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4 CAMINHO METODOLÓGICO

4.5 PROCEDIMENTOS

A seleção da abordagem metodológica para a realização desta pesquisa apoiou-se nos objetivos e nas questões orientadoras do estudo. As atividades que socializam os conhecimentos, articulando significativamente os saberes do cotidiano, as histórias de vida, as noções sobre saúde, doença, propiciam a construção do conhecimento sobre o momento específico vivenciado pelas crianças hospitalizadas, que a escuta pedagógica contribui para a sua elaboração, como sugere Fontes (2005).

4.5.1 Procedimentos preliminares

A entrada no campo necessita de uma preparação com estratégias para descrição do trabalho, apresentação dos investigadores, formas de estabelecer os contatos de acordo com Minayo (2010). Antes de iniciar a atividade diretamente com as crianças, a aproximação do campo foi realizada por meio de contatos com a funcionária do hospital responsável pela atividade da Classe Hospitalar e pela adequação dos procedimentos às normas previstas pela instituição. Foram realizados acessos da pesquisadora ao hospital para a realização das etapas previstas para a aprovação do projeto de pesquisa, um deles foi uma visita às professoras da Classe hospitalar no período matutino em dezembro/2017.

Nesses acessos, a pesquisadora teve oportunidade de localizar-se nos prédios e setores da instituição, conversar e apresentar a proposta para departamentos diferenciados (Serviço Social, Unidade de Pesquisa Clínica, Departamento de Pediatria e Puericultura, Chefia do Ambulatório e Laboratório). A apresentação do projeto a liberação do campo foram ocorrendo gradativamente.

As sessões de coleta tiveram um roteiro com etapas comuns a todos os sujeitos, porém a forma como cada sessão foi realizada teve um desenvolvimento diferenciado em função das circunstâncias de aplicação dos jogos e da diferença entre as crianças. Fazem parte das atividades comuns realizadas no início das atividade: a indicação feita pelas professoras, o contato para convite, apresentação da proposta e assinatura da documentação, a instalação do

equipamento de filmagem, a apresentação e escolha do jogo, a combinação das regras, a realização do jogo, a despedida.

A partir da identificação e seleção das crianças em condições de participarem da pesquisa pelas professoras, era feito o contato entre a pesquisadora tanto com as crianças, como com a pessoa responsável por ela, a fim de apresentar o projeto e as condições para participar da pesquisa. Nesse contato, eram apresentados alguns materiais a serem utilizados na coleta de dados e os procedimentos a serem realizados, garantindo antes do início da pesquisa a obtenção do consentimento das pessoas envolvidas, para que possíveis dificuldades possam ser identificadas e superadas, além de estar claro o objetivo e o papel do pesquisador. (CAMPOS, 2008)

Algumas situações impediram a realização da atividade com as crianças contatadas como: a impossibilidade de uma das crianças convidadas erguer a cabeça do travesseiro, a ausência do responsável, a condição de alta médica da criança, a negativa do responsável ou a preferência da criança por não participar. Este último motivo foi acentuadamente respeitado, sem contraoferta ou outro recurso para viabilizar a realização da coleta. Pois, como entende Leite (2008), a obrigatoriedade da participação inviabilizaria a proposta de autonomia e competência infantil, repetindo o modelo adulto e criança nas posições de quem manda e obedece, respectivamente.

De acordo com a regulamentação presente na Resolução nº 510, de 07 de abril de 2016 do Conselho Nacional de Saúde (BRASIL, 2016), que dispõe sobre as normas aplicáveis a pesquisas em Ciências Humanas e Sociais, foi elaborado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e o Termo de Assentimento Livre e esclarecido (TALE) ambos apresentados nos Apêndices B e C. Como os procedimentos metodológicos envolvem a utilização de dados diretamente obtidos com os participantes ou de informações identificáveis, todos os responsáveis e todas as crianças participantes foram informadas dos procedimentos e das condições para a pesquisa.

Campos (2008) sugere a necessidade de desenvolvimento de um contato prévio ao início da atividade com as crianças, de modo a encontrar melhores condições de comunicação no desenvolvimento da pesquisa. Como preparação das sessões de coleta, foi realizado um primeiro contato para o convite e apresentação da proposta, em seguida a pesquisadora se retirava para que a criança e seu responsável conversassem, avaliassem a participação e a disponibilidade. Ao retornar, em caso da aceitação da participação, a pesquisadora conversava com a criança e seu responsável retomando as informações e estabelecendo interação para a apresentação e leitura do TALE e do TCLE, para iniciar a coleta em seguida.

O texto do Termo de Assentimento Livre e Esclarecido justifica o convite à participação da criança colaboradora com a seguinte redação: “é você quem participa das atividades e sua opinião irá contribuir com este estudo”. As atividades a que o texto se refere são as rotinas e trabalhos realizados durante o tratamento de saúde na classe hospitalar, pois a proposta deste trabalho é escutar a voz da criança hospitalizada, para que ela expresse suas narrativas sobre a vida escolar.

