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4. INOVAÇÃO E INVESTIGAÇÃO NO FUTEBOL

4.1. Introdução

Sendo o futebol uma modalidade de estrutura complexa onde o fator tático se assume como o mais importante para o sucesso, as habilidades motoras como o passe têm como principal objetivo resolver problemas táticos que podem surgir na competição (Costa, Greco, Garganta, Costa & Mesquita, 2011).

Para treinar estas habilidades motoras, os treinadores utilizam tarefas em que participam vários atletas num regime de cooperação/oposição sendo que, todos eles, têm necessidades diferentes. Logo, as tarefas podem não estar adequadas a alguns atletas por estes terem uma taxa de sucesso muito elevada e a outros por terem uma taxa de sucesso muito reduzida, ou seja, o princípio da individualização do treino desportivo e a aprendizagem dos atletas podem estar comprometidos.

Que estratégias pode um treinador utilizar para aumentar a taxa de sucesso de um jogador na realização de determinada habilidade técnica? Como pode criar tarefas ajustadas à capacidade do jogador sem que esta perca a representatividade relativamente à competição?

Um dos fatores psicológicos que mais afeta o rendimento desportivo é a autoeficácia (Guicciardi, Fadda & Delitala, 2016) sendo esta definida como a crença de uma pessoa na sua capacidade de executar e organizar uma ação para realizar uma determinada tarefa (Bandura, 1997 citado por Feltz, Short & Sullivan, 2008). Assim, um indivíduo pode ter a crença de que consegue realizar determinada ação com sucesso ou ter a crença de que não a consegue realizar. Segundo Bandura (1997, citado por Feltz et al., 2008), esta é influenciada por vários fatores dos quais se destaca as experiências passadas.

Desta forma, a reduzida taxa de sucesso numa determinada tarefa irá influenciar a capacidade do atleta realizar uma tarefa semelhante, logo, neste caso, é importante que o treinador consiga criar tarefas ou estratégias para o atleta conseguir ter mais vezes sucesso e, por sua vez, aumentar a sua autoeficácia. Nestas tarefas deve estar assegurada uma elevada representatividade da situação de competição para que o atleta possa associar o sucesso nessa tarefa a uma melhoria na sua capacidade de jogo em contexto competitivo. Araújo & Davids (2015) afirmam que esta representatividade está assegurada se existir uma correspondência nos comportamentos entre o contexto competitivo e o

51 contexto da tarefa sendo que esta correspondência deve “obedecer” a três princípios: 1.

Os indivíduos que executam a tarefa devem selecionar as mesmas affordances que são observadas na competição. 2. As ações motoras executadas na tarefa devem ser semelhantes às ações executadas na competição. 3. O sucesso das ações de cada individuo deve ser semelhante ao sucesso que obtêm nessas mesmas ações realizadas na competição.

Dito isto, os treinadores podem utilizar ambientes virtuais para criar tarefas representativas desde que os 3 princípios mencionados anteriormente estejam presentes quando se comparam os comportamentos observados nos dois contextos (tarefa e competição).

Os ambientes virtuais têm sido estudados devido ao dilema entre preservar a representatividade das tarefas e ter controlo experimental dessas tarefas para avaliar e estudar os comportamentos do atleta em competição (Correia, Araújo, Watson, & Craig, 2013). No que diz respeito à investigação no desporto, devido aos avanços tecnológicos, este dilema parece estar perto de ser resolvido, contribuindo para um despertar da curiosidade no que concerne à utilização destas tecnologias no treino desportivo. Num estudo realizado por Stevenson, Smeeton, Filby & Maxwell (2015) no críquete, observaram que uma tarefa realizada num ambiente virtual pode ser representativa da competição devido ao facto de os atletas adaptarem os seus comportamentos motores em função das informações que o ambiente proporcionava e devido ao facto de os atletas com mais sucesso na competição (atletas mais experientes) serem os mesmos que conseguiam ter mais sucesso na tarefa. Apesar do aumento da representatividade das tarefas realizadas em ambientes virtuais e da potencialidade que estas podem ter por serem facilmente manipuláveis, existem algumas limitações na realidade virtual.

