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1.2 O CONTROLE DO PROCESSO DE TRABALHO PELO CAPITAL

1.2.2 A Maquinaria e a Indústria Capitalista

De acordo com Marx (1996), o emprego da maquinaria não tem por objetivo diminuir o trabalho dos homens. A finalidade é baratear as mercadorias, diminuindo o tempo de trabalho socialmente necessário e aumentando a mais-valia, da qual o capitalista se apropria. Marglin (1996, p. 41) acrescenta que “essas inovações na organização do trabalho foram introduzidas a fim de que o capitalista receba uma fatia maior do bolo”.

Marx (1996) afirma ainda que toda maquinaria desenvolvida é dotada de três partes distintas: o motor, a transmissão e a máquina-ferramenta ou máquina de trabalho. O motor é a força motriz de todo o mecanismo. A transmissão é constituída dos eixos, turbinas, cabos, correntes etc. O motor e a transmissão existem para transmitir movimento à máquina-ferramenta, que transforma a manufatura em exploração mecanizada. É desta parte da maquinaria que parte a Revolução Industrial do século XVIII. Esta substitui o trabalhador que maneja uma única ferramenta por um mecanismo que opera ao mesmo tempo com um certo número de ferramentas e é acionado por uma única força motriz.

38 De acordo com Lessa e Tonet (2007), a Revolução Industrial possibilitou que a sociedade burguesa atingisse a sua maturidade, com o antagonismo explícito de duas classes: a burguesia e o proletariado.

Verifica-se uma diferença importante entre a manufatura e a produção mecanizada. Na primeira, as operações parciais eram executadas manualmente pelos trabalhadores isolados ou em grupos, que utilizavam suas ferramentas. Já “na produção mecanizada, desaparece esse princípio subjetivo da divisão do trabalho” (MARX, 1996, p. 433). O isolamento dos processos parciais antes existentes na manufatura é substituído pela sua imperativa continuidade, e as fases que compõem o processo dependem essencialmente do entrelaçamento das máquinas, ficando o trabalhador apenas como um apêndice desse sistema.

A primeira preocupação do capital ao empregar a maquinaria foi a de utilizar o trabalho de mulheres e crianças. Assim, todos os membros da família ficaram sob o domínio direto do capital. Para Engels (1980), a emancipação da mulher e sua equiparação ao homem não poderiam acontecer enquanto ela estivesse excluída do trabalho produtivo social e confinada ao trabalho doméstico, que para ele é um trabalho privado. A emancipação da mulher só se torna possível quando ela pode participar em grande escala da produção e quando o trabalho doméstico lhe toma apenas um tempo insignificante. Essa condição só pode ser alcançada com a grande indústria moderna, que não apenas permite o trabalho da mulher em grande escala, mas até o exige.

Isso demonstra a tendência das mulheres a uma inserção cada vez maior no mercado de trabalho. Por outro lado, essa representação é acompanhada duplamente por uma maior carga horária e um menor salário em relação aos homens. O capital reconheceu assim a polivalência feminina e não hesitou em explorá-la. Ao analisar essa temática, Antunes (1999) reconhece que a incorporação da mulher no mercado de trabalho constitui-se em um momento importante da emancipação parcial (grifo do autor), porém a predominância feminina é notada nas áreas de maior exploração do trabalho manual, de maior trabalho intensivo. Já a presença dos homens é majoritária nas áreas em que predominam o capital intensivo e o maquinário mais avançado.

A maquinaria “baseia-se no emprego de mulheres, de crianças de todas as idades, de trabalhadores sem habilitação, sempre que possível; enfim, na mão-de- obra barata” (MARX, 1996, p. 529). Nesse contexto, o valor da força de trabalho

39 passou a ser determinado pelo tempo de trabalho necessário para manter toda a família e não o trabalhador individual. Dessa maneira, a força de trabalho foi desvalorizada (MARX, 1996).

Além disso, a maquinaria “é o meio mais poderoso para aumentar a produtividade do trabalho, isto é, para diminuir o tempo de trabalho necessário à produção de uma mercadoria” (idem, p. 459). Como podemos constatar a partir dessa afirmação, a máquina é um instrumento que ajuda a produzir mais-valia relativa. A experiência de trabalhadores vai intensificar o trabalho, capacitando-os a empregar mais força em um espaço de tempo cada vez menor. São dadas as condições para explorar intensamente, cada vez mais, a força de trabalho, sobretudo nos limites da fábrica.

A maquinaria forma um sistema de máquinas diferentes, operando de forma combinada e simultânea. Há ainda, uma espécie de conexão entre o trabalhador principal e uns poucos auxiliares. O primeiro é aquele que trabalha diretamente com a máquina; os últimos são aqueles que a alimentam com o material a ser trabalhado18. Ao lado desses dois tipos, há um pessoal pouco numeroso, de nível superior19, que controla a maquinaria e a repara constantemente (MARX, 1996).

É importante acrescentarmos ainda que, diferentemente da manufatura, na qual o trabalhador era destinado permanentemente à mesma função, na produção mecanizada os operários podem mudar a qualquer tempo de função, sem que o processo de trabalho seja interrompido, pois o movimento global da fábrica não parte do trabalhador, mas da máquina. Assim, a maquinaria é utilizada para transformar o trabalhador em parte de uma máquina.

Na manufatura e no artesanato, o trabalhador se serve da ferramenta; na fábrica, serve à máquina. Naquele, procede dele o movimento do instrumental de trabalho; nesta, tem de acompanhar o movimento do instrumental. Na manufatura, os trabalhadores são membros de um mecanismo vivo. Na fábrica, eles se tornam complementos vivos de um mecanismo morto que existe independentemente deles. [...] O trabalho na fábrica exaure os

18 Na maioria dos casos, os trabalhadores auxiliares são crianças, devido ao baixo custo da força de

trabalho. Marx (1996, p. 451) constata que “antes, o trabalhador vendia sua própria força de trabalho, da qual dispunha formalmente como pessoa livre. Agora vende mulher e filhos”. Segundo esse mesmo autor, a procura de trabalho infantil, naquela época, às vezes lembrava a procura de escravos.

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Esses trabalhadores ora possuem formação científica, ora dominam um ofício. São engenheiros, mecânicos, marceneiros, que se distinguem dos trabalhadores da fábrica, estando apenas agregados a eles.

40 nervos ao extremo, suprime o jogo variado dos músculos e confisca toda a atividade livre do trabalhador, física e espiritual (MARX, 1996, p. 483).

Assim, na fábrica, o processo de trabalho se caracteriza por o instrumental de trabalho empregar o trabalhador, e não o contrário. Essa inversão irá se solidificar a partir do emprego da maquinaria.

Como ressaltam Netto e Braz (2007), foram necessários mais de dois séculos (entre o século XVI e o XIX) para que o capital conseguisse controlar totalmente o processo de trabalho. O comando efetivo, ou nas palavras de Marx, a subsunção real do trabalho ao capital operou-se com a Revolução Industrial, iniciada no final do século XVIII. Com a grande indústria, o trabalhador passa a ser um apêndice das máquinas. Nessa subordinação o capitalista encontra melhores condições para explorar o trabalhador20 e extrair a mais-valia, fonte de seu lucro.

1.2.3 Subordinação do Trabalho ao Capital: subsunção formal e subsunção real