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CAPÍTULO IV – A TENSÃO ABERTA E PERMANENTE ENTRE A DIVULGAÇÃO NOMINAL DA REMUNERAÇÃO DOS SERVIDORES

4.3. A máxima da proporcionalidade

Como um dos mais importantes instrumentos da hermenêutica constitucional, o princípio da proporcionalidade, segundo Daniel Sarmento, originou-se no direito administrativo alemão (prussiano) do século XIX, sendo utilizado, inicialmente, para controle do exercício do poder de polícia. Após o advento da II Guerra Mundial, o princípio foi

403 PAGNAN, Rogério. Segurança de SP aperta filtro de acesso a dados públicos. Folha de São Paulo,

São Paulo, 2 mar. 2016. Caderno Cotidiano, B4.

404 SÃO PAULO. Decreto nº 61.836, de 18 de fevereiro de 2016. Dispõe sobre a classificação de

documento, dado ou informação sigilosa e pessoal no âmbito da Administração Pública direta e

indireta. DOE-I, 19/2/2016, p. 1. Disponível em:

<http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/decreto/2016/decreto-61836-18.02.2016.html>. Acesso em: 3 mar. 2016.

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transposto para o âmbito do direito constitucional alemão, oportunidade em que passou a ser empregado também para o controle de constitucionalidade de atos legislativos, principalmente aqueles correlatos a restrições a direitos fundamentais. Consolidaram-se três parâmetros, ou subprincípios com o passar do tempo: a adequação, a necessidade e a proporcionalidade em sentido estrito. O êxito da experiência alemã na utilização do princípio influenciou grande parte do mundo, ocorrendo a sua incorporação progressiva à jurisprudência constitucional de diversos países, e até mesmo em órgãos jurisdicionais supranacionais, como a Corte Europeia de Direitos Humanos, o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias e a Organização Mundial do Comercio.405

No direito constitucional germânico, ao princípio da proporcionalidade outorga-se a qualidade de norma constitucional não-escrita, derivada do Estado de Direito, que tem como objetivo aferir a compatibilidade entre meios e fins, evitando-se restrições desnecessárias ou abusivas contra os direitos fundamentais, no escólio de Gilmar Mendes.406

O princípio da proporcionalidade, por sua natureza, atua na contenção de abusos e na moderação do exercício do poder em favor da proteção dos direitos do cidadão. No cenário brasileiro, o desenvolvimento do princípio da proporcionalidade vem ocorrendo após o advento da Constituição de 1988, sob forte influência da teoria constitucional alemã.

O e. Supremo Tribunal Federal, sob a égide da Constituição de 1988, passou a referir-se à proporcionalidade, com frequência, no controle de constitucionalidade. Mas, no início, a e. Corte não se valia dos subprincípios, restringindo-se a destacar o caráter arbitrário ou desarrazoado do ato normativo examinado. Com o passar do tempo, já na última década, o princípio da proporcionalidade vem sendo empregado de forma mais analítica.

Muito embora não previsto na CRFB/88, o STF tem fundamentado o princípio– tratado pela Corte como idêntico ao princípio da razoabilidade – na cláusula do devido processo

405 SOUZA NETO, Cláudio Pereira de; SARMENTO, Daniel. Direito constitucional: teoria, história e

métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 465-466.

406 MENDES, Gilmar Ferreira. Controle de constitucionalidade: aspectos jurídicos e políticos. São Paulo:

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legal, na sua dimensão substantiva (at. 5º, XXXIV)407, com amplo suporte em nossa doutrina constitucional.408

O princípio da proporcionalidade foi recepcionado pelo direito brasileiro, além de ser a expressão mais usual nos diversos sistemas do direito europeu.409

Há uma razoável concordância sobre a aplicabilidade do princípio da proporcionalidade no ordenamento brasileiro, bem como em sua estrutura, calcada em subprincípios.

Deste modo, o princípio da proporcionalidade se insere no corpo constitucional da Carta Maior, podendo ser deduzido de sua estrutura normativa a sua utilização como princípio da reserva legal (art. 5º, inciso II, da CRFB/88), ou princípio do devido processo legal (art. 5º, inciso LIV, da CRFB/88), ou do art. 5º, § 2º, da CRF410, ou mesmo do próprio sistema de direitos fundamentais constitucionalmente adotado.

O Ministro Gilmar Mendes leciona restar consolidado no e. STF a evolução do princípio da proporcionalidade como postulado constitucional dotado de autonomia que teria seu fundamento em disposição sobre o devido processo legal. Tal posicionamento se deduz tratar-se de um princípio geral do direito, como tem assentado a jurisprudência.411

A norma em apreço restringe abusos, arbitrariedades, e excessos na atuação do poder público, sob a ótica de três sub-regras: a da adequação; a da necessidade; e a da proporcionalidade em sentido estrito. Assim, presente se achará a adequação se a medida em análise cumprir os fins que almeja; haverá necessidade caso não se verifique outro meio igualmente efetivo e menos danoso a direitos fundamentais de se alcançar os objetivos pretendidos. Por fim, a proporcionalidade em sentido estrito será respeitada caso, em uma

407 Neste sentido, por exemplo, Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.158-MC, Rel.

Min. Celso de Mello. DJU, 26 maio 1995; Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.076-MC, Rel. Min. Sepúlveda Pertence. DJU, 7 dez. 2000; Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1,922-MC, Rel. Min. Moreira Alves, DJU, 24 nov. 2000; Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.276, Rel. Min. Maurício Corrêa. DJU, 5 dez. 2002.

408 Neste sentido, dentre outros: MENDES, Gilmar Ferreira. A proporcionalidade na jurisprudência do STF.

In: MENDES, Gilmar Ferreira, p. 83; BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição, p. 237.

409 Conforme Suzana de Toledo Barros, o Brasil, mesmo adotando o sistema de controle de

constitucionalidade similar ao americano, não recepcionou o princípio da razoabilidade nos termos notabilizados pelo direito americano. BARROS, Suzana de Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direitos fundamentais. 2. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2000, p. 66.

410 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado,

1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm.> Acesso em: 4 nov. 2015.

411 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 9. ed.

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ponderação de custo-benefício, os ônus oriundos da medida sejam menores que os benefícios aos quais pretende produzir.412

Entretanto, ainda se tem entendido que o postulado da proporcionalidade também possui uma concepção positiva, a vedação da proteção deficiente, impondo-se ao Estado o dever de atuação no objetivo de prestar aos direitos fundamentais a efetiva e devida proteção, sob risco de padecer em inconstitucionalidade e ensejar a intervenção do Poder Judiciário. Ressalte-se que esta obrigação contempla, igualmente, o dever de legislar, no sentido de assegurar a proteção suficiente aos direitos fundamentais.

Em tal sentido:

[...] a consideração dos direitos fundamentais como imperativos de tutela (Canaris) imprime ao princípio da proporcionalidade uma estrutura diferenciada. O ato não será adequado caso não proteja o direito fundamental de maneira ótima; não será necessário na hipótese de existirem medidas alternativas que favoreçam ainda mais a realização do direito fundamental; e violará o subprincípio da proporcionalidade em sentido estrito se o grau de satisfação do fim legislativo for inferior ao grau em que não se realiza o direito fundamental de proteção. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus nº 104.410/RS. Relator: Ministro Gilmar Mendes. Diário da Justiça Eletrônico, Brasília, 27 mar. 2012).