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Maria Berenice Dias - Maria Da Penha Na Justiça -

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O terceiro no proccsso. Rio de Janeiro: Aide, 1993

União homossexual 3. ed Porto Aíegre: Livraria do Advogado, 2006

Homoafctividade: o que diz a justiça! Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003 Manual dc direito das famílias 3 ed São Paulo: RI, 2006.

Conversando sobre a mulher e seus direitos.. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2 0 0 4

Conversando sobre, família e o novo Código Civil Porto Alegre: Livraria do Advo­ gado, 2 0 0 4

Conversando sobre homoafctividade Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. Conversando sobre. ...jiistiça e os crimes contra a mulher, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2 0 0 4

Conversando sobre... o direito das famílias. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004 Conversando sobre alimentos. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006.

Dados Internacionais dc C atalogação na Publicação (C IP) (Cüm ara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Dias, Maria Berenice

A Lei Maria da Penha na justiça : a efetividade da Lei 11 3 4 0 /2 0 0 6 de com bate ã violência doméstica e familiar contra a m ulher / Maria Berenice Dias - São Paulo : Editora Revista dos Tribunais. 2 0 0 7

Bibliografia

ISBN 9 7 8 -8 5 -2 0 3 -3 0 6 7 -8

1 Mulheres - Abuso - Leis c legislação - Brasil 2.. Violüncia familiar - Leis c legisla­ ç ã o -B r a s i l 1 Título. ;

0 7 - 2 3 1 5 •' -■ C D U - 3 4 :3 9 6 6 ( 8 1 ) ( 0 9 4 )

índices para catálogo sistem ático: 1. B ra sil: Leis : Mulheres : Violência doméstica e fam iliar: Combate : Direito 3 4 :3 9 6 6 ( 8 1 ) (0 9 4 ) 2„ Lei Maria dá Penha Mulheres : Violência doméstica c familiar : Com bate : Direito 3 4 :3 9 6 6 (8 1 ) (0 9 4 )

(3)

M

aria

B

e r e n ic e

D

ias

A LEI MARIA DA PENHA

NA JUSTIÇA

A efetividade da Lei I I 340/2006 de combate

à violência doméstica e familiar contra a mulher

EDITORA l Y S F

(4)

Ma r ia Be r e n i c e Dia s

Diagraniação eielrOnica:

Fama - Edil Eletrônica Lida . CNPj 96.582 853/0001-58 hnprcssüo c encadernação:

Associaç;io Palas Athena do Brasil - Gráfica e Editora Palas Atliena. C N Pj 43 310 283/0005-04

© desta edição í

[2007]

Ed it o r a Revista d o s Tr ib u n a is Lt d a , C a r l o s H e n riq u e de C a r v a lh o F ilh o

; D jretor responsável}; r --5

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Impresso no Brasil [04-20071 Profissional Atualizado até [03-20071 1DH O RA AFILIADA • c " -‘ V V I V. ' " ISBN 9 7 8 -8 5 -2 0 3 -3 0 6 7 -8 ’; :

6808

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A todas as M arias d a P en ha deste país,

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Chegou a hora de resgatara cidadania feminina. Dai a L ei 11 340/2006 - chamada Maria da Penha ~-qúe cria mecanismos para coibir e preve­ nir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Ninguém duvida que será difícil tirá-la do papel, transfòrmá-la em uma lei efetiva . Para isso o intérprete precisa encharcar-se com o seu conteúdo e'se deixar encantar com a fórma atenta de com o a vítima passou à ser protegida. Este é o único caminho para assegurar efetividade à hovalegislacâo; minimizar os severos índices que a violência doméstica atingiü.

Mas a Lei foi recebida com desdém e desconfiança . Alvo das mais ácidas críticas é rotulada de indevida, de inconveniente Há uma ten­ dência geral de desqualificá-la São suscitadas dúvidas, apontados erros,.identificadas imprecisões e proclamadas até inconstituçionali-dades Tudo serve de motivo para tentar impedir que se torne efetiva* Mas todos esses ataques nada mais revelam.do que injustificável xe~ ^isign d ^a uma nova postura no enfrentamento da violência que tem origem em uma relação de afeto. A fu stig a d a lei experim en ta toda a sorte

de resistência p o r p a rte de quem insiste na reprodu ção das v elh as estru­ turas, p o is representa m u dan ça de p a r a d ig m a s 1

A banalização da violência dom éstica levou à invisibilidade do crime de m aior incidência no pais e o único que tem perverso efeito multiplicador. Suas seqüelas não se restringem à pessoa da ofendida. Comprometem todos os membros da entidade familiar, principalmente c ria n ç a s , que terão a ten d ên cia de se tra n sfo rm a r em agen tes multiplicadores do com portam ento que vivenciam dentro de casa

I Shelm a Lom bardi de Kato, A Lei M aria da Penha e a proteção dos direitos humanos . ..,2 0

(7)

8 A LEI MARIA DA PENHA NA JUSTIÇA

É histórica a falta de consciência de que a violência intrafamiliar merecia um tratam ento diferenciado Com o se trata de crim e de con-lornos próprios, mais do que uma lei, acabou por surgir um estatuto, verdadeiro microssistema, que atenta às peculiares circunstâncias que envolvem a violência doméstica.. Novos m ecanism os de proteção bus­ cam colocar a mulher a salvo da agressão, havendo até a possibilidade de ser decretada a pr isão preventiva do agressor Agora, de acordo com a nova lei, a vítima será ouvida, sempre estará acom panhada de defen­ sor e receberá proteção não só da autoridade policial, mas da própria ju stiça que, de forma imediata, deverá adotar medidas protetiyas de

urgência.

A ênfase em afastar a incidência da Lei dos Juizados Especiais nada mais significa do que reação à maneira absolutamente inadequada com que a Ju stiça cuidava da violência doméstica. A partir .do( rnorneruq em que a lesão corporal leve foi considerada de pequeno potencial ofensivo, surgindo a possibilidade de os conflitos serem, soluciona­ dos de forma consensual, praticam ente deixou de ser punida a vio-lência intrafamiliar, O excesso de serviço levava o juiz à f orçar desis­ tências impondo acordos . O seu inter esse, com o'form a de reduzir o volume de demandas, era não deixar qué o processo sé instalasse., À título de pena restritiva de direito popularizou-se de tal iriòdo a irirpó-sição de pagam ento de cestas básicas, què ó seu efeito punitivo' foi inócuo. A vítima sentia-se ultrajada por sua integridade física ter'tão pouca valia, enquanto o agressor adquiriu lâ consciência de que era

“barato bater na m ulher”. ' 1 1 J

A partir de agora a mulher pode denunciar, sem temei que sua palavra não seja levada a sério Basta aplicar-se a riòva lei E, por mais que se tente minimizar a eficácia e questionar a valia da hová emenda,

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A p re se n ta çã o ... ... ' ...7 1, P o r q ue M aria da P en h a? ... ...13 2 0 c iclo da v io lê n cia ... . ... ... '. ... 1 5 3.. U m o lb a r n o t e m p o ...2 1 3 .1 N o p a s s a d o ... ... 2 1 3 2 U m n o v o tem p o ... ... 2 4 4.. A q u e v e m ... ... ... 2 7 4 1 C o m p ro m isso s i n t e r n a c i o n a i s ... ... 2 7 4 2 A fo iça d os tra ta d o s ... ... 2 9 5 U m a v io la çã o aos d ireitos h u m a n o s ... 3 2 6 A leg alização das u n iõ es h o m o a fe tiv a s ... ... ... 3 5 7 A lgu n s c o n c e i t o s ... ... ... 3 9 , 7 .1 C o n c e ito de v io lên cia d o m é stica ... .... ... 3 9 7 .2 S ujeito ativo e su je ito p assivo ... ... : ... 4 1 7 3 U n id ad e d o m é s t i c a ... . 4.2 7 .4 F a m í l i a ... ... ... 4 3 7 5 R elação in tim a de afeto ... ...‘... . ... 4 4 7 6 F o rm a s da v io lên cia ... 4 6 7 6 1 V iolên cia física ... ... ... ... 4 6 7 6 .2 V iolên cia p sic o ló g ica ... ... ... 4 7 7 6 3 V iolên cia s e x u a l ... ... ... 4 8 7. 6 4 V iolên cia p a t r i m o n i a l ... ... ... ... ... 5 1 7 6 .5 V iolên cia m o r a l ... .... ... 5 4 8.' A q u e stã o da c o n stitu cio n a lid a d e ... ...: ' 5 5 9 ( D efin ição da c o m p e t ê n c i a ... ... ... . ^ 6 0

