958). Nesse sentido, proximidade fomenta o desenvolvimento
necessário para a resolução de questões locais (ASHEIM; GRILLITSCH; TRIPPL, 2015),
associado à contingência de não replicação em contextos diferentes. Assim, baseado na
literatura até aqui apresentada, pode-se afirmar que universidades engajadas com
organizações (firmas) e governo para questões regionais apresentam grande potencial para o
desenvolvimento regional.
Esta tese concorda com o conceito de região defendido por Asheim, Grillitsch e Trippl
(2015), assim como o de Cooke, Uranga e Etxebarria (1998), que afirmam que região é uma
evolução administrativa e cultural.
Um dos elementos para o sucesso de sistemas regionais de inovação é a capacidade de
articulação entre os atores regionais. Nesse sentido, o tópico de articulação estratégica será
apresentado em seguida.