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Metodologia utilizada neste estudo, hipóteses e objetivos A elaboração do presente trabalho passou pela realização de

1980-1999) Caso estimativaMelhor provávelFaixa

1.6. Metodologia utilizada neste estudo, hipóteses e objetivos A elaboração do presente trabalho passou pela realização de

revisão bibliográfica sobre o tema das mudanças climáticas globais. Por ser ainda um assunto muito recente nos meios científicos internacionais, a governança climática nas cidades ainda carece de bibliografia específica disponível; logo, essa carência torna-se também uma justificativa para o presente trabalho acadêmico. Assim, a pesquisa bibliográfica baseou-se também no levantamento de projetos municipais que pudessem estar relacionados à mitigação e/ou adaptação das cidades às mudanças climáticas globais, mesmo que de forma indireta. Seguiu-se coleta de dados (percepções, reflexões, posicionamento e propostas de ações frente ao problema) dos atores, via entrevista gravada do tipo estruturada, por meio de questionário realizado face a face (ver Apêndice A, à página 365), a técnica mais flexível de coleta de dados de que dispõem as ciências sociais e que constitui a base da metodologia da história oral

(GIL, 1999). As entrevistas gravadas e posteriormente transcritas por profissional especializado serão depositadas no Laboratório de História Oral da Universidade da Região de Joinville – Univille.

Para este autor, as questões devem ser elaboradas de forma a possibilitar que sua leitura e seu entendimento pelo entrevistador e entrevistado ocorram sem maiores dificuldades e que, ao longo do processo, possa haver um estímulo a respostas completas. Em relação ao acompanhamento desse processo, Kastrup (2007) apresenta uma forma de ir a campo utilizando especialmente a atenção como instrumento fundamental, e afirma que, nessa perspectiva, a etapa inicial não é uma simples coleta, mas, sim, produção de dados.

No caso do processo metodológico, existem distâncias culturais entre o pesquisador e o pesquisado que remetem à importância de procurar perceber como os indivíduos do grupo investigado (entrevistados) constroem e definem a sua realidade, como articulam e que peso relativo têm os fatos que vivenciam e relatam (VELHO, 1980). Por outro lado, deve-se ter em conta que

os efeitos de realidade que presidem a narrativa do entrevistado ancoram-se na biografia cognitiva do pesquisador, ou seja, na história do percurso objetivo do pensamento, e na ordem dramática a partir da qual ele atribui um sentido a uma série de acontecimentos e situações vividas (ROCHA; ECKERT, 2005, p. 11).

De acordo com Demo (1997), pesquisa é a atividade científica pela qual descobrimos a realidade. A pesquisa utilizada neste trabalho é exploratória, ou seja, estimula os entrevistados a pensarem livremente sobre algum tema, objeto ou conceito. Ela faz emergir aspectos subjetivos e atinge motivações não explícitas, ou mesmo conscientes, de maneira espontânea. É usada quando se buscam percepções e entendimento sobre a natureza geral de uma questão, abrindo espaço para a interpretação. Ela parte de questionamentos.

Conceitualmente utiliza-se a pesquisa qualitativa quando o interesse não está focalizado em contar o número de vezes em que uma variável aparece, mas sim que qualidade ela apresenta. A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa com um nível de realidade que não pode ser quantificado. A principal característica da pesquisa qualitativa é o fato de seguir a tradição

“compreensiva” ou “interpretativa” e possuir como determinantes os seguintes aspectos: a fonte de dados é o ambiente natural, o pesquisador é o instrumento principal, ela é descritiva/analítica e valoriza muito o processo e não apenas o resultado (MINAYO, 1999).

A partir da definição da metodologia a ser utilizada neste trabalho, passamos a descrever nosso campo de pesquisa. Importante polo cultural de Santa Catarina e terceiro polo econômico da Região Sul do Brasil, Joinville, figura entre os quinze maiores arrecadadores de tributos e taxas municipais, estaduais e federais do país (IPPUJ, 2007, p.11), com uma população aproximada de 500 mil habitantes. O centro urbano do município está apenas 2 metros acima do nível do mar, e localiza-se ao longo das margens do rio Cachoeira. Isso faz com que a cada três ou quatro anos ocorra uma forte inundação, tanto pela cheia do rio quanto pelo nível das marés, sem a ocorrência de precipitação (IPPUJ, 2007, p. 12). Esse fato, aliado à ocorrência de enchentes nas planícies do município e deslizamentos de encostas de morros cada vez mais frequentes provocados por chuvas intensas demonstram, por si só, a fragilidade da cidade e colocam-na em risco frente às mudanças climáticas globais. Tal fragilidade sugere ações imediatas por parte dos setores público, privado e da sociedade civil, com vistas à diminuição desse risco.

