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Parte II – Temas Desenvolvidos ao Longo do Estágio

1. Higiene do Sono

1.1 Enquadramento Teórico

1.1.7. Intervenções Farmacêuticas

Ao realizar uma pesquisa na base de dados pubmed, utilizando as palavras-chave “pharmacy”, “intervention” e “sleep”, é fácil constatar que são escassos os trabalhos publicados por farmacêuticos nesta área. No entanto, apesar desta lacuna, ainda é possível encontrar alguns trabalhos realizados no âmbito da farmácia comunitária.

O farmacêutico comunitário ocupa um lugar de excelência no que diz respeito ao aconselhamento. Este profissional é dotado de conhecimentos acerca dos medicamentos, gestão de doenças, educação para a saúde e, ainda beneficia de uma comunicação mais acessível durante o atendimento.43,44 Estas características tornam a farmácia num local onde é possível realizar estudos

de monitorização ou interventivos de modo a melhorar a saúde da comunidade abrangida. Uma parte dos trabalhos realizados são de natureza epidemiológica e consistem na recolha e tratamento de dados acerca das diferentes patologias do sono e a sua incidência.43,45 Este tipo de metodologia é útil

para obter dados mais fidedignos da prevalência de determinado distúrbio e, por outro lado, permite identificar casos de risco mais precocemente.44,45,46Para além disso, neste exemplo de trabalhos é

estudada a intervenção farmacêutica a nível da recomendação de medidas farmacológicas, de educação para a saúde, quer seja utilizando aconselhamento verbal, material didático – como cartazes, panfletos ou palestras sobre, por exemplo, a higiene do sono – e, ainda, referimento a um cuidado mais especializado, como é o caso do médico de família ou psicólogo.44, 45 Contudo, há um

fator fundamental para que haja uma mudança de paradigma no contexto da farmácia comunitária que é a formação.45 Os profissionais devem ser treinados acerca das medidas farmacológicas e não

farmacológicas e, não menos importante, acerca dos critérios de referenciação. Além do mais, deve ser feito um esforço para documentar o seguimento dos utentes de modo a obter dados, não só úteis no tratamento do indivíduo mas, também na evolução do papel do farmacêutico comunitário. Os estudos referenciados mostram que a adesão dos utentes é positiva e que os programas devem ser implementados.44, 45

1.1.8. Higiene do Sono

A HS pode ser descrita como um conjunto de práticas, quer sejam elas comportamentais ou ambientais, utilizadas com o objetivo de promover um sono saudável.47 A descrição deste conceito foi

realizada inicialmente por Peter Hauri em 1977.48 Neste trabalho, o autor descreve diferentes

25 científicas já comprovadas– como é o caso da influência da cafeína – e outras baseadas na sua prática profissional.48 Na Tabela 3 estão descritas as dez recomendações, para adultos, da World Sleep Society (WSS), sumariadas no âmbito do dia mundial do sono.49 Estas recomendações são o resumo

de várias descritas por diferentes autores. Apesar de serem recomendações genéricas, devem ser adaptadas a cada indivíduo, como vai ser explicado mais à frente no texto.

Tabela 3 – 10 mandamentos para uma boa higiene do sono, WSS 201948

Horas de deitar e acordar regulares.

Sestas diurnas com duração menor do que 45

minutos.

Evitar ingestão de álcool, assim como fumar, 4 horas

antes de dormir. Evitar o consumo de cafeína 6

horas antes de dormir.

Praticar exercício regular, mas não antes de dormir.

Reservar a cama apenas para dormir e para sexo. Utilizar lençóis e cobertores

confortáveis e adequados na cama.

Manter o quarto com uma temperatura confortável.

Bloquear a entrada de luz e de barulho no ambiente onde

dorme.

Evitar comidas ricas em açúcar e gorduras, assim como de comidas picantes, 4 horas antes de dormir.