A adesão das crianças além de ser uma condição para que seja possível ao pesquisador empreender as etapas para conseguir as informações e/ou participação em qualquer proposta de acordo com Souza (2010), porém além da continuidade da coleta, o convite e o consentimento as crianças “serem ouvidas acerca de temas que lhes dizem respeito não é uma concessão que lhes fazemos, mas um direito das crianças, e isso pode ajudar os adultos a tomarem melhores decisões” (CRUZ, 2010, p. 12-13).

Todas as crianças participantes expressaram como compreenderam a leitura do texto do TALE por meio de desenho ou escrita de uma frase (esse material está disponível no Anexo D). A participação de crianças em pesquisas envolve cuidados éticos e metodológicos, evitando que as atividades que visam assegurar o desenvolvimento científico e tecnológico se transformem em constrangimentos, sequelas ou abusos de poder sobre os sujeitos da pesquisa. (PASSEGGI; ROCHA, 2012)

Tanto a escolha de um dos três jogos disponíveis, quanto as regras a serem seguidas foram elaboradas em conjunto entre a pesquisadora e cada uma das crianças colaboradoras no momento da atividade, confirmando o olhar para as crianças como seres competentes e participantes.

4.5.2 Procedimentos realizados na coleta de dados

Todas as crianças participaram de duas sessões de jogo distribuídas de acordo com a viabilidade de realização da coleta, de modo que ocorreram sessões em datas diferentes (2 crianças: D. e K.), no mesmo dia, sendo uma de manhã e outra à tarde (duas crianças: L. e P) no mesmo dia e no mesmo período (uma criança: M.)

O roteiro de entrevista semiestruturada, que para Minayo (2010) possibilita a abrangência de diferentes indicadores considerados essenciais e suficientes, também contempla a abrangência das informações esperadas, favorece a escuta, registro e identificação do significado das manifestações. No caso das crianças, por meio dos jogos, o desenvolvimento das entrevistas foi propiciado pelos temas geradores apresentados nas diferentes jogadas,

gerando narrativas. A entrevista semiestruturada baseou-se nas perguntas: O que você me conta sobre “isso”? ou Como é “isso” na classe hospitalar? O termo “isso” refere-se aos temas geradores sorteados em fichas durante os jogos.

No desenvolvimento dos jogos, o papel vivenciado pela pesquisadora e pela criança revelou uma dinâmica de troca, pois ambos jogaram em parceria, contribuindo para a realização da atividade e conversando sobre os temas sugeridos nas fichas sorteadas. Souza e Castro (2008) destacam o papel inquiridor do adulto e o lugar de respondente da criança, estabelecendo, frequentemente a partir da referência cultural, uma hierarquia entre eles numa distinção clara de quem é o adulto e quem é a criança. As autoras sugerem a possibilidade e a necessidade de que criança e adulto na situação de entrevista refaçam o significado original de suas posições, pois esse local não é fixo, possibilitando enquadramentos relacionais mais heterogêneos. Houve atenção para essa possibilidade de modo que a participação de cada um ocorreu com espontaneidade e flexibilidade em relação aos papéis vivenciados.

Em uma das sessões houve perguntas realizadas pela criança à pesquisadora. A realização de perguntas pelo adulto pesquisador, tiveram a função de sustentar o diálogo e ampliar o significado da atividade que estavam realizando (SOUZA; CASTRO, 2008). Houve intervenções da pesquisadora para confirmar a fala das crianças no caso do tom de voz estar muito baixo, mas principalmente para verificar a compreensão da mensagem.

Eventualmente durante a realização dos jogos houve interrupções devido a presença de funcionários do serviço de enfermagem para verificar informações ou fazer medições. Também eventualmente, foi necessário verificar o funcionamento do equipamento de filmagem, dando continuidade à atividade em seguida.

O desenvolvimento da sessão de coleta realizado com cada um dos sujeitos, apresentou variações em função das circunstâncias, interesses e a individualidade de cada participante. Assim a primeira sessão de coleta com D. foi a única em que a pesquisadora também respondeu a perguntas formuladas pela criança. As perguntas formuladas por D. tiveram conteúdo relacionado ao estudo realizado no Mestrado, às atividades realizadas na Enfermaria do HC Criança e à necessidade da filmagem, outros assuntos versaram sobre a profissão, a forma de realizar trabalhos, a idade, o lazer da pesquisadora. O jogo foi realizado enquanto D. aguardava a chamada para o centro cirúrgico e posteriormente, tanto D. quanto seus pais consideraram que a atividade foi oportuna, pois diminuiu a ansiedade provocada pela espera e atraso na realização do procedimento cirúrgico.

Três dias após a realização da primeira sessão de coleta, foi feito um novo contato com a criança para continuação da atividade, porém como D. mostrava-se indisposto e cansado, a

segunda parte da coleta foi adiada e ocorreu depois de mais alguns dias. D. realizou a segunda sessão de coleta na sala destinada à classe hospitalar, interessou-se pelos equipamentos e ações para a montagem da câmera filmadora e do tripé, aguardou a liberação do colega (K.) que seria seu parceiro, brincando com os materiais disponíveis até o início do jogo “Trilha da Classe Hospitalar”. A participação de D. no segundo jogo expressou divertimento e satisfação. Ao finalizar o trabalho, as despedidas foram afetuosas e D. retornou ao quarto, aguardando a alta em breve.

