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4. ANÁLISE

4.3 A NÁLISE DA IMAGEM PÚBLICA DE M ICHEL T EMER

4.3.2 Michel Temer por outras pessoas

147 Veja essa, Veja, 28 de setembro de 2016, p.40.

148BARROCAL, Carta Capital, 28 de setembro de 2016, p.25.

149 BARROCAL, Carta Capital, 28 de setembro de 2016, p.26.

150 Panorama Veja essa, Veja, 23 de dezembro de 2015, p.56.

151 BARROCAL, Carta Capital, 14 de setembro de 2016, p.18.

Michel Temer tem uma imagem política construída há um tempo consideravelmente maior que o da ex-presidenta e era comumente conhecido como um político de bastidores, que fazia o jogo político e as alianças sem ir para os holofotes: “Temer, que não é dado a confrontos em público”153, é um “homem das sombras”154.

Mesmo assim, o presidente recebe críticas não só pela maneira como se portou durante o impeachment, “aparecendo” bastante e não apoiando Dilma, como pelo fato de assumir um governo de maneira ilegítima para muitos, que o enquadram da mesma forma que a revista Carta Capital, como foi discutido em seção da análise anterior:

Presidente sem voto, Michel Temer chefiará um governo autoritário, mas ele próprio será o que já é, um mamulengo, prisioneiro de suas próprias circunstâncias e do roteiro ditado pelos seus criadores, senhores absolutos dos cordéis que movimentam seus passos. Sua pequena margem de manobra – pois não é o chefe da maioria parlamentar que decretou o impeachment, nem muito menos um líder popular –, verá, a partir de 31 de dezembro, ainda acossado pelo temor das delações premiadas por enquanto contidas, seu campo de atuação visivelmente reduzido.155

Outro discurso que aparece sobre Temer é a possibilidade de ele piorar a situação que já era considerada crítica, ao assumir o governo, preocupação manifesta na fala a seguir de um indígena presente em Brasília durante os momentos finais do processo do impeachment:

Depois que eu ouvi na TV o discurso do Michel Temer, vi que ele não falou nada de povos indígenas. Na verdade, ninguém lá falou nada de povos indígenas. [...] Tenho esperanças de que não irá acontecer coisas ainda pior contra os indígenas e as pessoas que estão sofrendo mais nesse momento, como os quilombolas, os negros e as negras, as mulheres.156

Em algumas falas, é possível perceber que o componente de gênero é acionado para diferenciar e diminuir Dilma frente aos dois homens políticos que estão na mesma órbita: Lula e Temer. Lula é o carismático, o bom negociador, “o lula é um ilusionista”157, que pode “conseguir convencer o povo a lembrar só das coisas positivas dele e esquecer do resto”158, qualidades que faltam a ela. Temer, apesar de não acionar o carisma, possui maior capacidade de articulação política – e muito de sua indicação à vice se deveu ao que ele agregaria à chapa

153 PEREIRA, Veja, 09 de dezembro de 2015, p.61.

154 BARROCAL, Carta Capital, 07 de setembro de 2016, p.21.

155 AMARAL, Carta Capital, 31 de agosto de 2016, online.

156 MILANEZ, Carta Capital, 07 de setembro de 2016, online.

157 BONIN, Veja, 20 de janeiro de 2016, p.17.

em termos de capital político: “Nunca houve a menor necessidade de ficar com raiva de Michel Temer. [...] é o tipo clássico do perfeito ‘gente fina’”159.

As ações de Temer na semana inicial de seu mandato envolvem criar as condições para as reformas que planejava no plano de governo “Ponte para o futuro”, inclusive sendo mais assertivo em suas abordagens, justificadamente, segundo Veja: “Temer subiu o tom porque sabe que terá dificuldade em se fazer ouvir”160. Mesmo em um cenário de crise, o impeachment traz certa vontade de mudança na realidade de cada um(a) e as esperanças no governo de Michel existiam, inclusive por ele ser diferente de Dilma e fazer diferente dela: “O presidente Temer não fará como a ex-presidente Dilma, que tinha uma base do tamanho de um oceano e terminou com um laguinho quase seco”, diz Aloysio Nunes do PSDB161 e “o futuro do presidente Michel Temer, agora em definitivo no cargo, está na agenda para tirar a economia do precipício. Há sinais de uma retomada, mas ainda embrionários”162.

