• Nenhum resultado encontrado

Música MPB

No documento Download/Open (páginas 114-119)

PERSPECTIVA CULTURAL

6. Música e dança 1 Dança

6.3. Música MPB

6.3.1. E assim se passaram... 50 anos

A capa da edição nº 378 tem como chamada “Os 50 anos da bossa nova” e a reportagem, assinada por Tom Cardoso, intitula-se “E assim se passaram... 50 anos”187,

187

completada pela linha-fina: “A bossa nova chega à meia-idade em abril, mês em que foi lançado o disco ‘Canção do Amor Demais’, em 1958, cuja polêmica quanto à data é explicada no lead e desenvolvida em toda a matéria a partir da opinião dos principais envolvidos:

As efemérides de música brasileira costumam ser marcadas por longas controvérsias. No ano passado, anunciou-se que o samba completava 90 anos por causa da primeira gravação de “Pelo Telefone”, de Donga, no Rio, o que provocou uma onda de protestos de historiadores baianos, pernambucanos e mineiros. Todos reivindicavam a paternidade para seus Estados e contestavam o marco inicial. Agora é a vez de uma cria do samba, elegante e sofisticada, abrir os festejos. A bossa nova chega à meia-idade em abril, quando se completam 50 anos do lançamento de “Canção do Amor demais”, disco gravado por Elizeth Cardoso, o mesmo que abriu o espaço para a revolucionária batida de violão de João Gilberto em duas faixas, “Chega de Saudade”, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes, e “Outra Vez”, de Jobim.

O EU& informa que Carlos Lyra e Roberto Menescal não concordam que o disco da Elizeth seja considerado o marco da bossa nova e explica que há dois outros embriões: 1) em 1957 (músicos da classe média carioca: Lyra, Nara Leão, Menescal e Sylvia Telles), o primeiro movimento musical a sair das faculdades; 2) em 1958 (para muitos o verdadeiro início) com o lançamento pela Odeon do disco 78 rotações, “Chega de Saudades” e “Bim Bom” de João Gilberto.

O suplemento continua a argumentação sobre a falta de consenso quanto ao marco inicial e informa que para Billy Blanco188 o gênero nasceu quando, em 1953, Johnny Alf compôs “Rapaz de Bem” com estrutura harmônica arrojada para a época. Carlos Lyra discorda por entender que o Alf foi importante por causa dos acordes dissonantes, mas não fez bossa nova, pois era um movimento elitista, nem por isso de menor valor. Já para Marcos Valle, “o que caracteriza a bossa nova é o ritmo da batida do violão de João Gilberto, a harmonia de Tom Jobim e as letras de Vinícius de Moraes”. Ou seja, o

188

EU& se reafirma como espaço de debate ao apresentar a diversidade de opiniões para o leitor.

Mantendo a polêmica, o suplemento também expõe alguns dos conflitos ao acrescentar que Sérgio Ricardo deixou de frequentar as reuniões na casa de Nara e saiu da bossa nova quando surgiu “o clubinho zona sul”. Para Claudette Soares o grupo era preconceituoso, diz que, no Rio só conseguiu cantar em um grande evento porque ela era conhecida como a “princesinha do baião” e que quando decidiu gravar Roberto Carlos a porta se fechou de vez. O caderno informa, ainda, que Alaíde Costa tem queixa semelhante, pois por ser negra, os produtores queriam que ela cantasse samba.

A partir da narrativa do suplemento, o leitor toma conhecimento de que Oscar Castro Neves, Sérgio Mendes, Luiz Bonfá e Eumir Deodato tiveram longa carreira de sucesso nos EUA com o samba de João Gilberto e que, em 1962, ano do show no Carnegie Hall, Stan Getz e Charlie Byrd (músicos de jazz) gravaram versão instrumental de “Desafinado” (Jobim e Newton Mendonça). Tom Jobim e João Gilberto também tiveram várias músicas gravadas por Frank Sinatra, Ella Fitzgerald, Miles Davis, Sarah Vaughan, Oscar Peterson, Bill Evans. O suplemento informa que essas gravações despertaram a fúria de certos críticos, como José Ramos Tinhorão, que defendia a tese de que a bossa nova era “uma cópia barata da música popular americana”. A reportagem traz a informação inusitada de que, em represália às críticas, “Jobim comprou a planta tinhorão e fazia o último xixi da noite nela”.

O texto traduz uma atmosfera de agradável saudosismo por parte das fontes, mas sem apelação. Informa que a fase ortodoxa do gênero foi de 1958 a 1965, quando deixou de ser “amor, sorriso e flor” e Carlos Lyra e Sérgio Ricardo compuseram canções mais politizadas e Nara passou a receber músicos do morro, como Zé Keti e Paulinho da Viola. A segunda fase influenciou diretamente uma geração inteira de músicos: Chico Buarque, Edu Lobo, Francis Hime, Caetano Veloso, Gilberto Gil (MPB). Segundo o EU&, Carlos Lyra se orgulha do movimento bossa nova: “As duas fases da bossa nova, a romântica e a social, têm grande valor artístico. (...) O nosso legado é grande”.

A reportagem tem fluência verbal bem articulada, reconhece a contribuição inegável da bossa nova para a cultura brasileira em relação a referenciais internacionais, expõe com cuidado a opinião dos entrevistados de forma abrangente, sensível e contextualizada para situar o leitor quanto ao significado de cada apreciação, e, mais uma vez, deixa para o leitor a tarefa de decidir. Além dos citados, ouve também Tarik de Souza (crítico musical), Jairo Severiano (pesquisador) e Marcos Valle.

