• Nenhum resultado encontrado

A legalização das uniões homoafeíivas

A,Lei Maria da Penha, modo expresso, enlaça no conceito de fa­ mília as uniões homoafelivas Diz o seu artigo 2 .°: “Toda mulher, in­ dependentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual (...) goza, dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana ”. O parágrafo único do artigo 5 ,Q reitera que independem cie orientação sexual to­ das as situações que c onfiguram violência doméstica e familiar O pre­ ceito tem enorme repercussão, Como é assegurada proteção legal a fatos que ocorrem no ambiente dom éstico, isso quer dizer que as uniões de pessoas do mesmo sexo são entidades familiares Violência domésti­ ca, como diz o próprio nome, é violência que acontece no seio de uma família Assim, a Lei Maria da Penha ampliou o conceito de família alcançando as uniões homoafetivas, P ela prim eira vez fo i consagrado,

no âm bito in fracon stitu cion al, a id éia de que a fa m ília não é constituída p o r im posição d a lei, m as sim p o r vontade dos seus p róp rios m e m b r o s 1

Ao ser afirmado que está sob o abrigo da Lei a mulher, sem dis­ tinguir sua orientação sexual, encontra-se assegurada proteção tanto às lésbicas com o às travestis, as transexuais e os transgêneros do sexo feminino que mantêm relação íntima de afeto em ambiente familiar ou de convívio Em todos esses relacionamentos as situações de vio­ lência contra o gênero feminino justificam especial proteção,

As uniõ es de pessoas d o mesmo s exo , p or puro preco ncei to, eram relegadas ao âmbito do Direito das Obrigações, e identificadas com o um negócio de fins lucrativos No final da sociedade, procedia-se à divisão de lucros, mediante a prova da participação de cada parceiro

i Leonardo B arreto M oreira Alves, O re co n h e cim e n to legal do co n ce ito m oderno de fa m ília .., 149.

na formação do patrimônio amealhado duranie o período de conví­ vio Como sócios não constituem uma família, as uniões homoafetivas acabavam excluídas do âmbii.o do Direito das Famílias e do Direito das Sucessões Esta era a tendência majoritária da jurisprudência.

A mudança comc.çou pela ju stiça gaúcha ao definir a com petên­ cia das Varas de Família para o julgamento das ações envolvendo as uniões hom ossexuais, o que provocou a remessa de todas as dem an­ das que tramitavam nas varas cíveis para a jurisdição de família Tam­ bém os recursos migraram para as Câm aras de Fam ília, que detêm com petência para apreciar a maLéria A primeira decisão deferindo herança ao parceiro do mesmo sexo também é do Rio Grande do Sul Reconhecida a união homoafetiva com o entidade familiar, acabou por ser inserida 110 âmbito do Direito das Fam ílias.2 Igualmente, é gaúcha a decisão que deferiu a adoção hom oparental a duas m ulheres Na esteira dessas decisões, que alcançaram repercussão de âmbito nacio­ nal, encorajam-se outros tribunais^, com significativa freqüência, são divulgados novos julgam entos adotando posicionam entos idênticos

Mas agora, a partir da nova definição de entidade familiar, trazida pela Lei Maria da Penha, não mais cabe questionar a natureza dos vín­ culos formados por pessoas do mesmo sexo N inguém pode continuar sustentando que, em face da omissão legislativa, não é possível em ­ prestar-lhes efeitos jurídicos Há uma nova regulamentação legislativa da família. No dizer de Roberto Lorea, derruba-se, enfim, a última baireira - meramente formal - para a dem ocratização do acesso ao casamento no Brasil: A novíute/imçãc1 legal d a fa m ília b ra sileira se har­

m on iza com o con ceito de casam en to “entre côn ju g es” do art 1 511, do C ódigo Civil, irão apenas cleixamio de f a z e r q u alq u er alusão ã oposição dc sexos, m as explicitan do que a h eterossex n alid ad c n ão é con d ição p a ra o casam en to 3

O avanço ê significativo, visto que coloca um ponto final à dis­ cussão que emretém a doutrina e divide os tribunais.. A eficácia da nova

lei é imediata, passando as uniões hom ossexuais a m erecer a especial

proteção do Estado (CF, art 2 2 6 ) Sequer de sociedade de fato cabe

2 Na minha obra Uniões hom ossexuais: o que diz a ju stiça , trago as pionei­ ras decisões da justiça brasileira que recon h eceram as uniões hom oaíetivas 3 Roberto Arriada Lorea, A nova definição legal da família brasileira

