• Nenhum resultado encontrado

Capítulo II – Problemática e Metodologia

1. Investigação Existente

Dos diversos estudos existentes no Instituto de Educação da Universidade de Lisboa, selecionamos alguns que considerámos relevantes tendo em conta os temas e problemáticas desenvolvidas, a saber: perfil do reitor; modelos de gestão e lógicas de ação; processos de tomada de decisão e gestão de conflitos. Destes, a maioria reflete acerca da figura do gestor escolar, da relação deste com os diversos atores educativos ou do seu percurso profissional versus formação e experiência profissional. São trabalhos predominantemente de natureza qualitativa, assentes em histórias de vida e estudos de caso, que procuram retratar a realidade vivida no contexto educativo.

Com exceção da tese de doutoramento de Barroso, todos os restantes trabalhos desenvolvem a sua análise no período posterior à revolução de Abril, sendo a maioria investigações recentes, realizadas na última década. Contudo, tendo em conta as temáticas que desenvolvem e a pertinência das mesmas no contexto da elaboração do presente trabalho, considerámos importante a sua referência.

Na sua dissertação de doutoramento, intitulada Os Liceus, Organização

Pedagógica e Administração (1836-1960), Barroso (1995), segue uma perspetiva

histórica e organizacional, com base numa metodologia de tipo indutivo, qualitativa, assente na análise documental. Toma como objeto de investigação as “estruturas

formais” que regulam a administração e organização pedagógica do liceu entre 1836 e

1960. A análise das estruturas formais é realizada a três níveis: organização pedagógica do liceu e seus antecedentes, a administração do liceu e sua evolução legal e as práticas

dos reitores. O trabalho divide-se em duas partes: na primeira procura analisar as estruturas formais que regulam a administração e organização pedagógica do liceu, através do quadro legal e da imprensa pedagógica existente no período entre 1836 e 1947, e, na segunda, recorre a 546 relatórios de reitores, elaborados entre 1935 e 1960, onde visa a política educativa do Estado Novo e a organização do liceu tendo em conta três dimensões: institucional, organizacional e pessoal.

Na conclusão do seu trabalho, salientamos os seguintes aspetos: a existência de quatro “polos de influência” que definem a produção normativa orientadora da organização e administração do liceu em Portugal. Esses polos - político, administrativo, pedagógico e profissional – exercem uma influência diferenciada ao longo do tempo (1836-1947), mediante vários fatores como as transformações que ocorrem no interior desses polos, quer de um reequilíbrio de forças entre influências exercidas a partir de cada um deles, com a substituição de umas dominantes por outras. O autor aponta ainda para a existência de quatro concordâncias dominantes na relação destes quatro polos e que podem ocorrer na elaboração de determinados diplomas. Essas concordâncias reforçam determinadas características formais e podem ser designadas por: burocrática, corporativa, prática e axiológica. Assim, a construção do quadro normativo resulta da oposição das dicotomias “burocrático – pedagógico”, “administrativo – profissional”, “orgânico - mecânico”, burocracia mecanicista – burocracia profissional”.

Na segunda parte, conclui que existem diferentes papéis desempenhados pelo reitor – profissional e administrativo – e que a importância atribuída a cada um deles é diferente. O processo de burocratização do ensino liceal leva a que a dimensão administrativa seja valorizada em prejuízo da direção pedagógica e educativa. Independentemente disso, os relatórios apontam para a preocupação dos reitores em darem uma imagem da sua ação como “líderes”, construída com base numa visão pedagógica e educativa, onde a disciplina e a ordem são apontadas como fatores de “eficiência” e capacidade “na tomada de decisão”. O reitor assume esse papel de “líder” e “tenta comprometer os outros nos valores em que ele próprio acredita”. A análise dos relatórios permite ainda mostrar que os reitores têm dificuldade em integrar de igual modo as duas dimensões e vivem muitas vezes de maneira conflitual este duplo papel de “líder profissional” e “administrador”. A tentativa de ultrapassar esta conflitualidade dá origem a diferentes estratégias que determinam o seu estilo de gestão. Duas dessas

estratégias passam pelo estabelecimento tácito entre reitor e professores na partilha das suas “zonas de influência” e na assunção, por parte do reitor, do papel de “administrador – educador”, exercendo a sua autoridade formal ao serviço de um projeto educativo. Assim, constata-se uma articulação entre o administrativo e o profissional, dependendo esta do perfil de cada reitor, dos estilos de gestão e processos de liderança, existindo uma prevalência do reitor como administrativo e profissional.

Na dissertação de mestrado de Dinis (1997), intitulada Presidente do Conselho

Diretivo: o profissional como administrador – escolas do 2º/3º ciclos do ensino básico – dois estudos de caso, a questão central da investigação é: como é que os presidentes

dos conselhos diretivos fazem a gestão de papéis antagónicos associados à dupla condição de profissionais e de administradores? Os seus principais objetivos são identificar, descrever e compreender os modelos de gestão implementados nas escolas pelos presidentes dos conselhos diretivos que abarcam o duplo papel de administradores e profissionais. Encontramos uma metodologia construída com base na análise documental, na observação não participante e participante e em entrevistas. Pretende-se averiguar como é que o gestor desempenha o seu cargo de modo a identificar a dimensão que tem um papel mais relevante: se a de administrador ou a de docente. Apresenta como conclusão principal a existência de uma «bipolaridade administrativa

versus pedagógica».

