Capítulo
Técnica 21 é um conjunto de procedimentos concretos ligados a uma arte ou ciência e que permite a aplicação do conhecimento científico na indústria ou nos
3.3 Modelos do processo de decisão
3.3.1 Modelo racional clássico vs Modelo da racionalidade limitada
No modelo racional clássico, o “homem económico” (Simon 1955) teria um conhecimento absoluto, ou quase, do mundo que o rodeia e um sistema de preferências perfeitamente organizado. A juntar a estas características, possuiria também uma capacidade de cálculo que lhe permitiria avaliar todas as possíveis alternativas de decisão disponíveis e seleccionar aquela com maior valor na sua escala de preferências.
Ainda segundo Simon (Simon 1955), todos os modelos de comportamento racional incluiriam todos ou alguns dos elementos indicados a seguir:
Um conjunto A de opções ou decisões alternativas.
O subconjunto de alternativas A’ (A’A) de que o agente inteligente tem conhecimento (contexto) e de que tem percepção (cognição). Ou seja, o
agente faz a sua escolha de entre um conjunto de alternativas mais reduzido do que aquele que de facto existe.
O conjunto S de estados futuros possíveis resultantes, ou consequência, do conjunto de alternativas.
Uma função de recompensa V(s), definida para todos os elementos s de S, capaz de permitir calcular o valor ou a utilidade de cada um dos resultados possíveis. Em muitas situações bastará uma relação de ordem entre eles, mesmo parcial, de acordo com a escala de preferências do agente, isto é, uma relação que permita estabelecer, para um par de valores (s1, s2), se s1 é preferido a s2.
Informação sobre qual o estado futuro em S que resultará de uma determinada escolha a A. Esta informação pode ser incompleta, ou seja pode haver mais de um resultado possível s para cada alternativa a. Informação sobre a probabilidade de cada resultado particular s ocorrer se a alternativa a for escolhida, Pa(s), sendo que ∑ 1. Assim, no modelo racional clássico, uma alternativa só é óptima se: i) existir um conjunto de critérios que permitem que todas as alternativas sejam comparadas e ii) a alternativa for escolhida segundo esses critérios. À teoria clássica Simon contrapõe um modelo de racionalidade limitada (Simon 1997), introduzindo o conceito de decisões satisfatórias. Uma alternativa é satisfatória quando: i) existe um conjunto de critérios que descreve um mínimo de satisfação para as alternativas e ii) a alternativa escolhida satisfaz esses critérios. Ficam assim cobertas as situações, que Simon considera mais próximas da realidade, em que não é viável gerar todas as alternativas possíveis nem é possível ou interessante procurar a alternativa óptima. O decisor deverá então seleccionar a primeira alternativa que satisfaça os critérios de decisão.
“Instead of assuming a fixed set of alternatives among which the decision maker chooses, we may postulate a process for generating alternatives. Instead of assuming known probability distributions of outcomes, we may introduce estimating procedures for them, or we may look for strategies for dealing with uncertainty that do not assume knowledge of probabilities. Instead of assuming the maximization of a utility function, we may postulate a satisficing strategy.” [pág. 291]
É o “homem administrativo”, por oposição ao “homem económico” da teoria clássica, que tem em conta as limitações cognitivas do decisor, nomeadamente a impossibilidade de conhecer todas as alternativas possíveis e a incapacidade de estabelecer critérios absolutos para optimizar as suas decisões. Procura, assim, tomar decisões atendendo aos padrões mínimos de satisfação e nunca de optimização.
Aos elementos identificados acima Simon acrescenta um modelo de processo de tomada de decisão dividido em três fases (Simon 1977): 1. Inteligência (Qual é o problema?); 2. Concepção (Quais são as soluções alternativas?); 3. Escolha (Qual é a melhor alternativa?). A Figura 3.5, adaptada de (Lu, Zhang et al. 2007) e de (Mora, Forgionne et al. 2002), mostra esquematicamente estas fases, juntamente com a fase de implementação, a qual foi acrescentada mais tarde por Robert Sprage e Dave Carlson (1982).
Figura 3.5 ‐ Modelo do processo de decisão
Inteligência
Na fase da inteligência a realidade que rodeia a organização é analisada, de forma intermitente ou contínua, visando a identificação de um problema ou de uma oportunidade de mudança. A percepção da necessidade de uma actividade de decisão desencadeia o processo.
A identificação de um problema passa pela compreensão dos pressupostos de gestão da organização, dos limites e da missão desta, e das condições iniciais e desejadas. Tem como objectivo principal esclarecer todos os aspectos em presença e preparar uma descrição completa do problema. Para a tomada de decisão em grupo
esta descrição é ainda mais importante, para uma compreensão clara do que está em jogo, por parte de todos os elementos.
Como exemplo de problema vamos considerar que um utente do VirtualECare necessita de ser operado para colocação de uma prótese na anca, que vai melhorar consideravelmente a sua mobilidade.
A análise de requisitos identifica as condições que qualquer solução aceitável deverá cumprir, ou seja, as restrições impostas ao conjunto de soluções possíveis. Os requisitos podem ser definidos através da recolha de dados e da análise da situação. Os requisitos para o exemplo acima podem incluir o custo da prótese e o prazo para a realização da operação.
Concepção
A fase da concepção inclui todas as tarefas necessárias para gerar diferentes soluções para o problema. O grupo de decisores pode optar por procurar soluções já prontas, por adaptar uma dessas soluções ou por desenvolver soluções específicas.
