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O Cristo é o nosso Mestre, onde quer que estejamos, na face da Terra ou na sua grandiosa atmosfera.

Esse vagão cósmico viaja pelo espaço juntamente com o cortejo solar, e constitui uma das inúmeras escolas do infinito que pulsa no coração de Deus.

Fechei o capítulo anterior resmungando por dentro, ansioso em saber de certas coisas que a vida apresenta como segredo.

O dia mostrou sua claridade, cheio de afazeres. Era de se notar na nossa colônia de trabalho, a multidão de companheiros chegando e saindo, como se não registrasse o tempo e se esquecesse do espaço. Muitos de nós, neste estágio de vida, ainda carecemos de descanso para refazermos as energias gastas na labuta que abraçamos por amor, como sendo para nós, meios de ganhar o dinheiro divino da paz de consciência.

Há gente que olha a Terra com tristeza, porque somente observa o inferno que nela ainda existe, esquecendo-se de analisar as nesgas dos céus espraiadas por toda parte. Quem tem o mal por dentro, só enxerga o mal exterior. O planeta que habitamos por misericórdia de Deus está se transformando pela força do progresso espiritual, pois ele é arrastado por esta força de Deus que circula por toda a criação e comanda todos os entendimentos.

A Terra é uma lavoura que o saber nos confiou para o bom plantio e a caridade se revela nas mãos dos anjos que nos ajudam na semeadura, dependendo da nossa disposição. Temos liberdade em plantar, mas não em colher; a colheita é conforme o que semeamos no solo da vida. Do ato de plantar surge a justiça de receber.

Ao escrever estas páginas, lembro-me vivamente de um grande poeta brasileiro, nascido num engenho de açúcar da Paraíba. Fui visitar um velho companheiro em Leopoldina, e este, quando lá cheguei, estava folheando os seus alfarrábios, quando pôs as mãos em um exemplar da Gazeta de Leopoldina, datada de 18 de agosto de 1914, ano do início da Primeira Grande Guerra mundial e nela vimos estampada uma poesia do grande mestre da rima, e que falava sobre a virtude mais respeitada na Terra e no Céu:

CARIDADE No universo caridade Em contraste ao vício infando É como um astro brilhando Sobre a dor da humanidade.

Nos mais sombrios horrores Por entre a mágoa nefasta A caridade se arrasta Toda coberta de flores!

Semeadora de carinhos Ela abre todas as portas E no horror das horas mortas Vem beijar os pobrezinhos.

Torna as tormentas mais calmas Ouve o soluço do mundo E dentro do amor profundo Abrange todas as almas. O céu de estrelas se veste Em fluido de misticismo Vibra no nosso organismo Um sentimento celeste.

A alegria mais acesa Nossas cabeças invade Glória, pois, à caridade No seio da natureza

Pensamos, falamos e escrevemos que Jesus é o nosso Mestre, porque Ele nos ensinou a caridade na sua feição mais pura. Antes d'Ele, éramos iludidos com sentimentos egoístas e excessos de amor próprio.

A caridade iluminada, aquela que não exige, que não se troca nem se vende, a caridade que é feita por amor, foi o Cristo quem a viveu na sua mais alta expressão!

*

Minha cabeça girava em um turbilhão de perguntas, surgidas dos fatos narrados no capítulo anterior. Como eu não consigo ficar muito tempo com a mente conturbada e ansiosa por esclarecer determinados pontos, vamos colocar a luz sobre a mesa, para que a razão se aquiete com a Verdade.

Miramez aproximou-se, e eu já o cumprimentei desfechando-lhe perguntas: — Deves ter percebido a inquietação da minha mente, resultante dos acontecimentos de ontem à noite, cujas particularidades deixaram-me confuso. Primeiramente, se me permites, gostaria de saber qual é a força usada pela nossa irmã Kahena, ao estender as mãos diante das árvores e colher delas as substâncias usadas como medicamento para os enfermos. Já experimentei, imitando-lhe os gestos, pedindo ajuda aos vegetais, mas nada consegui. Qual é a diferença entre o meu pedido e o dela?

