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Lene (2009, p. 86) caracteriza em quadro a formação no Brasil dos jornalistas da área econômica. Segundo ela, na década de 50, quando o jornalismo econômico começava a se destacar

não havia "especialização dos repórteres para cobertura dessa área específica". Prevalecia na área o colunismo. Já a partir da década de 60 e 70, a área tornou-se especializada, a editoria de economia ganhou espaço e cresceu e a "apuração da informação passou a ser segmentada por setores econômicos específicos". Durante a década de 70 e 80, os jornalistas passaram a se especializar mais por meio de cursos e treinamentos promovidos por segmentos específicos.

Com o desenvolvimento e reestruturação das editorias de economia e de veículos de comunicação, os jornalistas também desenvolveram suas relações e especializações na área econômica, conforme aponta Pedroso Neto:

Nesse período, progressivamente, foram estruturadas editorias ‒ ou reestruturadas as poucas existentes ‒ e cadernos de economia em jornais já existentes. Foram fundados ainda, novos jornais, revistas, programas de rádio e televisão dedicados a assuntos da esfera econômica. Ao mesmo tempo, começou a especialização dos jornalistas; o crescimento do pessoal, das rotinas, dos relacionamentos com fontes específicas e dos processos de treinamento e formação de profissionais, todos relacionados a fatos, agentes, instituições e processos da economia. (PEDROSO NETO, 2015, p. 136).

Segundo Abreu (2003, p. 28), no início da década de 70 as notícias predominantes eram sobre financeiro, mas passaram a tratar de assuntos da bolsa de valores e mercado. Logo os jornalistas procuravam se informar sobre o funcionamento da área com técnicos que trabalhavam no setor público e no setor privado. O autor reforça que A especialização de muitos dos profissionais que cobriam as páginas de economia se deu de maneira autodidata com a formação se dando no contato diário com as fontes.

Foi também durante a década de 70 que apareceram em cena os principais nomes do jornalismo econômico: Joelmir Beting, Luís Nassif, Carlos Alberto Sardenberg e Celso Ming. O jornalista Joelmir Beting, que atuava há mais tempo na imprensa brasileira, foi responsável por traduzir a linguagem técnica da área, o “economês”, em sua própria coluna diária, já que naquele período a notícia econômica era voltada a atender o consumidor (PEDROSO NETO, 2015; LENE, 2009; PULITI, 2013).

Beting atuou em 1964 como editor de economia na Folha de S. Paulo. Ele não tinha experiência como editor, mas sua formação acadêmica era voltada ao campo econômico. Deste modo o seu conhecimento do setor econômico o ajudava a traduzir para o público geral o "economês" comum no vocabulário dos atuantes na área. No jornal impresso, o jornalista começou como redator no Diário da Noite e repórter no O Esporte, se consolidando na Folha de S. Paulo com sua coluna diária (LENE, 2009, p. 90).

Conforme explanado, a linguagem utilizada no jornalismo econômico é bastante questionada por ser muito técnica. Sendo assim, os jornais percebem a necessidade de utilizar uma linguagem mais clara e objetiva para alcançar o público em geral. Muitos jornalistas passam a "copiar" Beting e começam a introduzir nos textos uma linguagem mais clara, substituindo o vocabulário usado por economistas.

O texto de economia exige esforço extra do repórter para traduzir, em linguagem clara e acessível, a frieza dos números, os termos técnicos e herméticos usados pelas fontes de informação, pesquisas, balanços, relatórios e documentos do governo. É preciso, sobretudo, saber interpretar com simplicidade e agregar novos dados para projetar e oferecer ao leitor informações de tendências, para que ele possa planejar sua vida ou seu negócio (CALDAS, 2008, pp. 84-85).

Puliti (2013, p. 46) corrobora o autor citado ao afirmar que com as mudanças - que ocorriam no país e se refletiam na imprensa – os economistas teóricos que atuavam bastante nos jornais passaram a ser considerados muito acadêmicos. "Os jornalistas queriam informações de pessoas mais envolvidas com o cotidiano do nascente mercado financeiro".

Para explicar os termos técnicos das instituições financeiras, os jornais passaram a utilizar outras fontes como economistas de bancos, conforme elucida Puliti (2013, p. 46). Segundo a autora, mesmo hoje, estas fontes passam legitimidade para leitores e jornalistas mesmo que usem termos técnicos. Reforçando Putini, Lene (2009, p. 403) afirma que o papel desempenhado pelos economistas na composição do jornalismo de economia é deles serem "as principais fontes de informação e de análise que alimentam permanentemente essa editoria".

Nesse contexto, os economistas que compõem a elite dirigente do país foram, ao longo dos sucessivos planos econômicos, as principais fontes que alimentaram o noticiário das editorias da área, que passaram as informações sobre as medidas do governo e traduziram os fatos para jornalistas que, por sua vez, as repassaram ao público leigo, por meio das narrativas jornalísticas (LENE, 2009, p. 404).

Para Puliti (2009, p. 27), ao colaborar com os jornalistas, os agentes do mercado buscam influenciar a agenda político-econômica nacional, além de atrair clientes para suas instituições. Sobre o mesmo ponto, Lene (2009, p. 404) afirma que os economistas são legitimados pelos jornais e pelos jornalistas da área. Em contrapartida, os jornalistas de economia também são legitimados por essas fontes, pois os distinguem de outros profissionais "ao permitir que atuem como intermediários entre eles, com seu saber técnico, e o público leigo, com o conhecimento do senso comum".

Há, neste contexto, uma ligação entre os campos jornalístico e econômico. Neste caso, é a procura do respaldo técnico das informações prestadas junto ao campo econômico ao mesmo tempo em que os agentes do campo econômico aproveitam a visibilidade propiciada para legitimação junto ao seu próprio campo e aos demais campos. Além disso, a influência do campo jornalístico reforça as tendências dos agentes comprometidos com o campo político-econômico a submeterem-se à pressão das expectativas e das exigências da maioria.

A classe econômica organiza uma rede de apoio para legitimar e influenciar políticos, governo e sociedade. Essa rede é composta por imprensa e academia. "Os grupos de interesse querem a cooperação dos jornalistas para aparecer, e os jornalistas querem a cooperação desses grupos para ter notícias", afirma Puliti (2009, p. 63). A imprensa é importante nessa relação, pois é por meio dela que a agenda de interesses nacionais é fixada e apresentada para a sociedade.

Outra fonte recorrente no jornalismo de economia são as que compõem equipes do governo, ou seja, o jornalismo econômico brasileiro é bastante dependente de fontes oficiais, conforme destaca Lene (2009, p. 404). Sobre o apontado por Lene, Puliti (2009, p. 272) corrobora em pesquisa ao observar que a vertente ideológica da financeirização foi introduzida nos noticiários por discursos do próprio governo e não de banqueiros ou mesmo de economistas do mercado financeiro. Com isso, os "interesses do capital são colocados como sendo de amplo interesse nacional", aponta a pesquisadora.

Acerca da financeirização, o capítulo quatro abordará o tema e evidenciará como a financeirização da economia no sistema capitalista ocorreu. O que explica, portanto, os motivos pelos quais o jornalismo econômico tornou-se financeirizado.