K. participou da coleta em dupla com D. e no segundo momento sugeriu usar as bolinhas de gude como se fosse um jogo de bilhar, indicou como deveria ser a formação das bolinhas sobre a bandeja e como usar o palito de sorvete como taco. Nesta atividade, mostrou-se competitivo, contando várias vezes as bolinhas conquistadas, comparando com a quantidade do outro jogador, no caso a pesquisadora.

Especialmente em virtude dos cuidados necessários em virtude da baixa imunidade, na sessão de coleta realizada com L. os materiais utilizados foram higienizados com álcool gel no quarto da criança, antes do início do jogo (normalmente, os materiais foram higienizados após cada dia de uso). L. escolheu fazer os jogos “Trilha da Classe Hospitalar” e “Bolinha de gude” e participou com interesse, mostrando-se alegre e expressando divertimento nas jogadas e situações do jogo, entretanto, em alguns momentos esteve pensativa, olhando à distância através do vidro da janela do quarto antes de iniciar sua narrativa sobre os temas geradores sorteados. A cor das bolinhas de gude agradou à menina, que admirava o vidro colorido com atenção e contentamento.

M. foi a única criança que realizou as duas sessões de coleta em seguida uma da outra, sem intervalo. Houve uma interrupção apenas para troca de material. A atividade de coleta foi realizada no espaço da classe hospitalar. M. mostrou-se interessado nos jogos e expressou satisfação ao realizá-los. Embora apresentasse as narrativas completas e com detalhes, finalizava com a frase: “E só”, iniciando a próxima jogada. Durante os jogos M. mostrou-se atento e concentrado na atividade, leu as fichas com situações-surpresa sem dificuldade de compreensão. Suas respostas foram diretas, sem demonstrar necessidade de elaboração prévia, por si mesmo retirava a ficha com o tema gerador do quadro, lia em voz alta e iniciava a narrativa expressando suas experiências e opiniões.

No segundo jogo, a criança sugeriu fazer um tiro ao gol com as peças do jogo 5 Marias. As traves foram montadas com os dedos da pesquisadora. Os pontos foram contados a cada gol marcado, que corresponderam também ao sorteio de uma ficha com tema gerador. M. mostrou- se disponível para realizar outro jogo ao final da atividade, porém não foi possível iniciar outra

rodada, pois todas as palavras haviam sido utilizadas. Ele ganhou algumas bolinhas de gude para brincar em outro momento.

As sessões de coleta com P. foram realizadas no leito e houve cuidado na disposição dos materiais utilizados no jogo, pois a perna e quadril de P. não podiam ser movimentados nem receber qualquer tipo de pressão. O uso da bandeja com apoio foi descartado, porque a abertura do suporte não era suficiente para manter a região do curativo livre. O tabuleiro do jogo “Trilha da Classe Hospitalar” ficou apoiado sobre várias camadas de lençóis dobrados nas pernas de P. para evitar também qualquer forma de contaminação da região operada. Durante o jogo houve necessidade de substituição de algumas situações-surpresa por sorteio de fichas com temas geradores, pois P. demonstrava cansaço e o efeito da medicação provocava sonolência. Na segunda sessão de coleta, embora P. estivesse desperto e expressando que estava em melhores condições para participar da atividade, o jogo de bolinhas de gude foi adaptado para o uso de dados, pois não seria possível usar o apoio da bandeja. A regra estabelecida foi que quem obtivesse mais pontos no dado, receberia uma bolinha de gude e sortearia uma ficha com tema gerador, somente no caso de o vencedor dos dados ser P.

Na conclusão das atividades com as crianças houve a demonstração de gratidão pela colaboração, foi feito o registro de contatos para comunicação do resultado final e a entrega de uma lembrança (quebra-cabeça), que a criança escolhia entre os diversos modelos apresentados.

O conhecimento prévio das regras dos jogos pelas crianças facilitou a execução dos procedimentos e evitou o desgaste para que elas realizassem a aprendizagem do modo de jogar, pois não era este o objetivo do uso do material. As crianças sentindo-se familiarizadas com a maneira de jogar, puderam se dedicar às narrativas e desfrutarem do divertimento presente na atividade.

A saída do campo foi realizada no dia 17 (dezessete) de maio de 2018, com a finalização do levantamento de dados das narrativas de crianças sobre a vida escolar, informações sobre as crianças participantes da coleta e despedida da equipe: assistente social e professoras da classe hospitalar. O Departamento de Puericultura e Pediatria do HCFMRP – USP foi informado por e-mail da finalização das atividades de coleta, com agradecimento pela parceria na realização da pesquisa.

4.6 FORMA DE REGISTRO DOS DADOS NA COLETA E ORGANIZAÇÃO DESSES