— Lancellin, o que é preciso a um aluno de engenharia, do primeiro ano, para assentar-se diante de uma prancheta de desenho do seu mestre, e traçar um importante edifício, com todos os detalhes e com toda a segurança? O projetista deve ter a capacidade que o engenhoso serviço requer. Isso é válido para o astrônomo, o médico, o economista, enfim, para o profissional em geral. Assim, no tocante às coisas do espírito, ninguém passa a saber, apenas porque viu os outros fazerem. Kahena dedicou muitas vidas a essa arte de se comunicar com a vida vegetal e animal e, por vezes, a mineral. Agora, ela estuda na universidade da vida, como se comunicar com os homens, aprofundando-se nos seus desejos e reações, coisa bem mais difícil, porque requer muito amor, aquele amor que se confunde com a justiça, pleno de equilíbrio espiritual. Para

aumentar a nossa esperança, Jesus nos ensina: Pedi e obtereis. E nós acrescentamos àqueles que pedem: Aprendei como convém pedir.

Antes que o nosso instrutor terminasse a resposta, eu já estava com outra pergunta na ponta da língua:

— Fiquei muito intrigado com aqueles seres que vieram ter conosco diante daquela árvore, pelo chamado de Kahena. Eles vos festejaram com tanta alegria, mostraram-se desconfiados comigo. Quem são eles e por que procederam assim?

— Meu companheiro, a obra de Deus é cheia de segredos, aos quais vamos tendo acesso à medida que evoluímos. Assim como todos nós, já passaste por vários estágios, ocupando lugares diferentes na criação; no entanto, a escola é a mesma. No futuro, aqueles seres irão ocupar o lugar que tu desfrutas hoje. Somente o tempo tem o segredo desse avanço. Aquelas pequeninas criaturas evoluem e prestam um grande serviço à natureza. Eles agitam, de vez em quando, a seiva das árvores e conhecem a natureza das mesmas na sua profundidade, mas obedecem a um ser maior, como se fosse um deus para eles, tanto que, quando eles admiram qualquer peça que usamos e desejam usá-la, podemos notar que eles desaparecem e, daí a instantes, ressurgem usando o objeto almejado. É que eles vão ao Espírito-deus, e ele cria uma réplica perfeita para eles. São crianças espirituais que querem para si quase tudo o que veem. Para que possas ser amigo deles, não basta apenas olhar, nem pedir ou ter Espírito de domínio; tens que ir ao Espírito-deus, que os comanda, para que ele promova a ligação afetiva entre ti e aqueles irmãozinhos, por meios que ainda desconhecemos. Para que possas vê- lo, é necessário subir até a sétima frequência. Tudo o mais, aprenderás com a prática.

Fiquei pensativo. A resposta de Miramez ativara-me uma curiosidade ainda maior, acerca dos minúsculos seres da natureza. Logo insisti em nova pergunta:

— O Espírito-deus desses seres é somente um?

— Não, Lancellin. Nesse imenso campo da vida, há muitas divisões, nas quais a ordem e a disciplina são muito maiores do que pensas, mais ainda do que entre os homens.

— Eles têm necessidade disso para evoluir, ou têm esse trabalho que ora fazem, como sendo um divertimento?

— Como não? E são seres que habitam corpos fluídicos, se bem observaste. Destaque-se, ainda, a facilidade com que entram nas árvores, deslizam por entre as correntes vitais que sustentam as mesmas e impulsionam as seivas em todas as direções. Alguns são hábeis colhedores de plasma vegetal, e sabem envolvê-lo em camadas de energias para que não se dispersem ao contato com a atmosfera e a luz. Eles aprendem tudo isso com o Espírito-deus, que é uma inteligência lúcida, mestre em várias artes, nessa profunda ciência do conhecimento do reino vegetal.

— O senhor poderia nos dizer algo acerca das rosas, particularmente daquela, tão obediente à mão estendida de Kahena, que ela se encheu de fluidos perfumados, cuja delicadeza sugeria a presença de uma dama da mais alta linhagem a nos festejar?

— No campo das rosas, Lancellin, e, certamente, das flores em geral, a história é outra; no entanto, o fundo é o mesmo. São rios que correm para o mar da evolução. Às criaturas que nós citamos primeiro, é dado o nome de Gnomos; no segundo caso, são as fadinhas, com outra linha de evolução, que depois se encontram, como os que ora se

encontram no mundo, na composição dos lares na forma de homens e mulheres. Todos nós já estivemos na posição em que aquelas se encontram, como Gnomos e Fadas. Alguns detalhes ficarão sem explicação, para que possas pensar.

