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Capitulo 2 A FUNÇÃO SOCIAL DA SOCIOLOGIA

2.2 Intermediária entre a população e as estruturas de poder

Nesta segunda função, o papel dos sociólogos surge enquanto mediadores entre a população e o Estado, para que este tome decisões mais informadas e consentâneas com a realidade social, é necessária a inserção dos sociólogos nos mecanismos de decisão e nas políticas públicas. O conselheiro do príncipe, que pelos seus conhecimentos contribui para o bem-estar das populações, justificando as suas necessidades junto do poder.

Destaca-se nesta função social o apoio que prestamos na construção de políticas públicas, que se definem pela intervenção de uma autoridade investida de poder público e com legitimidade governamental sobre um domínio específico da sociedade ou do território (Morata, 2000, p.25). São a expressão do poder político, o modo como se governa uma sociedade. Esta atividade foi largamente ampliada no processo de construção da Europa Social, apesar do seu estado atual, de crise, para além do desenvolvimento económico almejado, também ambicionava no seu projeto inicial a proteção social dos seus cidadãos. Flagelada durante séculos pela fome, guerra e epidemias, a necessidade imperiosa de Bem- estar esteve sempre latente no cerne das preocupações sociais. Assim, dos Escandinavos a Comunidade Europeia adotou e desenvolveu o Modelo Social Europeu, para assegurar aos seus cidadãos os limiares mínimos de dignidade social, os quais o Mercado não garante e que necessitam de regulação e políticas públicas. Desta forma procurou-se assegurar aos cidadãos uma proteção social total, no sentido em que este nunca fique sem meios de provimento, adotando-se políticas sociais mais respeitadoras da dimensão holística do ser humano, tais como: salário mínimo nacional, pensão social mínima, rendimento mínimo de cidadania, acesso à escolaridade obrigatória gratuita, acesso a serviços de saúde essenciais (vacinação e assistência materno-infantil) e uma legislação que garanta trabalho digno. Na verdade tudo o que se alcançou na Europa Comunitária, em termos de desenvolvimento económico e desenvolvimento humano, é inigualável no resto do mundo. Os pilares comunitários, sobre os quais desenvolve as suas políticas assentam na empregabilidade, competitividade, adaptabilidade e igualdade de oportunidades.

Da Comissão Europeia emanam os estudos e propostas de como concretizar estas políticas, no entanto como a sua aplicação é nacional, há que as adaptar à realidade de cada país, constituindo-se assim como diretivas que se materializam na subsidiariedade, tão próximo da realidade quanto possível. Daí que fique a cargo de cada país a colocação em prática e regulamentação das políticas públicas sociais para tal desenvolvem-se programas de financiamento a que se candidatam projetos de desenvolvimento social local. Quanto aos

outros atores das políticas públicas sociais, para além dos institucionais, tem vindo a promover-se a sua participação, mediante o reforço da sociedade civil na implementação das políticas e até mesmo na definição destas, convocando parceiros e cidadãos, para a elaboração e implementação dos projetos financiados. Depois da cimeira de Lisboa as diretrizes para as políticas públicas passaram também a promover a aprendizagem ao longo da vida e a transição para a sociedade do conhecimento, bem como o envolvimento dos parceiros sociais visando a delineação de políticas ativas.

Para a implementação dos objetivos dos programas de intervenção definidos, são colocadas à disposição dos promotores locais de desenvolvimento social, candidaturas a financiamentos para a operacionalização dos objetivos específicos, ações e atividades. É assim que surgem os projetos de intervenção local, para cuja conceção, desenvolvimento e avaliação se tornou necessário ter um sociólogo nos municípios portugueses, o que viria a aumentar a sua empregabilidade. Para a realização destes projetos de intervenção tem vindo a ser seguido um sistema aberto, uma vez que a realidade está em plena mutação e nenhuma medida pode ser estanque, concorrem um conjunto de entidades locais ligadas em redes de parceria. Para tal há que ser realizado um diagnóstico do problema a ser intervencionado, ao que após se segue a delineação de objetivos, acompanhado de um plano de ação. Após a realização das atividades, estas são reavaliadas em função dos resultados alcançados, dando origem a um novo diagnóstico e, assim, sucessivamente. Por norma este ciclo obedece à apresentação do relatório de atividades e posteriormente de um novo plano de ação. Foi daqui que também surgiu a necessidade de alargar a participação ao público. Assim, para além de fornecer diagnósticos ao poder politico, o próprio sociólogo viu alargado o seu campo de ação (nem sempre do agrado dos políticos que procuram se substituir aos técnicos superiores).

