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METODOLOGIA APLICADA

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CAPÍTULO 1 UMA VIAGEM COMPREENSIVA AO UNIVERSO DAS MÍDIAS

1.2 METODOLOGIA APLICADA

Este segundo ponto do primeiro capítulo compreende uma descrição do caminho que trilhamos para a construção da pesquisa, e caminho é um bom termo para expressar o que originalmente, em grego, a palavra “método” (meta + odós) significa: o caminho por onde chegamos aonde queremos ir. Este estudo, como adiantado no ponto 1.1, se orienta por uma perspectiva compreensiva dos fenômenos, em uma busca mais orientada para uma aproximação do modo como esses fenômenos ocorrem do que propriamente pela busca de sua completa explicação (KAUFMANN, 2013). A natureza dos fenômenos em análise é de permanente transformação, tanto pelo movimento próprio que é o processo da produção jornalística, como pelo ritmo acelerado dessas mudanças no contexto das novas tecnologias. Assim, vamos a campo mais com dúvidas de que com certezas, alinhados à perspectiva de que o campo “deixe de ser abordado majoritariamente como uma instância de verificação da teoria para se tornar o lócus de seu nascedouro, o ponto de partida da problematização teórica sugerida pelos fatos” (KAUFMANN, 2013, p.19).

Assim, o percurso metodológico da pesquisa nos faz lembrar novamente Kaufmann (2013, p. 49), quando diz que o modelo ideal, definido por Wright Mills, é o do “artesão intelectual” que constrói, ele próprio, sua teoria e seu método. Orientamo-nos, assim, necessariamente, por uma perspectiva qualitativa (HAGUETTE, 1987; MINAYO, 1992; MARCONI; LAKATOS, 2007), mas mais que isso, por uma abordagem compreensiva (KÜNSCH, 2016, 2017; KAUFMANN, 2013), tendo em conta que compreenhendere, em seu sentido original, do latim, é “abranger, abraçar ou pegar junto” (KÜNSCH, 2005, p. 46). A orientação dos estudos desta natureza compreende, assim, que “saber como e por que as coisas acontecem é, muitas vezes, mais útil do que obter precisão sobre o que está ocorrendo” (DUARTE, 2006, p. 64). A pesquisa qualitativa busca “analisar e interpretar aspectos mais profundos, descrevendo a complexidade do comportamento humano. Fornece análise mais detalhada sobre as investigações, hábitos, atitudes, tendências de comportamento etc. (MARCONI; LAKATOS, 2007, p. 269).

Uma postura e uma perspectiva analítica compreensiva por parte do pesquisador, mais que um caminho metodológico, significam uma maneira de ver o mundo e de observar os fenômenos que nele ocorrem. Uma pretensão mais de mostrar os fenômenos em foco do que de demonstrá-los:

Menos explicação, mais compreensão, costumamos repetir quase que como um mantra ou algo assim. Mais noções, menos conceitos. Menos portanto e mais talvez. Mais vírgulas, reticências, interrogações – muitas interrogações – do que a ideia de uma certeza e de uma verdade não dialógicas (KÜNSCH, 2017a, p. 11).

Para Kaufmann, o “pesquisador social toma para si a tarefa de traçar a rota de construção de um objeto, do levantamento e da análise de seus dados” (KAUFMANN, 2013, p.14). Os fenômenos comunicacionais em foco neste estudo, como mais de uma vez apontado, são novos do ponto de vista teórico e, sobretudo, o recorte empírico da pesquisa situa-se no momento presente e em permanente movimento. Isso nos coloca não só diante do desafio de traçar a rota, mas de revê-la várias vezes. Assim, os procedimentos metodológicos aplicados na pesquisa de campo foram sendo construídos, em parte, no próprio campo, e, algumas vezes, enquanto os fenômenos ocorrem (SILVA, 2015). Isso nos levou a uma postura permanentemente reflexiva com relação aos procedimentos empregados, em uma perspectiva de que o objeto escolhe o método, e não o contrário.

(...) especialmente em pesquisa qualitativa existe uma dimensão improvisada, intransferível e em grande parte autoconstruída. Isso torna a prática científica um processo de verdadeira bricolagem permanente, uma construção in situ no ato mesmo de sua efetivação. (KAUFMANN, 2013, p. 14).

