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PERÍODO MAO: ENTRE A MOBILIZAÇÃO DE MASSAS, DE UM LADO, E O ESTADO E A ECONOMIA, DE OUTRO

2.4 A VONTADE DAS MASSAS PARA CONSTRUIR A ECONOMIA E O SOCIALISMO

2.4.3 O Método das Campanhas de Massas

Conforme a retórica de Mao, o Estado e o partido estariam, em certas circunstâncias, identificados como instituições onde se manifestava o burocratismo. Então,

tanto resultados econômicos negativos, quanto descontentamento social seriam atribuídos à burocratização de quadros dirigentes. Avaliava-se que o burocratismo seria essencialmente um desvio ideológico, e, por isso, seriam necessárias campanhas periódicas de retificação doutrinária. Essas campanhas foram um invento originado do apelo maoísta às massas e à revolucionarização, supostamente.

Proclamava-se que, nesse processo, seriam eliminadas as forças contra- revolucionárias, segundo a visão das contradições entre o povo e os inimigos do socialismo. Acreditava-se que seria desenvolvido um esforço de mobilização para identificar os problemas políticos e ideológicos e seriam adotados os métodos para combatê- los. As contradições no seio do povo exigiriam crítica e autocrítica, unidade-crítica-unidade. Alguns intelectuais estariam a favor do socialismo, mas outros intelectuais, conforme sua origem social, suas ligações com a velha China e sob a influência do Ocidente burguês, seriam hostis à contraditória construção socialista em curso. Esses últimos tinham que ser reeducados, ou seja, seriam submetidos às violências da repressão política e do constragimento público.

As campanhas de retificação, sob a liderança de Mao, podiam abranger o partido, o exército, ou a população em geral. No ambiente militar de uma guerra prolongada, assim como existiam as campanhas militares poderiam existir, também, campanhas político- ideológicas, artísticas, científicas, econômicas. A campanha poderia contribuir para transformar o homem, reformando seu pensamento, retificando sua prática social. Na maioria das vezes, não eram campanhas confinadas à vanguarda, começando, transcorrendo e encerrando dentro do partido, mas envolviam as massas. Essas campanhas, supostamente combatendo determinados problemas, serviriam, acreditava-se, para unificar, disciplinar e mobilizar as forças da revolução no enfrentamento de importantes momentos de dificuldade ou de deflagração de novas tarefas.

Durante a guerra de resistência, Mao lançou uma campanha de retificação (1942- 44), em um momento de defensiva em razão de destrutivos ataques japoneses, que desejavam “queimar tudo, matar tudo, pilhar tudo”. Essa campanha era voltada, formalmente, para os membros do partido, que tinha incorporado grandes contingentes de militantes, que careciam dos conhecimentos e métodos partidários. Esse movimento tinha como alvos o subjetivismo, o sectarismo e o formalismo. Ele se materializava na assim chamada retificação dos variados problemas, como: o estilo da escrita, o método de estudo (combinando teoria e prática), o divisionismo e a luta de facções (unificando militares e civis, quadros e militantes de base), o

burocratismo na administração (descentralizando funções administrativas em favor das aldeias), o formalismo (adaptando as soluções às circunstâncias concretas) e o individualismo dos intelectuais recém- incorporados ao partido.

Com a revolução já vitoriosa, o método das campanhas seria empregado para novos objetivos. Para recuperar a economia e consolidar o poder, surgiu a Campanha dos Três Antis: anticorrupção, antidesperdício e antiburocracia. Essa campanha voltava-se, sobretudo, a problemas na administração do Estado. Houve, também, a Campanha dos Cinco Antis contra as sabotagens de capitalistas, como sonegação de impostos, fraudes na gestão da mão- de-obra e dos materiais e roubo de informação econômica reservada do Estado. As massas submetiam os capitalistas a sessões de julgamento público em torno de diversas acusações, recorrendo a diferentes métodos, inclusive exame de documentos administrativos e contábeis da empresa.

A campanha das Cem Flores foi deflagrada pela direção do PCCh, por proposta de Mão, em reação aos acontecimentos da Hungria em 1956. Era preciso prevenir os problemas, ampliando a liberdade de expressão e a educação ideológica. Buscava-se mobilizar a intelectualidade para criticar o burocratismo e agregar a contribuição técnica dos especialistas na construção do socialismo. Dizia Mao: “Que se abram cem flores e que cem escolas compitam”. A campanha ocorreu em 1956 e encerrou-se em 1957 como repressão aos críticos da marcha dos acontecimentos.

Nessa campanha, o debate público encaminhou-se para um movimento cada vez maior de críticas e protestos. A base dessa contundência adquirida pelas críticas eram as insatisfações com as conseqüências das dificuldades econômicas sobre as condições de vida e o descontentamento com as restrições do regime à liberdade de pensamento e expressão. Houve greves operárias e estudantis e protestos de membros de algumas cooperativas. Evidentemente, qualquer processo de transformação socialista, sobretudo no caso das grandes dificuldades peculiares da China, defronta-se inevitavelmente com resistências, oposições, cisões, em vez do movimento suave, do caminho linear, da opinião consensual, da harmonia universal dos interesses. Assim, os dirigentes comunistas não souberam lidar de outra forma com o estado de coisas criado e retrocederam, suprimindo o debate público em curso. Para o PCCh, houve intelectuais oriundos de velhos setores aristocráticos que teriam se aproveitado do movimento para lançar ataques ao próprio socialismo.

Nesse contexto, sobre as dificuldades da conjuntura econô mica, considere-se que o ano de 1956 foi, especialmente, marcado por secas, inundações, problemas climáticos, afetando duramente a produção na agricultura. Todavia, além dos efeitos sociais dessa queda da produção, Mao acusou as instâncias superiores do partido e do Estado de burocratismo, supostamente a causa principal da onda de descontentamento popular. Desencadeou-se uma campanha contra a burocratização, o sectarismo e o subjetivismo no partido e de combate aos, assim chamados, direitistas, sobretudo entre os intelectuais. Foram mandados para campos de trabalho, a título de reeducação ideológica, tanto centenas de intelectuais que mais se destacaram nas críticas, quanto muitos quadros partidários, acusados de burocratismo.