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Neste tipo de isolamento, são utilizadas as barreiras de proteção, que reduzem o risco de exposição, tanto da pele como das membranas mucosas do profissional da saúde com material infectante Como exemplos de

Explorando a associação de motivos condicionantes do acidente de trabalho na perspectiva da reflexão coletiva

38 Neste tipo de isolamento, são utilizadas as barreiras de proteção, que reduzem o risco de exposição, tanto da pele como das membranas mucosas do profissional da saúde com material infectante Como exemplos de

porém, nenhum deles os utiliza, alegando serem grandes, desconfortáveis etc., apesar de concordarem com a necessidade pelo ruído “ensurdecedor”.

Os EPI, além de existirem como exigência legal, devem ser encarados como necessários na e para a qualidade de vida do sujeito no trabalho. Para isto, devem ser adequados ao trabalhador e ao fim ao qual se destinam.

Em Costa (1991), encontra-se uma reflexão que vem corroborar com tal assertiva. Diz que os EPI, quando não construídos de acordo com as características do trabalhador ou de seu local de trabalho, podem transformar-se em fonte de problema para o trabalhador, ao invés de protegê-lo.

Os entrevistados relatam que a inadequação dos EPLao uso. é uma das causas que podem conduzir a acidentes. É extremamente difícil - e isto a prática mostra - trabalhar com EPI inadequados em quantidade e qualidade, o que pode até mesmo inviabilizar a realização de determinados procedimentos. Se, no momento da execução do procedimento, o EPI oferece dificuldade, ao invés de proteção, como o exemplo da luva com numeração maior, já não se tem prevenção e, sim, maior possibilidade de acidentes:

“Quantas vezes já transfixei luvas. Nos meus dedos não foi, mas luva já fo i transfixada horrores de vezes, pelo tamanho. Fica nos dedos sobrando, fica mau, grande, perde a sensibilidade. (...) Já várias vezes fiquei com o ‘abocath ’fincado nas luvas. ”(T1)

Quando não apropriados, dificultam a ação propriamente dita do trabalhador e causam estresse, insegurança, predispondo ao não uso ou ao questionamento sobre a validade do uso, pela falta de credibilidade nos mesmos.

Confirma-se esta reflexão com as palavras de Costa (1981, p. 113), quando refere-se aos EPI: “(...) os equipamentos são constantementes deixados de lado, assim como certas precauções, pois podem tomar o trabalho mais difícil ou até impedi-lo.(...) E isso quando o próprio equipamento, que não foi

projetado para ser usado pelo operario, segundo suas características físicas, não se tomarem em fontes de acidentes”.

A adequação e reflexão sobre o uso são indispensáveis para que não se transformem em mais um elemento de risco no processo de trabalho.

Como uma forma de justificar o não uso dos EPI, cuja causa primeira já foi apontada: não compreensão da situação de risco, surgem dificuldades, a saber: não dá tempo de ir buscar a luva no armário, tem coisas que dá para fazer sem luva. Outros motivos surgem ainda, como a falta de costume, a perda ou diminuição da sensibilidade para punção venosa, negligência, entre outros:

“Negligência, descuido mesmo. (...) Antes eu não usava, mas agora eu comecei a usar até nos curativos. Eu comecei a usar mesmo, porque tem que se cuidar. Mas até a pessoa tomar

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consciência, a negligência é muita: não precisai E aquela coisa

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toda. E que nem comigo, até eu tomar consciência que eu tinha que fazer... Não vou te dizer que sempre eu uso. Geralmente eu uso para curativo, algumas punções, não são todas, porque, às vezes, é urgente e não dá tempo. Mas quando eu vejo, olho o paciente, eu calço a luva. Porque a gente nunca sabe! ” (T4)

A negligência , como um comportamento individual que conduz a acidentes, realmente se mostra no cotidiano dos trabalhadores e repercute na totalidade do trabalho, podendo causar acidentes em quem apresenta tal comportamento como em outros trabalhadores da equipe.

Provavelmente, essas atitudes decorram da ausência de compromisso de cada trabalhador com o conjunto do trabalho. Essa ausência pode ter origem na forma organizativa, que não propõe a participação, fragmentando o trabalho cada vez mais, como na falta de motivação, de envolvimento do trabalhador.

Na lógica do encadeamento de ações, que compõem a organização do

trabalho, a negligência é, também, um aspecto coletivo deste trabalho e, como tal, deve ser explorado.

Independente da origem, é imprescindível que tais atitudes sejam discutidas com os próprios trabalhadores, buscando-se, através da reflexão, perceber como podem ser modificadas para que não se criem possibilidades de acidentes, baseadas em comportamentos individuais ou coletivos, mas que estes sejam resultado de investimentos coletivos na prevenção.