9 .1 I n t r o d u ç ã o ... ... . ..1..’ ,:J. ' 6 0 9 2 C o m p e tê n c ia de “ju ris d iç ã o ” ... 6 0 • 9 3 C o m p e tê n cia de ju íz o ... . . . , ;l ' 6 1

9 4 C o m p e tê n cia f u n c i o n a l ... ... ...■. ; 6 4 9 .5 C o m p e tê n cia ratiom ' perso n a e : ; ... ... i 6 5

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10 A LEI MARIA DA PENHA NA JUSTIÇA

9.6 Competência das Varas Criminais e dos JVDFMs... 67

9 7 Competência do jú r i... 68

9 8 Foro de eieição... 69

10 A inaplicabilidade da Lei dos juizados Especiais... 71

1 1 .0 papel do Ministério Público ... 74

12 As medidas protetivas de urgência ... 78

12 1 Tutela de urgência... ... 78

12 .2 Que obrigam o agressor... 82

12 3 Que protegem a vitim a... ... ... ... ... 83

12.4 Separação de corpos e proibição de contato,,-... ... \ 84

12 5 Obrigação alim entar... ... ... 86

12.6 Medidas de ordem patrimonial... ... ... 87

12..7 Execução... ... ... ;.vJ„ J 92 13 Garantia do trabalho... ... ; 93

13.1 Introdução ... ... , ... ... _ 93 13 2 No serviço público ___ .:... 94

13.3 Na iniciativa privada ... ‘..'.'J....:..:... : 95

14. Dos delitos e das penas... ... ... ,...;... , -98

14.1 O que m udou... ... . . . ... ... : .98

14.2 Alterações no Código Penal .,1.'.: / ; L 98 14.2 1 Uma nova a g r a v a n t e ... . . . . . . ; 99

14 2.2 Lesão corporal qualificada . : v; .. ... ... : ... 100

1 4 .2 .3 Mais uma majorante . ' l i . . ... 101

14 3 Prisão preventiva... ... ■ 1102

14.4 Comparecimento a programa de recuperação e reeducação T ! 104 14.5 Cesta básica... ...V.;.:;,:. ,,„A ■ 107 14 6 Sursis... :...vi..v!'. ^ :T: ....' " 108 15 Retratação, desistência ou renúncia? . . . ... ... 110

15.1 Algumas definições ... ... . 110

15 2 Representação e renúncia na Lei dos Juizados.Especiais , 112 15..3 Representação e renúncia na Lei Maria da Penha ... ... 112

16,. A polêmica sobre as lesões c o r p o r a i s . ... ,1 1 6 1 6 1 Introdução... ... ... ... ... . ,.1 1 6 ■ ' r •; -i í, i'l; < !.;■■■ f ■ 1 íi 'i ‘ -;f. ! 16.2 Para uns... ... .:... ... .1 1 7 16.3 Para outros... ... ...,....____•. .1..'.. ... '118

17. Providências policiais... ... > ‘1 2 7 17.1 Por onde começar ... •• •..127

(10)

18 Procedimento no Juizado de Violência Doméstica e Familiar

contra a Mulher-JVDFM ... 134

18 1 Para onde deve segu ir... 134

18.2 Rito ... 136

18 3 Competência ... ... 137

18.4 Medida protetiva de urgência 140 18.5 Audiência de justificação... 143

18.6 Audiência de conciliação . ... ... ... 144

18.7 Retratação â representação ... 146

18.8 Dos recursos... 146

19 Procedimento na Vara Criminal... 148

19 1 Onde não deveria estar... ... ... 148

19,.2 Encaminhamento à Vara Cível... 152

19.3 Dos recursos... ... ... 153

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Por que Maria da Penha?

Talvez m uitos não saibam por que a Lei 1 1 .3 4 0 /2 0 0 6 é chamada Maria da Penha.,

Ajustificativa é dolorosa, pois a farmacêutica Maria da Penha Maia Fer nandes foi mais uma das tantas vitimas da violência doméstica deste país, Como muitas outras mulheres~ela reiteradamente denunciou as agressões que softeu. Çhegou a ficar com vergonha de, dizer que tinha sido vitima da violência doméstica e pensava: se não acon teceu nada até

agora, é porqu e ele, o agressor, tinha ra z ã o de ter je it o a q u ilo .1 Mas, ainda

assim, não se calou Em face da inércia da Justiça Maria da Penha escre­ veu um livro,2 uniu-se ao movimento de mulheres e, como ela mesmo diz, não perdeu nenhuma oportunidade de manifestar sua indignação3

pQr duas vezes, seu marido, o professor univéisitário e econo­ mista M. A. H. V, tentou m atá-la, Na primeira vez, em 29 de maio de 1 9 8 3 , simulou um assalto fazendo uso de uma espingarda Como re­ sultado ela ficou paraplégica.. Após alguns dias, poüco mais de um a semana, nova tentativa, buscou eletrocutá-la por meio de uma des­ carga elétrica enquanto ela tomava banho

Tais fatos aconteceram em Eortaleza, Ceará. As investigações com eçaram em junho de 1 9 8 3 , mas a denúncia só fòToferecida em setembro de 1984. E m 1 9 9 1 , o réu foi condenado pelo tribunal dó júri á oito anos de prisão: Além de ter recorrido em liberdade ele, um ano depois, teve seu julgamento anulado. Levado a novo julgamento em 19 9 6 , foi-lhe imposta a pena de dez anos e seis meses Mais uma vez^ rgeorreu em liberdade e somente 19 anos e 6 meses após os fatos, em 2 0 0 2 , é que M. A. H. V foi pres o . Cumpriu apenas dois anos de prisão

1 Maria da Penha, Antes de tudo, um a forte, 2 2

2. Maria da Penha Maia Fernandes, Sobrevivi, posso contar, Fortaleza, 1 9 9 4 3 Maria da Penha, Antes de tudo, um a forte, 22 , :■ . .

(12)

Essa é a história de Maria cia Penha A repercussão foi de tal or­ dem que o Centro pela Justiça e o Direito Internacional - C EjlL e o Comitê Latino-Americano e dó Caribe para a Delesa dos Direitos da ij^ l u l h e r - CLADEM formalizavam denúncia à Comissão Interam eri-I c ana P^re^los Humanos da Organização dos Estados Americanos.