A dissertação de mestrado de Pina (2001), subordinada ao tema Sentidos e

Modos de Gestão, tem como principal objetivo a interpretação de processos de tomada

de decisão pelo gestor escolar, entendidos numa perspetiva interativa e como situações particularmente ricas na produção de sentido e na revelação de micro-políticas de escola. O trabalho segue uma abordagem cultural e política das organizações escolares e é desenvolvido com base em duas linhas interrogativas: uma primeira, centrada nos modos de decisão, e uma segunda vocacionada para questões associadas aos significados atribuídos pelos atores à sua ação/decisão. A dissertação é centrada em três professores, membros de uma mesma equipa de gestão, e construída com base em um conjunto de narrativas do quotidiano que possibilitaram a realização de entrevistas de aprofundamento. Este estudo permite concluir que, entre os vários atores educativos, existem diversos sentidos para a gestão escolar e para a escola; que, não obstante a multiplicidade de referentes mobilizados pelos gestores escolares, há um sentido estratégico na ação de gestão dos mesmos, baseado numa autonomia e racionalidades

limitadas; que existe um conjunto de ideias comuns aos três atores, construídas com base numa visão da escola como um universo micro-político, onde existem interesses e expectativas diversas; que a forma de decisão passa pelo contexto da situação, pelos sujeitos envolvidos, o conjunto de significados perante os quais se desenvolve uma racionalidade a posteriori legitimadora da ação.

A dissertação de mestrado de Carvalheiro (2004), intitulada A Especificidade da

Gestão Escolar em Portugal na Memória de Três Gestores Escolares, tem como

principal objetivo conhecer, interpretar e explicar as narrativas da vida profissional de três gestores escolares e, desse modo, clarificar o papel do gestor escolar em Portugal nas últimas décadas, tendo em conta o percurso e a identidade profissional de cada um. Com base nas narrativas de vida dos gestores escolares, encontramos três dimensões que os caracterizam: o gestor enquanto ator social, personagem e informador dum grupo social a que pertence. O objeto do estudo é definido através das dimensões enunciadas e construído mediante a biografia profissional de cada gestor, onde as narrativas de vida desvelam as memórias de cada um. Segue uma metodologia qualitativa, edificada em três estudos de caso. O presente estudo não permitiu à autora tecer uma conclusão com base numa generalização, mas sim apresentar as diversas posições dos vários atores perante os pontos analisados. De salientar, contudo, algumas características comuns em relação às competências adquiridas pelos gestores: ausência de formação para o cargo; a valorização da experiência e de um bom ambiente de trabalho entre os professores. No que pensam da escola e da relação entre os vários atores educativos, salientam a interação de vontades como primazia no desenvolvimento organizacional; apenas reconhecem aos professores o estatuto de parceiros nas decisões; olham a escola como uma organização construída como base em valores éticos e pedagógicos, não podendo esta ser confundida com uma empresa; valorizam uma cultura democrática dentro da escola e uma proximidade dos pares; reforçam a importância da identidade de “dois em um”: profissional e administrador, a necessidade de articular de modo dinâmico o papel de representante do Estado e o representante dos professores.

A dissertação de mestrado de Alves (2005), subordinada ao tema A Trajetória

Profissional de Três Gestores Escolares, tem como objetivo reconstruir as memórias

dos gestores escolares, pondo em evidência os saberes e práticas desenvolvidas no exercício das suas funções. Tem como objeto de estudo a biografia profissional de três gestores escolares que, através das suas narrativas de vida, relatam a sua experiência de

dez anos no exercício de funções. Para a concretização do estudo, segue por uma metodologia de investigação qualitativa, assente numa estratégia de recolha de dados enquadrada nas histórias de vida. Procede à análise de conteúdo das entrevistas e da interpretação dos resultados, permitindo à autora concluir que cada estilo de gestão escolar é construído em função do contexto e que os gestores adquirem saberes específicos na área da administração e da liderança escolar através da auto-formação.

A dissertação de mestrado de Jesus (2005), Memórias dos Gestores Escolares, parte da narrativa de três gestores escolares e procura compreender o que é ser gestor escolar em Portugal num estabelecimento de ensino não superior. O trabalho é de natureza qualitativa, naturalista, indutiva e com recurso a entrevistas. As conclusões apontam para a valorização da experiência profissional e das relações estabelecidas com os diversos atores educativos como fatores importantes para o desempenho do cargo de gestor escolar. A autora considera ainda que a interação estabelecida no contexto educativo traduz uma oportunidade de crescimento pessoal e profissional.