O estudo do tema das mudanças climáticas globais e seus efeitos, a descrição da situação da cidade de Joinville em relação ao tema e as entrevistas com os atores escolhidos levarão à análise da governança dessa questão no âmbito local (vulnerabilidades, barreiras, oportunidades e responsabilidades). Contudo, em que pese haver crescente consenso científico e político a respeito da gravidade das mudanças climáticas, ainda não está definida nem consensuada a governança relativa a elas. A governança43 é de âmbito global e implica o reconhecimento da importância de atores não-estatais, inclusive do mercado, seja na participação ativa nos processos decisórios e de engenharia legislativa, seja como destinatários de políticas públicas mais transparentes.

Este estudo apontará também as possíveis alterações e/ou mudanças do meio físico ocorridas nos últimos anos na cidade que

43 Segundo o Banco Mundial, em seu documento Governance and Development, de 1992, a

definição geral de governança é “o exercício da autoridade, controle, administração, poder de governo”. Precisando melhor, “é a maneira pela qual o poder é exercido na administração dos recursos sociais e econômicos de um país visando ao desenvolvimento”, o que implica, ainda, “a capacidade dos governos de planejar, formular e implementar políticas e cumprir funções” (fonte: <http://www.conpedi.org.br>).

podem estar contribuindo para fragilizá-la diante do fenômeno das mudanças climáticas globais. Tomou-se como hipótese, aqui, a vulnerabilidade da cidade de Joinville frente às mudanças climáticas. Tal vulnerabilidade será relacionada à existência ou não de espaços locais e estruturas definidas para o debate e deliberações sobre a questão e seus impactos na cidade; o preparo ou não da cidade e de seus gestores para o enfrentamento do problema; a existência ou não de recursos para a implementação de ações e projetos de mitigação e/ou adaptação às mudanças climáticas; e a existência de obstáculos, mas também de oportunidades para a cidade de Joinville enfrentar e adaptar-se às mudanças climáticas.

Os atores entrevistados são líderes e empresários da cidade, pessoas ligadas à gestão administrativa atual e aos órgãos aptos a cuidar da governança da questão em estudo. São eles: o prefeito da cidade de Joinville, o presidente da Câmara de Vereadores, o secretário da Seplan, o presidente do IPPUJ, o presidente da Fundema, o gerente da Defesa Civil, o presidente da ACIJ e um membro do Instituto Joinville. Para tanto, este autor valeu-se das redes de conhecimento que foram sendo constituídas em função da própria pesquisa para a seleção dos entrevistados, partindo de indicações feitas por pessoas que passou a conhecer em sua jornada profissional e nas discussões sobre o tema da mudança climática. Sua reflexão pessoal sobre as narrativas está respaldada nas leituras e discussões de artigos e livros que abordam a questão. A participação direta deste autor como membro do Conselho Municipal de Desenvolvimento Sustentável da Cidade de Joinville (Conselho da Cidade), do Conselho de Desenvolvimento de Joinville (Desenville) e do Conselho de Desenvolvimento Regional resulta em uma posição privilegiada para a análise do envolvimento e das ações das lideranças joinvilenses em relação ao tema em estudo.

O estudo da governança climática na cidade de Joinville como objeto de um doutorado acadêmico, além de fornecer elementos ao cidadão joinvilense e a seus governantes para o enfrentamento das mudanças climáticas globais em nível local, visando ao desenvolvimento sustentável da cidade, tem por objetivo reunir um conjunto de informações que possam despertar a atenção de outros governos municipais para a questão, deflagrando uma proatividade de ações para a mitigação e/ou adaptação de outras cidades brasileiras às mudanças climáticas globais.

Se os efeitos de uma mudança climática em nível planetário já podem ser percebidos, é nos países menos desenvolvidos que tais efeitos ficam mais explícitos. Nações ricas estão mais capacitadas a se proteger ou a se ajustar às mudanças, mas as nações pobres do “terceiro mundo”44 necessitariam de recursos para atacar os problemas resultantes desse processo. De acordo com Giddens,

os riscos ambientais globais afetam as consciências das pessoas de forma mais universal do que outras ameaças, simplesmente porque não existe meio de escapar deles. Mais que quaisquer outros perigos, esses riscos são refratários a testes segundo os procedimentos usuais da ciência... Se o aquecimento global está ou não ocorrendo é um assunto controverso. O curso de ação mais prudente – sempre se partindo do princípio de que as medidas necessárias poderiam ser tomadas, de maneira viável, em um nível global – seria adotar medidas preventivas, pressupondo-se que o aquecimento global está de fato acontecendo e que terá consequências prejudiciais. No entanto, se tais medidas forem de fato implementadas, seria fácil argumentar, retrospectivamente, que isto foi apenas outro pânico e que se fez um grande esforço por nada (GIDDENS, 1996, p. 3).

