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Manufatura

No documento leandrotheodoroguedes (páginas 58-68)

3 PROCESSO DE TRABALHO E BASE TÉCNICA: SUPERIORIDADE DE

3.1 O PROCESSO DE TRABALHO E A INFLEXÃO DA BASE TÉCNICA SEGUNDO

3.1.4 Manufatura

Os exemplos mais importantes do desenvolvimento da manufatura aparecem em Marx deixando muito latentes a divisão do trabalho como o princípio que a fundamenta, mas também como um salto em relação à cooperação (ou seja, trata-se de uma divisão do trabalho mais potente que aquela mera combinação de trabalhadores com uma base técnica superior).

Descreve Marx que “reúnem-se numa mesma oficina, sob o controle de um mesmo capitalista, trabalhadores de diversos ofícios autónomos, por cujas mãos têm de passar um produto até seu acabamento final” (MARX, 2013, p. 411). Isso ocorria no processo de fabricação de carruagens, por exemplo. O que na cooperação era um resultado do acréscimo de trabalhadores, aparece, agora, na manufatura, não como resultado último desse acréscimo, mas de uma combinação de diferentes trabalhadores, com diferentes habilidades, numa divisão qualitativa. Ou como define Moraes Neto (2003, p. 74): “as diferentes tarefas parciais anteriormente realizadas pelo artesão (e pelo ‘artesão-assalariado’ da cooperação simples) são destinadas a trabalhadores diferentes, surgindo dessa forma o trabalhador parcial”. Percebe-se que o princípio de divisão do trabalho é elevado a outro patamar com a criação de possibilidades de fabricação de produtos cada vez mais sofisticados. Ao mesmo tempo em que aquele saber operário intransponível nas mãos do artesão vai sendo progressivamente superado.

Vários caminhos levam a essas modificações. A diversificação de trabalhos num mesmo lócus implica modificações no trabalho, o “costureiro, o ferreiro, o correeiro etc. que se dedicam apenas à fabricação de carruagens perdem gradualmente, com o costume, a capacidade de exercer seu antigo ofício em toda sua amplitude” (MARX, 2013, p. 411). Aqui, demarcam-se dois pontos característicos da manufatura que precisam receber destaque: a especialização e a desqualificação relativa. Ambos são traços resultantes dessa divisão do trabalho que coloca lado a lado diferentes especialistas. A atuação destes profissionais especializados num mesmo processo e agora, limitada ao mesmo processo de um mesmo produto, leva à especialização de cada operário numa função específica na produção de um produto. A divisão do trabalho aloca cada um numa fase diferente da produção. Com o tempo, a repetição de movimentos retira o caráter mais minucioso do trabalho por eles executado, uma vez que aquele trabalho se torna parte de um processo complexo, e exponencia o caráter repetitivo. Consequentemente, a desqualificação é a perda progressiva da dependência dos saberes dos artesãos, dado a reprodução e a simplificação das tarefas. A habilidade deixa de ser progressivamente um atributo pessoal: “A autonomização dessas funções ou sua atribuição a trabalhadores específicos só passa a representar uma vantagem com a ampliação do número de trabalhadores ocupados” (MARX, 2013, p. 421). Coloca-se em marcha os processos de quebra daqueles saberes detidos por poucos.

Tanto a desqualificação quanto a especialização (e tudo o mais que esteja embutido nisso como a padronização dos movimentos) não são, portanto, resultado do capitalismo tardio, mas de uma fase dependente da manufatura (ainda no século XVIII), uma vez que “seu princípio peculiar da divisão de trabalho provoca um isolamento das diferentes fases de produção, que,

como diversos outros trabalhos parciais artesanais, se autonomizam mutuamente” (MARX, 2013, p. 418). A questão central é que, mesmo não havendo uma mudança drástica no processo produtivo, a diversificação da organização do trabalho cria novas possibilidades de exploração do trabalho. Sinteticamente:

Por um lado, portanto, a manufatura introduz a divisão do trabalho num processo de produção, ou desenvolve a divisão do trabalho já existente; por outro, ela combina ofícios que até então eram separados. Mas seja qual for seu ponto de partida particular, sua configuração final é a mesma: um mecanismo de produção, cujos órgãos são seres humanos (MARX, 2013, p. 413).