J Apesar de, por quatro vezes, a Comissão ter solicitado informações

' ao governo brasileiro, nunca recebeu nenhuma resposta.. O Brasil foi c ondenado internacionalm ente em 2 0 0 1 . O Relatório da OEA, além de impor o pagamento de indenização no valor de 2 0 mil dólares em favor de Maria da Penha, responsabilizou o Estado brasileiro por ne­ gligência e omissão em relação àviolência dom éstica, recom endando a adoção de várias medidas, entre elas “simplificar os procedimentos j udiciais penais a fim de que possa ser reduzido ó tem po processual” Foi em face da pressão sofrida por parte da OEA que o Brasil; fi­ nalmente, cumpriu as convenções e tratados internacionais do qual é signatário Daí a referência constante da èmenta contida na Lei Maria dá Penha à Convenção sobre a Elim inação de Todas ás Form as de Dis­ crim inação contra as Mulheres e à Convenção Interam ericana para Prevenir. Punir e Erradicar á Violência contra a Mulher. "

ac O projeto, que teve início em 2 0 0 2 , foi elaborado p or um con­

sórcio de 1 5 ONGVque trabalham com a violência dom éstica. O Gru-po de Trabalho ínterministerial, criado pelo Decreto 5 0 3 0 /2 0 0 4 , sob a coordenação d a S e c r e t a r ia E s p e c ia l d e PnTi tiras p ;m i as MnThrrrs. elaborou o projeto que, em novembro de 2 0 0 4 , foi enviado ao Con­ gresso Nacional

A Pep u tad a landira Feghali, relatora do Projeto d.e Lei 4 .5 5 9 / 2 0 0 4 , realizou audiências públicas em vários Estados e apresentou substitutivo, Novas alterações foram levadas.a efeito pelo Senado F e­ deral (PLC 3 7 /2 0 0 6 ) . A Lei 1 1 .3 4 0 , sancionada pelo Presidente da ^ epiA licajem 7 de agosto de 2 0 0 6 v está em,vigor desde 2 2 de setem r bro_de,2 0 0 6 ,;__ V.. ,,... . . j , , 4 ;

Quando o Presidente Lula assinou a Lei Maria d'a! Penha-disse: E sta mulher renasceu d as cin zas p a r a se tran sfo rm ar em um sím bolo, da

___luta con tra a violência d om éstica no n osso país

A Maria da Penha, a Comissão Interam ericana:de Direitos Hu­ manos da Organização dos Estados Amer icanos e 0 legislador fizeram sua parte Agora é a nossa vez!

(13)

O ciclo da violência

Ditados populares, repetidos de forma jocosa, absolveram a vio­ lência doméstica: “em briga de m arido e mulher ninguém, mete a cot lher”; “ele pode não saber por que bate, mas ela sabe por que apanha”. Esses, entre outros ditos repetidos como brincadeira, sempre escon­ deram um a certa conivência da sociedade para com a violência do­ méstica. Talvez o mais terrível deles seja; “mulher gosta de apanhar”, engano gerado pela dificuldade que elas têm de denunciar seu agressor. Seja por m edo, p or vergonha, por não ter para onde ir, por receio de não conseguir se m anter sozinha e sustentar os filhos, o fato é que a mulher resiste em buscar a punição de quem ama ou, ao menos, um

dia am ou. ; : ( .. ,:i _ ^ .

.vj . Todos sonham com a felicidade, mas a mulher deposita este so­ nho no casam ento: ser a rainha do lar, ter uma casa para cuidar, filhos para cria r e um m arido para am ar Não há casam en to em que as casado iras não suspirem pelo buquê da noiva. Ao depois, venderam para a mulher a idéia de que ela é frágil e necessita de proteção.e dele­ garam ao hom em o papel de pro tetor, de provedor. Dai à dominação, l do sentimento de superioridade.à.agr£ssãQT é um passo.

,'n >y: D esãejqne o m undo é mundo hum ano, a m ídllgr sem p rzlaL d iscn m i-j y i d a d h i s p i z z g à f Ü m a ^ ^

Ninguém duvida que a violéncia\soirida pela m ulher não é e xclu siv aT

mente de responsabilidade do agressor A sociedade ainda cultiva va­ lores que incentivam a violência, o que impõe a necessidade de se to­ m ar consciência de que a culpa é de todos. Q fundamento é cultural e decorre da desigualdade no exercício dó poder e que leva a uma rela-ção de dominante e dominado. Essas posturas acabam sendo

(14)

dadas pelo Estado Daí o absoluto descaso de que sempre foi alvo a v i ol ê n c i a d o m és tic a QJÍ££LSÍ/_g ucuxla óqciLkízçjí i?isí ó r lças..d ííd ^ ^ íííU

d a d c, inclusive. no..plcmo jiu:idico..r

Apesar de todos os avanços, da equjnai.acMmlxej3.lioiiiein-.e-a-. 111 ulhcr levada a efei to de modo tão enfático pelaC.Qiisiituicao. a ideo-logia patriarcal ainda subsiste A desigualdade sociocnltural é uma das íazões da discriminação feminina, e, principalm ente, de sua dom ina­ ção pelos hom ens, que se vêem com o superiores e mais fortes.3 O homem se tem com o proprietário do corpo e da vontade da mulher e dos filhos A sociedade protege a agressividade masculina, constrói a imagem da superioridade do sexo que é r espeitado por sua virilidade Afetividade e sensibilidade não são expressões da masculinidade., Desde o nascim ento é encorajado a ser forte, não chorar, nãò levar de­ saforo para casa, não ser “m ulherzinha” , Os hom ens precisam ser supei-hom ens, n ão lhes é perm itido ser apenas hum anos. Essa errô ­ nea c onsciência masculina de poder é que lhes assegura o suposto direito de fazer uso de sua força física e superioridade corporal sobre todos os membros da família

Àinda que se esteja falando em violência contra á mulher, há um dado que parece de todos esquecido: a violência dom éstica é o !germé da violência que está assustando a todos'. Q uernvivencia a violência, _mnirasvezp.snré antes de nascer e dur ante toda a infância, só pode achar natural o uso da força física Também a im potência da vítima; que não rnnsegue ver o agressor punido, gera nos filhos a consciência de que

f Os resultados são per versos Segundo a Organização Mundial da Saúde - OMS, 30% das mulheres foram forçadas nas primeiras expe­ riên cias sexu ais; 52% são alvo dé assédio se x u a l; 69% já foram agredidas ou violadas. Isso tudo, sem contar1 o núm ero de homicídios praticados pelo marido ou com panheiro sob a alegação de legítima

defesa da honra, !

Ainda que tais dados sejam surpreendentes, é preciso atentar que esses números não retratam a realidade, pois a violência é

subnoti-2 Shelma Lombàrdi de Kato, A Lei M aria da Penha e a proteção dos direitos hum anos sob a perspectiva de gênero, 19

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ficada..somente 10% das agressões sofr idas por mulheres são levadas ao conhecim ento da polícia. É difícil denunciar alguém que reside sob o mesmo tetò, pessoa com quem se tem um vínculo afetivo e filhos em com um e que, não raro, é o responsável pela subsistência da família A conclusão só pode sei uma; as mulheres nunca paiam de apanhar, sendo a sua casa o lugar mais perigoso para elas e os filhos.

Ao homem sempre coube o espaço público e a m ulher foi confi­ nada nos limites cia família e do lar, o que enseja a formação de dois mundos: um de dom inação, externo, produtor; o outro de submis­ são, interno e reprodutor Ambos os universos, ativo e passivo, criam pólos de dominação e subm issão.4 A essa diferença estão associados papéis ideais atribuídos a cada um: ele provendo a família e ela cuidan­ do do lar, cada um desempenhando a sua função. Padrões de com por­ tamento assim instituídos de m odo tão distinto levam ã geração de um verdadeiro código de honra. A sociedade outorga ao m acho um papel paternalista, exigindo uma postura de submissão da fêmea. As mulheres acabam recebendo uma educação diferenciada, pois neces-... ... ... ... ■ ... :.. ... ... t1*"*"".. ... sitam ser mais controladas, mais limitadas em suas aspirações e dese­ jos., Por isso o tabu da virgindade, a restrição ao exercício cia sexuali­ dade e a sacralização da m aternidade

Á evolução da Medicina, com a descoberta de m étodos contra-ceptivos, bem com o as lutas emancipatórias promovidas pelo movi­ m ento feminista levaram à redefinição do modelo ideal de família. A mulher, ao se integrar no mercado de trabalho, saiu do lar, impondo ao homem a necessidade de assumir responsabilidades dentro de casa..