Tendo em vista esta compreensão teórico-metodológica, organizamos as etapas do trabalho em levantamento e estudo bibliográfico e documental, entrevistas em profundidade e observação direta (em algum nível, participante) dos fenômenos. Pretendeu-se assim, analisar um continuum multimídia, das práticas metajornalísticas dos profissionais em foco à sua atuação como produtores de conteúdos em mídias independentes, em um processo articulado, compreensivo, e não antagônico.

1.2.1 Referencial teórico

A fundamentação teórica da pesquisa – cujo panorama é mostrado no Quadro 1, incluídas as referências às metodologias específicas, apresentadas mais adiante – abrange estudos acerca do jornalismo contemporâneo, suas transformações diante dos avanços tecnológicos, se valendo de autores, entre outros, como Jean Charron e Jean de Bonville (2016), Zélia Leal Adghirni e Fábio Henrique Pereira (2011, 2012), Steen Steensen (2010), C. W. Anderson, Emily Bell (2013) e Clay Shirky (2013); das tecnologias e do jornalismo móvel, convergente e em redes, como Henry Jenkins (2014), Manuel Castells (2011, 2013), Marcos Palacios (1999, 2004), João Canavilhas (2001, 2010, 2013, 2014, 2017) e Suzana

Barbosa (2013)]; da emergência de novas mídias, entre elas a mídia alternativa/independente, com autores como Kari Karppinen e Hallvard Moe (2016), Chris Atton (2017), John Downing (2010), Elizabeth Lorenzotti (2014), Ivana Bentes (2015), Fábio Malini e Henrique Antoun (2013) e Maria Clara Bittencourt (2014)].

As principais referências teóricas para pensar a produção da notícia percorrem autores conhecidos no campo de estudos de newsmaking, como Miguel Rodrigo Alsina (2009), Nelson Traquina (2016, 2011, 2012), Gaye Tuchman (1978), Michael Schudson (1978), Mauro Wolf (1995) e Jorge Pedro Sousa (2002), além de Manuel Carlos Chaparro (2003, 2007, 2014) e sua compreensão teórico-metodológica acerca da pragmática do jornalismo e do rastreamento da produção. O pensamento de Zygmunt Bauman (2001, 2007) sobre o que ele chama de sociedade líquido-moderna aciona mecanismos de compreensão do mundo social, político e econômico onde as mídias digitais independentes nascem e operam.

Por se tratar de um objeto de estudo recente e atual, como também adiantado, foi feito um levantamento e estudo bibliográfico acerca dos estudos já existentes acerca do jornalismo independente no Brasil, compreendendo, ainda, os estudos recentes que enfocam as mídias selecionadas como universo da pesquisa.

Tabela 4: Panorama dos principais referenciais teóricos

Jornalismo contemporâneo e mudanças tecnológicas

 Jean Charron e Jean de Bonville (2016);

 Steen Steensen (2010);

 Zélia Leal Adghirni e Fábio Henrique Pereira (2011, 2012);

 C. W. Anderson, Emily Bell, Clay Shirky (2013)

Tecnologias, jornalismo móvel, convergente e em redes  Henry Jenkins (2014)  Manuel Castells (2011, 2013)  Marcos Palacios (1999, 2004)  João Canavilhas (2001, 2010, 2013, 2014, 2017)

Fernando Firmino da Silva (2008, 2009, 2013, 2013b, 2015)

 Suzana Barbosa (2013) Emergência de novas mídias, entre elas a mídia

alternativa/independente

 Kari Karppinen e Hallvard Moe (2016)

 Chris Atton (2017)

 John Downing (2010)

 Elizabeth Lorenzotti (2014)

 Ivana Bentes (2015)

 Fábio Malini e Henrique Antoun (2013)

Produção da notícia/estudos de newsmaking  Miguel Rodrigo Alsina (2009)

 Nelson Traquina (2016, 2011, 2012)

 Gaye Tuchman (1972, 1973, 1976, 1978)

 Michael Schudson (1978)

 Mauro Wolf (1995)

 Jorge Pedro Sousa (2002)

 Manuel Carlos Chaparro (2003, 2007, 2014)