A diferença fundamental que se inaugura é justamente a criação de um mecanismo (produto desta divisão do trabalho), que até então não tinha se desenvolvido na cooperação simples, e agora cria as condições de produção dos mais complexos bens nas mais altas quantidades. Ou seja, a divisão do trabalho chega ao seu patamar mais desenvolvido propiciando um processo de produção sistematizado pela articulação da divisão do trabalho, elevando as condições de produtividade e concentrando muitos trabalhadores que anteriormente atuavam isoladamente.

Duas são as formas básicas do desenvolvimento da manufatura, derivadas justamente daquelas duas formas de divisão do trabalho que se generalizam nessa fase da manufatura (citadas no exemplo das carruagens). Entende-se que o “duplo caráter provém da natureza do próprio produto. Este ou é constituído por mera composição mecânica de produtos parciais independentes, ou deve sua configuração acabada a uma sequência de processos e manipulações encadeadas” (MARX, 2013, p. 416). No caso dessa composição mecânica, ou manufatura heterogênea: “o fracionamento da produção em inúmeros processos heterogêneos permite pouca aplicação de meios coletivos de trabalho e o capitalista, com a fabricação fragmentada, economiza os gastos com instalações fabris etc.” (MARX, 2013, p. 417). Aqui há um processo menos contínuo e o foco é justamente a combinação de processos e produtos independentes que formam o mecanismo fundamental do produto final. Por outro lado, tratando da chamada manufatura orgânica, “ao combinar ofícios originalmente dispersos, tal manufatura reduz a separação espacial entre as fases particulares de produção do artigo. O tempo de sua passagem de um estágio para outro é reduzido, assim como o trabalho que medeia essa passagem” (MARX, 2013, p. 418). Agora, a questão central é o aglutinamento de trabalhos semelhantes, eliminando o tempo gasto para tarefas de movimentação de materiais e outros procedimentos comuns aos ofícios de artesãos. Exemplificando, pode-se descrever esses processos como “orgânica, quando consiste na união de produtores independentes, como no caso da produção de relógios, e heterogénea, quando o produto deve passar por uma série de processos

consecutivos, como na fabricação do calçado” (KABAT, 2001, p. 3, tradução nossa)24. Um dos efeitos mais importantes que se erguem com essa sistematização é a evolução do trabalhador coletivo em detrimento da desqualificação do trabalho individual. É, portanto, no momento da manufatura quando a divisão do trabalho chega a seu desenvolvimento máximo. Em detalhes esse processo pode ser melhor descrito da seguinte maneira:

O trabalho artesanal permanece sendo a base, e essa base técnica limitada exclui uma análise verdadeiramente científica do processo de produção, pois cada processo parcial que o produto percorre tem de ser executável como trabalho parcial artesanal. É justamente porque a habilidade artesanal permanece como a base do processo de produção que cada trabalhador passa a dedicar-se exclusivamente a uma função parcial, e sua força de trabalho é então transformada em órgão vitalício dessa função parcial. (MARX, 2013, p. 413)

Embora a manufatura introduza inovações que modifiquem muito o processo de trabalho, as mudanças ocorridas na esfera da organização do trabalho (agora, necessariamente especializado e parcializado) são um indicador de continuidade do processo de trabalho fundado no trabalho vivo. O salto para a manufatura identifica o aperfeiçoamento mais acabado do sistema de cooperação, agora imposto pelo capitalismo. Mas há também um salto que coloca em perspectiva a possibilidade de produção em massa dos mais complexos produtos, sem depender das funções que antes poderiam ser executadas por artesãos muito qualificados. Já é possível ver como se ergue uma determinada mecanização do homem na manufatura, pois a divisão do trabalho cria um mecanismo que funciona pelo encadeamento das funções de cada operário. A precisão, rapidez e perfeição da execução dessas funções depende justamente das habilidades do operário, que desenvolve uma mecânica para esta execução coordenada pelas formas de organização do trabalho.

Nessa direção, seguindo as palavras do autor em tela,

A força produtiva aumentada se deve aqui ou ao dispêndio crescente de força de trabalho num dado período de tempo – portanto, à intensidade crescente do trabalho –, ou ao decréscimo do consumo improdutivo de força de trabalho. O excesso de dispêndio de força exigido em cada passagem do repouso ao movimento é compensado pela duração maior da velocidade normal, depois de esta ter sido alcançada (MARX, 2013, p. 415).