O CICLO DA VIOLÊNCIA ,1 7

Essa-õmdfl u £xu i cahaii_pj Q im cajjãcL£LaLa s t am enLajdux-paiâffi^tro preestabelecido, terreno fértil para conflitos.

Nesse contexto é que.surge a violência, justificada com o forma de; com pensar possíveis falhas.no cum prim ento ideai dos papéis de gênero. Quando um não está satisfeito com a atuação do outro, surge a guerra dos sexos.. Cada um usa suas armas: ele, os músculos;.el^, as lágrimas. A mulher, por evidente, leva a pior e se torna vitima da vio­ lência masculina.

Acostumada a realizar-se exclusivam ente com o sucesso de seu par e o desenvolvimento dos filhos, não consegue essa nova rriuiher

(16)

encontrar em si o centro de gratificação própria O medo, a depen­ dência econôm ica, o sentim ento de inferioridade, de m enos valia, decorrentes da ausência de pontos de realização pessoais impuseram à mulher a lei cio silêncio. Nem sempre é por necessidade de sustento ou por não ter condições de provei sozinha a própria existência que ela se submete e não denuncia as agressões cie que é vítima Em seu intim o, se acha m erecedora da punição por ter desatendido as tarefas que acredita serem de sua exclusiva responsabilidade. Um profundo sentim ento de culpa a impede de usar a queixa com o forma de fazer cessar a agressão Por isso, raros são os casos em que a vítima se enco-r aja ^ jenum'iaenco-r_a violê ncia ocoenco-renco-rida dentenco-ro cio laenco-r.

As relações familiares, em sua grande m aioria, têm origem em um elo de afetividade Surgem de um enlaçam ento amoroso.. Diante dessa realidade evidente por si c abe questionar, afinal, por que as re­ lações afetivas migram paia a violência em núm eros tão chocantes e surpreendentes?. Por que as mulheres sofrem em silêncio? Medo, ver­ gonha, tem or da incom preensão, sentim ento de incapacidade, de impotência, tolerância à submissão, desrespeito a si próprias? Mas essas são as.causas da violência ou são os m otivos do silêncio?

...

. iii

-

...

O desejo do agressor é subm eter a m ulher à vontade dele: tem & necessidade de controlá-la. Assim busca destruir sua auto-estim a As criticas constantes fazem ela acreditar que tudo que faz é errado. de nada entende, não sabe se vestir nem se com p ortar socialm ente. JÉ_ induzida a acreditar que não tem capacidade para administrar a casa nem cuidar dos filhos. A alegação de não ter ela bom desempenho sexual leva ao afastamento da intimidade e à am eaça de abandono

‘: ’ Para dominar a vitima, o varão procura isolá-la do m undo exte­ rior. afastando-a da família Proíbe amizades, denigre sua imagem aos amigos Muitas vezes a impede de trabalhar, sob a justificativa de ter condições de prover a família Com isso, a m ulher se distancia das pessoas junto às quais poderia buscar apoio. Perde a possibilidade de ter um contato com a sanidade e buscar ajuda

O cicja d a violência é perverso.

Primeiro vem o silêncio seguido da indiferença. Depois surgem as reclamações, reprimendas, reprovações e com eçam os castigos e as punições Os gritos transformam-se em em purrões, tapas, socos,

(17)

pon-O CICLpon-O DA VIpon-OLÊNCIA .19

tapés, num ciescer sem fim. As agressões não se cingem à pessoa cia vitima, o varão desirói seus objetos de estimação, a humilha diante dos fil h os. Sabe que estes são os seus pontos fracos e os usa como massa de manobra, ameaçando maltratá-los

No entanto, socialm ente o agressor é agradável, encantador. Em público se mostra um bélo companheiro, a não per mitir que alguma referência a atitudes agressivas mereça credibilidade O homem não odeia a mulher, ele odeia a si mesmo Muitas vezes ele foi vitima de abuso ou agressão e tem medo, precisa ter o controle da situação para se sentir seguro A forma de se com pensar é agredir.

Facilm ente a vitima encontra explicações, justificativas para o com portam ento do parceiro. Acredita que é uma fase, que vai pássarT que ele anda estressado, trabalhando m uito, com pouco dinheiro Pro cura agradá-lo. ser mais com preensiva, boa parceira Para evitar problemas, afasia-se dos amigos, submete-se à vontade do agressor. só usa as roupas que ele gosta, deixa de se maquiar paranãodesagradá-__1q. Está constantem ente assustada, pois não sabe quando será a pró­ xima explosão, e tenta não fazer nada errado,. Torna-se insegura e, para não incom odar o com panheir o, com eça a perguntar a ele o que e como fazer, torna-se sua dependente Anula a si p róp ria^ eu s deseios.rso-nhos de realizaçãojiessoal, objetivos próprios Nesse m om ento, a mulher vira um alvo fácil A angústia do fracasso passa a ser seu coti­ diano, Questiona o que fez de errado, sem se dar co nta de que para o agressor não existe nada certo Não há com o satisfazer o que nada mais é do que desejo de dominação, de mando, fruto de um com portam en­ to controlador

O homem sempre atribui a culpa à mulher, tenta justificar seu descontrole na conduta dela: suas exigências constantes de dinheiro, seu desleixo para com a casa e os filhos. Alega que foi a vitima quem com eçou, pois não faz nada certo, não faz o que ele m anda, Ela acaba reconhecendo que em parte a culpa é sua. Assim o perdoa Para evitar nova agressão, recua, deixando mais espaço para a agressão O medo da solidão a faz dependente, sua segurança resta abalada A mulher não resiste à m anipulação e se torna piisioneira da vontade do homem, surgindo o abuso psicológico.

Depois de um episódio de violência, vem o arrependim ento, pedidos de perdão, ch oro, flores, prom essas Cenas de ciúmes são

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recebidas com o prova de amor, e ela fica lisonjeada O clima familiar melhora e o casal vive uma nova lua-de-mel Ela sente-se protegida, amada, querida, e acredita que ele vai mudar

Tudo fica bom até a próxim a cobrança, am eaça, grito, tapa . l“orma-se um ciclo em espiral ascendente que não tem mais lim ite.

Jn tciíei ênçia nem d afu stiça, faz coin queiudoi^xiciajsjU&mgJradsú veh protegida peiqflEJUgdjau.Agressor e agredida firmam um pacto de silêncio, que o livra da p u n ição. Estabelece-se um verdadeiro círculo vicioso: a m ulher não se sente vítima, o que faz desaparecer a figura do agressor Mas o silêncio não impõe nenhum a barreira. A falta de um limite faz a violência aum entar O hom em testa seus limites de dominação Quando a ação não gera reação, exacerba a agressividade, para conseguir dominar, para m anter a subm issão.

A ferida saja, os_ossos quebrados se recuperam , o sangue seca, mas a percla da auto-estim a, o sentimento oe m enos valia,Tclepres­ são, essas são feridas que não cicatrizam .

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Um olhar no tempo

3

SUMÁRIO: 3 1 No passado - 3 ,2 Um novo tempo.