Numa tarefa representativa, o ciclo perceção-ação é semelhante àquele que acontece na competição visto que este está na base da relação entre o individuo e o seu envolvimento. Ou seja, segundo Warren (1990), o individuo age de acordo com a informação que obtém do seu envolvimento, mas também, a informação que o envolvimento lhe fornece depende das suas ações, logo, existe um ciclo que, no caso particular do simulador 360s, não existe visto ser um projetor circular e a informação que fornece não depende da ação do atleta. O facto de as projeções estarem sempre à mesma distância do atleta que realiza a tarefa (distância da parede para o centro do simulador) também é uma limitação do 360s porque impossibilita a emergência de alguns comportamentos que podem acontecer na competição como passes longos ou passes muito curtos. Este simulador é constituído por 4 paredes com redes de LEDs que projetam

52 imagens sendo que estas paredes formam um quadrado com 12,8 metros em cada aresta.

Em cada vértice deste quadrado formado pelas 4 paredes está um canhão que “dispara” uma bola por cada ação dos atletas que estão colocados no centro do quadrado/simulador. Após a saída da bola, aparecem imagens de colegas de equipa e de adversários nas quatro paredes que variam de posição, movimento e velocidade de deslocamento de acordo com a manipulação do treinador que cria a tarefa. Por último, após a saída da bola do canhão, o atleta que está a executar a tarefa tem como objetivo colocar a bola nos pés de um dos colegas de equipa projetados nas paredes sendo que, o simulador, regista tanto a taxa de sucesso das ações como o tempo que o atleta demora a executá-las.

Como dissemos anteriormente, o interesse na utilização de ambientes virtuais no treino desportivo é muito recente. Com este estudo pretendemos perceber se tarefas realizadas no simulador 360s têm influência na autoeficácia específica para a habilidade motora do passe. Ou seja, sendo esta habilidade motora muito utilizada em competição e fundamental para o rendimento coletivo e individual no Futebol, pretendemos perceber se tarefas realizadas no simulador e que proporcionam experiências com uma elevada taxa de sucesso na realização desta habilidade motora melhoram os níveis de autoeficácia específica para o passe e, por sua vez, se a melhoria desta autoeficácia específica tem um efeito positivo no rendimento do atleta em contexto de jogo reduzido devido ao facto de ser um fator psicológico que influencia o rendimento desportivo segundo Guicciardi, Fadda & Delitala (2016).

Neste sentido, as hipóteses deste estudo são: Hipótese 1- Um programa de treino no 360s para a habilidade motora do passe melhora os níveis de autoeficácia desse atleta para essa habilidade. Hipótese 2- Existe uma melhoria na percentagem de passes realizados com sucesso em contexto de jogo reduzido depois da aplicação deste programa de treino.

Na Hipótese 1, esperamos que os atletas sujeitos ao programa de treino no simulador melhorem os resultados nos questionários de autoeficácia especifica para a habilidade do passe. Relativamente à Hipótese 2, esperamos que os atletas sujeitos ao programa de treino obtenham melhorias na percentagem de passes realizados com sucesso em contexto de jogo reduzido.

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4.2. Método

4.2.1. Amostra

Para a realização deste estudo iniciámos com 30 atletas, mas, devido a lesões e outros impedimentos, apenas 25 participantes do sexo masculino terminaram o programa de treino e realizaram o pré e pós-teste sendo que, desses 25 jogadores, 14 são atletas sub-13 (nascidos no ano de 2004) e 11 são atletas sub-14 (nascidos no ano de 2003) com 7,92 (± 1,44) anos de prática e inseridos em equipas federadas de futebol.

Os 30 participantes que iniciaram o estudo, compõem o grupo experimental e este será dividido em três subgrupos de 10 indivíduos onde cada um desses subgrupos será sujeito ao mesmo programa de treino no simulador, mas, em diferentes momentos. No processo de seleção dos grupos, os treinadores das respetivas equipas selecionaram os grupos de acordo com a disponibilidade dos atletas para a realização dos treinos. As equipas dos jogos reduzidos também foram selecionadas pelos treinadores para que a qualidade das mesmas fosse semelhante.

4.2.2. Design e Procedimentos

Depois da constituição dos três subgrupos, será aplicado um préteste que consiste na aplicação de um questionário sobre a autoeficácia específica para o passe e na realização de três jogos reduzidos de Gr+4x4+Gr (espaço de 34,8m x 28,5m) com 10 minutos de tempo útil de jogo com o objetivo de medir a percentagem de passes realizados com sucesso, o nº de toques na bola, o nº de posses de bola e o tempo com bola.

