• Nenhum resultado encontrado

Jogos aplicados como instrumentos para coleta de dados

4 CAMINHO METODOLÓGICO

4.4 INSTRUMENTO: OS JOGOS

4.4.4 Jogos aplicados como instrumentos para coleta de dados

Após as diversas análises, experimentações e revisões para definição do instrumento de coleta de dados a partir de critérios teóricos baseados em Brougère (1998, 2004a, 2004b), Pessaggi e Rocha (2012), Afonso e Abade (2013) foram selecionados três jogos que atendessem aos seguintes critérios:

a) uso de temas geradores;

b) possibilidade de higienização frequente; c) conhecimento prévio das regras pelas crianças;

d) flexibilidade para adaptações de acordo com as condições físicas das crianças e seus interesses.

Os temas geradores38 que sugerem as narrativas das crianças referem-se a ações, objetos, atividades ou ambientes que fazem parte da rotina escolar e são apresentados em fichas coloridas com uma palavra, que as crianças sorteiam no desenvolvimento do jogo e apresentam

suas experiências ou pensamentos sobre o tema sorteado. Cada criança comenta o tema gerador apenas uma vez, pois eles são distribuídos nas sessões de coleta.

As fichas com temas geradores foram escritas em uma tabela com diferentes cores no fundo, impressas em vinil adesivo, coladas na manta imantada e recortadas. Caso a criança realizasse a atividade no leito, a imantação evitaria que as fichas se movessem, porém, a manta não apresentou aderência suficiente, o que não permitiu a fixação das fichas no quadro imantado.

QUADRO 6 - Temas geradores para a coleta de dados.

LIÇÃO ESCOLA

BRINCAR CLASSE HOSPITALAR

SABER IMPORTANTE

LIVRO ESCREVER

LER CONTAR

FAZER RESOLVER PROBLEMA

GOSTAR ESTUDAR

ERRAR APRENDER

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Houve a necessidade de confeccionar um quadro, para apresentação das fichas com palavras para que as fichas ficassem dispostas em bolsos para serem sorteados pelas crianças. O quadro foi confeccionado em papelão revestido por tecido plastificado e estampado com pássaros, flores e folhagens, grama, listas nas cores alaranjado, amarelo, lilás, verde, branco e preto. Na parte posterior foi colocado um apoio de modo que o quadro fique na vertical durante a realização dos jogos. A escolha do tema e das cores do tecido teve a intenção de contemplar interesse infantis com cores e formas simples e alegres.

Os materiais do jogo e sua manipulação foram prioridades na elaboração do instrumento para coleta de dados em função de necessidades e cuidados previstos para atividades realizadas com crianças hospitalizadas. Dessa forma, a confecção dos jogos teve maior atenção voltada para a facilidade de higienização frequente do material e a fixação dos diferentes elementos usados no jogo para o caso de sua aplicação no leito, sem um apoio rígido. Por recomendação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), de acordo com o documento “Protocolos de controle de infecção” da Universidade Federal do Triângulo Mineiro, qualquer brinquedo ou objeto que entrar em contato com fluidos corpóreos deverá ser limpo imediatamente, por isso os brinquedos devem ser preferencialmente de material lavável e atóxico (plástico, borracha, acrílico, metal) e objetos de madeira devem ser recobertos, pintados com tintas esmaltadas, laváveis. Os brinquedos de tecido não são recomendados, exceto para uso exclusivo.

Martins, Maia e Dantas (2016) indicam formas de realizar a higienização hospitalar no texto intitulado “Procedimento operacional padrão” da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH). As autoras consideram que a limpeza constitui a remoção de toda sujidade de qualquer superfície ou ambiente (piso, paredes, teto, mobiliário e equipamentos). O processo deve ser realizado com água, detergente e ação mecânica manual. A desinfecção é considerada o processo de destruição de microrganismos patogênicos na forma vegetativa existente em artigos ou superfícies, mediante a aplicação de solução germicida em uma superfície previamente limpa.O álcool é recomendado por ser amplamente utilizado como desinfetante e antisséptico no ambiente hospitalar, tanto o etílico, 70% (p/v), como o isopropílico, 92% (p/v), pela ação germicida (bactericida, virucida, fungicida, tuberculicida), pelo custo reduzido e baixa toxicidade.

Para atender à essas orientações, o material dos jogos confeccionados para a serem utilizados na coleta usam plástico ou tem revestimento plastificado, que permitiu a higienização diariamente após o uso. A manta magnética, o vinil colorido e transparente e placas de EVA foram alternativas selecionadas após o levantamento de materiais disponíveis no mercado, que possibilitaram a montagem dos jogos nessas condições necessárias. Como o material deveria ser adaptado a qualquer condição de aplicação, a flexibilidade foi um fator importante tanto na confecção do material, quanto no seu uso de acordo com as condições físicas das crianças e seus interesses.

A participação das crianças cooperadoras da pesquisa na escolha do jogo que preferiram realizar e na elaboração de combinados sobre como jogar reafirma a protagonismo infantil e expressa a possibilidade de diálogo, além de compartilhar o desenvolvimento da atividade.