3 . 1 NO PASSADO

^ Até o advento da Lei Maria da Penha, a violência doméstica não N y mereceu a devida atenção, nem da sociedade, nem do legislador e muito

> menos do judiciário Como eram situações que ocorriam no interior do "lar, doce lar”, ninguém interferia. Afinal, "em briga de marido e mulher ninguém põe a colher” 1

A criação de juízos especiais para o julgam ento de delitos m eno­ res foi determ inada pela Constituição F e d e ra l1 A Lei dos Juizados Especiais2 veio dar efetividade ao com ando constitucional e signifi­ cou verdadeira revolução no sistema processual penal brasileiro A criação de medidas despenalizadoras, a adoção de um rito sumaríssi-mo, a possibilidade de aplicação da pena mesmo antes do oferecimento da acusação e sem discussão da culpabilidade, agilizaram o julgamento dos crimes considerados de pequeno potencial ofensivo. Com isso a justiça desafogou-se, ganhou celeridade e diminuiu a ocorrência de

prescrição, emprestando maior credibilidade ao Poder Judiciário

1 CF; art 9 8 : A U nião, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados cria­ rão: I - juizados especiais, providos por juizes togados, ou togados e lei­ gos, com petentes para a con ciliação, o julgam ento e a execu ção de causas eiveis de m enor com plexidade e infrações penais de m enor potencial ofen­ sivo, mediante os procedim entos oral e sum ariíssim o, perm itidos, nas hi­ póteses previstas em lei, a transação e o ju lgam en to de recu rsos por tur­ mas de juizes de prim eiro grau

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Aincla que tenha havido uma consciente tentativa de acabar com a impunidade, deixou o legislador de priorizar a pessoa humana, pre­ servar sua vida e sua integridade física Ao condicionar à representa­ ção as lesões corpo i ais leves e as lesões culposas, o mi t iu -se o Estado de sua obrigação de punir, transmitindo à vítima a iniciativa de bus-■car..a..ap.enacão de seu agressor, segundo critério subjetivo de conve­ niência. Foram consideradas com o infrações menores as que afetam o cidadão, tny> continuam os delitos contra o patrimônio desenca-deando ação pubIica incondicionacla

Na ânsia de agilizar, olvidou-se a lei que não é possível condicio­ nar a ação penal à iniciativa da vítima quando existe desequilíbrio entre: agressor e agredido, hierarquização entre ambos. Não há com o exigir que o desprotegido, o hipossuficiente, o subalterno, formalizem queixa contra o seu agressor. Esse desequilíbrio também ocorre no âmbito das relações afetivas, já que,'em suarnáciça maioria, a violência é per­ petrada por m aridos, companheiros oú pais contra mulheres, crian­ ças e adolescentes, Apesar de a igualdade entre os sexos estar ressalta­ da enfaticamente na Constituição Federal, é secular a discriminação que coloca a mulher em posição de inferioridade e subordinação frente ao homem. A desproporção, quer física, quer de valoração social, entre o gênero masculino e feminino, não pode ser olvidada

Injustificável a falta de consciência do legislador de que a vio­ lência intrafamiliar merecia um tiatam ento diferenciado Evidente o descaso ao ser exigida a representação no delito de lesões corporais, sem ressalvar a violência contra a mulher, sabidamente a prática delltiva que mais ocorre no ambiente dom éstico. Jj vitima, ao veicular a quei­ xa, nem sempre quer sepaiar-se do agressor. Também não quer que ele seja preso. Só quer que a agressão cesse. Assim, vai em busca de um aliado, pois as tentativas anteriores não lograram êxito. A m ulher, quando procura socorro, já está cansada de apanhar e se vê im poten­ te. A submissão que lhe é im posta, o sentim ento de m enos valia, a deixam cheia de medo e vergonha, Aliás, este é o motivo de não de­ nunciar a primeira agressão

fiara atender esta realidade é que foram criadas as Delegacias da Mulher. A .primeira foi implantada em São Paulo, no ano de 1 9 8 5 . Desempenharam importante papel, pois o atendimento especializa­ do, feito quase sempre por mulheres, estimulava as vítimas a denun­ ciar os maus tratos sofridos, muitas vezes, ao longo de anos.. De outro

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lado, o (ato de os agressores serem chamados peianie a autoridade

UM OLHAR NO TEMPO 1 3

policial cumpria importante função intimidatória. Ainda que a recon­ ciliação do casal ensejasse a tentativa de “retirar a queixa”, a instaura­ r ã o do inquérito e o clesencadeamento autom ático da ação penal de~

sempenhava papel pedagógico

Pprém, a Lei dos juizados Especiais esvaziou as Delegacias da Mulher, que se viram limitadas a lavrar termos circunstanciados e encam inhá-los a juízo tya audiência preliminar, a conciliação mais~ do que proposta, era imposta, ensejando simples com posição de da-; nòs. Não obtido acordo, a vitima tinha o direito de representar, mas precisava se manifestar na presença cio agressor. Mesmo após a repre­ sentação, e sem a participação da ofendida', ^M inistério Público po­ dia transacionar a aplicação de multa ou pena resLritiva de direitos Aceita a proposta, o crim e desaparecia: não ensejava reincidência, não constava da certidão de antecedentes e não tinha efeitos civis.

Os avanços legais foram tímidos .

A Lei 1 0 ,4 5 5 , de 2 0 0 2 ,3 c riou uma medida cautelar, de natureza penal, ao admitir a possibilidade de o juiz decretar o afastamento do agressor do lar conjugal na hipótese de violência doméstica.

J á a Lei 1 0 .8 8 6 , de 2 0 0 4 / acrescentou um subtipo à lesão corpo­ ral leve, decorrente de violência dom éstica, aumentando a pena m íni­ ma de três para seis meses de detenção Nenhuma das mudanças em ­ polgou ! A violência doméstica continuou acumulando estatísticas, Isso porque a questão continuava a tramitar no juizado Especial Criminal e sob a incidência dos institutos despenalizadoresda Lei 9 ,0 9 9 /1 9 9 5 5 As alterações legislativas foram praticamente inócuas, pois c om o crime 3 A Lei acrescentou um parágrafo ú nico ao artigo 6 9 da Lei 9 .0 9 9 /1 9 9 5 : Ao autor do fato que, apôs a íavratura do term o, for im ediatam ente encam i­ nhado ao juizado ou assum ir o com prom isso de a ele com parecer, não se ím porâ prisão em flagrante, nem se exigirá fiança Em caso de violência d om éstica, o juiz poderá determ inar, com o medida de cautela, seu afasta­ m ento do lar, dom icílio ou local de convivência com a vitima

4 CP, art. 1 2 9 , § 9.°: Se a lesão for praticada con tra ascendente, descendente, irm ão, cônjuge ou com panheiro, ou com quem conviva ou tenha c o nvivi-do, ou, ain da, prevalecendo-se o agente das relacões.dQmésticas..de coabi-tação ou de hospitalidade: Pena - detenção, de 6 (seis-) meses a 1 (u m ) ano, 5 M arcelo Lessa Bastos, Violência dom éstica e familiar con tra a m ulher - Lei

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de m enor potencial ofensivo, ficava dispensado o flagrante se o autor se com prom etesse a com parecer no Juizado Especial C rim inal Além disso, era possível a transação penal, a concessão de sursis (Lei 9 0 9 9 / 1 9 9 5 , a n 8 9 ), a aplicação das penas restritivas de direitos, e, se a lesão fosse leve, a ação dependia de representação (Lei 9 0 9 9 Ã 9 9 5 * ari. 8SX'6

Ainda que, com a criação das Delegacias da Mulher c. dos juizados Especiais, tenha haviclo aumento expressivo no núm eio de registros policiais de lesões corporais e ajrreaças, 70% dos casos julgados en­ volviam violência cometida pelo homem contra, a .mulher,- o que de­ m onstra a banalização da violência dom éstica, não havendo solução satisfatória para o conflito 7 ' \\í::í:í

Apesar de expressivos os números da violênéiá dom éstica, não se encontra just ificativa para o baixo índice de cbndènaçõésVA justi­ ficativa sempre foi a preservação da Família. À rnulhej eia considera­ da propriedade do marido, sendo-Ihc assegurado ô‘cÍiréito de dispor do seu corpo, da sua saúde e até da sua vida.. As absolvições sistem ati­ cam ente levadas a efeito para garantir a harm onia f a m i l i a r .acabaram tendo efeito contrário: consagraram a im pünidadeié.cpndenaram a violência doméstica à invisibilidade

