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4.6 A Metodologia da Ação Comunicativa

4.6.2 Metodologia da Ação Comunicativa: uma Proposta Prática

Partindo da metodologia proposta na seção anterior, foi elaborado um proto- colo de uso da Ágora para os processos de consulta da opinião pública. Este protocolo tem por objetivo estabelecer as etapas da consulta pública definindo, para cada uma, como os elementos da Ágora (debates, artigos, questões e relatórios) devem ser utilizados pela comunidade a ser consultada. Cinco etapas foram definidas e estão ilustradas no Fluxograma da Figura 19. Segue uma descrição:

∙ Etapa 1: a primeira etapa do processo de consulta da opinião pública consiste em conhecer os temas que a comunidade deseja debater e para as quais pretende propor soluções. Para isto, uma pergunta disparadora é lançada na Ágora através de uma questão dissertativa, solicitando que o usuário discorra livremente. Cada usuário poderá enviar uma única resposta, limitada a 1000 caracteres. O conjunto de respostas será processado pelo Extrator de Opinião Pública, o qual extrairá todos os temas presentes no documento.

∙ Etapa 2: a segunda etapa trata da seleção dos temas extraídos. Uma questão de múltipla escolha será utilizada para que os usuários possam escolher qual(is) tema(s) deseja(m) debater (dentre aqueles revelados pelo EOP). Os resultados também serão balizadores da representatividade dos temas. Ao final, um relatório será criado com os resultados das votações e os temas selecionados para o debate.

∙ Etapa 3: nesta etapa, ocorrerão os debates com os temas selecionados pelos usuá- rios. Cada tema terá sua própria thread, na qual cada usuário poderá fazer um único comentário e uma única réplica em cada comentário de outro usuário. Esta dinâ- mica tem por objetivo garantir a participação igualitária, uma vez que cada usuário

Figura 19 – Fluxograma da proposta prática para Metodologia da Ação Comunicativa.

terá o mesmo espaço para se manifestar e poderá alterar sua opinião/argumentação à medida que o debate se constrói. O debate será orientado para busca de pro- postas e soluções para o tema em discussão. Os participantes deverão seguir um

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“Código de Princípios Éticos” disponibilizado na Ágora e descrito no Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, o qual enuncia algumas condições para o debate racional/argumentativo e livre de coação. Ao fim desta etapa, todos os comentários e réplicas serão processados pelo EOP, o qual irá extrair as propostas mais re- presentativas, selecionadas conforme o índice de representatividade calculado pelos algoritmos de mineração de textos (mais detalhes sobre o índice no capítulo 5). ∙ Etapa 4: A penúltima etapa consiste na validação das propostas extraídas pelo

EOP. Segundo a premissa habermasiana, a validação do conteúdo gerado nos debates deve ser realizada pela própria comunidade, a qual direciona a seleção do conteúdo consensual. Para que isto seja possível, foi elaborada uma técnica de crowdsourcing, em que os usuários votam pelas ideias/propostas indicando se concordam ou não, e um índice, o índice de consenso, é calculado dinamicamente conforme a votação vai ocorrendo.

A técnica de crowdsourcing foi implementada criando um elemento especial chamado “Questão Propositiva”, composta por uma tabela onde as proposições extraídas pelo EOP são apresentadas e ranqueadas. Ao lado de cada proposição, um sinal de “cur- tir” e “não curtir” é apresentado para que o usuário escolha se concorda ou não com a ideia. Cada usuário pode votar uma única vez em cada proposição, selecio- nando apenas uma opção. Com base na votação dos usuários, o índice de consenso é calculado, levando em consideração a quantidade de usuários que participaram da votação e a quantidade total de pessoas aptas a participarem da consulta. O índice é definido abaixo: 𝐼𝑐 = 100 (︂ 1 + 𝐶 − 𝑁 𝑁 𝑇 )︂ (4.1) onde, para cada proposta, 𝐶 é a quantidade total de “curtir”, 𝑁 de “não curtir” e 𝑁 𝑇 o número total de pessoas que acessaram a Ágora. Desta forma, o índice de con- senso 𝐼𝑐 é um valor que varia entre 0 e 200, sendo que cada proposta é inicializada com o valor 100. Caso todos os participantes respondam apenas com “curtir”, tem- se a condição de 100% de consenso com 𝐼𝑐 valendo 200. Caso todos os participantes respondam apenas “Não Curtir”, tem-se a condição discordância completa com 𝐼𝑐 valendo 0. Os valores intermediários são sempre uma ponderação entre a diferença de avaliação e a quantidade de pessoas que avaliaram. Este modelo possibilita que uma proposição avaliada majoritariamente como positiva ou negativa por um grupo pequeno de pessoas não seja considerada consenso ou dissenso.

