Capítulo
Técnica 21 é um conjunto de procedimentos concretos ligados a uma arte ou ciência e que permite a aplicação do conhecimento científico na indústria ou nos
3.5 Métodos de apoio à decisão multicritério
3.5.3 Método Delphi
O método Delphi foi concebido em 1959 por Olaf Helmer, Norman Dalkey, e Nicholas Rescher no âmbito do projecto RAND32, em plena guerra fria (Stewart, Shamdasani et al. 2006). É um método interactivo de previsão (o que explica o seu nome, inspirado no oráculo Delphi da antiga Grécia), derivado do TGN, e é baseado nas opiniões de um painel de peritos. Recorre‐se a este método em situações
32 O Projecto RAND (um acrónimo para Research and Development) deu origem à Rand Corporation,
uma organização sem fins lucrativos criada há mais de sessenta anos. Tudo começou em 1946 com uma tarefa encomendada pelo General H. H. Arnold com o objectivo de aportar para a Força Aérea Americana os avanços científicos conseguidos pela sociedade civil durante o esforço de guerra da Segunda Guerra Mundial (http://www.rand.org)
envolvendo problemas complexos onde técnicas quantitativas não possam ser usadas, nomeadamente na análise a longo prazo de tendências de carácter social e/ou da influência de uma nova tecnologia, ou a previsão da ocorrência de um evento não frequente.
Depois de constituído o grupo de peritos, o método desenvolve‐se iterativamente em várias fases semelhantes. Neste método os participantes não se encontram frente‐a‐frente, embora nalgumas variantes do mesmo isso possa acontecer. Em cada fase começa‐se por recolher as previsões individuais de cada perito, assim como os pressupostos ou cenários em que estes basearam a sua previsão. É também solicitado que os peritos indiquem uma medida de confiança na sua previsão, principalmente quando são baseadas em estimativas feitas pelos próprios. As previsões individuais são resumidas por um facilitador, que também as torna anónimas, e este resumo é fornecido a todo o painel. Os peritos são então convidados a rever as suas previsões em face desta súmula contendo as posições de todos os participantes. Este procedimento é repetido até se conseguir um consenso, até deixar de haver alteração nas previsões entre uma iteração e a seguinte ou quando se atinge um critério pré‐definido (por exemplo um número fixo de iterações).
Os factores críticos no método de Delphi são a constituição do grupo de peritos, a concepção do conjunto de questões a usar para as previsões e pressupostos e a sumarização das contribuições individuais.
O método de Delphi tem sido objecto de muitas críticas ao longo dos anos, sendo considerado por muito como um método pouco científico e de “último recurso”. No entanto, vários estudos empíricos têm também demonstrado que são obtidos resultados substancialmente melhores com este método do que com métodos quantitativos tradicionais (Mullen 2003).
O método Delphi é também usado para a aquisição colaborativa de conhecimento em sistemas baseados em conhecimento, nomeadamente em sistemas periciais (Boose 1989) (Liou 1992).
Como principal vantagem deste método podemos apontar o facto das interacções entre os participantes serem controladas e efectuadas através de um facilitador, o qual processa a informação e filtra os conteúdos irrelevantes. O que evita os aspectos negativos da dinâmica de grupos em reuniões frente‐a‐frente, nomeadamente (Nunamaker, Dennis et al. 1991) a fragmentação do tempo de discurso, a inibição de participar, a pressão da conformidade, o receio da avaliação, a inércia cognitiva, o tempo perdido com a socialização, o domínio da discussão por parte de alguns elementos e os problemas de coordenação. Os participantes podem comentar sem constrangimento as posições do grupo como um todo e as de cada participante, incluindo também a possibilidade de rever as suas próprias previsões, de forma anónima. Numa reunião frente‐a‐frente os participantes têm tendência a manter a sua posição mesmo que já tenham interiorizado uma mudança de opinião.