Os alarmantes níveis de violência com eçararh'á assustar e des­ pertaram a atenção de todos Mas tudo isso! agòra :çhega<abliin, ao menos é o que se espera • r ; -.r,. rií/t. ; •

; V ■: t-M? ' i* ' :

3 . 2 Um NOVO TEMPO j*jj i . '

;;. ■ " f i t ■j r ■

Em muito boa hora entrou em vigor, em 2,2 desetem bio de 2 0 0 6 . a Lei 1 1 .3 4 0 , de 0 7.08.2006^ com o nome de Maria da Penha, que cria m ecanism os para coibir a violência dom éstica e. fam iliar co n tra a

mulher. :

Conforme o relatório da Deputada Jandira Féghàli, quando da apresentação do proieto de lei, em dez anos de atuação^d^Luizados E speciais os resultados reforçam a im punidade, que-deu-margem ã i • .••; À i . I r 6 D amásio de Jesu s, Violência dom éstica: novos tipos penais criádos-pela Lei

10 8 8 6 , de 17 de ju n h o de 2 0 0 4 . -7 Elisa Girotti Celm er e Rodrigo G hiringhelli de  zevedó, V iolência de gê­

nero, produção legislativa e discurso punitivo: um a.análise dá L e iM 3 4 0 / 2 0 0 6 ,1 5

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UM OLHAR NO TEMPO 2*5 >

reincidência e ao agravamento cio aio violento: 90% dos casos são ar-quivados ou levados à tra nsação p e n a lí! Es lima-se que, no Biasil, ape - ' nas 2% dos acusados por violência dom éstica contra a mulher são }

condenados. De cada cem brasileiras assassinadas, setenta são vítimas ( no âmbito de suas relações dom ésticas, evidenciando que, ao contrá­ rio dos hom ens, as mulheres perdem suas vidas no “espaço privado” 9 }

Os avanços da nova lei são muitos e significativos., Uma das gran- ' cies novidades foi a c riação dos Juizados de Violência Doméstica c , Familiar contra a Mulher - IVDFMs, com com petência cível e crim i­ nal (art. 1 4 ) Devolvida à autoridade policial a pierroga.ti.va..inves­ tiga tória, cabe-lhe instalar o inquérito. A vítima estará sempre acom - '>

pqnhada de advogado (art. 2 7 ), tanto na fase policial com o na judicial, , sendo-lhe garantido o acesso aos serviços da Defensoria Pública e da Assistência Judiciária Gratuita (art. 28) Não pode ser ela a portadora da notificação ou da intimação ao agressor (art 21, parágrafo único) 1

Também deve a vítima ser pessoalmente cientificada, quando o ,/ agressor for preso ou liberado da prisão, sem prejuízo cia intim ação de seu procurador constituído ou do defensor público (art. 2 1 ). Mais, deve ojuiz adotar medidas que façam cessar a violência, por exemplo; determ inar o afastamento do agressor do lar: impedi-lo que se aproxi- > me da casa; vedar o seu contato com a família (art 22) Também tem )

o dever de encaminhar a mulher e os filhos a abrigos seguros, garan-tindo-lhe a mantença do vínculo de emprego (art 9 °, 11) Além disso, 1 pode decretar a separação de coip os, fixar alim entos, bem com o ado-tar medidas outras como suspender procuração outorgada ao agressor e anular a venda de bens com uns (art 2 4 ) A Lei proíbe a aplicação de pena pecuniária, multa ou a entrega d.e cesta básica ( art 17) e permite '

a prisão preventiva do ofensor (art 20). i

O último dispositivo da Lei é dos mais salutares, ao pe.miUii-q-U€ o juiz determine o com parecim ento obrigatório do agressor a p rogra-mas de recuperação e reeducação (art 4 5 ) 10 É importante que as

pe-8 jan dira Feghali, Violência contra a m ulher: um ponto final, 18 ( 9 Idem, 2 0

10 LEP, art 15 2 : Poderão ser m inistrados ao condenado, durante o tem po de 1 perm anência, cursos e palestras, ou atribuídas atividades educativas Pa­ rágrafo ú nico Nos casos de violência dom éstica con tra a mulher, o juiz poderá d eterm in ar o c o m p arecim en to ob rigatório do ag resso r a_p r ogr a - '

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nas restritivas de direilo sejam de molde a propiciar uma mudança de com portam ento naquele que pratica o crime sem entender o caráter cr iminoso de seu agir Mas para isso é necessário que tais espaços exis­ tam, para o cum prim ento da determ inação judicial

Imprescindível, no entanto, que sejam instalados os JVDFMs e que seus juizes, prom otoies, advogados e defensores estejam devida­ mente capacitados Im perioso, igualm ente, que seja m ontada uma estrutura intcrdisciplinar, para que todos os m em bros da família re­ cebam atendimento psicológico e acom panham ento por assistentes sociais

Chegou o m om ento de resgatar a cidadania feminina .É urgente a adoção de m ecanism os de proteção que coloquem a mulher a salvo do agressor, para que ela tenha coragem de denunciar sem temer que sua palavra não seja levada a sério. Só assim será possível dar efetividade

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T

4

A que vem

SUM ÁRiO: 3 1 C om prom issos internacionais - 3 2 A força dos tratados

4 . 1 Co m p r o m i s s o s i n t e r n a c i o n a i s

Proclama a Constituição Federal (art 2 2 6 ): UA família, base da sociedade, tem especial p roteção do E s ta d o ” E prom ete (art. 2 2 6 , § 8 .° ): “O Estado assegurará a assistência à família na pessoa'de cada um dos que a integram , criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações”

A Lei Maria da Penha vem para atender esse com prom isso cons­ titucional. Porém , chama a atenção que, na sua ementa, há referência não só à norm a constitucional, mas também são mencionadas as Con-vin çõesT ob re a Elim inação de Todas as Form as de D iscrim inação contra as M ulheres e sobre a ínteram ericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a M ulher

.Esse tipo de referência pouco usual na legislação infraconstitu-cional, além de atenderTrecom endação da OEA, decorrente da con ­ denação imposta ao Brasil, também reflete uma nova postura frente aos tratados internacionais deproteção dos direitos hum anos,

A partir do processo de dem ocratização, deflagrado em 1 9 8 5 , o Brasil passou a ratificar relevantes tratados internacionais de direitos humanos, que revelam, sobretudo, a con sciên cia ética con tem p orân ea

co m p a rtilh a d a p elo s E stados, na m ed id a em que tradu zem o consen so in tern acion al a cerc a d e p a râ m etros protetivos m ínim os relativos ao s d i­ reitos huma?ios: o “m inim o ético irredu tível” 1

L Fíávia Piovesan, Tratados internacionais de proteção dos direitos hum a­ nos e a Constituição Federal de 1 9 8 8 ,8 .