A proposta de uso do jogo de tabuleiro intitulado “Trilha da Classe Hospitalar” foi inspirada no jogo “Trilhas da Cidadania” criado em 1991, no laboratório de Educação em ambiente e Saúde da Fundação Oswaldo Cruz com a finalidade de discutir questões ligadas à saúde sexual e reprodutiva e à prevenção da AIDS, baseado no jogo39 Zig-Zaids (Schall, 1999). A partir da experiência em que o jogo “Trilhas da Cidadania” foi aplicado na proposta de Educação em Direitos Humanos e contribuiu para auxiliar na elaboração dos conteúdos e dilemas presentes nas narrativas. O jogo foi utilizado e descrito Afonso e Abade (2013), elaborado a partir dos princípios freireano, com ênfase no diálogo e na cooperação, problematizando questões vividas pelos educandos. De acordo com as autoras, o material volta- se se para o desenvolvimento de competências, a auto-organização diante da imprevisibilidade dos resultados, o enfrentamento dos desafios contidos na transformação de sentidos e valores, que são discutidos nas situações do jogo.

O conjunto de peças do jogo é formado por um tabuleiro, seis marcadores plásticos identificados por adesivos (urso, coração, estrela, pinguim, gato, flor), 16 (dezesseis) fichas com temas geradores, um quadro para suporte das fichas, 10 (dez) fichas com situações- surpresa, cinco fichas verdes com a palavra ‘concordo’, cinco fichas vermelhas com a palavra ‘ discordo’ e dois dados.

FIGURA 5 – Conjunto de peças do jogo Trilha da classe hospitalar

Fonte: Acervo da pesquisadora

O tabuleiro foi confeccionado em EVA amarelo com uma trilha de 24 casas em círculo, algumas casas têm adesivo com um barquinho e outras casas tem adesivo com um peixinho,

algumas casas ficaram em branco. As casas são numeradas com pincel permanente e contornadas com cola colorida vermelha por dentro, azul por fora e verde na divisória das casas. O fundo do tabuleiro é enfeitado com recortes de animais marinhos coloridos em tons de azul, laranja, amarelo, cor de rosa e verde, além de branco e preto. Nas imagens há golfinhos, siris, tartarugas, peixes, polvos, baú com moedas, plantas aquáticas, anêmonas e corais. Há pontos coloridos feitos com cola de diferentes cores espalhados pelo tabuleiro. No centro do tabuleiro foi colocada uma cena completa e nos outros espaços foram colados elementos recortados com a mesma temática.

No canto inferior esquerdo há marcação para os adesivos com peixinho, identificada por ‘situação surpresa’ e com barquinho identificada por ‘conversa legal’. Esses códigos indicam o local do qual serão sorteadas as fichas com propostas de narrativas ao caírem em uma das casas identificadas pelas figuras.

As casas com peixinho remetem à ‘conversa legal’ e indicam o sorteio de uma ficha com tema gerador apresentada no quadro de acordo com descrição acima. As casas em branco são pontos de descanso, em que o jogador passará sem a elaboração de uma narrativa. No caso da indicação de uma situação surpresa, será virada a primeira ficha disposta no monte para leitura de uma situação referente à vivência na classe hospitalar e na escola de origem, que propõe uma narrativa da criança. O conjunto de ‘situações-surpresas’ é formado por 10 (dez) propostas de circunstâncias que ocorrem na classe hospitalar e na escola regular para que o jogador expresse seus pensamentos sobre elas. As situações-surpresa foram escritas em uma tabela com diferentes cores no fundo, impressas em vinil adesivo, coladas na manta imantada e recortadas. Essas situações são apresentadas abaixo:

QUADRO 7 – Situações-surpresa

SITUAÇÃO 1

T. fez um tratamento longo e sua internação durou quatro meses e meio. Como recebeu alta, T. voltará para a sua escola.

- O que você pensa que irá acontecer, quando T. voltar para sua escola?

SITUAÇÃO 2

M. ficou internada durante 5 semanas, quando voltou para a escola, seus colegas ficaram contentes, mas também ficaram curiosos e queriam saber como era estudar no hospital.

- O que você acha que M. contou para seus colegas?

SITUAÇÃO 3

A mãe de R. trouxe dois livros que a professora da escola enviou para R. fazer suas lições no hospital. No livro tinham exercícios e leituras para R. fazer. - Na sua opinião, o que R. pensa sobre fazer atividades no livro que a professora mandou?

SITUAÇÃO 4

D. precisou faltar várias vezes na aula, porque estava fazendo exames e tinha muitas consultas com diferentes médicos. Quando D. ia para a aula, não sabia como fazer as atividades, ficava muito triste. - O que poderia ser feito para ajudar D. a acompanhar as aulas na escola? Qual a sua sugestão?