Esta fase começa com a identificação dos objectivos para a decisão do problema e estabelecimento das respectivas metas. Pode haver objectivos conflituantes e nem todos terão o mesmo grau de importância. As metas devem permitir quantificar os objectivos ou estabelecer uma medida que permita avaliar se um dado objectivo foi atingido. Para uma decisão em grupo pode ser necessário resolver opiniões contrárias sobre objectivos, recorrendo por exemplo à negociação, e mesmo à votação, até se chegar a um conjunto de objectivos e metas aceite por todo o grupo.
Os objectivos definidos ajudam na geração de alternativas, as quais devem cumprir os requisitos identificados na fase anterior. Esta verificação pode ser exaustiva no caso de o conjunto de alternativas ser finito, terminando com a obtenção de uma lista explícita de soluções, ou, sendo infinito, será o conjunto de soluções que satisfaz as restrições, na formulação matemática dos requisitos. A
produtividade individual dos membros de um grupo pode ser multiplicada por técnicas desenvolvidas há várias dezenas de anos, como o brainstorming22, criado por Alex Osborn em 1953, ou o Synectics23, desenvolvido por George Prince e William Gordon nos anos cinquenta. Uma descrição destas técnicas pode ser encontrada em (Stewart, Shamdasani et al. 2006).
Na fase de concepção é construído o modelo que permitirá avaliar as diferentes alternativas. Isso é feito à custa da definição de um conjunto de pressupostos, que implica normalmente uma simplificação da realidade, e do estabelecimento das relações entre as variáveis em jogo. O modelo é então validado e são definidos os critérios de acordo com os objectivos. Muitas vezes, o processo de construção do modelo permite identificar soluções potenciais e vice‐versa. Este modelo está associado a um método ou a uma ferramenta de decisão, que deverá também ser seleccionado nesta fase. A selecção do método mais apropriado depende do tipo de problema em concreto e do contexto do processo de decisão. No caso da decisão em grupo deverá ser ajustado à forma como vão decorrer os trabalhos, por exemplo se as reuniões vão ocorrer com todos os participantes no mesmo local e se existe um líder, entre outros. Escolha A fase da escolha tem por objectivo a selecção de uma das soluções propostas para o modelo adoptado antes, de entre as alternativas identificadas na fase anterior.
22 Numa sessão de brainstorming, com ou sem moderador, os membros do grupo são instados a
conceber soluções sem se preocuparem com o seu custo ou exequibilidade, por mais inverosímeis que possam ser. Os membros não devem criticar as ideias uns dos outros, mas, pelo contrário, devem até desenvolvê‐las ou redesenhá‐las. Pretende criar‐se um ambiente que favoreça a criatividade e o aparecimento de um grande número de ideias, na expectativa que desse grande número surja, pelo menos, uma ideia aproveitável.
23 Synectics é uma abordagem mais estruturada que o brainstorming para a geração de ideias. Exige
um moderador habilitado, capaz de conduzir o grupo numa análise do problema e procura de soluções segundo perspectivas não habituais, eventualmente por analogia com situações que não têm directamente a ver com o problema. Por exemplo, o moderador pode sugerir que o grupo naufragou numa ilha deserta sem as ferramentas habituais para as tarefas do dia‐a‐dia, mas com amplos recursos naturais à disposição.
A primeira tarefa passa pela avaliação das alternativas face aos objectivos definidos, usando os critérios fixados antes e seguindo o método adoptado. Em face de problemas multi‐atributo a escolha torna‐se mais difícil, podendo na prática ser usadas diversas estratégias de decisão, muitas delas baseadas em heurísticas.
Se possível, a solução é testada para determinar a sua viabilidade.
Nesta fase podem ser usadas diferentes técnicas de decisão, conforme a decisão é tomada por um indivíduo ou em grupo. A seguir, e apenas como exemplo, apresentam‐se alguns métodos de decisão em grupo (Lu, Zhang et al. 2007):
Regra da maioria – a decisão é baseada numa votação das alternativas, após um período de discussão. Permite decisões rápidas, mas o resultado pode ser afectado se não for dado o tempo suficiente para a discussão.
Regra da minoria negativa – são votadas e eliminadas sucessivamente as alternativas consideradas menos interessantes, até restar apenas uma. Útil quando há muitas alternativas e o grupo é constituído por poucos membros. É um método mais lento e pode levar a uma menor satisfação entre os membros do grupo.
Regra do ranking – os participantes atribuem uma pontuação a cada alternativa, por exemplo um valor entre 1 e 10 – sendo 10 a melhor pontuação. São somados os pontos obtidos por cada alternativa e é escolhida a alternativa que conseguir maior pontuação. Embora este método inclua uma votação, pode ter como resultado uma solução que não é a primeira escolha de nenhum dos membros do grupo, com os consequentes problemas potenciais de suporte à decisão na sua implementação.
Regra do consenso – a decisão é discutida e negociada até que todos os membros concordam que esta é aceitável e que corresponde à melhor linha de acção. Todos os participantes têm a mesma capacidade de
influenciar a decisão final, ou pelo menos estão convencidos disso, e continuarão a suportar o grupo. Obriga a um cuidado acrescido na partilha da informação e nos canais de comunicação entre os participantes. Obviamente é um método tendencialmente mais demorado, sendo por vezes difícil ou até impossível chegar a um consenso, o que leva a que seja habitualmente combinado com outros métodos.
Implementação
A fase da implementação é auto‐explicativa. A solução seleccionada é implementada, podendo, em caso de insucesso na resolução do problema, regressar‐ se a uma das fases anteriores.