3.6 Reflexão Crítica
Como se pôde ver até aqui, nenhuma referência foi feita à distinção entre a tomada de decisão individual e a tomada de decisão em grupo. De facto, a generalidade das classes de métodos enumerados não têm em conta as preferências de mais de um decisor. No entanto, começa a ser consensual que a maioria das decisões no mundo real envolve vários agentes de decisão. Conforme o processo de tomada de decisão sai da esfera individual e passa a ser um processo realizado em grupo, muitas organizações criam grupos de trabalho virtuais com os membros geograficamente distribuídos (Warkentin, Sayeed et al. 1997) (Pillis and Furumo 2006).
As reuniões assíncronas começam, assim, a ser comuns nas organizações, permitindo que vários elementos de uma equipa possam realizar um trabalho conjunto sem estarem fisicamente no mesmo local, nem mesmo terem de reunir ao mesmo tempo. As tecnologias envolvidas, nomeadamente a utilização da Internet, permitem ultrapassar os constrangimentos de tempo e espaço associados às reuniões presenciais frente‐a‐frente e melhoram o desempenho do grupo, principalmente porque ajudam a evitar os aspectos negativos típicos da dinâmica de grupos. Estas “reuniões virtuais” necessitam de um sistema eficaz de troca de documentos e partilha de informações entre os participantes, assim como de métodos de decisão adequados ao carácter assíncrono da participação dos seus membros, como por exemplo o método de Delphi.
Muitos estudos têm sido realizados na área dos problemas de decisão multi‐ critério, tendo em vista processos de decisão em grupo e tendo como objectivo o apoio aos agentes de decisão envolvidos (Lootsma 1999) (Cao and Burstein 1999) (Farnham, Chesley et al. 2000) (Antunes, Melo et al. 2007) (Marreiros, Novais et al. 2006). Nos problemas multi‐critério, a incompatibilidade de soluções não dominadas obriga a considerar no processo as preferências do decisor individual. Na presença de um processo de decisão em grupo, portanto com vários agentes de decisão, torna‐se ainda necessário considerar as preferências de todos os participantes e o processo deve ser conduzido conforme o modelo de decisão que está a ser utilizado, de forma a conseguir uma solução final.
Uma possibilidade é a agregação das preferências dos diferentes participantes, valorando as preferências e as soluções de forma a estabelecer as necessárias relações de ordem entre estas últimas (Herrera, Herrera‐Viedma et al. 2001) (Zhang, Chen et al. 2004). Um aspecto negativo desta abordagem é o facto de minimizar a influência que a interacção entre os membros do grupo poderia ter para a obtenção da solução.
Uma abordagem diferente passa pela agregação das preferências individuais em classes de preferências, as quais podem depois ser discutidas pelos agentes de decisão num processo iterativo (Yen and Bui 1999). Esta abordagem permite uma maior interacção entre os participantes, dado que não existe uma primeira e única avaliação das diferentes alternativas, mas sim uma avaliação iterativa até se conseguir um grau de consenso considerado satisfatório. Se não for conseguida à primeira nenhuma solução, é necessário empreender um processo de negociação para analisar e, tanto quanto possível, resolver as diferenças individuais.
Uma terceira abordagem passa pela utilização de um Sistema de Apoio à Decisão em Grupo (SADG), cujo suporte permita a discussão das diferentes alternativas através da apresentação dos argumentos dos elementos do grupo, com o objectivo de se chegar a um consenso sobre uma dada solução. Dada a cada vez maior característica assíncrona, no espaço e no tempo, dos processos de tomada de decisão, tornam‐se necessários os SADG que suportem essa característica e que incorporem componentes de apoio à resolução de problemas multi‐critério (Cao and Burstein 1999).
Nesta tese efectuamos a aplicação da tomada de decisão multi‐atributo ao projecto VirtualECare, com suporte para grupos em contexto assíncrono.