As proposições apresentadas atualizam dinamicamente sua posição na tabela se- gundo o índice de consenso e em ordem decrescente. Além das propostas extraídas pelo EOP, a questão também permite que cada usuário acrescente uma única vez

uma ou mais propostas que também serão colocadas para avaliação. A Figura 20 exemplifica uma questão propositiva.

Figura 20 – Exemplo de uma Questão Propositiva.

Após o tempo estipulado para que os usuários validem as proposições, a etapa 4 se encerra e as ideias que atingiram um valor mínimo no índice de consenso são classificadas como representantes da opinião pública.

∙ Etapa 5: A última etapa trata da apresentação dos resultados e dos encaminha- mentos. Nesta fase, um relatório é gerado com um resumo da consulta e com os resultados apresentados como a opinião genuína da comunidade sobre a pauta dis- cutida. Também podem ser dados esclarecimentos sobre os encaminhamentos dos resultados e como eles podem vir a afetar as deliberações políticas.

O teste e validação da MAC foram executados junto com o uso da Ágora em uma consulta com a comunidade acadêmica com a pauta “Segurança na Unicamp e em Barão Geraldo”. Os detalhes, desafios, resultados e conclusões desta consulta estão apresentados no capítulo 8.

4.7

Conclusão do Capítulo

O presente capítulo tratou de apresentar os objetivos e métodos do projeto e-Ágora, proposto para desenvolver tecnologias que possibilitem a formação da opinião pública a partir da participação direta dos membros de uma comunidade.

Capítulo 4. Projeto e-Ágora: a Ágora e a Metodologia da Ação Comunicativa 113

Fundamentado na teoria da democracia deliberativa de Jürgen Habermas, o projeto e-Ágora é composto por três frentes: a Ágora, um projeto de uma plataforma virtual de participação política inspirado no conceito de esfera pública; o Extrator de Opinião Pública, um conjunto de algoritmos de inteligência artificial que se utilizam de técnicas de mineração de textos e processamento de linguagem natural para revelar temas e conteúdos relevantes em documentos textuais; e a Metodologia da Ação Comunicativa, uma proposta teórica e prática de construção da opinião coletiva segundo os preceitos da teoria da ação comunicativa e que se utiliza da Ágora e do EOP para estabelecer um protocolo de consulta da opinião pública.

Neste Capítulo, foi apresentada a Ágora e a Metodologia da Ação Comunica- tiva, uma vez que a primeira estabelece o espaço real de participação política e o segundo, o protocolo de uso dos seus elementos para a consulta da opinião pública.

Para a Ágora, o conceito de esfera pública, espaço de participação universal e plural de emanação da opinião pública, foi o fundamento principal no processo de desenvolvimento da plataforma web. Pensada como um ambiente virtual irrestrito de debate, conhecimento e atuação cidadã, sua criação envolveu desafios de ordem filosófica, os quais definiram os elementos que uma esfera pública virtual deveria conter, e também de ordem computacional, uma vez que exigiu o uso de conhecimento da área de engenharia de software, engenharia web, desenvolvimento de sistemas de informação até webdesign e segurança de rede. Ao fim, a Ágora foi implementada e hospedada em um servidor web e disponibilizada para consultas de opinião com a comunidade da Unicamp.