Sociedade líquido-moderna  Zygmunt Bauman (2001, 2007)

Reportagem  Cremilda Medina (1973, 1988)

 João Canavilhas e Alciane Baccin (2015)

 Edvaldo Pereira Lima, (2009)

Metodologias aplicadas  Laurence Bardin (1977)

 Martin W. Bauer (2015)

 Roque Moraes (1999)

 Edvaldo Pereira Lima, (2009)

 Carolina Moura Klautau; Dimas A. Künsch; Renata Carraro (2018)

 Jean-Claude Kaufmann (2013)  Cremilda Medina (2005, 2016)

 Mônica Pegurer Caprino e Priscila Ferreira Perazzo (2011)

 Jorge Duarte (2006)

 Teresa Maria Frota Haguette (1987)

 George Gaskell (2015)

 Maria Cecília de Souza Minayo (1992)

 Marina de Andrade Marconi e Eva Maria Lakatos (2006)

 Mylène Jaccoud e Robert Mayer, (2008)

 Künsch (2000, 2005, 2012, 2014, 2016, 2017, 2017b)

Fonte: Elaborado pela autora

1.2.2 Análise documental

Todo o percurso da pesquisa foi marcado por um levantamento e análise de documentos, disponíveis em fontes diversas da internet e redes sociais, para a caracterização dos grupos de mídias independentes, suas histórias e práticas, o que muito ajudou na escolha dos entrevistados. Esses documentos encontram-se disponíveis em formatos diversos de plataformas – textos, áudios, vídeos ou streaming – e de gêneros – notícias, reportagens,

depoimentos, opiniões etc. Faz parte desta tarefa uma verificação atenta dos conteúdos dos Portais das mídias na internet, começando por descrevê-los em suas características principais - - descrição esta realizada em grande parte no ponto anterior deste capítulo.

1.2.3 Análise de conteúdo

Realizamos uma análise dos conteúdos dos Portais das mídias na internet. Em um primeiro momento, uma caracterização, descrevendo suas editorias, maneiras de organizar seu conteúdo, sua periodicidade e temáticas predominantes na abordagem jornalística, como vimos no primeiro ponto deste capítulo.

A análise de conteúdo aparece também em outro momento do trabalho. No capítulo 3, em “Narrativas jornalísticas reconfiguradas”, fazemos uma análise de quatro narrativas de quatro diferentes mídias em foco neste trabalho, que consideramos expressivas e representativas do jornalismo praticado. As reportagens se enquadram naquilo a que as mídias se referem como Especiais, mais analíticas do que as praticadas no cotidiano, chegando a ser referidas nas entrevistas que realizamos com os jornalistas. No começo, pretendíamos analisar uma reportagem de cada uma das sete mídias de que nos aproximamos, mas isso se mostrou até certo ponto inviável, por questão de tempo e porque podia nos desviar um pouco do foco principal deste trabalho. E também porque, após a análise da quarta reportagem, consideramos possuir material suficiente para um melhor entendimento sobre os modos de fazer jornalismo por parte dessas mídias, que é o que nos interessa saber, em primeiro lugar.

São as seguintes as reportagens selecionadas conforme Tabela 4: “Vida pública, vias privadas e a erosão da intimidade”, do emblemático Programa Córtex, do Estúdio Fluxo; do Jornal Nexo, uma cobertura especial sobre Mariana, chamada “Mariana: a gênese da tragédia”; “Ruralômetro: medindo a febre ruralista dos deputados”, da Repórter Brasil; e, por fim, o especial “Marielle Franco: uma homenagem da Mídia Ninja”, da Mídia Ninja. O jornalismo praticado por essas mídias, como se pode adiantar, busca, em geral, abordagens aprofundadas dos fenômenos, em uma prática mais apurada, próxima da reportagem e do que se pode chamar de jornalismo interpretativo.98

98 No artigo intitulado “Jornalismo interpretativo e a compreensão c omo método: o abraço entre o antigo e o

novo na arte de tecer o presente”, Klautau, Künsch e Carraro (2018), retomam a tradição histórica do jornalismo interpretativo, a partir do quadro teórico-metodológico da compreensão como método, e levantam a hipóte se de que a crise do jornalismo contemporâneo indica a reportagem como grande aposta para tempos de abundante informação e pouca compreensão.