O desenvolvimento da divisão do trabalho tem também como uma de suas forças propulsoras a atuação da organização do trabalho no sentido de diminuir os esforços inúteis para a realização da tarefa, como método de exploração. Há aqui a incidência da reciprocidade

24 orgánica, cuando consiste en la unión de productos independientes, como en el caso de la producción de relojes,

y heterogénea, cuando el producto debe pasar por una serie de procesos consecutivos, como en la fabricación de calzado” (KABAT, 2001, p. 3)

entre mais-valor relativo e absoluto apresentada anteriormente, em que o primeiro passa a preponderar com a manufatura atingindo um estágio mais avanço, assim como passa a se maturar a subsunção real do trabalho.

O problema do taylorismo será visto com mais detalhes adiante, mas como bem demarcou Moraes Neto (1986), Marx não anteviu o taylorismo tal como viria a ser – e nem poderia, pois estamos no território da ciência que captura grandes tendências –, mas relatou elementos centrais da assim chamada “organização científica do trabalho” ainda em meados do século XIX, pois são esses elementos constitutivos do sistema de manufatura apoiado no trabalho vivo e compunham a realidade produtiva como anterioridade à formação ideal de um Taylor no final do século XIX (e por isso se diz que o taylorismo é uma formação ideal tardia em referência ao desenvolvimento material de sua época. Cf. Paço Cunha et al. 2017). A intensificação do trabalho que propicia um impulso na produtividade é aqui também mediada por uma evolução na forma com que esse trabalho é realizado. De modo que como o próprio Marx observou:

Estabelecer e manter a conexão entre as funções isoladas exige o transporte constante do artigo de uma mão para outra e de um processo para outro. É evidente que essa dependência imediata dos trabalhos e, por conseguinte, dos trabalhadores entre si, força cada indivíduo a empregar em sua função não mais do que o tempo necessário, gerando-se assim uma continuidade, uniformidade, regularidade, ordenamento e, mais ainda, uma intensidade de trabalho absolutamente distintos daqueles vigentes no ofício autônomo ou mesmo no regime de cooperação simples (MARX, 2013, p. 418) O desenvolvimento da exploração do trabalho vivo criado pelas condições da manufatura implica o condicionamento de entificação do trabalhador especializado e disciplinado pelo próprio processo de trabalho, o que estabeleceu novos padrões de intensificação do trabalho. O movimento de aperfeiçoamento não tem ainda nenhum caráter tecnológico, determinado pela máquina. Ele se realiza ainda como uma mudança dentro das bases da cooperação. Aqui, o salto se dá no âmbito qualitativo, com maior número e maior complexidade de tarefas sendo divididas e padronizadas. A evolução dessas propriedades, que são fundamentais num sistema de máquinas, na manufatura, inclusive vai abrindo terreno para a entrada da maquinaria. Os pontos de evolução da manufatura são assim também embriões da grande indústria.

Do ponto de vista tecnológico, o elemento mais diferenciador da manufatura em relação à cooperação se articula com a utilização mais concreta e mais ampla do aparato ferramental. Isto é, há um desenvolvimento nos instrumentos de trabalho, ainda que permaneçam sendo meio de trabalho nas mãos dos trabalhadores e a divisão do trabalho, a força motriz do processo de

trabalho. Não é possível falar, portanto, em uma estagnação técnica no período da manufatura porque esse desenvolvimento se deu de maneira bastante específica:

A diferenciação dos instrumentos de trabalho, por meio da qual instrumentos de mesmo tipo assumem formas particulares e fixas para cada aplicação útil particular, e sua especialização, que faz com que cada um desses instrumentos especiais só funcione em toda plenitude nas mãos de trabalhadores parciais específicos, caracterizam a manufatura. O período da manufatura simplifica, melhora e diversifica as ferramentas de trabalho por meio de sua adaptação às funções específicas e exclusivas dos trabalhadores parciais. Com isso, ela cria, ao mesmo tempo, uma das condições materiais da maquinaria, que consiste numa combinação de instrumentos simples (MARX, 2013, p. 416).

A base do processo produtivo permanece sendo a força de trabalho humana, que manuseia o ferramental. Mas o processo de evolução e aperfeiçoamento das ferramentas desponta permitindo um novo impulso de produtividade, garantido a efetividade daquela divisão do trabalho levada ao mais alto grau de especialização e intensificação. Mais que isso, como ressalta o autor, esse avanço no desenvolvimento dos meios de trabalho também passa a criar as condições de uma evolução na base técnica que deságua no sistema de máquinas, cujas combinações de ferramentas nos maquinismos (e não nas mãos humanas) é um dos pressupostos.