Atualmente, o diagnóstico de “higiene do sono inadequada” está presente na classificação internacional de distúrbios do sono (ICSD), publicada pela Academia Americana de Medicina do Sono, e pode ser definido como “perturbação do sono devido à realização de atividades diárias inconsistentes com a manutenção de uma boa qualidade do sono e de um estado de vigília adequado”.50 A partir desta definição, pode-se chegar a uma lista extensa de comportamentos que

podem contribuir para uma má HS. Contudo, é possível separar os mesmos em duas categorias fundamentais, ou seja, as atividades que levam a um estado de excitação e, por conseguinte, impedem o sono e, ainda, as atividades que vão contra a organização natural do sono, como é o caso de horários irregulares ou excesso de sestas durante o dia.50 Os critérios de diagnóstico baseiam-se

nos comportamentos, sendo importante realçar que, para além de insónia ou sonolência, basta estar presente um hábito de sono inadequado para diagnosticar.48

A HS é utilizada como parte da terapia não farmacológica no tratamento de distúrbios do sono.51

Apesar de uma má higiene do sono não se traduzir na existência de alguma patologia mais complexa, como uma insónia crónica, comportamentos inadequados podem agravar uma condição preexistente e, por outro lado, podem precipitar a mesma.50 Geralmente, a higiene do sono faz parte de uma

abordagem inicial à insónia, de modo a identificar e a corrigir comportamentos inadequados.52 Apesar

da prática de comportamentos descritos como promotores de uma boa higiene do sono estar associada a melhores resultados em saúde e ter um melhor custo-eficiência do que outras terapias comportamentais,53 é necessário ser crítico sobre a evidência científica das recomendações.54

26 Por exemplo, uma das recomendações encontradas é a diminuição da ingestão de cafeína. Esta foi elaborada baseada na evidência de que a cafeína tem um efeito estimulante do SNC.47 No entanto,

a duração do efeito da cafeína está dependente do seu tempo de semivida que, por sua vez, é determinado pelo metabolismo do indivíduo.47 Os trabalhos realizados mostram que o consumo

excessivo de cafeína próximo da hora de dormir é prejudicial para o sono, mas não apresentam resultados para consumo ligeiro. Ainda, não é claro que a abstinência de cafeína tenha o mesmo efeito em consumidores regulares do que em consumidores habituais.47 Outro aspeto interessante

são as recomendações acerca do consumo de nicotina. Neste caso, uma vez mais o consumo regular ou ocasional tem de ser considerado aquando da realização de uma recomendação. É evidente que a cessação tabágica tem efeitos benéficos a longo prazo e que o ato de fumar tem consequências nefastas no sono em geral, visto que suprime o sono REM quando comparado com o placebo.47 No

entanto, para utilizadores regulares, a cessação tabágica vai ter efeitos agudos de abstinência que se podem traduzir num aumento do stress e da ansiedade o que, por conseguinte, pode levar a insónia.47, 55 Deste modo, é importante perceber se o indivíduo a quem se está a fazer aconselhamento acerca

da higiene do sono é fumador habitual ou não e se quer deixar de fumar por completo uma vez que os benefícios no sono só se irão notar a longo prazo. Ao analisar os estudos em que estas descobertas se baseiam, é possível observar que estes são conduzidos através de comportamentos extremos comparados aos grupos controlo. É necessário aumentar a investigação de comportamentos naturais do indivíduo, de modo a reproduzir o quotidiano e a tirar conclusões válidas sobre a HS e a sua utilidade.47, 55 Adicionalmente, é evidente a necessidade de personalização das recomendações para

cada utente. Alguns trabalhos mostraram que a recomendação de 2 a 4 medidas de higiene do sono personalizadas, resultaram em melhorias na qualidade do sono e que estas ainda estavam a ser praticadas 1 ano após a monitorização, sugerindo que esta abordagem resulta numa maior adesão.47

1.2. Desenvolvimento do Projeto