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JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA

No documento Dimensões dos Direitos Humanos (páginas 146-149)

KEY WORDS:

3. JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA

A judicialização da política surge como um fenômeno moderno representando a busca de solução judicial para problemas reais de certo déficit de democracia, na medida em que muitas políticas públicas são submetidas ao Poder Judiciário, pois não encontram espaço no âmbito do debate público envolvendo os atores sociais (APPIO, 2007, p. 172).

Os direitos presentes no constitucionalismo contemporâneo alicerçam o Poder Judiciário na expansão judicial sob a esfera política por via de uma judicialização capaz de sanar as ingerências Executivas e Legislativas na garantia especialmente dos Direitos Fundamentais.

A progressiva expansão do Estado em cada um dos seus ramos acaba modernizando a concepção formal do Princípio da Separação dos Poderes, à medida que a interpretação constitucional passa a ser feita sob a égide do neoconstitucionalismo, legitimando então uma maior atuação do Judiciário em matérias que de prima fácie não estariam elencadas em sua função primária.

O termo judicialização da política se presta para designar abordagem da dimensão política do papel dos juízes e dos tribunais no sistema político democrático, o interesse social no papel dos juízes pode ser colocado de duas formas distintas, sendo uma ao que diz respeito ao protagonismo político mais acentuado da sociedade organizada, e outra sob a perspectiva da adoção da democracia constitucional como modelo de acesso ao poder decisório, de organização da sociedade e de gerenciamento e resolução dos conflitos entre classes e grupos sociais (TEIXEIRA, 2001, p. 32).

Por tal situação, ocorre uma interação entre o Poder Judiciário, os Poderes Legislativos e Executivos ao que tange o processo decisório no regime democrático.

Em relação à justiça e à segurança, o Direito acaba vivendo uma crise existencial, não dando ao juiz oportunidade de distanciamento crítico em relação aos casos em que tenha que proferir julgamento, tendo este que atuar meio à fumaça e à

Priscila Luciene Santos de Lima & Rafael Lima Torres

espuma, circulando numa era de sufixos neo e pós, na tentativa de nominar tudo de novo o que está a lhe acometer (BARROSO, 2005, p. 233-234).

No Brasil, a judicialização de política pública surge após a Constituição de 1988, em meio a necessidade de assegurar a mínima garantia dos direitos sociais fundamentais e dos cidadãos, deixando para trás anos de opressão militar imposto pelas ditaduras.

A partir da Carta magna, as normas constitucionais passam a ser postuladas como sendo normas jurídicas dirigidas a toda sociedade, sendo imperativas e possuindo capacidade de ser imposta pela força desde que seja eivada da legalidade que se espera.

Nesse sentido, até a concretização do novo pensar constitucional, o Poder Judiciário não possuía papel relevante na concretização do conteúdo da Constituição, sendo somente após este período que o juiz passa a ser responsável também pela realização e cumprimento da Constituição, criando então uma expansão às suas atividades.

Ao movimento natural do conjunto de transformações gerado pela interpretação constitucional, com a constitucionalização dos direitos sociais e direitos fundamentais que marcaram o constitucionalismo contemporâneo se dá o sustentáculo da judicialização da política.

A propósito da expansão judicial, nota-se que esta não se dá a partir da retórica, mas sim de um conceito de proteção e robustez constitucional que lhe afirma legitimidade, sendo um mecanismo de interpretação ou de acoplamento estrutural (NEVES, 2007, p. 65), que teve no direito da constituição a judicialização da política à medida que os conflitos sociais gerados pelos direitos fundamentais foram surgindo.

A jurisdição constitucional vem exercer importante papel no cenário de controle judicial da legitimidade do poder político uma vez que nenhum dos Poderes da República está em posição superior à Constituição, estando todo e qualquer desvio jurídico constitucional praticado em qualquer instância do poder sujeito à fiscalização judicial.

O paradigma que surge a partir da possibilidade do controle judicial dos atos públicos exercidos na forma da judicialização da política, está ligado à limitação da discricionariedade ou liberdade na elaboração das normas pelo Legislativo e da imposição de programas e políticas constitucionais que são impostas pela Administração.

