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CAPÍTULO 2 INSTITUTO JURÍDICO DO CASO JULGADO NO DIREITO

2.5 LIMITES À PROTEÇÃO DO CASO JULGADO

2.5.2 Limites Subjetivos do Caso Julgado

Depois da compreensão do alcance objetivo do caso julgado no processo penal, se faz necessário o enfrentamento dos seus limites subjetivos. Embora o Código de Processo Penal seja omisso nesse particular, Rodolfo Kronemberg Hartmann331 destaca que na forma do artigo 472 do Código de Processo Civil brasileiro “a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando nem prejudicando terceiros”, indicando que, em primeira análise, também no processo penal apenas as partes da relação processual (autor/réu) é que poderão ser atingidos pelo caso julgado, interpretação que, inclusive, se coaduna com antiga

regra res inter alios judicata, aliis non praeiudicare (Digesto, D. 42, 1, 63) conhecida dos

romanos, que significa que o caso julgado não prejudica terceiros, ou seja, não pode aproveitar nem prejudicar, senão às próprias partes.

Os limites subjetivos do caso julgado dizem respeito a quem está sujeito à autoridade do caso julgado, vinculando apenas as partes e não terceiros, conforme doutrina romana.

Porém, em situações excepcionais, um terceiro alheio às partes do processo, poderá ser atingido pelo caso julgado proveniente de certo processo. É o que acontece, por exemplo, “na substituição processual, no litisconsórcio facultativo unitário e, por fim, nas ações coletivas”, sendo que em direito processual penal apenas a hipótese da substituição processual é verificada com alguma frequência332.

Para o substituto processual, produz efeitos do caso julgado material atingindo o substituído que não foi parte no processo. Isto porque o direito material discutido em juízo, sobre a qual se formou autoridade do caso julgado, é do substituído e está sendo defendido pelo substituto.

Portanto, o princípio fundamental clássico de que o caso julgado não prejudica terceiros não é suficiente para afastar a possibilidade da repercussão mais ou menos intensa e

331 HARTMANN, Rodolfo Kronemberg.. Op. cit., p. 01. 332 Idem, ibidem, p. 01.

extensa dos efeitos da sentença a terceiros, os quais, mesmo não sujeitos diretamente á decisão da sentença, podem indiretamente sentir seus efeitos333.

Nos dias de hoje, no que diz respeito aos limites subjetivos do caso julgado, Sérgio Gilberto Porto334 informa que está em vigor uma nova realidade, na medida em que há uma vinculação de tais limites à natureza do direito posto em causa, ou seja:

a) em sendo o direito posto à análise de natureza individual heterogênea, apenas as partes, por regra, serão atingidas pela autoridade do caso julgado e, por exceção, o cessionário, o sucessor e o substituído processualmente;

b) sendo o direito individual homogêneo, a autoridade do caso julgado, no caso de procedência da demanda, será erga omnes;

c) sendo coletivo, salvo a hipótese de improcedência por ausência de provas, a autoridade do caso julgado será ultra partes; e

d) tendo o direito posto em causa, de natureza difusa, também, salvo nos casos de improcedência por falta de provas, a autoridade do caso julgado projetar-se-á erga omnes.

Portanto, pela regra geral, a sentença faz caso julgado às partes entre as quais é dada, não beneficiando e nem prejudicando terceiros. O julgamento é imutável apenas entre as partes; em relação a terceiros poderá produzir efeitos ou não, pois, tendo interesse, poderá impugnar os efeitos do julgado. É que uma sentença não pode negar o direito dos terceiros estranhos, como seria possível acontecer no caso em que a relação reconhecida como existente ou inexistente num processo, compreendesse como sujeito um terceiro, estranho à lide. Assim, os terceiros interessados serão atingidos reflexamente pelo caso julgado material, quando adquire o direito ou objeto litigioso, pois mesmo que não ingresse no processo com sucessor do alienante, fica sujeito aos efeitos do caso julgado.

Desde o direito romano, vigora a regra, de que os casos julgados entre uns não prejudicam outros. Também o direito germânico consolidou a máxima de que “a sentença poderia atingir quem quer que dela tivesse notícia e, por isso mesmo, são vários ali os meios de intervenção de terceiros”. Foi da fusão desses preceitos, que surgiu o direito comum que, de um lado, limita os efeitos do caso julgado aos litigantes e, de outro, permite a terceiros de intervir na causa, deixando claro que a autoridade de caso julgado exige a tríplice identidade prevista no artigo 498 do Código de Processo Civil, que se aplica por extensão ao Código de Processo Penal, por força teoria geral do processo e particularmente pelo artigo 84, do Código

333 SANTOS, Moacyr Amaral. Op. cit., p. 69. 334 PORTO, Sérgio Gilberto. 2009. Op. cit., p. 44-45.

de Processo Penal português, referendado pela jurisprudência portuguesa, aplicável também na legislação brasileira, conforme Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça335.

O Código de Processo Penal brasileiro, no artigo 95, caput e inciso V, admite o caso julgado, como exceção de admissibilidade, dispondo que “poderão ser opostas as exceções de caso julgado”. Já no caput do artigo 110 do mesmo diploma legal, que versa sobre a aplicação da exceção do caso julgado sobre a exceção da incompetência do juízo, consta que “nas exceções de litispendência, ilegitimidade de parte e caso julgado, será observado, no que lhes for aplicável, o disposto sobre a exceção de incompetência do juízo”. No direito português a matéria é regulada no artigo 84º do Código de Processo Penal, que aplica às mesmas hipóteses e soluções das sentenças civis.

Sobre os efeitos da sentença penal nas relações civis, o artigo 65, do Código de Processo Penal brasileiro complementa descrevendo que, “faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito”.

Do exposto, verifica-se que no sistema jurídico contemporâneo em vigor, o instituto do caso julgado não constituí algo absoluto. Como exemplo disso, tem-se a possibilidade de sua desconstituição por meio da ação rescisória na esfera cível e da revisão criminal na esfera penal. Este estudo e investigação versa especificamente sobre a sentença penal transitada em julgado.

O princípio da res judicata tem suas origens no antigo direito romano e, atualmente, tem recebido limitações e diretrizes para sua aplicação, visando preservar o verdadeiro sentido da segurança jurídica.

335 TORNAGHI, Hélio Bastos. Op. cit., p. 187. No mesmo sentido: STJ-PT, Supremo Tribunal de Justiça de

Portugal. Processo nº 076092. Acórdão de 15 de junho de 1988. Relator Joaquim Figueiredo. Disponível em: <www.dgsi.pt>. Acesso em: 02 out. 2018; STJ-PT, Supremo Tribunal de Justiça de Portugal. Processo nº 04B948. Acórdão de 13 de maio de 2004. Relator Ferreira Girão. Disponível em: <www.dgsi.pt>. Acesso em: 02 out. 2018.

CAPÍTULO 3 - SENTENÇA JUDICIAL EM MATÉRIA PENAL NO DIREITO