6.3.2. Aquela velha amizade

O título da segunda matéria, também de autoria de Tom Cardoso, é “Aquela velha amizade”189. Trata-se de uma entrevista mútua de artistas da bossa nova (eles se entrevistam, em tom de “roda de conversa” sobre histórias, personagens e bastidores dos 50 anos do movimento artístico): Alaíde Costa, Carlos Lyra, Claudette Soares, Roberto Menescal, Billy Blanco, Normando Santos, Sérgio Ricardo e Marcos Valle.

A entrevista, no formato pingue-pongue flui, ao que tudo indica (até pelo título) espontaneamente. Assim, o suplemento aparentemente não interfere e registra as respostas de vários representantes do gênero musical. Carlos Lyra diz que a bossa nova é a expressão de uma classe social de uma época e não um “estado de espírito”; Roberto Menescal diz que há muitas canções de bossa nova, mas que o público quer ouvir sempre as mais famosas, que todos os dias há cantores novos e que, portanto, não há músicas suficientes para todos. Sérgio Ricardo informa que em 2008 vai lançar um disco com as canções censuradas pelos militares e que não sabe se faria outra do tipo “Zelão” para protestar contra o governo Lula, porque os avanços sociais no governo dele são inegáveis.

Marcos Valle diz que a canção favorita dele é “Dia de Vitória” (feita depois da “Passeata dos Cem Mil”, em 1968, no Rio) e a mais famosa e que lhe deu mais dinheiro foi “Samba de Verão”. Claudette Soares afirma que “a escola de Elizeth Cardoso era o samba- canção”, mas que ela era uma intérprete de vários recursos e não precisava ficar presa a gênero nenhum. Billy Blanco menciona que o Rio está violento, mas ainda serve de inspiração, que tem várias canções na gaveta, mas não quer gravar do jeito que as gravadoras propõem. Normando Santos (mais de 40 anos morando em Paris) diz ser esta é a razão de ter sido marginalizado pela turma da bossa nova, pois o filme “Coisa Mais Linda – Histórias e Casos da Bossa Nova”, dirigido por Paulo Thiago, em 2005, nem sequer cita o nome dele.

Como se pode perceber, aparentemente não há roteiro prévio para as perguntas e o leitor passa a ser inserido nas reminiscências desta “roda de conversa” cultural de forma absolutamente natural.

6.3.3. Festivais, shows e filme para celebrar

A terceira matéria, também de Tom Cardoso, sobre o tema tem por título “Festivais, shows e filme para celebrar”190 e tem por gancho o anúncio de quatro eventos comemorativos

189

“Aquela velha amizade” – EU&, nº 378 , de 4, 5 e 6/jan/2008, p.15-16 190

dos 50 anos da Bossa Nova: (1) o lançamento da agenda “Anotações com Arte” com os olhos de Nara estampados; (2) o filme da vida de Tom Jobim a ser feito por Nelson Pereira dos Santos; (3) a realização de festivais universitários de bossa nova e (4) um grande espetáculo que vai reunir em Brasília, SP e Rio artistas internacionais e velhos militantes do gênero.

O EU& relembra que a “agenda” já homenageou Vinicius, Chico e Tom Jobim e foi idealizada por Fred Rossi que também acerta os detalhes para os festivais em 15 cidades paulistas entre maio e junho (presenças confirmadas: Roberto Menescal, Carlos Lyra, Wanda Sá e Os Cariocas). Informa, ainda, que, apesar dos protestos de Carlos Lyra, os empresários escolheram mesmo o disco de Elizeth em abril como marco da bossa nova em outro evento que deve juntar velhos amigos e parceiros para o festival “Chega de Saudade – 50 Anos de Bossa Nova”, organizado pelo empresário Leonardo Soltz e pelo produtor artístico Rogério Brandão em clima do Carnegie Hall –Nova York, 1962, misturando artistas brasileiros e americanos como Tommy James e Kristine Mills (pianista e vocalista da Duke Ellington Orchestra) e do guitarrista John Pizzarelli - evento previsto para Brasília, Rio e São Paulo depois para a Europa, EUA e Japão. Ou seja, informa que as atividades comemorativas vão extrapolar o território nacional, mas que ainda não conseguiram convencer João Gilberto a dar uma canja, pois o músico “anda cada vez mais recluso”. Haverá, ainda, homenagem a Tom Jobim (1994) e cita os eventos que registram esse reconhecimento:

A caixa “Maestro Soberano”, dirigida por Roberto de Oliveira, lançada pela Biscoito Fino, é um grande esforço de pesquisa, obrigatória para os fãs do músico e de música brasileira. Não há como entender o sucesso da bossa nova sem ouvir Jobim. A mesma Biscoito Fino acaba de lançar o DVD “A Casa do Tom – Mundo, Monde, Mondo”, deliciosa compilação de imagens dirigida por Ana Jobim, mulher de Tom por 17 anos. “É um filme caseiro, que narra a paixão do Tom pela música, pela família e, sobretudo, pela natureza”, conta Ana.

E, para encerrar as homenagens ao maestro, o EU& revela que em breve Nelson Pereira dos Santos deve começar as filmagens de “Antônio Carlos Jobim – O Homem Iluminado”, inspirado no livro homônimo escrito pela irmã do compositor, Helena Jobim. A reportagem fornece para o leitor as informações sobre eventos e produtos culturais referente ao gênero musical disponíveis no mercado. Ouve: Fred Rossi (produtor cultural) e Jairo Severiano (pesquisador).

No documento Download/Open (páginas 114-119)