Do depoimento do T4, ressalta-se ainda o fato de que são selecionados certos cuidados na assistência ao paciente, para os quais o uso da luva é necessário. Esta seleção não deveria existir, pois todos os procedimentos, - envolvendo sangue e/ou fluidos corporais, deveriam, pela simples existência, suscitar a proteção de si, através da biossegurança. Porém, se houvesse um projeto de trabalho que focalizasse as ações de prevenção das situações de risco e acidentes de trabalho envolvendo sangue e/ou fluidos corporais, as dificuldades seriam coletivamente resolvidas e individualmente aplicadas. O uso da luva seria, assim, internalizado no trabalhador^ como uma necessidade para a produção de sua saúde.

No entanto, as medidas de biossegurança não estão incorporadas na organização do trabalho nem no trabalhador. Existe a necessidade de que tais medidas sejam adotadas para todo e qualquer procedimento, envolvendo sangue /ou fluidos corporais, para com todo paciente/cliente. Entretanto, não existe a exigência institucional de sua aplicação, o que conduz da normatização à ação. Não existindo esta exigência, que vai além da vontade e da ação individual, pois é uma necessidade vital para a proteção do trabalhador, enquanto componente do processo de trabalho, predomina a ação individual, que conduz, inevitavelmente, a uma lógica de trabalho coletivo, condicionada por estas ações individuais, ou seja, cada trabalhador resolve a sua proteção, independente da resolução dos outros, ou de medidas institucionalmente preconizadas.

Um dos trabalhadores, que participou do grupo de reflexão-ação na disciplina de Prática Assistencial, verbalizou não usar luvas para realização de punção venosa nos doentes de AIDS. Este mesmo trabalhador ressalta que, mais preocupante do que a existência das situações de risco, é a conduta dos trabalhadores nessas situações, cuja manifestação nem sempre é através de ações de proteção. Apesar da existência dessas “condutas de risco”, não existe uma exigência institucional, que incida sobre os trabalhadores, como uma forma de levá-los a refletir sobre tais condutas e modificá-las.

A exigência institucional se faz necessária, pois o conhecimento existente não está sendo aplicado no cotidiano de trabalho; não está, como mencionado, internalizado nos trabalhadores, a ponto de produzir ações de proteção. Se assim estivesse, a exigência institucional existiria para manter a lógica de produção da saúde, sem necessidade de punições ou cobranças, como muitas vezes é feito, mas sim, de controle.

Sobre os conhecimentos, que não são aplicados na prática, Goelzer (1998), participante do Congresso do Prevensul (evento ocorrido no ano de 1997), cujo tema internacional foi “Perspectivas Internacionais de Segurança, Higiene e Saúde no Trabalho”, diz que “Os conhecimentos são imensos, tanto quanto aos riscos, quanto às formas de prevenção.(...) existe um espaço muito grande entre o conhecimento e a aplicação. Parece simples, mas não é. Para dar esse passo, é preciso vencer uma série de obstáculos, que muitas vezes não são fáceis” (Revista Proteção, 1998, p.46).

O cotidiano de trabalho absorve por demais o trabalhador da saúde, não só pelo aspecto da quantificação de suas ações, como também pela proximidade com a dor, o sofrimento, a doença, a morte, sentimentos que desgastam o trabalhador quando no seu desempenho prático, afastando-o das possibilidades de mudanças. Apesar dos obstáculos, é preciso que exista a intenção de querer mudar.

O fazer dos trabalhadores tem que ser, mais do que nunca, voltado à proteção de si e do outro trabalhador da saúde. Com o crescente número de casos de pacientes acometidos com doenças infecto-contagiosas40, entre elas a AIDS, é imperativo que, coletivamente, sejam refletidos os casos de acidentes e a existência das situações de risco, visando à modificação coletiva das ações produtoras do acidente. Esta modificação inverteria a origem da lógica, que se tem hoje na organização do trabalho, ou seja, as ações coletivas, então originárias das ações individuais, passariam a ser a mola propulsora dessas, até mesmo das ações individuais mais “resistentes”, fazendo com que o movimento dessa organização produzisse a saúde do trabalhador.

O conhecimento que o trabalhador possui, que é anterior às suas ações, ou que vai se construindo na própria realização da ação, deve ser aplicado, ou seja, deve ser produzido e reproduzido nas ações de trabalho, transformando e

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sendo transformado no próprio processo de trabalho. E este saber tecnológico, que pode transformar, visto integrar o conhecimento, a prática e a reflexão crítica. A produção deste novo conhecimento se reproduz em outros trabalhadores, conferindo ao processo de trabalho um movimento transformador.

A importância deste saber tecnológico está, entre outros fatores, no comprometimento, no envolvimento maior do trabalhador com o processo de trabalho.

O saber tecnológico confere ao trabalhador um “poder” dentro da organização do trabalho, não revestido de “mando”, mas um poder que, fundamentado no saber, possibilita a crítica, que leva à transformação. É um poder embasado na conquista de seu papel de trabalhador e de seu espaço no

40 As taxas de infecção ocupacional com HIV e com o vírus da hepatite B, apresentados na justificativa deste

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