Efetivação dos direitos fundamentais no Brasil (...)

Em que pese à afirmação da possibilidade de judicialização da política, um ponto de questionamento é levantado acerca do controle judicial dos atos administrativos, em especial ao tocante à discricionariedade dos atos da administração pública.

Em relação aos atos discricionários inerentes ao Poder Público, cumpre apresentar o conceito trazido por Hely Lopes Meirelles (2010, p. 121-122):

Poder discricionário é o que o Direito concede à Administração, de modo explícito ou implícito, para prática de atos administrativos com liberdade na escolha de sua conveniência, oportunidade e conteúdo.

Convém esclarecer que poder discricionário não se confunde com poder arbitrário. Discricionariedade e arbítrio são atitudes inteiramente diversas. Discricionariedade é liberdade de ação administrativa, dentro dos limites permitidos em lei; arbítrio é ação contrária ou excedente da lei. Ato discricionário quando autorizado pelo Direito, é legal e válido; ato arbitrário é sempre ilegítimo e inválido. [...] mais uma vez insistimos nessa distinção, para que o administrador público, nem sempre familiarizado com os conceitos jurídicos, não converta a discricionariedade em arbítrio, como também não se arreceie de usar plenamente de seu poder discricionário quando estiver autorizado e o interesse público o exigir.

A partir da íntima ligação da discricionariedade com o interesse público, é possível notar que existe uma correlação entre a atividade estatal e o controle judicial em especial das políticas públicas, diante de uma possível inércia do Estado em relação ao cumprimento de seu dever precípuo de proteção aos direitos e garantias fundamentais.

Em termo, a judicialização acaba sendo operada tanto pelos tribunais que realizam a revisão judicial das ações realizadas pelo Executivo e Legislativo, quanto à introdução de procedimentos judiciais das demais esferas do Poder, para Barroso (2013, p. 3):

Judicialização significa que algumas questões de larga repercussão política ou social estão sendo decididas por órgão do poder judiciário, e não pelas instâncias políticas tradicionais: o congresso e o poder executivo em cujo âmbito se encontra o Presidente da República, seus ministérios e a administração em geral. Como intuitivo, a judicialização envolve uma transferência de poder para juízes e tribunais, com alterações significativas na linguagem, na argumentação e no modo de participação da sociedade.

De um possível rol de ações que devem ser realizadas pelo Poder Executivo e Legislativo estão as políticas públicas, sendo estas um instrumento de concretização e afirmação dos direitos fundamentais consagrados na Carta Magna.

Priscila Luciene Santos de Lima & Rafael Lima Torres

Porém, são frequentes as omissões do Estado frente a execução das políticas públicas relacionadas aos direitos fundamentais, havendo a necessidade de um controle judicial das ações ligadas aos direitos aqui tratados.

O caráter das políticas públicas no Brasil deriva em regra de ato político de governo que tem grande margem de discricionariedade, permitindo que o administrador o faça sem a necessidade de consulta ao Legislativo, enquanto os atos de governo gozam de ampla discricionariedade com vínculo à legislação infraconstitucional.

A diferenciação do ato político e do ato de governo é necessária, pois a doutrina defende a possibilidade do controle judicial dos atos de governo, enquanto apresentam uma restrição da possibilidade do controle judicial dos atos políticos em razão de sua discricionariedade, firmando-se no direito pátrio uma certa orientação no sentido da admissibilidade de apreciação jurisdicional dos atos de governo caso haja lesão ou ameaça de direito (MEDAUAR, 2012, p. 164).

Ao que se nota, pode sim haver uma judicialização na execução das políticas públicas dirigidas à proteção dos direitos constitucionais do cidadão sempre que houver lesão ou ameaça ao direito conforme consta expressamente no art. 5º, XXXV da Constituição Federal.

Desta forma, a judicialização da política figura como gênesis do constitucionalismo contemporâneo que decorre da constitucionalização do Direito, dando forma ao Poder Judiciário para que este, por meio da jurisdição constitucional, expanda sua atuação no Poder Político.

4. JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS E LEGITIMIDADE DO

No documento Dimensões dos Direitos Humanos (páginas 146-149)