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1 AS GARANTIAS PROCESSUAIS

1.4 JURISDIÇÕES UNA E DUAL EM MATÉRIA DE

1.4.5 Jurisdição una e jurisdição dual

De início, é importante ressaltar que as jurisdições una e dual também dizem respeito às demandas da esfera administrativa, ou seja, dependem do tipo de regime que o Estado adota para proceder ao controle dos atos administrativos (ilegais ou ilegítimos) praticados por agentes públicos dos mais variados níveis de governo ou do Estado bem como os atos dos seus administrados.

Atualmente, prevalece a polarização de dois grandes sistemas jurisdicionais adotados na maioria dos países democráticos ocidentais: um denominado jurisdição única ou una, baseada no sistema jurídico inglês, e outro denominado jurisdição dupla ou dual, baseada no sistema jurídico francês.162

O sistema inglês ou da jurisdição una (unicidade jurisdicional) prevê que todos os conflitos, sejam eles privados ou da esfera administrativa, podem ser levados à apreciação do Poder Judiciário por ser este o único dos Poderes constituídos do Estado com competência

160RIBEIRO, Pedro Barbosa. Curso de direito processual civil: teoria geral do

processo, p. 86-87.

161ATHANÁSIO, João Batista. Cadernos de direito processual civil, p. 55-56. 162SOUZA, Wanderley Welder de. O exercício da competência judicante pelo

Tribunal de Contas da União. Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Católica de Brasília. Brasília, DF, 2012, p. 27.

para solucionar conflitos jurídicos de qualquer natureza. Esse sistema não veda que demandas do âmbito administrativo sejam solucionadas administrativamente sem que se tenha a necessidade de provocação do Poder Judiciário, tampouco limita ou impede que a Administração Pública controle e questione a legitimidade dos seus próprios atos, isto é, confere ao Estado, por meio de seus órgãos administrativos, a competência jurisdicional para solucionar demandas na esfera do direito administrativo, ficando facultado ao particular e mesmo à Administração Pública recorrer ou não ao Poder Judiciário.163

José dos Santos Carvalho Filho164 afirma que:

No sistema da unidade de jurisdição – una lex una jurisdictio – apenas os órgãos do Judiciário exercem a função jurisdicional e proferem decisões com o caráter da definitividade. Mesmo as raríssimas exceções contempladas na Constituição, conferindo essa função ao Congresso Nacional, não servem para desfigurar o monopólio da jurisdição pelo Judiciário.

Por sua vez, Celso Antônio Bandeira de Mello165 assevera que:

Assim, o Poder Judiciário, a instância da parte interessada controla, in concreto, a legitimidade dos comportamentos da Administração Pública, anulando suas condutas ilegítimas, compelindo-as àquelas que seriam obrigatórias e condenando-a a indenizar os lesados, quando for o caso.

Nota-se, assim, que pelo sistema da jurisdição una, o Poder Judiciário é, em princípio, aquele que possui a legitimidade originária para a aplicação da lei aos casos concretos, cabendo-lhe as funções de conhecer, processar e julgar demandas das esferas privada e

163CARVALHO, Rodrigo Janoni. Notas sobre o sistema administrativo

brasileiro. 17.09.2011. Disponível em:

<http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=4084>. Acesso em: 8 fev. 2016.

164CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo,

p. 1.003-1.004.

165

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo, p. 954.

administrativa, materializando o monopólio sobre a competência jurisdicional.166

O sistema de jurisdição dual (sistema francês), também denominado contencioso administrativo, objetiva impedir que as demandas da esfera administrativa sejam apreciadas, processadas e julgadas pelo Poder Judiciário, ou seja, os atos da Administração Pública e as demandas da seara do direito administrativo são de competência jurisdicional de tribunais administrativos.167

No sistema jurisdicional dual francês, há nítida divisão entre jurisdição comum (se assim se pode dizer) e jurisdição administrativa, isto é, as matérias não administrativas são apreciadas, processadas e julgadas pelo Poder Judiciário; as inerentes ao direito administrativo são de competência jurisdicional exclusiva dos chamados tribunais administrativos, que, naquele país, convivem de forma harmônica.168

Miguel Seabra Fagundes169 assim discorre sobre a jurisdição dual:

O outro sistema (chamado jurisdição dúplice, por oposição ao primeiro) implica um controle exercido mediante tribunais especialmente instituídos para as situações contenciosas em que seja parte a Administração. Os atos administrativos não se submetem de modo algum, ou se submetem em número reduzido, ao Poder Judiciário. Nesse sistema mencionado de contencioso-administrativo, a administração pública não se submete à jurisdição comum, destinada a compor as lides privadas, mas sim a

166SOUZA, Wanderley Welder de. O exercício da competência judicante pelo

Tribunal de Contas da União. Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Católica de Brasília, Brasília, DF, 2012, p. 28.