Pela expressão de Celes, notei que ele queria perguntar também, e foi o que ele fez:

— Irmão Miramez, de onde vieram esses seres? Todos gostamos da pergunta.

Miramez respondeu, com leve sorriso nos lábios:

— Vieram de Deus, meu irmão, como nós outros. Passaram por vários caminhos já trilhados por nós, e vão seguir pelos mesmos roteiros que seguimos em passado longínquo.

Meditou um pouco e continuou:

— Existem, Celes, duas forças poderosas que nos libertam, a nos mostrar o reino da tranquilidade imperturbável; elas são: conhecer e amar, e uma se confunde com a outra, porque ninguém conhece a Verdade sem amá-la, nem a ama sem conhecer.

Daí, eu disse para mim mesmo: "E ninguém conhece e ama sem perguntar". Foi nessa filosofia que se seguiu mais uma pergunta.

— Nós queríamos, se fosse possível, que a nossa companheira Kahena nos dissesse quais são aquelas árvores onde se colheu o plasma vegetal que serviu de medicamento para a nossa irmã de caridade.

Kahena, satisfeita, nos respondeu com sua voz meio rouca, mas de esplendente clareza:

— A primeira que tocamos, podemos dizer que é um famoso tubérculo, de nome Bardana (Lapa Officinalis) e medra nos lugares úmidos e sombrios, como pudeste constatar. O seu valor terapêutico é extraordinário, principalmente pelo equilíbrio dos elementos que a compõem; podemos dar uma pequena amostra da sua importância: a Bardana serve para curar abcessos, afecções da pele, bronquite, catarros do estômago e dos intestinos, cálculos nefríticos, cálculos da bexiga, eólicas nefríticas, eólicas hepáticas, comichão, debilidade do estômago, má digestão, enfermidades cardíacas, gastrites, furunculose, herpes, gota, prisão de ventre, hidropisia, queda de cabelos, reumatismos, tumores e sarna. É muito rica em fósforo. Pelo que se pode notar, é uma verdadeira farmácia, esta planta. Também, quando colocada em mãos de alguém como Kahena, se transmuta em outros valores espirituais, enriquecendo sua força energética para sustentação do equilíbrio bio-orgânico.

Fiquei abismado de conhecer tanta variedade curativa em uma só planta. A natureza, pensei, é uma bênção de Deus à nossa procura, basta que procuremos por ela.

Kahena continuou:

— A outra ciclópica árvore, Lancellin, é o tão conhecido Jatobá (Hyménaea Courbaril), da família das leguminosas-cesalpiniáceas, que encontramos por todo esse imenso Brasil. Ele é adstringente peitoral, vermífugo, remédio salutar para o estômago, combate a cistite, prostatite, blenorragia, disúria, anúria, bronquite, sendo ainda excelente medicamento no tratamento da anemia e da fraqueza geral. A humanidade — acrescentou Kahena — haverá, de dentro em breve, passar a usar os medicamentos naturais. O melhor laboratório do mundo é a nossa mãe natureza, por mostrar profunda

afinidade com os fluidos espirituais, de sorte a nos ajudar na cura de todas as enfermidades.

Não vi o tempo passar, pelo encanto da conversa de Kahena. Queria que ela continuasse, mas Padre Galeno nos interrompeu:

— Vamos tratar de outros assuntos e em outra oportunidade voltaremos aos encantos do reino da natureza, que está sempre em festa.

Poderíamos tomar todo esse capítulo perguntando e ouvindo, mas o nosso trabalho urgia e tínhamos de continuá-lo, apesar da nossa ânsia de saber para melhor amar.

Quando cheguei ao mundo espiritual, aprendi uma coisa muito simples, porém, na sua profundidade, engenhosa. É uma ciência que, quando aprendemos a dominá-la, abre-nos as portas de todo entendimento: é a oração. A prece, em nosso plano de vida e trabalho, é como que o lanche para os encarnados, todas as manhãs. Ela nos reabastece de todas as forças e nos dá uma visão daquilo que vamos fazer. A súplica nos liga com a realidade maior, cuja voz passa a nos comandar, insuflando-nos o ânimo e a alegria. E é nessa onda de força que vamos iniciar o nosso trabalho.

