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2 LAZER OU ENTRETENIMENTO

2.1 O LAZER

Para tratar do lazer busco a leitura de Joffre Dumazedier (2001), em seu livro intitulado Lazer

e cultura popular. Para este sociólogo, o lazer é uma “realidade fundamentalmente ambígua”

(p. 21) e está presente “como um elemento central da cultura vivida por milhões de trabalhadores” (p. 20). É ambígua, segundo DUMAZEDIER (2001), pois ao mesmo tempo em que várias teorias sobre lazeres estiveram “em processo de constituição há já trinta anos, a Sociologia Geral do Lazer apresenta-se, ainda, na infância” (p. 21).

Portanto, ainda não há como mensurar ou estabelecer uma definição sobre o que o lazer tem de concreto, já que ele se altera constantemente, pois está ligado às práticas culturais dentro de um fenômeno específico no interior da Sociedade, que não somente o trabalho profissional (p. 31). Também, considerar o lazer como oposto à atividade tecnicista, pode levar a uma definição “inexata e perigosa”, pois, segundo Joffre Dumazedier (2001, p. 31), a definição de lazer deve ser entendida dentro da ótica de “oposição ao conjunto das necessidades e obrigações da vida cotidiana” (p. 31). Ou seja, o lazer está muito mais ligado à necessidade em dizer o que não é o trabalho – e ao mesmo tempo legitimá-lo –, do que estabelecer um momento de puro divertimento, sem a pretensão de opor-se a algo. Sendo assim, continua Joffre (2001), é preciso ver a “dialética da vida cotidiana” (p. 31), pois assim, todos “os elementos se ligam entre si e reagem uns aos outros” (p. 31).

Ora, até mesmo no “fazer nada” podemos estar criando coisas, realizando atividades intelectuais, possibilitando o surgimento de ideias que podem ser constituídas como uma espécie de função laboral da mente humana e, porque não, realização de entretenimento, diversão. Esse “fazer nada” pode ser entendido como o ócio criativo, que não deve ser direcionado ao entendimento de que o sujeito exercendo o ócio tenha por característica ser preguiçoso.

Obviamente que ao estabelecer um trabalho realizado pelo intelecto, exclui de determinada maneira, as pessoas que exercem “trabalhos físicos pesados, perigosos e um esforço corpóreo grande” (MASI, 2015), pois o ócio criativo é puramente intelectivo, criativo, inventivo, tornando-se assim, “uma condição de privilégio” (MASI, 2015). E, atualmente, com as novas tecnologias, “os trabalhos repetitivos e chatos são cada vez mais entregue às máquinas” deixando o homem com tempo para refletir e praticar o ócio criativo18.

Pode-se entender essa definição de lazer muito ligada às atividades realizadas por Thiago em meio aos intervalos das aulas. Aqui, estabelecerei o estudo como um trabalho exercido por ele. Nos intervalos, entre um período de aula e outro, Thiago saía com amigas e ia para um bar, em frente a instituição de ensino, para beber. Para ele, é um momento de espairecer, e por diversas vezes, o mesmo dizia que “era necessário, pois o dia dele havia sido muito puxado”.

Mesmo que Thiago não determine isso como entretenimento ou como lazer, fica clara em sua fala, a separação entre trabalho (obrigações estudantis) e diversão. Esse é um período de

18 MASI, Domenico de. O que é o ócio criativo? Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=TVx- L2I1TDk. Acessado em: 24 jan. 2019.

rompimento da lógica cotidiana, para imersão em um outro que se diferencie da sua rotina. Sendo assim, as palavras de Dumazedier (2001) podem ser representadas nas ações do “nativo” Thiago.

Portanto, quando a palavra lazer é lançada com o intuito de equiparação com os substantivos

divertimento, entretenimento e/ou recreação, ela esconde o perigo de esquecimento de sua

“dupla face”, a busca de “ruptura com o universo do cotidiano” (DUMAZEDIER, 2001, p. 33). Em determinados momentos o lazer também pode ser caracterizado como um equalizador, fonte de equilíbrio para “suportar as disciplinas e as coerções necessárias à vida social” (p. 33). Nestes dois casos a “fuga por meio de divertimento e evasão para um mundo diferente” demonstra que sujeito que não estabelece um valor em si mesmo para o lazer, mas apenas estabelece a existência dele como o fruto de sua força produtiva. Então, essa lógica do divertimento estabelecida por Thiago, ao ir para o bar durante o intervalo de aula, traz a ele uma realidade completamente diferente do momento em que está inserido, criando uma espécie de curvatura da linha dos afazeres cotidianos, como se surgisse uma “pausa na alma”, para relaxar e voltar (em curto espaço de tempo) para as atividades normativas.

Apesar do lazer estabelecido por Joffre Dumazedier (2001) tenha existência apenas em contraposição as tarefas cotidianas, ele pode, sim, estabelecer um movimento repleto de sentidos dado pelos sujeitos. Naquele momento, Thiago está criando possibilidades de divertimento, de interesses em comum com os amigos e dando significado aos seus atos, mostrando que apesar das realizações das tarefas ordinárias acadêmicas, existe espaço para se divertir.

Como dito anteriormente, os conceitos existem, mas podem ser ultrapassados mediante o olhar do nativo, pois mesmo diante das definições, as lógicas podem ser alteradas pelas percepções individuais e as experiências subjetivas. Isso não anula o fato da existência de uma contraposição e, muito menos, de uma superação da mesma.

Sendo assim, é pertinente dizer que a identificação do lazer não é a busca desta minha pesquisa, apesar do trabalho cotidiano dos sujeitos que acompanhei estarem presentes o tempo inteiro. Mas estarei voltado para a diversão em si mesma, sem a intenção de dicotomizar as experiências frente ao trabalho ou a obrigação da existência de um entretenimento que provoque a fuga das condições da vida cotidiana.

Se assim o fosse, não haveria a condição de um certo tipo de entretenimento surgir em meio a tantas situações, pois, deveras, ele sempre estaria atrelado à ruptura de atividades reais, mas, ao contrário, o sujeito é capaz de estabelecer as condições para o entretenimento a qualquer momento, inclusive durante suas atividades rotineiras e obrigatórias e/ou fazer de suas atividades rotineiras um entretenimento.