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Em 1975, foi realizada, no M éxico, a 1 Conferência Mundial sobre a Mulher qiíê teve como resultado'a elaboração, em 1 y T ^ d ã C õ n vên-cão^iõlSFêYlEhrnmãção de iodas as bormas de Discriminação contra as Mulheres e cjuc entrou em vigor no ano de 1 9 8 1. A Convenção prevê a possibilidade de ações afir mativas abarcando áreas como trabalho, saú­ de, educação, direitos civis e políticos, estereótipos sexuais, prostitui­ ção e família Esse foi.o primeiro instrumento internacional que dispôs amplamente sobre os direitos humanos da mulher . Tem dois propósi­ tos: promover os direitos da mulher na busca da igualdade de gênero e reprimir quaisquer discr iminações contra a m u lh er2 Porém, neste do­ cu mento, não foi incorporada a questão da violência de. gênero 3

Somente em 1.° de fevereiro de 1 9 8 4 o Brasil subscreveu esta Convenção, também denominada Convenção da Mulher ou Conven­ ção CEDAW. ’ Ainda assim c om reservas na parte relativa ao direim rlp_ família . As_xeservas foram retiradas e a C onvenção acabou sendo ratificada plenamente em 19 9 4 Aprovada pelo C ongresso N acional,15 foi promulgada pelo Presidente da República.6

O Comitê CEDAW apresentou algumas recom endações, dentre elas a de que os Estados participantes devem estabelecer legislação especial sobie violência dom éstica e familiar contra a mulher, Essa Convenção deve ser tomada com o parâm etro mínimo das ações esta­ tais para promover os direitos humanos das m ulheres, Os Estados têm o dever de eliminar a discrim inação contra a m ulher através da ado­ ção de medidas legais, políticas e program ãticas 7

Foi a Conferência das Nacões Unidas sobre direitos humanos, no ano de 1993. em Viena, que definiu formalmente a violência con ­ tra a,..m.n lhe n co m o _y.io.lacão aos direitos hum anos

A Convenção Interam ericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Doméstica - conhecida com o Convenção de Belém do Pará

2 Silvia Pim entel, O m onitoram ento do Com itê CEDAW e a violência co n ­ tra a mulher, 5 8

3 L.eila Linhares Barsted, Lei e realidade social: igualdade x desigualdade, 4 4 4 D ecreto 4 .3 7 7 /2 0 0 2 .

5 D ecreto Legislativo 2 6 /1 9 9 4 . 6 D ecreto 4 3 7 7 /2 0 0 2 .

7 Silvia Pim entel, O m onitoram ento do Com itê CEDAW e a violência c o n ­ tra a mulher, 59

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A QUE VEM 2 9

- foi adotada pela ONU em 1 9 9 4.. O docum ento c o nceitua a violência contra a'mulher como (art i.° j: “qualquer ação ou conduta baseada^ no gênero, que canse m orte, dano ou sofrim ento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público com o no privado” A violência contra a mulher é tratada com o grave problema cie saúde pública A Convenção foi ratificada pelo Biasil em 27 de novembro de 1 9 9 5 , sendo aprovada pelo Congresso Nacional8 e promulgada pelo Presidente da República 9

A Lei Maria da Penha só chegou agora, c umprindo o Brasil com ­ promissos assumidos inter nacionalmente Mas, apesar da demora na "sua elaboração, com o saúda Sílvia Pimentel, o Brasil está de parabéns, pois se trata de instrum ento legal bastante cuidadoso, detalhado e abrangente, que representa o esforço de contextualização das"duas paradigmáticas convenções.10

4 2 A PORCA DOS TRATADOS

Os direitos enunciados em tratados internacionais têm aplica-bilidade im ediata e naturezacle norm a con stitu cion al (CF. art. 5~F. § 1.° e § 2 .°) As norm as previstas nos atos, tratados, convenções o.u em pactos internacionais devidamente aprovadas pelo Legislativos promulgadas pelo Presidente da República, inclusive quando prevêem normas sobre direitos fundamentais, ingressam no ordenamento j u-rídico c om o leis ordinárias, xncorporando-se ao sistem a juu-rídico infraconstitucional u

A Constituição Federal não tem regra expressa que recepcione automaticamente um tratado internacional ao direito interno jdepende de u m pro ced ime n to formal incorp ora tó ri o , o qu a 1 resu 1 ta d a interação entre ato do Poder Executivo e do Poder Legislativo, que tem a

atri-8 Decreto Legislativo 1 0 7 /1 9 9 5 9. D ecreto 1 .9 7 3 /1 9 9 6

10 Silvia Pim entel, O m onitoram ento do C om itê CEDAW e a violência con ­ tra a mulher, 6 4

11 CF, art. 5 °, § 2 Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regim e e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasii seja parte

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buição de aprovar sua celeb ração (CF, arts 8 4 , V1U,!2 4 9 , l 13) H O Congresso Nacional aprova os tratados e atos internacionais m edian­ te a edição de decreto legisla ti vo7que~cl ispc nsa sanção ou prom ulga­ ção por parte do Presidente da República Este ato,"ãlèmcTe significar a aprovação do tratado pelo Congresso Nacional, autoriza o Presidente da República a ratificá-lo em nome da República Federativa do Brasil" por meio da edição de um decreto presidencial. Promulgado o decre­ to presidencial, a norma inserida pelo tratado internacional, nesse m o­ m ento, adquire executoriedacíe interna 13

Com a Reforma do judiciário - Em enda Constitucional 4 5 /2 0 0 4 - , quando foi acrescentado o §.3 ° ao ait, 5 ° da Constituição Fede­ ral,16 ocorreu a constitucionalização dos tratados e convenções inter­ nacionais sobre direitos humanos 17 Paia eqüivalerem a emendas cons-titucionais precisam ser ap rovados, em cada C asa do C ongresso Nacional, em dois turnos, e por três quintos dos votos dos seus m em -bros Portanto, com referência aos tratados e convenções internacio­ nais que versem sobre direitos humanos, o Congresso Nacional tem possibilidade de incorporá-los com staíus ordinário (CF, art. 4 9 , 1) ou com sLatus constitucional (CF, art. 5 °, § 3 ° ) , a depender do quorum. da aprovação Assim, com o refere Alexandre de M oraes, a o p çã o de

in co rp o ra çã o de tratados e con ven ções inte?iia cio n a is sobre direitos hu­ m anos, nos term os d o art. 4 9 , 1, ou do § 3 ° d o a r t 5,°, é d is c n c io n á n a d o C ongresso N a c io n a l1B

12 CR art 8 4 : Com pete privativamente ao Presidente da República: (. ,) VIII ~ celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso N acio n al

13 CF, art 4 9 : É da com petência exclusiva do Congresso N acional: I - resol­ ver definitivam ente sobre tratad os, acord os ou atos in tern acion ais que acarretem encargos ou com prom issos gravosos ao patrim ônio nacional 14 Ingo W oífgang Sarlet, A e/iaícia dos direitos fundam entais, 140.

15 A lexandre de M oraes, Direiío constitucional, 6 1 6

16 CF; art 5 °, § 3 o: Os tratados e convenções internacionais sobre direitos hum anos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso N acional, em dois tu rn os, p or três quintos dos votos dos resp ectivos m em bros, serão equivalentes às em endas constitucionais

17 R ogério Sanches C unha e Ronaldo Batista P into, V iolência d om éstica e relação hom oafetiva, 18

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A QUE VEM 3-1

No que diz com tratados internacionais de proteção dos direitos humanos, há divergências doutrinai ias sobre sua hierarquia 10 E m face cio disposto no § 3 ° do art. 5.° da CF, os tratados possuem hierarquia constitucional, pois a Constituição atribui aos direitos internacionais re fe ientes a direitos humanos natureza especial e diferenciada de nor­ ma constitucional.20 Para obterem stáüts de emenda constitucional es­ tão sujeitas a votação especial, ou seja, necessitam passar pelo procedi­ mento do 8 3.° do art. 5.° da Ç F Porém, independentemente do quonim de sua aprovação, são materialmente constitucionais por força cio art 5 °, § 2 ° , da CF.21

Q uestionamentos têm surgido sobre os tratados ratificados an­ tes da inserção do § 3 oao art. 5 ° da Constituição Federal. ParaFlávia Piovesan não seria razoável sustentar que os tratados aprovados antes da nova exigência de aprovação especial fossem r ecepcionados som en­ te como lei federal. Todos os tratados de direitos humanos devem ter natureza constitucional, seja apenas materialmente (ratificados com aprovação simples) ou material e formalmente (ratificados com apro­ vação especial cie emenda constitucional) 22

Como bem refere Francisco Rezek, é sensato crer que ao prom ul­ gar o § 3 0 do art. 5.° da CF, através da Emenda Constitucional 4 5 , sem nenhuma ressalva aos tratados sobre direitos humanos outrora co n ­ cluídos mediante processo simples, o Congresso constituinte os ele­ vou à categoria dos tratados de nivel con stitu cion al23

Dai porque a Lei Maria da Penha, que vem regulamentar direitos .assegurados a nível internacional, ratificados pelo Brasil por meio de

tratados sobre direitos humanos, tem natureza constitucional.