As ações de Michel Temer se referenciam nas ações de Dilma Rousseff, política que acabara de deixar o cargo, reforçando o ponto de que a imagem pública é relacional. As imagens precisavam se distanciar para que Temer garantisse o mínimo de governabilidade e aprovasse as reformas caras a ele: “se o novo governo conseguir aprovar as reformas e retomar o crescimento econômico, esvaziará a principal bandeira petista até agora: a defesa das conquistas sociais supostamente ameaçadas pela política de austeridade fiscal”163. O período de início do governo de Temer é marcado pelos discursos que exploram a falta de apoio do presidente:

A partir de então estará inteiramente à mercê de seus construtores de hoje, seus prováveis algozes de amanhã. Por qualquer deslize será defenestrado, com ou sem crime de responsabilidade, como foi Dilma Rousseff, pelo mesmo Senado que hoje lhe está outorgando o poder a que não tem direito.164

A necessidade de articulação política emerge como a única saída para o governo de Temer, que possuía a imagem de, até então, ser o homem que “maneja todas as alavancas do Congresso e da máquina partidária peemedebista”165 e “muito hábil como parlamentar,

159 GUZZO, Veja, 21 de setembro de 2016, p.102.

160 SAKATE; PEREIRA, Veja,07 de setembro de 2016, p.60.

161 SAKATE; PEREIRA, Veja, 07 de setembro de 2016, p.61.

162 SAKATE; PEREIRA, Veja, 07 de setembro de 2016, p.58.

163 ZALIS; LEITE, Veja, 07 de setembro de 2016, p56-57.

164 AMARAL, Carta Capital, 07 de setembro de 2016.

mas incapaz de sentir o pulso do país. É um orador obsoleto com a retórica de centro estudantil de 1950 e um péssimo político no sentido de apelo ao voto”166.

O primeiro evento oficial de Michel Temer ocorreu uma semana após a posse, o dia da Independência e contou com algumas quebras de protocolo a fim de diminuir a exposição, “precauções que colaboraram para Temer ficar exposto por menos tempo aos olhos da plateia”167 e possivelmente evitar os confrontos (vaias incluídas) que ocorreram nos meses anteriores: “O presidente seguiu um protocolo de exposição mínima durante a parada militar em Brasília, uma tentativa de fugir das vistas e das vaias públicas. Não deu certo, como também falhara no Maracanã.”168 Rodrigo Maia, em entrevista à Veja, explica a necessidade de o governo se associar à população: “Agora é preciso fazer os ajustes. Do contrário, o governo perderá a chance de estabelecer o elo com a sociedade. Ele está se comunicando muito mal, de forma antiquada, mofada, ineficaz”169 e destaca um ponto interessante que diz da capacidade de imagens públicas se transformarem:

Os contrapontos ao termo ‘golpista’ e à expressão ‘Fora, Temer’ são pífios. Surgiu a ideia de divulgar o slogan ‘Bora, Temer’ mas acho horrível. ‘Fora, ladrão’, então, é pior ainda. FHC foi um presidente que demonstrou capacidade de transformar a imagem de seu governo com uma boa comunicação. O mesmo desafio se coloca agora.” “Não é só imagem. [...] Michel é preparado, mas precisa trazer para seu círculo quadros que possam ajudar a estabelecer esse novo elo com as ruas [Rodrigo Maia]170

Em termos de aprovação popular, nem Dilma nem Michel são políticos com aprovação elevada, especialmente na fase inicial de governo, a desaprovação de Temer cresce e “nas redes sociais da internet, ele desperta hoje mais rejeição do que aquela direcionada à petista no auge de protestos a favor do impeachment em 2015”171, apesar de as aparências serem outras: “no campo político, o novo governo deu mostras de que dispõe de uma base mais coesa que a de Dilma”172. Desaprovação explicada talvez pelo discurso da falta de legitimidade do projeto político que Temer gostaria de levar adiante e não encontra tanto apoio: “Sou contra o Temer no poder porque ele chegou lá com uma 'pernada' e quer fazer coisas que não foram vencedoras na eleição de 2014”173. Observa-se, assim, a disputa

166 DIAS, Carta Capital, 07 de setembro de 2016, online.

167 BARROCAL, Carta Capital,, 07 de setembro de 2016, p.20-6.

168 BARROCAL, Carta Capital,, 07 de setembro de 2016, p.20-6.

169 WEINBERG, M; PRADO, T. Veja, “Falta elo com as ruas”, 21 de setembro de 2016, p.15-19.

170 WEINBERG, M; PRADO, T. Veja, “Falta elo com as ruas”, 21 de setembro de 2016, p.15-19.

171 BARROCAL, Carta Capital, 07 de setembro de 2016, p.20-6.

172 SAKATE; PEREIRA, Veja, 07 de setembro de 2016, p.59.

simbólica em torno da imagem do atual presidente: ao mesmo tempo em que é visto como um bom administrador que irá reparar os erros da gestão de Dilma, também é visto como alguém que trapaceou para alcançar o posto que ocupa. Inclusive, Dilma esboça essa traição ao compará-lo ao ex-presidente da câmara: “Temer é Cunha e Cunha é Temer”174, e o colunista Maurício Dias concorda: “O vice Michel Temer há tempo sonha com o poder, mirava em 2018, mas agora gostaria de antecipar a sua chegada à Presidência. [...] Houve nesse episódio uma inominável traição. Com a anuência silenciosa de Temer”175