167CARVALHO, Rodrigo Janoni. Notas sobre o sistema administrativo

brasileiro. 17.09.2011. Disponível em:

<http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=4084>. Acesso em: 8 fev. 2016.

168SOUZA, Wanderley Welder de. O exercício da competência judicante pelo

Tribunal de Contas da União. Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Católica de Brasília, Brasília, DF, 2012, p. 28.

169FAGUNDES, Miguel Seabra. O controle dos atos administrativos pelo

Poder Judiciário. 8. ed. Atualizada por Gustavo Binenbojm. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 141.

Tribunais com competência específica para a aferição dos atos administrativos.

Michel Mascarenhas170, sobre o sistema dual francês, anota: “A jurisdição administrativa resolve os casos de sua competência de modo final e imutável sem que seja possível buscar o controle posterior do Poder Judiciário.”.

De acordo com o sistema dual francês, os conflitos pertencentes à esfera do direito administrativo só podem ser conhecidos, processados e julgados pela Administração Pública, por intermédio de seus tribunais administrativos (formando um Poder Judiciário Administrativo). As decisões emanadas por estes tribunais são definitivas, não havendo possibilidade de ser discutidas no âmbito do Poder Judiciário, que, neste caso, exerce a competência sobre as demais matérias de direito.171

Há, como visto, grande diferença entre o sistema inglês (jurisdição una) e o francês (jurisdição dual), que se colocam de modo antagônico. No sistema de jurisdição una, as demandas da esfera administrativa também podem ser apreciadas, processadas e julgadas pelo Poder Judiciário, o que já não acontece no sistema de jurisdição dual na medida em que separa claramente a jurisdição administrativa da jurisdição comum.172

O Brasil adotou o sistema inglês, de jurisdição una, determinando que compete ao Poder Judiciário a apreciação, o processamento e o julgamento de todas as matérias de direito, inclusive aquelas da esfera administrativa, e isto fica muito claro com o comando do inciso XXXV do artigo 5º da Constituição Federal, que assim dispõe: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”173. Em outras palavras, o texto constitucional determina que as demandas da esfera administrativa também podem ser submetidas ao

170

MASCARENHAS. Michel. Tribunais de Contas e Poder Judiciário: o sistema jurisdicional adotado no Brasil e o controle judicial sobre atos dos tribunais de contas. São Paulo: Conceito Editorial, 2011, p. 47.

171

SOUZA, Wanderley Welder de. O exercício da competência judicante pelo Tribunal de Contas da União. Monografia (Graduação em Direito) - Universidade Católica de Brasília, Brasília, DF, 2012, p. 28.

172FERNANDES, Jorge Ulisses Jacoby. Tribunais de Contas do Brasil:

jurisdição e competência. Belo Horizonte: Fórum, 2003, p. 121.

173BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil: texto

constitucional promulgado em 5 de outubro de 1988, com alterações adotadas pelas emendas constitucionais nº 1/92 a 64/2010, pelo decreto nº 186/2008 e pelas emendas constitucionais de revisão nº 1 a 6/94, 2010, p. 8.

Poder Judiciário. Porém, o citado dispositivo constitucional não proíbe que os conflitos da esfera do direito administrativo sejam processados pela Administração Pública; ao contrário, trata-se de procedimento comum e peculiar do cotidiano dos órgãos públicos, que corriqueiramente atuam como poder judicante e exaram decisões sobre matéria administrativa, mas, no entanto, não são definitivas, cabendo à parte interessada buscar a tutela jurisdicional do Estado (Poder Judiciário) caso se considere prejudicada pela decisão proferida na esfera administrativa.174

174CARVALHO, Rodrigo Janoni. Notas sobre o sistema administrativo

brasileiro. 17.09.2011. Disponível em:

<http://www.viajus.com.br/viajus.php?pagina=artigos&id=4084>. Acesso em: 8 fev. 2016.

2 O DANO AMBIENTAL NA ESFERA ADMINISTRATIVA: