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Percebemos na pesquisa que, com o processo de assentamento e a ida das famílias para os lotes, a estrutura organizacional observada no acampamento baseada na proposta do MST, vai aos poucos se perdendo. Esse fato evidencia dois momentos: primeiro, um período no qual o MST se estabelece como articulador das mediações entre o individual e o coletivo, em que a vida se estrutura a partir de necessidades coletivas; depois, com o objetivo concretizado, vem, em conseqüência, a dispersão das famílias e as relações coletivas se dissolvem e o interesse individual prevalece sobre o coletivo.

Contudo, identificamos que, atualmente, o vínculo com os princípios organizacionais do MST não se materializam com a mesma força política e como instrumento capaz de alterar a estrutura social, modificando relações de dominação e exclusão como foi no caso da organização em acampamento. O vínculo com o MST no assentamento faz-se, por exemplo, na realização do Curso de Agroecologia implementado na Vila Velha, conforme

relatamos no capítulo 3. Percebemos também que, apesar de não haver processos de coletivização da produção, conforme o Movimento sugere aos assentamentos, há processos decisórios coletivos voltados às questões de crédito e infra-estrutura do assentamento.

Quanto às formas de produção, segundo nossa análise, predominam relações individuais de cada família, apesar da afirmação de um assentado de que seria importante a implementação de processos de cooperação mais amplos, prevalecendo a estruturação organizacional da produção de acordo com aspectos culturais de relações individualistas.

Cada família tem a liberdade de fazer a sua escolha (de produção) e qual sua atividade, ela é livre no que planta, como vende, como colhe. É um processo da família, nós não fazemos ingerência sobre o que ela tem que plantar e tal, mas claro que tem algumas orientações técnicas que orienta o produtor [...] ele tem a liberdade de comercializar sua produção a quem ele conseguir agregar melhor preço. [...] se conversar com a maioria das famílias vão dizer da falta que faz ter uma cooperativa, então que faz falta faz que ela seria importante só que vai demorar anos ainda pra forma a consciência ainda da importância. [...] na nossa região mais aqui do sul já é cultura o cidadão, o agricultor dizer, olha, eu quero ter o meu canto, o meu local próprio [...] já é cultural aqui que cada produtor trabalhe no seu próprio lote, aí tem a questão de animais, seus bichinho ali só dele [...] eu acredito que se nós conseguisse trabalhar a consciência assim da importância de manter a organização, como em sistemas de comunidade e buscar parcerias em conjunto, claro que facilita um monte [...] é um processo lento e que tem que se formar a consciência primeiro que isso é importante, é um trabalho assim que vai demorar ainda” (Entrevistado E. em 12-04- 2007).

Os processos decisórios no assentamento, apesar de terem a participação da comunidade assentada, não proporcionam reflexões mais amplas, materializando-se no Princípio organizacional de luta de classe, por exemplo, restringem-se a âmbitos específicos, mais imediatos, o que, a nosso ver, não se constituem numa experiência com características contra-hegemônicas.

O Princípio organizativo da vinculação entre dirigência do MST com a Base concretiza-se no assentamento na medida em que ali residem representantes Estaduais e Regionais de vários Setores que fomentam a idéia da organização baseada nos princípios do Movimento. Com relação à ‘presença’, o MST no assentamento tanto aqui, como também na análise referente a este vinculo na escola, há a idéia de que o Movimento não se faz presente a partir das pessoas direcionadas, especificamente vinculadas com funções do MST no assentamento, mas sim através das relações estabelecidas entre os assentados.

“[...] eu acredito assim que toda a família assentada ela é integrante ou ela faz parte do MST. Não é uma pessoa de fora que vem e que fala tem que isso ou aquilo [...] é o conjunto das pessoas que ai moram ai se reúnem toma suas decisões e ajudam dar o rumo daquilo que tem que ser. É claro que tem na região representantes que ajudam a discutir mas sempre quando a gente precisou sempre foi discutido com essas pessoas [...] mas sempre muito junto” (Entrevistado E. em 12-04-2007).

A razão da desestruturação da organização baseada nos princípios organizacionais do MST, concretizada no acampamento e que depois deixa de se materializar no assentamento, aparece como sendo o distanciamento entre eles pela própria estrutura geográfica dos lotes, pelo compromisso com a produção na propriedade que demanda tempo, pela falta de identidade das famílias que chegam ao assentamento com a troca ou venda dos lotes e que não participaram do processo de ocupação e acampamento, pela tradição cultural do trabalho individualizado e pela ausência no assentamento do Princípio organizacional de Formação de Quadros, tido como fundamental para manter a organização.