Tabela 5: Síntese das reportagens e mídias

Título da reportagem Mídia Créditos Data da publicação

Vida pública, vias privadas e a erosão da intimidade Disponível em: <http://www.fluxo.net/tud o/2016/9/7/cortex7- christian-dunker>. Acesso em: 30 jun. 2019.

Estúdio Fluxo Apresentação: Bruno Torturra

Direção e câmera: Susana Jeha

Câmera e áudio: Maria Shirts

Edição: Susana Jeha e Thiago Neves 7 out. 2016 Mariana: a gênese da tragédia Disponível em: <https://www.nexojornal.c om.br/especial/2016/11/04 /Mariana-a-gênese-da- tragédia>. Acesso em: 30 jun. 2019.

Nexo Jornal Reportagem: Estêvão Bertoni Produção: Estêvão Bertoni e Murilo Roncolato Layout: Rodolfo Almeida Infográficos: Catarina Pignato, Rodolfo Almeida e Guilherme Falcão Desenvolvimento: Ariel Tonglet Timelapses: Ariel Tonglet 4 nov.2016 Ruralômetro: medindo a febre ruralista dos deputados Disponível em:

<https://ruralometro.repor terbrasil.org.br>. Acesso em: 30 jun. 2019.

Repórter Brasil Edição: Ana Magalhães e Ana Aranha

Reportagem: Ana Magalhães, Ana Aranha, Daniel Camargos, Guilherme Zocchio, João Cesar Diaz, Piero Locatelli, Reinaldo Chaves, Thaís Lazzeri E Janes P. Souza Tratamento de dados: Reinaldo Chaves Checagem: Keila Guimarães Consultoria estatística: Simone Harnik Criação e projeto gráfico: Fernanda Segabinassi e Alexandre Macedo Costa 30 jan.2018

Programação: Paulo Campos e André Mota Marielle Franco: uma

homenagem da Mídia Ninja Disponível em:

<https://medium.com/mari elle-franco>. Acesso em: 30 jun. 2019.

Mídia Ninja Não traz assinaturas. De acordo com a entrevista realizada com a editora Raíssa Galvão (Ver

Apêndices), de 8 a 9 pessoas estiveram envolvidas.

Mar. 201999

Fonte: Elaborado pela autora

Para a análise de conteúdo, partimos de referenciais teóricos tradicionalmente colocados acerca do método (BARDIN, 1977; BAUER, 2015; MORAES, 1999) e, no tocante às reportagens seguimos por um percurso que incorpora ferramentas do próprio jornalismo à definição das categorias que o método da análise de conteúdo demanda (LIMA, 2009; KLAUTAU; KÜNSCH; CARRARO, 2018), procurando nessa análise específica ressaltar os elementos e aspectos técnicos, estéticos e éticos da produção jornalística. Como mostram Klautau, Künsch e Carraro (2018, p. 81), “elementos da própria teoria da reportagem nos servem de auxílio na tarefa de mostrar, mais que demonstrar, as virtualidades desse gênero jornalístico, ontem como hoje, que podem ser potencializadas com os recursos gerados pelas tecnologias digitais”.

Seguimos os passos descritos por Roque de Moraes (1999), a partir da leitura de Bardin (1977), como indispensáveis a toda análise de conteúdo: categorização, descrição e interpretação. Levando em conta que as mídias independentes em foco produzem para a internet – com exceção da Congresso em Foco, que possui uma revista –, estabelecemos as seguintes categorias para análise das reportagens selecionadas, conforme tabela 5: a) uso da multimidialidade (presença dos elementos multimídias áudio, texto, vídeo e imagens na construção narrativa) 100; b) hipertextualidade do texto jornalístico, (narrativa hipertextual,

com a presença dos elementos multimídias: áudio, texto, vídeo e imagem compondo a

99 A reportagem não tem uma única data definida. Composta por diferentes matérias, foi publicada entre 12 e 18

de março de 2019.

