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Dentro das sociedades pós-modernas é evidente uma luta de classes como meio de se sobressair para dominar e não ser dominado. As classes buscam a distinção como meio de sobrevivência e manutenção das mesmas. Para analisar esta luta de classes, pela teoria de Bourdieu, se faz necessário compreender suas bases que estão fincadas na teoria do habitus e na teoria do campo, que estão entrelaçadas. Uma é o meio e a conseqüência da outra. Bourdieu analisou a relação entre classes sociais e consumo, tendo este – o consumo - como o campo das relações de poder (ANDRADE, 2007; MATTOSO, 2005).

A teoria de Bourdieu é fundamentada em três premissas que articulam todo seu processo de produção: o conhecimento praxiológico, a noção de habitus e o conceito de campo.

Sempre engajado em lutas sociais, defensor da autonomia intelectual e revolucionário, uma vez que quando todo o mundo falava que a educação era fundamental para reduzir as desigualdades sociais, ele constatou que a educação contribui para perpetuar as desigualdades, pois quanto maior for o estudo, maior será o capital social e, conseqüentemente, as diferenças de status e estilos de vida (BERGER, 2008; THIRY-

37 Este status e estilo de vida são, por sua vez, determinados pelo habitus definido como um sistema de disposições, maneira de perceber, de sentir, de pensar e de fazer que nos impulsionem a ter determinadas atitudes em determinadas circunstâncias. Circunstâncias estas que refletem a interiorização das estruturas sociais e histórias individuais e coletivas. O habitus mostra como as diferentes posições no espaço social, gestos nas posturas (corpo) e nas formas de ver, de classificar (mente) do grupo inscrito em um campo. Nele podemos encontrar a trajetória da existência social dos indivíduos, que tendem a se atualizar - podendo ser reversíveis e apreendidos.

O habitus constitui o mundo social representado, ou seja, o espaço dos estilos de vida. O conjunto de propriedades (bens materiais: casas, móveis, automóveis, roupas, livros, etc.) e as práticas que manifestam sua distinção – esportes, jogos, distrações culturais legitimadas no habitus é determinante da origem dos estilos de vida. O habitus funciona como esquema de ação, de percepção, de reflexão (BOURDIEU, 2007; SLATER,

2002; THIRY-CHERQUES, 2008).

O habitus é uma forma de capital cultural que passou a fazer parte dos indivíduos, assimilado ao longo do tempo e não comprado como qualquer objeto. De posse deste capital, que passa a fazer parte de seu possuidor, transforma-se em habitus, que passa a depender da capacidade de aprendizado do indivíduo.

Para Bourdieu (2007, p. 162), o habitus “é a capacidade de produzir práticas e obras classificáveis, além da capacidade de diferenciar e de apreciar essas práticas e esses produtos (gosto)”. O gosto e as apropriações destes princípios culturais sob a visão de Bourdieu fazem parte do processo de origem dos estilos de vida. Denomina-se ‘estilo de vida’ o conjunto do capital cultural e do capital econômico estabelecido como “distinto” por sua própria raridade, podendo ainda ser considerado “vulgar” pela facilidade, pelo comum de ser.

38 Como estilo de vida, Bourdieu define como a retradução simbólica das diferenças que existem de fato na empiria, ou seja, no habitus. Ou seja, estilo de vida é a forma como as pessoas ou grupos vivenciam a realidade e conseqüentemente, fazem suas escolhas. Escolhas estas que são expressas na lógica específica de cada um dos seus espaços simbólicos: móveis, vestuário, linguagem ou estilo corporal. Deste modo, os grupos dependem do consumo de bens materiais e simbólicos expressos pelo estilo de vida. Portanto, a preferência por certos bens culturais funciona como demarcador de classes. As diferenças entre as classes sociais se exprimem por meio dos bens adquiridos, sejam eles quadros de artistas famosos ou reproduções de quadros, vinhos franceses ou garrafões de vinhos populares.

Para facilitar este entendimento se faz necessária a apresentação de outro conceito de Bourdieu: o campo. Ele define campo como o espaço onde se manifestam as relações de poder; poder este, estruturado pelo seu “capital”, neste caso, social. São chamados de ‘dominantes’ os que detêm maior capital social, e ‘dominados’ os que detêm menor capital social. Deste modo observamos que o estilo de vida reproduz as diferenças sociais. Estas diferenças são observadas desde a escolha e consumo do lazer até o vestuário, passando pela alimentação e esportes (STREHLAU, 2005).