A LEGALIZAÇÃO DAS UNIÕES HOMOAFETIVAS '3 7

continuar falando, subterfúgio de conotação nitidam ente precon­ ceituosa, pois nega o com ponente de natureza sexual e afetiva dos vínculos hom ossexuais. Agora, as uniões homoafetivas não mais po­ dem ser reconhecidas com o sociedades de fato, sob pena de se negar vigência à iei federal 'f

Em face da norm alização levada a efeito, restam com pletam ente esvaziados iodos os projetos de lei em uam itação e que visam a regu­ lamentar a união civil ou.a parceria civil registrada Esses projetos perderam o objeto uma vez que há lei conceituando entidade fami­ liar, irão importando a orientação sexual de seus partícipes

No mom ento em que as uniões de pessoas do mesmo sexo estão tuteladas na lei de com bate à violência dom éstica, isso significa que são reconhecidas como uma família, encontrando-se sob a égide do Direito das Famílias Com isso fica afastada por com pleto a incidên­ cia da Súmula 3 8 0 do STF,5 uma vez que as uniões homoafetivas não são sociedades de fato e sim entidades familiares, por isso sua aprecia­ ção deve se dar sempre na Vara de Fam ília e não em Vara Cível 6 Consequentemente, impõe-se a redistribuição das ações que ainda se encontram nos juízos cíveis. Essa inédita previsão permite, também nas uniões hom ossexuais, a separação de corpos (art 22,11), a restri­ ção de visitas ao filho eventualmente adotado (art. 22, IV) e a fixação de alimentos (art 22, V ) 7

O conceito legal de família trazido pela Lei Maria da Penha inse­ re no sistema jurídico as uniões homoafetivas. Quer as relações de um homem e uma mulher, quer as formadas por duas mulheres ou cons­ tituídas entre dois hom ens, todas configuram entidade familiar. Ain­ da que a Lei tenha por finalidade proteger a mulher, acabou por cunhar um novo conceito de família, independente do sexo dos parceiros Assim, se família é a união entre duas mulheres, igualmente é família

4 Maria Berenice Dias, Violência dom éstica e as uniões hom oafetivas 5 Súm ula 3 8 0 : C o m p ro v ad a a e x is tê n c ia de so cie d a d e de fato en tre os

c o n c u b in o s , é ca b ív e l a su a d is s o lu ç ã o ju d ic ia l, co m a p a rtilh a do patrim ônio adquirido pelo esforço com um .

6 Leonardo B arreto M oreira Alves, O re co n h e cim e n to legal do co n ce ito m oderno de família , 1 5 2

! 7 Rogério Sanches C unha e R onaldo Batista Pinto, V iolência dom éstica e relação hom oafetiva, 11

a união entre clois homens. Ainda que eies não se encontrem ao abri­ go da Lei Maria cia Penha, para todos os outros Fins impõe-se este re­ c onhecim ento. Basta invocar o princípio da igualdade A cnticlade f a ­

m ilia r u ltra p a ssa os lim ites d a p rev isã o ju r íd ic a p a r a a b a r c a r tod o e q u a lq u er agru pam en to de pessoas onde p erm eie o elem en to afeto

Diante da nova definição legal, não mais se justiíica que o am or entre iguais ~ tanto de gays com o de lésbicas - seja banido do âmbito da proteção jurídica, uma vez que suas desavenças são reconhecidas com o violência doméstica A realidade dem onstra que a unidade fa­ m iliar não se resum e apenas a casais h etero ssexu ais As uniões homoafetivas já galgaram o status de unidade familiar A legislação apenas acom panha essa evolução para perm itir que, na ausência de sustentação própria, o Estado intervenha para garantir a integridade

física e psíquica dos membros de qualquer forma de família,-’

8 L eon ard o Barreto M oreira Alves, O re co n h e cim e n to legal do co n ce ito m oderno de fam ília.. 1 4 9

9 íglesias Fernanda de Azevedo Rabelo e Rodrigo Viana Saraiva, A Lei Maria da Penha e o reconhecim ento legal da evolução do con ceito de família.

;