100 Dos sete (multimidialidade; hipertextualidade; diversidade de fontes; imersão; engajamento; profundidade;

voz autoral) marcadores estabelecidos para olhar as narrativas, três (engajamento, profundidade e voz autoral) já havíamos utilizados para caracterizar as mídias independentes em foco, de modo geral, no capítulo primeiro. No entanto, no caso das mídias o olhar é para um descritivo da mídia e não de uma narrativa em particular. Neste caso, novos marcadores são possíveis, sendo que um deles (cobertura temática), não se aplicava já que as narrativas necessariamente abordam uma determinada temática e no caso da mídia, o marcador se aplica à escolha por uma atuação em determinados temas.

narrativa)101; c) diversidade de fontes (quantidade e variedade de vozes e pontos de vista na

narrativa); d) imersão (tactilidade somada a interatividade dos conteúdos)102; e) engajamento

(apresentação de interpretações, conclusões e/ou compreensão do repórter na narrativa, sem pretensões de imparcialidade); f) profundidade (conjunto de informações e elementos rumo à uma compreensão dos fatos e temáticas da reportagem)103; g) voz autoral (estilo próprio e

presença do repórter na narrativa).

Tecemos também considerações acerca do processo de produção da narrativa jornalística em análise, com um olhar voltado para o uso dos dispositivos móveis e convergentes em suas dinâmicas, a partir das entrevistas realizadas.

Em nossas análises, optamos por uma descrição de cada narrativa, e os elementos categorizadores aparecem, portanto, em sequências diferentes em cada reportagem analisada. A interpretação, que a análise de conteúdo propõe, é feita no processo analítico e em diferentes momentos de nossa descrição.

101 Das pesquisas de Mielniczuk, (2000; 2003), entre outros, decorrem as primeiras noções acerca das gerações

do jornalismo online no Brasil. A primeira delas ganhou o nome de transpositiva justamente por referir -se à transposição do conteúdo produzido para o veículo impresso integralmente para a página na web, sem nenhuma adequação do texto para a mídia. “Com o aperfeiçoamento e desenvolvimento da estrutura técnica da Internet”, a segunda geração emerge e é chamada pela autora de “metáfora” (Mielniczuk, 2001, p. 2). Nela, ainda se percebe o atrelamento ao proces so de produção do impresso, no entanto, é dado um passo à frente com a produção de conteúdo exclusivo para a mídia e uma tímida exploração ainda que rudimentar do universo hipertextual. Já a terceira geração nasce quando elementos potenciais da Internet se conjugam, fazendo surgir produtos jornalísticos multimiáticos e interativos enriquecendo toda a cadeia jornalística. Mielniczuk (2003, p. 9 e 10) explica que neste estágio temos “a utilização do hipertexto não apenas como um recurso de organização das informações da edição, mas também como uma possibilidade na narrativa jornalística de fatos; - atualização contínua no webjornal e não apenas na seção ‘últimas notícias’. Canavilhas e Baccin (2015) explica que “ao longo dos anos, os estudos acompanharam o des envolvimento da Web, sendo possível a identificação das quarta (BARBOSA, 2008, p. 11-12) e quinta (BARBOSA, 2013) gerações do webjornalismo que seriam, respectivamente, o jornalismo de base de dados (servem apenas de sustentação para as práticas jornalísticas, desde a pré-produção até a pós -produção) e o paradigma do jornalismo de base de dados (reúne características de medialidade, horizontalidade, continuum multimídia, mídias móveis, aplicativos e produtos autóctones).Os autores ressaltam, apoiados em Barbosa, que a sistematização em gerações não se refere a processos datados e estanques, mas coexistem, convivem simultaneamente num mesmo site jornalístico, portal ou aplicativo de notícias.

102 Canavilhas e Baccin (2015, p.15) explicam que a imersão soma a tactilidade à interatividade dos conteúdos e

“surge como um elemento recente a ser computado nos formatos de narração no jornalismo em tempos de dispositivos móveis, especialmente nos tablets”. Ele diz que imersão, "uma das condições essenciais à contextualização no jornalismo", acontece quando a narrativa utiliza as potencialidades da Web e dos dispositivos de recepção e “é importante na narrativa digital porque permite transportar o leitor para o espaço representado e apreendê-lo sob vários pontos de vista” (CANAVILHAS; BACCIN, 2015, p. 19).