A manufatura chega então à sua fase mais aguda com a divisão manufatureira do trabalho, característica da manufatura moderna:

A divisão manufatureira do trabalho, portanto, não só simplifica e diversifica os órgãos qualitativamente diferentes do trabalhador coletivo social como também cria uma proporção matemática fixa para a extensão quantitativa desses órgãos, isto é, para o número relativo de trabalhadores ou grandeza relativa dos grupos de trabalhadores em cada função específica. Ela desenvolve, com a subdivisão qualitativa do processo de trabalho social, a regra quantitativa e a proporcionalidade desse processo (MARX, 2013, p. 420).

A conexão entre as funções faz com que se crie proporcionalidade na aplicação entre elas devido às diferentes complexidades. Se um processo exige 2 trabalhadores para que uma fase seja concretizada e 3 para que outra fase se finalize, e evolução produtiva, com a aplicação maior de capital variável, só é atingida se o aumento de trabalhadores siga essa proporção. Assim, a manufatura também exige essa regularidade na sua evolução: “a divisão manufatureira do trabalho transforma numa necessidade técnica o aumento do número de trabalhadores empregados” (MARX, 2013, p. 433). Ao mesmo tempo, “também tem de crescer a parte constante do capital, e não só o volume das condições comuns de produção, como instalações, fornos etc., mas também (e principalmente) a matéria-prima” (MARX, 2013, p. 433). Este conjunto de consequências identifica, logo, o avanço do seu caráter técnico.

A manufatura moderna coloca em movimento o avanço da composição orgânica do capital e leva essa mecanização ao processo de trabalho. Nesse sentido, é uma determinação resultante desse conjunto de características que na “manufatura, o enriquecimento do trabalhador coletivo e, por conseguinte, do capital em sua força produtiva social é condicionado pelo empobrecimento do trabalhador em suas forças produtivas individuais” (MARX, 2013, p. 435). O trabalho coletivo desponta em relação aos individuais. Comparando com a cooperação, a manufatura é a tradução das habilidades para o processo de trabalho, com a repartição das tarefas, enquanto a cooperação era tão somente a reunião de trabalhadores habilidosos. O aspecto coletivo na manufatura se ergue mais solidamente por haver um encadeamento entre os trabalhos em que a continuidade depende de uma uniformização no ritmo de trabalho. E esse enriquecimento do trabalho coletivo também dá conta de mostrar como a evolução trazida pela manufatura representa o desenvolvimento da divisão do trabalho. O próprio Marx diz que aparece na manufatura uma hierarquização do trabalho. Nasce uma

classe dos chamados trabalhadores não qualificados, antes rigorosamente excluídos pelo artesanato, uma classe dos chamados trabalhadores não qualificados, antes rigorosamente excluídos pela especialidade totalmente unilateralizada, chega ao ponto da virtuosidade ela já começa a transformar numa especialidade a falta absoluta de desenvolvimento (MARX, 2013, p. 424).

O processo de solidificação da manufatura, na sua fase moderna, indica que controle do processo de trabalho está cada vez mais sob o domínio do capital. De maneira que Marx demarca mais esse aspecto na diferenciação entre manufatura e cooperação:

A manufatura propriamente dita não só submete ao comando e à disciplina do capital o trabalhador antes independente como também cria uma estrutura hierárquica entre os próprios trabalhadores. Enquanto a cooperação simples deixa praticamente intocado o modo de trabalho dos indivíduos, a manufatura o revoluciona desde seus fundamentos e se apodera da força individual de trabalho em suas raízes. Ela aleija o trabalhador, converte-o numa aberração, promovendo artificialmente sua habilidade detalhista por meio da repressão de um mundo de impulsos e capacidades produtivas, (MARX, 2013, p. 434).

