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Diante da necessidade da busca de dados para análise e construção da realidade, dentro da pesquisa qualitativa, a investigação etnográfica neste trabalho serve para demonstrar como esta abordagem de estudo traz algumas contribuições importantes para o campo das pesquisas de cunho qualitativo. Dentro desta perspectiva, investigamos as interações dos indivíduos e suas relações com o fenômeno aqui estudado. Deste modo, ao utilizarmos a pesquisa etnográfica, pudemos conhecer em profundidade as atitudes, crenças e valores do comportamento destes atores (BERGER e LUCKMANN,1985; NOVAZZI, 2006).

A etnografia tem suas raízes plantadas na fenomenologia, com marcas do interacionismo simbólico e da sociologia weberiana. A etnografia baseia-se no princípio da pesquisa social, de que a sociedade e a compreensão do mundo social estão em movimento constante; portanto, as generalizações não fazem sentido. Seus resultados são realmente uma fotografia do momento e revelam um consumidor real, com suas incoerências, vulnerabilidades, sem máscaras ou rótulos. O senso comum é valorizado para a compreensão do social e o observado procura interpretar aquilo que o sujeito já havia interpretado dentro do seu universo simbólico. É um estudo de significado da “vida diária”.

44 Na etnografia, o pesquisador se insere no ambiente do consumidor, buscando por meio da observação, informações sobre seu comportamento de consumo (LIMA et al, 1996;

NOVAZZI, 2007).

No processo de investigação, deve-se levar em consideração não só o que é visto e experimentado, como também o não explicitado, aquilo que é suposto, ou seja, de uma colocação geral, supostamente entendida, vai se subtraindo questionamentos, até que tudo fique explícito. A linguagem é um ponto importante a se considerar, pois somente o ator pode dar a dimensão exata, o conteúdo e as razões de suas colocações, já que são as experiências que definem o conteúdo significativo da interação consumo (LIMA et al, 1996;

NOVAZZI, 2007).

É válido salientar que a pesquisadora entende a linguagem constituída pelos aspectos sociais e culturais, haja visto que o legado de uma cultura se constrói ao longo do tempo, criando marcas de uma historicidade que será passada de uma geração à outra através da oralidade. Defendemos a idéia de uma competência comunicativa incluindo não somente as regras da comunicação e interação, mas também regras culturais que, por sua vez, estabelecem uma base para o contexto e conteúdo dos eventos comunicativos e processos interacionais (FARIAS JUNIOR, 2004).

Considerando a perspectiva antropológica da filosofia de Wittgenstein, a etnografia não é de várias culturas, mas de interações nas situações cotidianas na qual o observador compartilha seus costumes com os indivíduos a serem pesquisados com o objetivo de compreendê-lo (LEÃO, 2008). E, ainda, que a fala seja socialmente organizada, tanto no

aspecto de quem fala para quem fala, quanto no aspecto face a face e que são orientados e confirmados pelos aspectos culturais dos grupos sociais estudados (GOFFMAN, 2002).

Neste trabalho, diante das diversas formas da etnografia, utilizamos a etnografia da comunicação, que tem como foco a linguagem, como um conjunto de recursos simbólicos

45 que entra na constituição do sistema social e a representação do individual de mundos reais ou possíveis (WIKIN, 1988).

A etnografia da comunicação tem por objetivo compreender os determinados aspectos culturais, em estudo, sob a ótica da interação verbal entre seus participantes, considerado por Leão e Mello (2007), uma “comunidade de fala” por acontecer um compartilhamento no uso dos signos (lingüísticos ou não) da linguagem. Outros elementos também podem descrever o contexto de uso: a forma e conteúdo da mensagem, o cenário, os participantes, o efeito da comunicação, o meio, o gênero e as normas de interação (HALLIDAY e HASAN, 1989).

Para uma metodologia como a etnografia da comunicação faz-se necessária a compreensão da significação, isto é, “como os signos de nossa linguagem adquirem significação”. Esta compreensão do que ocorre nas interações verbais é fundamental, uma vez que, os atores interacionais fazem uso “do signo e não dos significados em si”, ou seja, o que o signo representa (LEÃO e MELLO, 2007).

Esta pesquisa utilizando a etnografia da comunicação foi realizada por meio da observação participante e não participante. A adoção desta abordagem é uma opção da etnografia e não uma imposição da pesquisa etnográfica (ANDIAN e SERVA, 2006).

Partindo do pressuposto de que o indivíduo, para manter-se no organismo social, necessita de um instrumento-base, que é a linguagem, faz-se necessária a compreensão de sistemas de sinais, possibilitando a sua atuação, ou seja, a sua interação social. Deste modo, torna-se possível o entendimento da construção social da realidade do grupo social pesquisado.

Considerando que os analistas de discurso vêem todo discurso como uma prática social, na análise de discurso funcional a “linguagem não é vista como um epifenômeno, mas como uma prática em si mesma” (GILL, 2002, p.248). Dentre os diversos tipos de

46 análise de discurso, nosso estudo da linguagem deu-se por meio da análise de discurso funcional.

Por meio da análise de discurso funcional é possível ultrapassar o cerco das palavras e encontrar, em outros sistemas de análises, a química que forma os diversos sentidos das representações sociais no organismo social. Ela possibilita a descrição e análise da dimensão representativa, ou seja, estruturação dos signos, dos objetos, dos processos ou fenômenos inter-relacionados à formação e apreensão do conhecimento humano (MANHÃES e ARRUDA, 2004).

A função é sempre uma ação. A função sempre se refere a algo, que, neste caso, é o ato da fala: quando falamos, estamos agindo. Conseqüentemente, a análise de discurso funcional é a análise de uma ação verbal de um discurso oral (LEÃO, 2008). A análise de

discurso propicia a afirmação de que a linguagem é um sistema mediador em todos os discursos e que a realidade se constrói pela linguagem, sendo que entre linguagem e sociedade há uma relação dialética, pois uma determina a outra, e as escolhas ou opções realizadas pelo indivíduo no ato comunicativo influenciam e sofrem influência da realidade social que, de certa forma, constituem o contexto de situação e de cultura do evento. Nesse sentido, Pereira e Almeida (2002, p. 245) afirmam que:

Uma realidade se constrói à medida que se fazem opções dentro da língua e à medida que essas opções influenciam, determinam ou legitimam comportamentos na sociedade. (...) a realidade é um reflexo das escolhas que fazemos quando produzimos linguagem, ou ainda, que aquilo a que chamamos de realidade se constrói pela linguagem.

Como atores sociais que somos, estamos a todo o momento sendo orientados pelo contexto interpretativo em que vivemos e tentando nos adaptar e ele. Baseados nesta premissa analizamos o discurso como linguagem e como contexto interpretativo simultaneamente. Consideramos que a análise de discurso funcional e a sociolingüística

47 interacional podem ser trabalhadas conjuntamente. Pois, enquanto a etnografia da comunicação preocupa-se com os aspectos culturais de uma comunidade sob a ótica da interação verbal, a sociolingüística interacional preocupa-se com o contexto interacional, ou seja, os fatos que ocorrem enquanto as pessoas interagem (LEÃO, 2007).

A seguir veremos como a construção do corpus da pesquisa e sua posterior análise.

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