Face à crise presente e perante a ameaça de fragmentação da União Europeia, torna-se urgente tomar medidas que reforcem a sua coesão e promovam um desenvolvimento coerente, não só económico, mas sobretudo social. Não há União Económica e Política sem uma verdadeira Europa Social. Atualmente o plano para retirar a Europa da crise passa pela estratégia ‘Europa 2020’, segundo a qual é prioritário retomar o desenvolvimento numa perspetiva holística de sustentabilidade e inclusividade, com um elevado nível de emprego e coesão social e territorial. Para que tal seja exequível pretende-se que a economia passe a basear-se no conhecimento e inovação e que seja mais eficiente, verde e competitiva. Assim as reformas nacionais e as políticas públicas deveriam refletir estes objetivos.

No sentido de garantir a eficiência do plano terá de haver uma metodologia que assegure a coordenação simultânea de processos. O Método Aberto de Coordenação50 possibilita o

avanço na harmonização de políticas, pois comtempla os contextos específicos e as prioridades de cada estado membro e, também objetivos e metas comuns em vários domínios de política. Não requer novos instrumentos, nem cria novas burocracias. Exige maior coordenação de políticas e tem natureza intergovernamental. Promove a participação responsável dos parceiros sociais e outros agentes pertinentes na sua conceção e implementação.

No entanto há outros domínios de poder em que os contributos dos sociólogos são valorizados. Ao nível das autarquias, embora o habitual seja fornecer informações e dados estatísticos, para sustentar decisões, vai-se mais longe ao propormos soluções e meios para os problemas locais que estudamos. Embora frequentemente sejam encomendas, alguns trabalhos também partem da iniciativa dos Técnicos Superiores e, é bom que assim seja e também da pressão da população. Como exemplo apresento um trabalho realizado em 2000, em conjunto com uma colega Engenheira Civil, propusemos fazer o levantamento de todo o parque escolar devoluto, há data 74 escolas; num raio de 3km a cada uma das escolas inquiri, recolhi os dados com o formulário guião e ouvi todas as pessoas que ali habitavam, traçando o contexto social em que se encontravam os edifícios devolutos com vista à sua possível reutilização. Daqui resultou um guia, contendo os levantamentos das condições dos edifícios e orçamentos da sua recuperação, realizados pela minha colega; a caracterização populacional, diagnóstico com enquadramento histórico, problemas e potencialidades humanas e propostas de reutilização, pela minha parte. Este trabalho supostamente viria a orientar as decisões em relação a este parque escolar, evitando a ruina de muitos equipamentos, e a sua recuperação para fins sociais (dentre muitos outros fins).

Quanto à ligação da Universidade ao meio, J. M. Pinto (2004, p.24), defende que esta deve ser uma participação ativa na transformação da sociedade mediante projetos de investigação/intervenção, estudos de impacto social ou ainda o seu envolvimento em projetos de investigação das ciências aplicadas. Abre-se aqui uma via para o desenvolvimento de estudos sociológicos e de suprir as necessidades de bem-estar da população, bem como incrementar a eficiência da administração pública. É assim que se podem definir estratégias de ação, quer por parte das entidades públicas, quer mesmo por parte dos cidadãos. Esta ligação é importante e ocorre com frequência por meio de encomendas mais complexas. No entanto da lista extensiva de programas nos anos 90 e início de 2000, foram contratados inúmeros profissionais das Ciências Sociais nas autarquias para fazer face à elaboração e coordenação de projetos, como já referimos. O que veio relativizar a ligação às universidades, não obstante a ligação a Centros de Investigação, com quem é mais fácil articular, validar e expandir perspectivas com quem está no terreno. Atualmente, na prática os sociólogos (bem como outros técnicos superiores)

são proscritos, pois domina a mentalidade de o que é bom é o que vem de fora. Daqui haver uma duplicação de tarefas e de gastos, o que outrora era gratuito agora custa caro, pois as Universidades e Centros de investigação carecem de fontes de rendimentos e criou-se o hábito de encomendar trabalhos, muitas vezes ignorando os técnicos locais. De facto o ideal seria existir um suporte dos centros de investigação, incluindo na equipa que realiza o trabalho os técnicos locais, ou que existisse facilidade por parte destes aos recursos destas unidades de pesquisa. Não obstante estas idiossincrasias, o sociólogo surge como uma versão sofisticada de conselheiro do príncipe (Maquiavel, 1513 (1970)), que trabalha em prol de ambos, do príncipe e do povo, servindo de intermediário, mas que fica sempre atrás do cenário, para ele não há lugar no palco.