Miramez nos convidou à oração, e ele mesmo tomou a palavra, no recolhimento que esse gesto requer:

Senhor de todos os mundos!

Somos conscientes das nossas necessidades e carentes de amor no coração. Permite que possamos, na Tua graça, despertar no nosso íntimo, a coragem para aceitar os deveres que nos chamam em inúmeros lugares. Que o desânimo em nossos caminhos seja ficção, para nos mostrar o que deve ser feito na pauta do empreendimento maior. Ajuda-nos, Senhor, a conquistar os valores que existem como fragmentos em nossos corações no sentido de que eles cresçam e se avolumem, nos garantindo a paz e restabelecendo em nossa vida a alegria de viver.

Que o Cristo Se faça em nós, como diz Paulo de Tarso, motivo de glória. Aquela glória que fecunda o amor, para se expressar como caridade.

Nós estamos aqui, Jesus, à Tua disposição, e estamos pensando e sentindo a pureza da Tua doutrina de Amor, para que ela penetre em nós como força da vida, libertando-nos da inferioridade que ainda carregamos do passado distante e da qual ainda não conseguimos nos libertar.

Abençoa, Senhor e Mestre, as casas de repouso e de tratamento espiritual, os enfermos que nelas estagiam e aqueles que ainda estão sem rumo.

Abençoa, Senhor Jesus, as colônias espirituais e aqueles, que nelas trabalham em favor dos que sofrem.

Abençoa a Terra, com todas as suas divisões.

Abençoa a Vida, nas vidas que se movimentam em Deus.

Louvamos-Te na expressão do trabalho que nos ergue a conduta, na forma de moral evangélica e nas linhas do bem que nunca morre.

Assim Seja.

Depois da oração, fomos tomados por um ânimo que a palavra e a escrita não têm condições de expressar. Somente quem pode sentir tal efeito, traduz para si mesmo a realidade e os valores que encerra uma prece feita com a participação de todos os recursos da alma.

Mesclada com a oração, foi ouvida uma música suave, que aguçava os nossos ouvidos, para percebermos o palpitar da existência universal.

Saímos planando no espaço, movidos pela força da prece e pelo dever que a caridade estimula. A velocidade não era tão alta quanto eu esperava, e quanto mais avançávamos, mais pesado ficava o ar; era como se nos movêssemos n'água, cuja densidade dificultasse o nosso avanço.

A minha mente formigava de vontade de perguntar o que era aquilo, mas, educação pedia silêncio e emprestava forças para manter um bom comportamento. Passavam por baixo de nós, nuvens e mais nuvens de cores esquisitas, como sendo luz que perdeu o poder de clarear, manifestando vida, porém, de forma inquieta e indesejada. Fomos descendo no meio delas, e Miramez nos pediu para nos concentrarmos no dever, sem vacilar. Entretanto, ao penetrarmos naquele caldo de magnetismo mental inferior, senti, por mais que fizesse força para me controlar, um calafrio em todo o corpo, como sendo uma segunda morte. Quase gritei por nosso benfeitor espiritual, mas reagi. Uma coisa eu garanto aos leitores: se eu estivesse sozinho, não suportaria tal agressão das sombras.

Livramo-nos delas, respirando aliviados, mas, ainda constrangidos. Eu buscava o equilíbrio que tinha, antes de sair para o trabalho.

Descemos mais, em uma noite linda, embora cheia de confusão nas grandes cidades: era o reinado de Momo, que içou a bandeira do seu domínio por três dias, e noites, nos quais os instintos inferiores se agitam na mente e nos atos de todas as criaturas que pulam desenfreadamente nas ruas e nos salões, embriagados pela maneira extravagante de distrair. Mulheres quase nuas e homens que não mediam o comportamento, deixavam extravasar o que realmente vibrava no recôndito de suas consciências. Certamente que era uma alegria coletiva, mas, inflamada pela corrupção.

O carnaval é um saco de frutas deterioradas; no entanto, tem sementes que podem gerar plantas sadias. É o que devemos esperar, com toda confiança nos céus.