Depois da realização do préteste em cada subgrupo, os indivíduos serão sujeitos a um treino de 60 minutos por semana durante 4 semanas no simulador 360s sendo que os exercícios serão realizados por 5 indivíduos em simultâneo em regime de cooperação, logo, o resultado é atribuído ao grupo e não ao indivíduo. Estes treinos serão planeados e conduzidos com o objetivo de solicitar a habilidade motora do passe associada a decisões que podem acontecer em contexto de jogo. Os atletas sujeitos a este programa de treino serão informados da sua prestação depois de cada exercício.

Depois de 4 semanas de intervenção, todos os participantes serão sujeitos a um pós teste que consiste na aplicação do mesmo questionário aplicado no préteste e na análise de mais três jogos reduzidos nas mesmas condições e com os mesmos objetivos que os jogos realizados no préteste.

54 Este procedimento foi o mesmo para todo o grupo experimental, mas, a data de

início e de término das intervenções em cada subgrupo de 10 jogadores foram diferentes. Devido a constrangimentos no que diz respeito à disponibilidade dos jogadores, não conseguimos com que as 6 semanas correspondentes à aplicação do préteste, aos 4 treinos na 360s e à aplicação do pós-teste fossem consecutivas.

4.2.3. Variáveis

A variável independente desta investigação será a realização ou não do programa de treino no simulador 360s visto que os grupos servirão de controlo de si mesmos, ou seja, o préteste será comparado com o pós-teste para verificar se existiram alterações tanto na autoeficácia para a habilidade do passe como na percentagem de passes bem- sucedidos em contexto de jogo reduzido com o objetivo de perceber o efeito do programa de treino nestas duas variáveis.

Dito isto, as variáveis dependentes serão a autoeficácia para a habilidade do passe e os 4 fatores que a compõem (Habilidades técnico-táticas, Controlo das emoções, Comunicação e Motivação para a prática), a percentagem de passes realizados com sucesso, o nº de toques na bola por posse e o tempo com bola por posse.

4.2.4. Instrumentos

Para medir a autoeficácia na habilidade motora do passe, utilizaremos um questionário específico para esta habilidade baseado no questionário V-MSES (Voleibol

Multidimensional Self-Efficacy Scale) desenvolvido por Guicciardi, Fadda e Delitala (2016)

para a modalidade de Voleibol. A elaboração deste questionário tem por base o pressuposto de que a autoeficácia especifica para uma habilidade relaciona-se mais com o rendimento que a autoeficácia geral para a modalidade porque, neste último caso, não se sabe o que está a ser medido em concreto (Guicciardi et al.,2016). Por esta razão escolhemos este questionário como base e realizámos uma tradução e adaptação por peritagem para que o questionário fosse específico para o futebol e para a habilidade do passe em concreto. O questionário aplicado está disponível em anexo e tem 3 itens diferentes do questionário original. Estes itens diziam respeito ao fator das habilidades técnico-táticas (o questionário original é composto por 4 fatores) e estavam relacionados com o voleibol, logo, pretendemos adaptá-lo para a habilidade do passe no futebol com três itens específicos para esta habilidade (4- Consigo utilizar o passe curto para criar

55 problemas à equipa adversária; 5- Erro poucos passes curtos no jogo; 8- Consigo realizar

o passe curto com a direção e força adequada a cada situação). As respostas para cada item são respondidas numa escala de Likert de 5 pontos (1=não confiante até 5=completamente confiante). (Anexo A)

Para medir as variáveis dependentes como a percentagem de passes realizados com sucesso, o nº de toques na bola, o nº de posses de bola e o tempo com bola utilizámos as gravações de vídeo de todos os jogos reduzidos sendo que um passe é considerado como bem-sucedido sempre que é recebido em condições de continuar a jogada pelo colega de equipa.

4.2.5. Recolha de Dados e Análise Estatística

Depois da aplicação dos instrumentos, os dados foram recolhidos para uma base de dados no software IBM SPSS Statistics Version 22 em que foram registados os resultados dos questionários de autoeficácia geral e para os 4 fatores, os resultados gerais do questionário, a percentagem de passes curtos realizados com sucesso, o nº de toques na bola, o nº de posses de bola e o tempo com bola tanto no préteste como no pósteste.

De seguida, serão calculadas medidas de estatística descritiva da amostra e realizados os testes às hipóteses através do teste t para amostras emparelhadas e do teste de Wilcoxon.

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