Isso nada mais é do que a consolidação da subsunção real. Fica ainda mais fácil compreender por que a manufatura moderna cria as bases da sua própria destruição. Por exemplo, “No período manufatureiro, as ferramentas se simplificam, diferenciam-se e se adaptam a distintas operações parciais. Tudo isto favorece ao processo posterior de mecanização” (KABAT, 2001, p. 3, tradução nossa)25. Uma dessas outras condições é a

25 En el período manufacturero, las herramientas se simplifican, diferencian y adaptan a las distintas operaciones

aproximação entre fornecedores e produtores nos setores, o que viabiliza a potencialização da produção. “A manufatura de um meio de produção é vinculada, aqui, à manufatura do produto. Inversamente, é também possível que a manufatura do produto se vincule a manufaturas às quais ele serve, por sua vez, de matéria-prima, ou a cujos produtos ele é acoplado posteriormente” (MARX, 2013, p. 422). Cria-se, assim, um sistema mais complexo de produção, mesmo com a utilização mais periférica das máquinas:

na fabricação do calçado durante a etapa manufatureira na Argentina, até a primeira década do século vinte, poucas máquinas eram utilizadas; a principal servia para cortar e aplanar solas, tarefa muito pesada e que, na escala de produção manufatureira, havia demandado descomunal gasto de mão de obra realizada manualmente, por isso foi uma das primeiras máquinas a serem introduzidas (KABAT, 2001, p. 3, tradução nossa)26.

Por esta razão, é preciso ressaltar que todas essas valências da manufatura não são suficientes para localizá-la ao lado da grande indústria, do sistema de máquinas. A utilização de máquinas na manufatura não é integrada e se atém a partes menos centrais do processo produtivo. A criação de condições não implica o revolucionamento do processo de trabalho. O mecanismo operativo aqui é ainda restrito. Na manufatura a mecanização é humana:

A maquinaria específica do período da manufatura permanece sendo o próprio trabalhador coletivo, que resulta da combinação de muitos trabalhadores parciais. As diversas operações que o produtor de uma mercadoria executa alternadamente e que se entrelaçam na totalidade de seu processo de trabalho colocam-lhe exigências diferentes (MARX, 2013, p. 423).

E aqui reside uma limitação clara do sistema baseado na divisão do trabalho: a incapacidade de se desgarrar do trabalho vivo. Mas somente o desenvolvimento de máquinas pode colocar a ruptura com a centralidade da divisão do trabalho em movimento. A divisão manufatureira encontra-se no estágio em que a manufatura chega ao ponto mais alto de desenvolvimento e é capaz de encetar uma subsunção real do trabalho. O trabalho desqualificado está distribuído nas diferentes funções e os trabalhadores mais qualificados estão restritos, pois o processo de trabalho já está sob seu controle. Marx denomina essa fase superior da manufatura como manufatura moderna.

26 en la fabricación de calzado durante su etapa manufacturera en la Argentina, hasta la primera década del siglo

veinte, se utilizaban pocas máquinas; la principal servía para cortar y aplanar suelas, tarea sumamente pesada y que, a la escala de producción manufacturera, hubiera demandado un descomunal gasto de mano de obra de realizarse en forma manual, por lo que fue una de las primeras máquinas que se introdujeron (KABAT, 2001, p. 3).

Trata-se de um momento transicional, mas ainda manufatureiro por manter o fundamento da divisão do trabalho. Como produto do capitalismo, a manufatura leva ao cabo todas as possibilidades do trabalho humano e, na medida em que essas possibilidades chegam a um limite que não pode mais ser transposto, passa a surgir uma nova forma de articulação que parte do estágio de desenvolvimento alcançado pela manufatura, coloca a baixo suas bases para estabelecer um novo paradigma de desenvolvimento técnico do processo de trabalho. Não é demais afirmar que a “própria base técnica estreita [da manufatura], tendo atingido certo grau de desenvolvimento, entrou em contradição com as necessidades de produção que ela mesma criara” (MARX, 2013, p. 442). Em outras palavras, entende-se que a manufatura “produziu a maquinaria, com a qual esta suprassumiu [aufhob] os sistemas artesanal e manufatureiro nas esferas de produção de que primeiro se apoderou” (MARX, 2013, p. 456). A manufatura cria as bases da sua superação. A maquinaria que liderará a grande indústria parte do estágio deixado pela manufatura sem que permaneça limitada pelos mesmos obstáculos.

Há contribuições adicionais de Marx para a compreensão da transição da manufatura para a grande indústria também nos Grundrisse. Nesse texto, é possível ver como se dá a transição na própria divisão do trabalho. Seguindo Marx,

o modo de produção correspondente ao capital, só pode existir em duas formas: manufatura ou grande indústria. Na primeira, predomina a divisão do trabalho: na segunda, combinação de forças de trabalho (com um modo de trabalho uniforme) e

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