Descemos em uma grande capital e penetramos em uma casa simples, em que sobressaía o asseio. A família pertencia à classe média. O irmão encarnado que estava na condição de chefe da família, estava assentado em uma cadeira de balanço, pensando e formulando ideais elevados. Em torno dele via-se com facilidade uma variação de cores, que lhe garantiam os bons sentimentos. Em dado momento, foram entrando quatro filhos, já com idade que não exigia muitos cuidados por parte dos pais. Alegres, como sói acontecer com os jovens, trocavam abraços dentro da maior fraternidade e logo foram falando ao pai sobre a ideia, já deliberada por eles, de pular naquele último dia de carnaval. Já tinham escolhido as fantasias, cujos preços eles traziam para a sua aquiescência, exigindo também o dinheiro para pagar.

O velho ouviu sem perder a serenidade e esboçando um sorriso respeitoso, falou com doçura aos filhos amados:

— Meus filhos, espero de vocês um entendimento melhor. Venho lendo, há alguns meses, obras onde se alicerça a Doutrina Espírita, uma das quais é esta em minhas mãos, que modificou um pouco a minha vida, influindo certamente em meus pensamentos. Eu, como vocês são testemunhas, já gastei muito dinheiro em muitos carnavais. Agora mudei de opinião e o dinheiro que vocês e eu iríamos gastar nestes três dias de loucura, já gastei todo, não com fantasias, mas com a realidade. Mostrarei o que comprei, e estou muito satisfeito porque a consciência aprovou o meu gesto, bem como o

coração. Peço a Deus para que vocês me entendam.

E abrindo a porta de um aposento, mostrou vinte sacolas abastecidas com gêneros de variadas espécies, com nomes desconhecidos para eles, escritos em cartões. Dois rapazes e duas moças, antes eufóricos, transformaram-se, no mesmo instante, fecharam as caras, deram respostas mal-educadas e saíram os quatro praguejando contra o velho pai renovado em Cristo. O homem, que não tinha perdido a serenidade antes, começou a se alterar; o seu coração batia descompassado, mas ele não perdeu a confiança, e o pensamento buscou a Deus nas asas do éter. Entretanto, nós já estávamos ao seu lado, atentos ao pedido de socorro, que ele fez com toda humildade.

Kahena ajoelhou-se aos seus pés e beijou as suas mãos, com reverência, diante da sinceridade da sua mudança de atitude. Logo, as mãos do pai aflito se iluminaram. Ele, instintivamente, as colocou sobre o peito, e o coração obedeceu, voltando ao ritmo habitual. Fernando levou as mãos às suas costas e aplicou-lhe longos passes, dispersando energias que o incomodavam. Miramez começou a arfar o peito em uma respiração ordenada e aplicou o sopro magnético em direção ao cérebro do companheiro referido, enquanto os nossos outros companheiros mantinham-se em oração, no silêncio que a paz requer. No mesmo momento, o pai de família sentiu-se reconfortado, olhou para o alto, mas nada disse. Lágrimas escorriam em suas enrugadas faces, conduzindo frases a Deus, no segredo que somente Ele sabe ler. Aquele irmão levantou-se alegre e falou baixinho:

— Tomei a atitude e já está tomada. Não recuo, e peço a Deus e aos Espíritos que me ouvem, para me ajudarem a vencer todos os obstáculos que, porventura apareçam, e que tendam a me fazer recuar. Estou com Deus, e certamente Deus está comigo. Viva Jesus!

Empenhou-se em carregar as sacolas para o seu carro, que já estava na porta. Daí a instantes, chegou um vizinho e, de boa vontade, passou a ajudá-lo. A caminho do trabalho programado, o bondoso pai narrou para o seu amigo, o motivo que o levou a tomar aquela atitude, naqueles dias.

Tudo tinha começado com um sonho que ele teve com a sua falecida esposa, alma que ele tanto amava, e que lhe fizera o pedido de ajuda aos necessitados. Ele não podia deixar de fazer o que ela desejara. A razão não deixava dúvidas a respeito da veracidade do sonho.

Acompanhamos o carro até uma grande favela onde as sacolas seriam entregues. Bateram à porta de uma casinha humilde, e logo uma mulher abriu a porta; tinha os olhos salientes, cabelos mal cuidados, e notava-se que ela tinha chorado muito. Cinco filhos levantaram para ver quem era, em estado de grande penúria.

— Mãezinha Lena, eu quero comer! Eu quero comer!... Eu estou com fome!

No documento Iniciação - Viagem Astral - João Nunes Maia (páginas 163-180)