“[...] teria que entende a ideologia do camponês, no momento do acampamento eu to lutando pelo mesmo objetivo que todo mundo, as ações elas são parecidas pra que eu tenha a conquista da terra, mas quando eu vou pro lote acabo a luta coletiva e eu vou fazer o que? a primeira coisa que eu faço vou coloca uma cerca [...] depois qual que é a outra necessidade, bom eu tenho a terra como que eu vou trabalha a terra eu tenho que roça eu tenho que faze tudo, então vamos faze uma reunião pra discuti mas não faz por que tem que trabalha. Você muda o foco da tua existência, se antes era pra conquista hoje é pra pode produzir [...] eu acho muito difícil por que primeiro teríamos que ter quadros pra poder fazer um bom debate e mostrar alternativas o que não visualizo isso a curto prazo. [...] a influencia do MST no assentamento eu avalio que muito pouca [...]. Aqui no assentamento eu não sei posso até tá equivocado [...] mas eu acho que a frustração do MST é o Ireno Alves e o Marcos Freire [...] por que você tem uma potencialidade de 1500 famílias assentadas no mesmo espaço [...] se eu conta agora juntando o novo assentamento também na Giacometi em Quedas eu tenho 3000 famílias assentadas no mesmo espaço contínuo. Que força que tem isso e qual é a organicidade que eu tenho? organicidade mesmo muito pouco [...] e por uma crise de liderança que eu não tenho. Eu não tenho quadros que dê conta da complexidade que é um assentamento com 1500 famílias, é muito complexo pra você entende isso e dá diretividade pra isso, têm que ter quadros” (Entrevistado E. em 15- 05-2007).

Percebemos, no histórico do assentamento, a intrínseca relação com a estrutura organizacional do MST no período de acampamento, o que fomentou a idéia de criação de um assentamento diferente daquele proposto pelo INCRA. Houve ampla discussão entre os acampados mediada por dirigentes do MST referente à precária condição em que viviam, as limitações impostas pelos recursos destinados ao financiamento da produção e as perspectivas que se desenhavam a partir dos pressupostos estabelecidos pelo Programa Oficial de Reforma Agrária.

Contrariando a idéia estrutural, geográfica e política de assentamento proposto pelo Programa Oficial de Reforma Agrária que, segundo o MST, resulta no isolamento geográfico e político dos assentados, as lideranças locais do MST, a coordenação do acampamento e os acampados passaram a discutir a idéia de manter a unidade do grupo que poderia ser perdida com o estabelecimento de cada família isolada em seu lote. Esta nova

centralidade proposta permitiria melhor articulação do grupo com a intenção de estabelecer uma organização oposta à dispersão e ao isolamento, mas ao mesmo tempo, estabeleciam-se novos focos de conflitos, já que a “cidade” pretendida pelo MST não era a mesma pretendida pela representação Estatal. Contudo, a interferência econômica e política do Estado foi determinante na desestruturação do processo e acabou se formando uma outra estrutura organizacional no assentamento.

A razão da desestruturação da organização, baseada nos princípios organizacionais do MST, concretizada no acampamento e que depois deixa de se materializar no assentamento, trata-se do distanciamento entre eles causado pela própria estrutura geográfica dos lotes, pelo compromisso com a produção na propriedade que demanda tempo, pela falta de identidade das famílias que chegam ao assentamento com a troca ou venda dos lotes que não participaram do processo de ocupação e acampamento, pela tradição cultural do trabalho individualizado e a ausência no assentamento do Princípio organizacional de Formação de Quadros, tido como fundamental para manter a organização.

Assim, o vínculo atual com os princípios organizacionais do MST não se materializa com a mesma força política e como instrumento capaz de alterar a estrutura social, modificando relações de dominação e exclusão, como foi o caso da organização em acampamento. Os processos decisivos no assentamento, apesar de terem a participação da comunidade assentada não proporcionaram reflexões mais amplas.

CAPÍTULO IV

RESGATE HISTÓRICO DA ESCOLA IRACI SALETE STROZAK E A RELAÇÃO