103 Em tempos de vasta informação e pouca compreensão, a reportagem se fortalece como principal gênero do

jornalismo interpretativo. Em 1973, Cremilda Medina e Paulo Roberto Leandro já diziam ser “impossível a qualquer ser humano acompanhar a evolução dos grandes acontecimentos apenas coletando fatos isolados” (1973, p. 17-18). Em um processo de aprofundamento, “através da contemplação de fatos que situam ou explicam o fato nuclear, através da pesquisa histórica de antecedentes ou através da busca do humano permanente no acontecimento imediato, a reportagem leva a um quadro interpretativo do fato” (Medina, 1988, p. 115). Observamos nas narrativas, dois fatores de aprofundamento apontados por Lima (2009), no caso dos livro- reportagem: um em termos de horizontalização (abordagem extensiva em termos de detalhes) e outro em âmbito de verticalização (em busca de implicações, desdobramentos).

Tabela 6: Síntese das categorias de análise

Categorias de Análise Compreensão

Uso da multimidialidade presença dos elementos multimídias (áudio, texto, vídeo e imagem)

Hipertextualidade do texto jornalístico

narrativa hipertextual, com a presença dos elementos mul ti mídias compondo a narrativa

Diversidade de fontes

quantidade e variedade de vozes e pontos de vista na narrativa

Imersão tactilidade somada a interatividade dos conteúdos;

Engajamento apresentação de interpretações, conclusões e/ou compree nsão do repórter na narrativa, sem pretensões de imparcialidade;

Profundidade conjunto de informações e elementos rumo à uma compreensão dos fatos e temáticas da reportagem;

Voz autoral estilo próprio e presença do jornalista na narrativa

Fonte: Elaborado pela autora

1.2.4 Entrevistas em profundidade

Um dos pontos altos do trabalho são as entrevistas em profundidade com os jornalistas das mídias independentes em foco. A escolha dos entrevistados orientou-se pelo critério de se ouvir profissionais do jornalismo que exercessem um cargo de responsabilidade editorial e/ou fossem fundadores, estando envolvidos a fundo com o processo de criação do veículo independente. Também houve, no processo de escolha dos jornalistas a serem entrevistados, um olhar para a trajetória profissional dos mesmos, valorizando assim sua experiência e passagem por jornais tradicionais, e ou em alguma medida diferentes da mídia independente atual. Acreditamos assim estarmos registrando a visão de protagonistas das transformações contemporâneas jornalísticas que estão em curso. Inspira e serve de referência para esta proposta, a obra de Jean Rossiaud e Ilse Scherer-Warren (2000), A democratização

Inacabável: as memórias do futuro, que conheci em um curso com a autora, ainda na

graduação, jovem pesquisadora de iniciação científica. Os autores ouvem personalidades atuantes no processo de democratização brasileira em longas entrevistas, que trazem na íntegra no livro.

Dos oito jornalistas entrevistados (6 mulheres e 2 homens, um de cada mídia selecionada, com exceção da Mídia Ninja, onde falamos com 2 jornalistas)104, seis têm

passagem por grandes jornais brasileiros. Isso pode corroborar nossa hipótese de que a prática jornalística nessas mídias está impregnada do que está sendo chamado de metajornalismo, como apontam estudos na área.105 A hipótese pode ser formulada do seguinte modo: em

grande medida, cuja dimensão aproximada a pesquisa se encarregará de levantar, as novas práticas jornalísticas são construídas a partir de uma visão ancorada em experiência crítica nas mídias tradicionais, favorecendo, assim, nossa busca das conexões entre o velho e o novo no jornalismo contemporâneo.

Todas as entrevistas foram presenciais, sendo realizadas nas cidades de São Paulo, Brasília e Rio de Janeiro, com exceção da entrevista com Raíssa Galvão, realizada via Skype. Compreendemos que o encontro face a face favorece o aprofundamento, talvez seja fundamental para ele. Possibilita que se estabeleça uma relação efetiva, além de ter permitido a observação direta (em alguma medida participante) das expressões dos jornalistas, do entorno, e das dinâmicas do ambiente de trabalho – quando se deu nesses locais.

Os ambientes variaram, de acordo com a indicação e preferência dos entrevistados. Três conversas se deram nas redações das mídias (Jornal Jota, Repórter Brasil, Mídia Ninja),

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