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Recuperando o já dito na introdução, que na cultura do Brasil, com fortes bases na mitologia cristã, a definição do que é o casamento para o senso comum, a partir de um ponto de vista conservador e tradicional, é demonstrada no livro sagrado: “Mas no começo do mundo Deus os fez homem e mulher: por isso o homem deixará seu pai e sua mãe e se ligará à sua mulher, e os dois se tornarão uma só carne. Assim, eles não são mais dois, mas uma só carne. Não separe, pois, o homem o que Deus uniu” (Mc 10, 6-9). Entretanto, há várias formas de religiões cristãs lerem a homossexualidade. De toda forma, a maneira de ver “a sexualidade humana pode ser caminho tanto de realização como de frustração; tanto de comunhão como de dominação; tanto de construção como de destruição. Tudo depende de como nós trabalhamos a nossa sexualidade” (GIUMBELLI, 2005, p. 23). Isso fica claro ao observar o posicionamento dos participantes expositores no seminário “Religião e Sexualidade: Convicções e Responsabilidades”, cujo objetivo foi “discutir a relação entre religião e sexualidade considerando um duplo aspecto: as religiões como matrizes de posicionamentos, o que permitiria evocar a dimensão das teologias, dos valores e dos princípios, e as religiões como forças de intervenção social” (GIUMBELLI, 2005, p. 9); o encontro virou livro, organizado por Emerson Giumbelli. Fazendo um apanhado dos posicionamentos dos participantes do encontro, essencialmente inter-religioso, há posturas positivas, mais abertas, em relação à homossexualidade por parte de pessoas como o Frei Antônio Moser e o Padre Valeriano Paitone, católicos, e por parte de pessoas como o Bispo Robinson Cavalcanti, anglicano; bem como há posturas fechadas, de desaprovação, do Pastor Eduardo Rosa Pedreira, presbiteriano, e de João Santolin, coordenador do Movimento pela Sexualidade Sadia (MOSES), entre outros que se manifestaram a favor ou contra a orientação sexual que não heterossexual. Os religiosos mais abertos caminham numa linha que entende que uma outra orientação sexual que não a heterossexual “não é uma doença; Deus é quem fez o homossexual. Deus criou o ser humano, e no respeito às diferenças, na sua opção de liberdade – como fala Jesus no Evangelho aqui citado – se situa também o homossexualismo. E não é pecado porque pecado é não amar” (GIUMBELLI, 2005, p. 81),

enquanto fechados e que desaprovam a sexualidade LGBT promovem a chamada “cura gay”, como o Movimento por uma Sexualidade Sadia (MOSES) e outros grupos de apoio, que realizam ações que resultam em colocações como a citada abaixo:

muitas pessoas vão deixar o comportamento homossexual; outras, o comportamento e o desejo homossexuais (orientação); outras, além do comportamento e desejo homossexual, vão desenvolver a heterossexualidade. Tenho percebido que, no fundo, aquele que procura um profissional e ministérios de apoio para deixar a homossexualidade, deseja apoio para retirar a sua máscara homossexual (mascara a sua realidade interna) e confirmar a sua heterossexualidade, tal como Deus o criou (GIUMBELLI, 2005, p. 120).

Sobre essa prática da “cura gay”, faz-se importante dizer que o Conselho Federal de Psicologia (CFP), evocando que a homossexualidade não constitui doença, nem distúrbio e nem perversão, determina, na resolução 001/1999, que “os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades” (BOCK, 1999, p. 2). Não há nenhuma base científica para que a “cura gay” seja promovida ou sequer considerada.

Comecei a falar da “cura gay” para evocar o Projeto de Decreto Legislativo da Câmara (PDC) 234/2011 (CAMPOS, 2011a), de autoria do deputado João Campos - PSDB/GO, que tem por objetivo “sustar a aplicação do parágrafo único do Art. 3º e o Art. 4º da Resolução do Conselho Federal de Psicologia nº 1, de 23 de março de 1999, que estabelece normas de atuação para os psicólogos em relação à questão da orientação sexual” (CAMPOS, 2011a, p. 1). Há um indicativo de leitura por parte dos deputados religiosos que uma prática sexual LGBT é doença, uma vez que existe esse tipo de iniciativa, que a chamada “cura gay” aconteça e seja promovida. Esse é, juntamente com o constante ataque na questão dos avanços em direitos que a comunidade LGBT obteve com a aprovação do casamento igualitário, também um episódio que demonstra a nebulosidade das questões religiosas na política do Brasil. No capítulo três, trato de teorias que falam sobre esses pontos, aprofundando e discutindo mais teoricamente o que apresentei sobre isso em termos de contextualização neste capítulo. Por fim, indico que, juntamente às análises feitas no capítulo quinto há, também, contextualizações pontuais para incrementar a compreensão da análise. Logo, este primeiro capítulo divide com partes do quinto, bem como outras pinceladas pelo texto todo da dissertação, a função de contextualizar o leitor sobre a questão em foco.

2 CAPÍTULO 2 – A Linguística como Ferramenta Crítica

Se o capítulo passado foi de contextualização, este presente capítulo é o primeiro que versa sobre as teorias que minha análise utiliza para realizar a leitura dos dados. Nele, eu disserto sobre a Linguística e as ferramentas que eu uso dela para fazer a descrição dos dados; no capítulo terceiro, eu faço a apresentação das ferramentas advindas da Sociologia que ajudam a observar os dados e, então, explicá-los. Esse é um trabalho essencialmente transdisciplinar, que associa a análise Linguística à interpretação sociológica, associação que a ADC discute e propõe e que eu vou discorrer em um determinado momento do capítulo e continuarei a discutir no início do capítulo três.

Para início de conversa, situo a LSF enquanto área de conhecimento dentro da ciência Linguística, enfocando as suas particularidades e distinções, o que permite o desdobramento teórico para a metodologia que utilizo para a leitura dos dados. A apresentação que vou fazer permitirá deixar mais clara a ancoragem que a Linguística dará para a leitura sociológica posterior.