Por outro lado a maioria dos processos de decisão no mundo real decorrem num contexto em que os objectivos, as restrições e as consequências das acções alternativas não são completamente conhecidas. Desde logo, o conhecimento sobre os atributos que estão em jogo no processo de tomada de decisão é imperfeito, tornando‐se essencial que o(s) decisor(es) estejam permanentemente habilitados com uma medida da qualidade da informação disponível.
Um dos objectivos desta tese é a definição de um metamodelo de processo de tomada de decisão em grupo que inclua a avaliação da qualidade de informação. O contexto que motivou este trabalho não inclui a produção de artefactos físicos. O processo de decisão está sim enquadrado num processo mais geral, contínuo no
tempo, de monitorização de situações que podem originar problemas, para os quais é necessário encontrar alternativas e escolher uma solução.
Neste capítulo foi definido o enquadramento necessário para o desenvolvimento das soluções que serão apresentadas em capítulos posteriores. Essencialmente, caracterizámos o tipo de problemas de decisão (decisão multi‐ critério) para o qual vamos propor um modelo de processo, assim como uma sistematização das tarefas de tomada de decisão em grupo, que permite perceber melhor a dinâmica e a complexidade do processo.
Os métodos de apoio à decisão em grupo apresentados foram‐no apenas como exemplo, não significando que devam ser adoptados todos ou algum deles. A apresentação destes métodos, de entre os vários que foram estudados, significa sim que se reconhece neles a existência de técnicas e heurísticas úteis num processo de tomada de decisão em grupo. Nomeadamente, permitem organizar e estruturar a resolução de problemas complexos não estruturados.
O metamodelo de processo de decisão apresentado mais à frente no Capítulo 6 permite a utilização destes modelos e de quaisquer outros que permitam a realização dos diversos tipos de tarefas que identificamos neste Capítulo.
Finalmente, refira‐se que a escolha de um método de apoio à decisão multi‐ critério é em si mesmo um problema de decisão multi‐critério. Um sistema inteligente de apoio à decisão em grupo deverá incluir mecanismos de recomendação do método a usar em cada situação concreta.
Capítulo
4 Sistemas de Apoio à Decisão em Grupo
Intellectuals solve problems; geniuses prevent them. Albert Einstein 4.1 Introdução
Assistiu‐se, nos últimos anos, a um interesse crescente na combinação dos avanços da sociedade do conhecimento – computadores, telecomunicações e disponibilidade da informação – para a criação de Sistemas de Apoio à Decisão em Grupo (SADG).
Este interesse resulta do reconhecimento de que cada vez mais as decisões nas organizações são tomadas por grupos de indivíduos, combinando áreas do saber distintas e potenciando a qualidade dos resultados obtidos (Simon 1997). Outro factor a favor da crescente utilização dos SADG é a cada vez maior dispersão geográfica das organizações, com o que isso significa nos custos em viagens e estadia para a realização de reuniões frente‐a‐frente, quando comparados com a participação em reuniões virtuais, principalmente quando se assiste ao contínuo decréscimo do custo de equipamentos e de comunicações em banda larga.
Este capítulo está organizado da seguinte forma: Começamos por fazer uma apresentação dos conceitos de Redes Colaborativas e Organizações Virtuais, essenciais para processos de tomada de decisão em grupo onde as reuniões presenciais frente‐a‐frente serão, no futuro, cada vez mais raras. Seguidamente apresentamos o conceito de Sistemas de Apoio à Decisão em Grupo, seguindo o seu trajecto desde os anos sessenta e apresentando uma sistematização taxonómica no que respeita a arquitecturas tecnológicas e tipo de suporte. São apresentados também alguns exemplos de sistemas. Finalmente, faz‐se um enquadramento deste
tipo de sistemas na aplicação ao apoio à decisão na saúde, com ênfase especial nos Guias Clínicos e respectivas formas de representação de informação/conhecimento.