Já a Metodologia da Ação Comunicativa tratou de elaborar uma proposta teórica e prática de pragmatização da teoria da ação comunicativa, a qual versa sobre o uso do debate racional/argumentativo de ideias para a busca de consenso e entendimento, tendo a linguagem como principal instrumento de transformação. Para isto, foi proposta uma metodologia de formação da opinião partindo da manifestação livre dos cidadãos, passando pelo debate de ideias e culminando na busca de consenso sobre o conteúdo elaborado. Na prática, um protocolo de uso dos elementos da Ágora (debates, votações, relatórios e artigos) foi criado para estabelecer as condições da ação comunicativa. Seu uso está apresentado no capítulo 8, que trata do uso da Ágora em um processo de consulta da opinião pública.

A última frente do projeto e-Ágora, o Extrator de Opinião Pública, será abor- dada no próximo capítulo, posto que seu desenvolvimento trata da criação de inovadores algoritmos de mineração de textos e processamento de linguagem natural.

5 Projeto e-Ágora: o Extrator de Opinião Pú-

blica

A Ágora e a Metodologia da Ação Comunicativa (MAC), apresentadas no capítulo 4, compõem duas frentes do projeto e-Ágora que têm por objetivo estabelecer um espaço de formação da opinião pública segundo a teoria da democracia deliberativa. A Ágora trata do desenvolvimento de um ambiente virtual fundamentado no conceito de esfera pública, na qual se estabelece um processo de formação de opinião com base na teoria do agir comunicativo. Este processo, que determina as formas de uso dos elementos da Ágora e os procedimentos de tratamento dos dados, foi denominado Metodologia da Ação Comunicativa.

A MAC, como uma proposta de formação da opinião pública em um contexto virtual e de ampla participação popular, implica no desenvolvimento de inúmeras estra- tégias de tratamento de grandes quantidades de dados que permitam, de forma rápida e com a mínima intervenção humana, revelar os desejos e anseios de uma comunidade apresentando a diversidade de temas e o conteúdo relevante.

É neste ponto que se encontra a principal fronteira entre o desenvolvimento de novos métodos em engenharia e o pensamento sociológico. Para que seja possível tornar reais (ou ao menos factíveis) as práticas democráticas aqui propostas, faz-se necessária uma imersão no campo da engenharia para desenvolver a tecnologia que dará suporte a esta empreitada.

Neste contexto surge o Extrator de Opinião Pública (EOP) como a frente do projeto e-Ágora que trata do desenvolvimento de novas tecnologias, as quais darão suporte aos processos de formação da opinião. Destarte, o EOP projeta-se como o núcleo de processamento de dados que possibilita a participação direta de muitas pessoas nos processos democráticos (condição completamente utópica sem a simbiose com as novas TICs) graças à criação de novos métodos na área de Processamento de Linguagem Natural (PLN) e Mineração de Textos.

O presente capítulo tratará de apresentar o Extrator de Opinião Pública como uma proposta de desenvolvimento de técnicas e métodos de descobrimento de conheci- mento em dados não-estruturados. O capítulo sobre mineração de textos, apresentado na parte teórica deste trabalho, trata do principal fundamento da metodologia a ser aqui apresentada, porém não se esgota nele, e outras áreas das engenharias, como as redes com- plexas e linguísticas, também foram fundamentais para a implementação dos processos de extração da opinião.

Capítulo 5. Projeto e-Ágora: o Extrator de Opinião Pública 115

Deste modo, este capítulo se organiza em três eixos: os dois primeiros tratam da fundamentação teórica que complementa o desenvolvimento dos algoritmos de extração da opinião: a teoria de redes complexas e as redes linguísticas; e o terceiro eixo apresentará a metodologia desenhada para o EOP, bem como os detalhes da sua implementação. A avaliação e os testes do método serão apresentados separadamente em capítulos posteri- ores.