A dissertação de mestrado de Batista (2008), intitulada O Gestor Escolar como

Administrador de Conflitos, considera a organização escolar como uma entidade

formada por indivíduos e grupos detentores de interesses e objetivos diferentes. Partindo desta premissa, a autora procura fazer uma reflexão crítica sobre as relações que encontramos entre as perceções e as ações. O objeto de estudo centra-se na forma como uma gestora de um estabelecimento de ensino não superior gere os conflitos. O estudo é construído com base numa metodologia de investigação qualitativa, onde a recolha de dados resulta do recurso à entrevista (exploratória, semi-estruturada e de recolha de narrativas). Através da análise de conteúdo, a autora conclui que a gestora vai gerindo os conflitos em função da situação concreta e dos objetivos que pretende atingir. O método de intervenção adotado varia em função das causas percebidas ou atribuídas da ocorrência, dos atores envolvidos, do contexto, e da reação do gestor a um determinado conflito sendo marcada pela utilização de combinações de estilos de gestão diferentes. Através de uma reflexão conjunta, a autora devolve à gestora um conjunto de indicadores no sentido desta melhorar a sua eficácia no que respeita à gestão de conflitos.

A dissertação de Santos (2009), subordinada ao tema O Gestor Escolar Segundo

a Inspeção-Geral da Educação, teve como principal objetivo o de caracterizar as

representações presentes no discurso institucional da Inspeção-Geral da Educação sobre o gestor escolar, no contexto do Regime de Autonomia, Administração e Gestão Escolar, regulamentado pelo decreto lei 115-A/98, de 4 de Maio. O autor procura clarificar as diversas visões existentes acerca da figura do gestor escolar, à luz dos vários paradigmas e modelos existentes. O estudo é de natureza naturalista, descritivo, de carácter extensivo, suportado pela técnica da análise documental. Os dados obtidos permitem concluir que a retórica institucional da Inspeção-Geral da Educação não apresenta uma representação única, um perfil linear, do papel do gestor escolar. Verifica a existência de diferentes lógicas de ação sobre a imagem do gestor escolar, assentes numa representação tripartida de Administrador/Profissional/Gestor, que não permite clarificar o papel do chefe executivo.

A dissertação de mestrado de Matos (2005), intitulada Lógicas de Ação

Estratégias de Exercício do Poder nas Escolas: Memórias de Gestores Escolares, tem

como principal objetivo a reconstrução das biografias pessoais e profissionais de três Presidentes de Conselho Diretivo/Executivo, com prolongada experiência de exercício de funções. O estudo apresenta o olhar de vários gestores em relação às suas funções, às políticas educativas, aos seus modos e lógicas de ação, à sua ação gestionária e aos modos de articulação da vida pessoal e profissional. Os vários elementos recolhidos permitem ao autor esboçar um quadro do que é ser-se gestor escolar em Portugal, no decurso do último quartel do século XX. O trabalho segue uma análise qualitativa de tipo naturalista, construída com base em narrativas de vida, onde a recolha de dados resulta do recurso ao inquérito por entrevista. Das conclusões destacamos: a importância atribuída pelos gestores à inovação, primordialmente desenvolvida em torno do domínio pedagógico e educativo; a valorização de uma atitude interventiva capaz de fomentar um bom clima relacional, “equilibrada”, com a firmeza necessária para prevenir anomalias; a valorização da “prática” como fator determinante para o sucesso da atividade de um administrador; um certo desencanto em relação à eficácia das políticas educativas e incapacidade de envolver os atores educativos nas pretensas estratégias de mudança; independentemente do controlo exercido pela Administração Educativa existe espaço de liberdade para que os atores educativos possam produzir a diferença; o

impacto negativo que o desempenho de cargos de gestão tem na vida familiar e pessoal de quem os exerce.

Os trabalhos enunciados apresentam diversas imagens, representações, conceções dos gestores escolares. Estas figuras são desenhadas mediante diferentes objetivos e contextos educativos onde essencialmente se procura compreender o papel do gestor nas suas relações com os restantes atores educativos, ao nível social, no modo como concebe ou foi desenvolvendo a sua formação profissional, nos diferentes papéis que desempenha, seja como administrador ou profissional. Muitas das histórias de vida relatam a experiência pessoal, que foi sendo construída ao longo do percurso profissional, onde cada um foi desenvolvendo a sua ideia/conceção de organização educativa, da função que lhe cabe como gestor, mas também enquanto educador. É de salientar que muitas das preocupações enunciadas por esses gestores prendem-se com problemas já apontados no período a que este estudo remonta, a saber: distribuição dos espaços, falta de recursos, disciplina, desempenho de alunos e professores, relações entre os vários elementos da comunidade educativa, relações com a família e com a tutela, entre outros fatores. Assim, a breve análise dos trabalhos referenciados permitiu- nos compreender melhor a realidade atual e as suas relações com o passado, bem como procuramos neles encontrar contributos de modo a definir o nosso campo de estudo e selecionar o modelo de análise.