19 Há q uatro linhas in terp retativas sobre a hierarquia dos tratad os, se: a) s u p ra c o n s titu c io n a l; b) c o n s titu c io n a l; c ) in fra c o n s titu c io n a l, m as supralegal; ou d) lei federal

20 Flávia Piovesan, Tratados internacionais de proteção dos direitos h um a­ nos e a Constituição Federal de 1 9 8 8 , 9.

21 Idem, ibidem 22. Idem

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Uma violação aos direitos humanos

A violência frequentemente es lá lidada ao uso da força física, psicológica pu intelectual paia obrigar outra pessoa a fazer algo que não quer., Constranger, impedir que outro manifeste sua vontade, to­ lhendo sua liberdade, é uma foi ma de violação dos direitos essenciais do ser humano, A relação de desigualdade entre o homem e a mulher, realidade milenar que sempre colocou a mulher em situação de infe­ rioridade lhe impondo a obediência e a submissão, é terreno fértil à afronta ao direito à liberdade 1 Aiibejdade é reconhecida com o a pi i-meira geração dos direitos humanos, direilo que é violado quando o hom em subm ete a m ulher ao seu domínio Também não há com o deixar de reconhecer nesta postura afronta aos direitos humanos de segunda geração, que consagra o direito à igualdade. De outro lado, q u an d o se fala nas q u estõ e s de g ê n e ro , ain d a m a rca d a s pela verticalização, é flagrante a a fronta à terceira geração dos direitos h u­ manos, que tem por tônica a solidar iedade.

Criminosa a omissão esíafd que, soi> o manío da d etu rp a d a n oção

de in v io la b ilid a d e do esp a ço p rivado, tem ch a n c ela d o as ?nais cru éis e v e la d a s Jo iu ia s de v iolên cia dos direitos hum anos 2 Som ente na Confe­

rência das Nações Unidas sobre Direitos Hum anos, que ocorreu no ano de 1 993 em Viena, a violência contra a mulher foi definida for­ malmente com o violação aosclireilos hum anos, o que foi proclam ado pela Convenção Interam ericana para Prevenir, Punir e E rradicar a Violência Doméstica, em 1 9 9 4 ..

Essa Convenção, que foi ratificada pelo Brasil em 1 9 9 5 , e está mencionada na ementa da Lei M aliada Penha, evidencia seu pro

pósi-1 K arotine Viana e Luciana A ndrade, Crim e e castigo, 13

2 Sumaya Saady M orhy Pereira, O M inistério Público e a Lei Maria da Penha, 29.

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UMA VIOLAÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS 33

to cie preservar os direitos humanos das m ulheres Daí a expressão legal (art 6 o): “A violência domestica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos hum anos.” Dispositivo en­ comendado para dar ensejo a eventual Incidente de Deslocamento de Competência 3 Assim, não há com o considerar desnecessária a refe­ rência feita pela lei ,'’ Tal técnica deveria ser desnecessária, mas como efetivamente não o é, houve a reiteração em norma infraconstitucio-nal daquilo que a Constituição já prevê, porém que a prática indica que não se costum a cu m p rir5

Além de p roclam ar a natureza da violência dom éstica com o violadora dos direitos hum anos, a Lei impôs a adoção de políticas públicas para resguardar os direitos humanos das mulheres (art 3 °, § 1 °).\“0 poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discrim inação, exploração, violência, crueldade e opressão ”j

Entre as diretrizes das políticas públicas a serem adotadas no âmbito federal, estadual e municipal e nas ações não-governamentais destaque especial é dado aos direitos humanos femininos na esfera educacional É determinada (art., 8 °, V): "a prom oção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência doméstica e fa­ miliar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das m ulheres”. A preocupação é de tal ordem que é obriga­ tória a inclusão do tema nos currículos escolares (art 8 °, IX): "desta­ que, nos currículos escolares de todos os n.íveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, à eqúidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a m ulher”

Em bora a Lei Maria da Penha proclame que a violência dom ésii-ca constitui violação .dos direitos humanos, não teve o propósito de 3 Stela Valéria Soares de Farias C avalcanti, Violência doméstica: análise da Lei

Maria da Penha, n.. 11 3 4 0 /2 0 0 6 , 179

4 Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Batista Pinto, V iolência dom éstica e relação hom oafetiva, 3 5

5 Sérgio Ricardo de Souza, Comentários á lei de combatc à violência contra a mulher. , 4 2

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transferir para a Justiça Federal a apuração c punição dos agressores de mulheres 6 Os crim es praticados contra as mulheres são da com pe­ tência da Justiça Esladuai (art 14)

No entanto, ocorrendo grave violação dos direitos hum anos, para assegurar o cum prim ento de obrigações decorrentes de tratados in­ ternacionais de direitos hum anos dos quais o Brasil é signatário, .o Procurador Geral da Republica pode, em qualquer iase do processo ou inquérito suscitar, perante o Superior Tribunal dejustiça, incidente de deslocamento de com petência paia a justiça Federal (C F art 109, V~A, § 5 °)

Como a Lei Maria da Penha foi editada atendendo a t ratados in­ ternacionais que preservam os direitos humanos cias m ulheres, con s­ tatado em qualquer ação ou inquérito desrespeito aos propósitos da Lei, qualquer um pode representar ao Procurador Geral da Repúbli­ ca, para que busque a transferência da demanda para a lustica Fede­ ral. Daí a cautela do legislador quanto a adjetivação da violência do­ m éstica.7

6 G uilherm e de Souza N ucci, Leis penais e processuais penais comentadas, 865. 7 Rogério Sanches C unha e Ronaldo Batista P into, V iolência d om éstica e

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/

A legalização das

uniões homoafeíivas

A,Lei Maria da Penha, modo expresso, enlaça no conceito de fa­ mília as uniões homoafelivas Diz o seu artigo 2 .°: “Toda mulher, in­ dependentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual (...) goza, dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana ”. O parágrafo único do artigo 5 ,Q reitera que independem cie orientação sexual to­ das as situações que c onfiguram violência doméstica e familiar O pre­ ceito tem enorme repercussão, Como é assegurada proteção legal a fatos que ocorrem no ambiente dom éstico, isso quer dizer que as uniões de pessoas do mesmo sexo são entidades familiares Violência domésti­ ca, como diz o próprio nome, é violência que acontece no seio de uma família Assim, a Lei Maria da Penha ampliou o conceito de família alcançando as uniões homoafetivas, P ela prim eira vez fo i consagrado,

no âm bito in fracon stitu cion al, a id éia de que a fa m ília não é constituída p o r im posição d a lei, m as sim p o r vontade dos seus p róp rios m e m b r o s 1

Ao ser afirmado que está sob o abrigo da Lei a mulher, sem dis­ tinguir sua orientação sexual, encontra-se assegurada proteção tanto às lésbicas com o às travestis, as transexuais e os transgêneros do sexo feminino que mantêm relação íntima de afeto em ambiente familiar ou de convívio Em todos esses relacionamentos as situações de vio­ lência contra o gênero feminino justificam especial proteção,

As uniõ es de pessoas d o mesmo s exo , p or puro preco ncei to, eram relegadas ao âmbito do Direito das Obrigações, e identificadas com o um negócio de fins lucrativos No final da sociedade, procedia-se à divisão de lucros, mediante a prova da participação de cada parceiro

i Leonardo B arreto M oreira Alves, O re co n h e cim e n to legal do co n ce ito m oderno de fa m ília .., 149.

Referências

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