Para que um campo funcione, entende Bourdieu, se faz necessário que haja objetos de disputas e pessoas prontas para disputar o jogo, dotadas de habitus que impliquem no conhecimento e reconhecimento das leis imanentes do jogo, dos objetos de disputas, etc. (PILATTI, 2006).

Porém, existe um paradoxo: quanto maior a hierarquia social mais as verdades do gosto e preferência dependem do ensino, portanto, da cultura. No entanto, por vezes, há discrepância entre os títulos escolares e o gosto cultural, a que chamamos de “gosto de berço” com maior legitimidade, interiorizado desde a infância. Este gosto se contrapõe

39 com o conhecimento adquirido nos estudos. Neste momento vai prevalecer o capital cultural como meio de distinção.

Capital cultural, segundo Bourdieu, é o conjunto de habilidades e informações que se obtém como resultado de qualificações intelectuais produzidas e transmitidas pelas famílias e pela escola (formação escolar). Quanto ao capital econômico, compreende a riqueza material (bens, patrimônio, trabalho). Aos conjuntos de acessos sociais, aos relacionamentos, às interações entendemos como capital social. Quanto ao capital simbólico consideramos os rituais de reconhecimento social que compreende o prestígio, a honra; ou seja, o capital simbólico é uma síntese do capital econômico, cultural e social.

A importância da obra de Bourdieu se dá quando da reunião dos diversos aspectos culturais na compreensão da natureza cultural do consumo. Deste modo, através da teoria da prática do gosto onde as formas culturais de escolha e preferência se dão no interior dos sistemas de estratificação, de modo a consolidar seus lugares nos campos sociais. A este processo Bourdieu chama de “distinção”. Distinção esta, onde o uso dos bens e o significado dos mesmos os distinguem nas relações sociais hierárquicas. Podemos dizer também, que o consumo é cultural, ao exercermos a exibição do nosso gosto ou estilo, ou seja, dando indícios visuais de nossa posição social (SLATER, 2002; BERGER, 2008; THIRY-

CHERQUES, 2008).

Bourdieu analisa as relações entre classe social e práticas de consumo, com foco em ferramentas conceituais para analisar a lógica do consumo. O gosto é a capacidade de julgar os valores estéticos de maneira imediata e intuitiva. A classe social é um produto da renda, no entanto a posição social nem sempre pode ser explicada pela variação da renda. Há uma preocupação dos indivíduos com o status social, derivado da diferenciação ocupacional, embora o status econômico não o leve a mudança de classe, assim como a

40 renda também não explique as escolhas destes consumidores. Bourdieu vê o comportamento de consumo como uma manifestação de conflito de classes.

Porém, para Bourdieu, o que realmente diferencia as classes está no princípio das diferenças que se observa no campo do consumo, e “muito além dessa área, é a oposição entre gostos de luxo (ou de liberdade) e os gostos de necessidade” (2007, p.168). Os gostos de luxo são os resultados de condições materiais caracterizadas pela ‘distância’ das necessidades, pela facilidade de consumo garantida pela posse de um capital. Já os gostos de necessidade exprimem por si próprios, as necessidades de que são o produto.

Deste modo, podemos distinguir claramente itens que assumem formas completamente inversas entre as classes: alimentação, cultura e despesas com apresentação pessoal e com representação: vestuário, cuidados com beleza, artigos de higiene, pessoal de serviço. Cada um destes itens fornece traços distintivos que permite exprimir diferenças sociais que possibilita identificação clara da classe a que cada membro pertence. E dentre todos os universos de consumo, o universo do luxo é o que mais claramente o codifica e o distingue.

Diante da conclusão da fundamentação teórica se faz necessário a apresentação dos procedimentos metodológicos com nossa orientação paradigmática, método de pesquisa, o corpus da pesquisa e seu processo de análise.

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3 Métodos de Pesquisa

Toda pesquisa com dados empíricos pressupõe um método, uma maneira pela qual o pesquisador encaminha a investigação do seu tema de interesse. A escolha do método ou metodologia relaciona-se com a visão que o pesquisador tem da realidade a ser estudada, permitindo assim a localização em um determinado paradigma de pesquisa (MOITA LOPES,

1994).

Neste capítulo serão apresentados os princípios ontológicos, epistemológicos e axiológicos da pesquisa assim como orientação paradigmática. Em seguida veremos o método escolhido para o desenvolvimento do trabalho e sua abordagem. O corpus da pesquisa será apresentado com seus dados, método de coleta, validade e confiabilidade e, finalmente, o plano de análise dos dados com indicação do tipo de análise que será utilizada.

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