SITUAÇÃO 5

A professora da classe hospitalar disse para L. que a aula do dia seria livre. L. iria sugerir o que fazer no horário da aula. L. deu um sorriso e escolheu três atividades para fazer.

- Se você fosse L., que atividades teria escolhido?

SITUAÇÃO 6

J. e B. estavam conversando sobre as atividades de Matemática que fizeram na aula de hoje. Eles estavam muito animados! Quando T. voltou do exame de ultrassom, quis saber o que J. e B. fizeram e por que estavam tão animados.

- Qual foi a resposta de J. e B. na sua opinião?

SITUAÇÃO 7

A professora de H. estava muito pensativa, porque precisava mandar atividades para H. fazer no hospital, mas não sabia o que seria interessante mandar.

- Como você ajudaria essa professora? Que sugestões poderia dar a ela?

SITUAÇÃO 8

O médico de P. disse que ele não poderá sair do leito por alguns dias. Por isso, as professoras irão trazer as atividades para ele fazer.

- Que atividades você acha que P. gostará de fazer nesse período?

SITUAÇÃO 9

M. gosta de fazer as atividades que as professoras propõem. Mas tem algumas que ela não quer fazer, porque acha que não serve para nada e são muito chatas.

- Que atividades são essas que M. não quer fazer, na sua opinião?

SITUAÇÃO 10

Durante o tratamento, C. fez várias atividades, mas algumas foram mais importantes

- Que atividades você considera mais importantes para serem feitas na classe hospitalar?

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

As fichas que expressam concordância ou discordância (cartões vermelhos com a palavra “Discordo” e cartões verdes com a palavra “Concordo”) possibilitam a interação entre os participantes e a discussão da temática apresentada na narrativa. Elas ficam disponíveis para os jogadores, que as utilizam de acordo com as proposições expressas pelos parceiros.

Os outros materiais utilizados com a finalidade lúdica para a coleta de dados foram os saquinhos com arroz e as bolinhas de gude, que fazem parte da cultura e do folclore. O jogo Cinco Marias é conhecido com diferentes designações de acordo com a região onde é utilizado: bugalha, pipoquinha, jogo das pedrinhas, cinco manés. Ele foi construído com saquinhos de tecido plastificado medindo 5cm X 5 cm e cheios com grãos de arroz. O jogo consiste em jogar os saquinhos para espalhá-los sobre um local rígido (uma bandeja decorada e forrada de EVA, ou uma mesa, em seguida, jogar um dos saquinhos para cima e antes da queda, pegar com a mesma mão um saquinho espalhado e o saquinho que foi jogado. A brincadeira se repete aumentando a quantidade de saquinhos recolhidos a cada jogada. O jogo pode ser realizado sobre uma mesa ou na bandeja decorada com adesivos coloridos e forrada com EVA amarelo, como suporte.

FIGURA 6 – Conjunto de peças do jogo Cinco Marias

Fonte: Acervo da pesquisadora

Por ter flexibilidade nas regras e diferentes modos de jogar desde a antiguidade40, o jogo pode ser adaptado às condições de cada criança participante da pesquisa, sendo usado da forma convencional, como um tiro a gol ou joga e pega um saquinho por vez, por exemplo. Quando jogado em dupla, podem ser atribuídos pontos para os saquinhos recolhidos. Cada vez que o jogador realiza o movimento combinado na regra, é convidado a sortear uma ficha com um dos temas geradores escrito para realizar a narrativa a partir dela.

O jogo de bolinhas de gude, também possibilita a adaptação de regras e variedade de formas de jogar. Foram usadas bolinhas em duas tonalidades: esverdeadas e azuladas. As bolinhas ficam espalhadas numa bandeja decorada com adesivos coloridos e forrada com EVA amarelo. A regra principal consiste em distribuir na bandeja seis bolinhas de cada cor e cada jogador lançar uma bolinha em direção a uma das bolinhas do parceiro. Se atingir a bolinha, além de recolhe-la, é feito o sorteio de uma ficha com um dos temas geradores do quadro para realizar uma narrativa. Ganha o jogo, quem tiver mais bolinhas recolhidas. Outras possibilidades seriam: jogar as bolinhas ao gol ou bater nas bolinhas com uma bolinha destacada e recolher todas que se mexerem.

40 Era utilizado na Grécia Antiga com ossos da pata de cordeiro, para tirar sorte e consultar os deuses de acordo

FIGURA 7 - Conjunto de peças do jogo de Bolinha de Gude

Fonte: Acervo da pesquisadora

Foram confeccionados quebra-cabeças para serem oferecidos como agradecimento às crianças participantes ao final da atividade e a outras que eventualmente fizeram parte dos contatos realizados durante a coleta (irmãos, companheiros de quartos, crianças fora da idade indicada, que mostraram desejo de participar, outras que prefeririam não participar da coleta).

FIGURA 8 - Quebra-cabeças

Os quebra-cabeças foram confeccionados em manta imantada e EVA com colagem das figuras sobre esses materiais. Todos os jogos foram ensacados em celofane transparente e amarrados com fitilho.