Os fatores que tornam os países pobres mais vulneráveis aos desastres climáticos seriam: extrema dependência de sua economia em relação aos recursos naturais, por exemplo, a agricultura; baixa diversificação da atividade econômica; concentração da população em áreas de risco ambiental; baixa capacidade institucional de ação e necessidade de reservas econômicas. Todos são característicos de

44 Muitos estudiosos ainda usam essa expressão para se referirem às nações não

industrializadas do mundo. De acordo com Willians (2005), o “terceiro mundo” e as pessoas se adaptaram aos desafios da ordem global prevalente, principalmente quanto ao desenvolvimento de suas economias, no sentido de satisfazer aos interesses externos mais do que a suas necessidades internas.

países em desenvolvimento, tanto que 96% das mortes por desastres naturais acontecem nesses países, onde, de acordo com as Nações Unidas, em 2025, 80% da população do planeta estará concentrada, principalmente, em cidades situadas em áreas costeiras sujeitas a enchentes e ciclones (IPCC, 2008). O município de Joinville, objeto de nossa análise, confirma esse cenário, pois possui a maior parte de seu limite urbano localizado em uma planície costeira sujeita a inundações. E sua população de baixa renda concentra-se, em grande parte, em áreas sujeitas a enchentes e deslizamentos.

No curso da história, a responsabilidade45 pelo aquecimento global seria das nações desenvolvidas, como as maiores consumidoras da grande maioria dos combustíveis fósseis nos últimos 200 anos; sua riqueza e prosperidade têm sido criadas com base na utilização desses combustíveis fósseis e no uso da atmosfera global como depósito para os GEE resultantes das atividades industriais e agropecuárias. Muitos desses países já desenvolvem políticas e ações no sentido da diminuição das emissões de GEE. Por outro lado, seguindo-se o atual padrão de desenvolvimento e consumo, em pouco tempo os países emergentes é que estarão listados como os maiores emissores desses gases. O Brasil, como nação com crescente influência no cenário econômico, político e ambiental internacional, deve necessariamente procurar desenvolver tais políticas e incorporá-las em seu projeto de desenvolvimento, como forma de procurar a sustentabilidade e o bem-estar de seus cidadãos.

Além disso, a população humana que vive em nações industrializadas e em países emergentes é responsável por 80% das emissões atmosféricas mundiais (IPCC, 2008). Sendo assim, todas as nações industrializadas e em processo de industrialização usam muito mais do que sua justa parte da energia disponível no planeta e na atmosfera. Essa “justa parte” da atmosfera poderia ser em tese calculada fazendo-se a estimativa da quantidade de poluição mundial que seria sustentável – capacidade dos processos naturais de absorção das emissões – dividida pela quantidade da população mundial (IPCC, 2008). Assim, todas as nações teriam os mesmos direitos para poluir e usar energia.

Com o intuito de coordenar os crescentes debates internacionais sobre mudanças climáticas e as ações de combate a esse fenômeno,

45 “Dois argumentos relacionados à ética ambiental: vivemos em um planeta frágil, submetido

atualmente à ruína e desorganização permanente por causa da intervenção humana; os seres humanos devem aprender a atuar como administradores responsáveis de seu planeta ameaçado” (GOULD, 1994, p. 45).

a UNFCCC (United Nations Framework Convention on Climate Change), também conhecida por Convenção do Clima (ver item 2.2), foi oficialmente criada na Conferência das Nações Unidas para o Ambiente e Desenvolvimento, no Rio de Janeiro, em 1992 (ECO 92)46. Essa conferência reuniu líderes governamentais de todo o mundo para a assinatura de um acordo que objetivava a estabilização das concentrações dos GEE em níveis que preveniriam perigosas interferências antropogênicas no sistema climático mundial.

A Convenção observou dois importantes princípios: o da precaução e o da igualdade, ou seja, todas as nações teriam os mesmos direitos de utilização da energia disponível, das mesmas quantidades de emissão dos GEE, ou de usar a capacidade natural do meio ambiente de absorver a poluição.

Em 1997, no Japão, os governos elaboraram o Protocolo de Quioto, que continha mecanismos e estratégias para a redução das emissões de GEE (ver item 2.6, à página 109). Para a discussão de um novo acordo sobre emissões atmosféricas, qualquer mecanismo de redução deveria efetivamente diminuir as emissões globais. O histórico débito de emissão de carbono das nações industrializadas para com as nações em desenvolvimento permanece, juntamente com o interesse comum em resolver as questões relativas às mudanças climáticas47. Este é outro argumento para as nações em desenvolvimento cancelarem suas dívidas externas com as nações desenvolvidas. Parte dos fundos e reservas dos países em desenvolvimento poderiam então ser usados, por exemplo, para investimentos em energia sustentável não poluente em planos e projetos de desenvolvimento das cidades, visando à diminuição dos riscos sociais e ambientais e à mitigação dos efeitos locais das mudanças climáticas globais.

2.1. Antecedentes das discussões sobre mudanças climáticas