A mudança na percepção sobre Michel Temer revela que as representações e a própria imagem pública podem sofrer alterações de acordo com o contexto e com estímulos por exemplo de um plano de marketing político (GOMES, 2004). No caso de Temer, seu envolvimento em ações diretas contra Dilma se encarregaram de mudar a imagem construída dele:

Dilma teve dois vices diferentes com um só nome. Ao longo dos quatro anos do primeiro mandato (2010-2014), com boa aprovação da sociedade, Temer foi um ‘vice-decorativo’, como ele mesmo se rotulou. Em 2015, mudou o comportamento. Tem sido um político superativo.176

Figura até então decorativa no primeiro mandato de Dilma, o vice-presidente Michel Temer deixou o estado de hibernação para ajudar o governo a negociar projetos no Parlamento. O imperceptível Temer ganhou status de protagonista e o PMDB vislumbrou no agravamento da crise a chance de deixar a condição de sócio minoritário do poder. [...] Não demorou muito e Temer passou a ser tratado como conspirador. O rompimento foi inevitável.177

Temer é comparado aos ex-vice-presidentes em relação a sua postura política e recebe críticas como as seguintes:

[...] antes mesmo de ser escolhido como vice, Temer já dava palpites, o que é de uma extrema indelicadeza, para dizer o mínimo. Isso mostrava como era diferente dos vices anteriores. Marco Maciel, de Fernando Henrique, entrou mudo e saiu calado. José Alencar foi discreto e tinha uma fidelidade absoluta a Lula. Não é o caso de Temer.178

Seu posicionamento como vice é bastante criticado. O político Pezão disse que vice “não é para conspirar” e que apesar de gostar de Temer, condenava suas atitudes: “Adoro

174 PEREIRA, Veja, 21 de setembro de 2016, p.51.

175 DIAS, M. Carta Capital, 16 de dezembro de 2015, p.16.

176 DIAS, M. Carta Capital, 16 de dezembro de 2015, p.16.

177 O Temer que ela temeu, Veja, 30 de dezembro de 2015, p.61.

o Michel, mas eu não tô achando legal o posicionamento dele nessa questão”179. Ciro Gomes também se pronuncia e o chama de “capitão do golpe”, enquadrando não só a situação interativa como os atores: “O beneficiário dessa ruptura da democracia e dessa potencial crise para durar 20 anos é ninguém menos do que o senhor Michel Temer, o capitão do golpe. [...] Temer conspira há algum tempo, tenho informações a respeito”180.

A relação de Temer e Cunha é bastante comentada, inclusive pelo fato do vice à época ter demorado a se pronunciar, o que pareceu falta de apoio a Rousseff: “calou-se e traiu o princípio de fidelidade à Dilma. [...] Repleta de lamúrias e insinuações, a missiva de Temer pode ser comparável à senha de uma conspiração articulada com Cunha”181 e ainda:

Dez anos depois, o impeachment tornou-se uma batalha real para Dilma Rousseff, mas ela não tem ao seu lado um vice como Alencar. Ao contrário. Nos últimas dias, Michel Temer deu sinais inequívocos ao mundo de que, entre a presidenta e o correligionário Eduardo Cunha, prefere o colega de partido. 182

Ciro Gomes também fala sobre o relacionamento do então vice com Eduardo Cunha e sobre a carta de Michel a Dilma:

Na verdade, Temer é o homem do Cunha, e não o inverso. Parte importante das loucuras que faz é por estar completamente comprometido. Ele está nas mãos do Cunha.

Nunca vi uma coisa tão ridícula, de tão baixo nível, absolutamente cretina e risível. Aquilo ali é um festival de vaidades e de mágoas explícitas. [...] E faz parte de um enredo golpista [sobre a carta].183

A carta, pensava Temer, poderia ser uma boa solução para sua relação com Dilma, mas acabou atraindo mais críticas e chacotas do que propriamente ajudando:

Temer, aliás, ficou em maus bocados após o rompimento, outro ponto a favor do Planalto. Saiu do episódio com a pecha de golpista, verbalizada sem piedade por vários petistas, e com a autoridade arranhada no partido. Artífice do rompimento ao lado de Cunha, Temer queria que os sete ministros do partido entregassem os postos. Seis deles, contudo, pediram a Dilma para que ficassem.184

Através dos dois eixos de análise sobre as falas e ações de Michel Temer, é possível observar a tentativa do presidente de se afastar da narrativa do golpe sustentada por Dilma e despontar como o “salvador” da pátria ao implementar as mudanças do projeto

179 BARROCAL, A. Carta Capital, 16 de dezembro de 2015, p.28.

180 MARTINS, R. Carta Capital, 16 de dezembro de 2015, p.30.

181 DIAS, M. Carta Capital, 16 de dezembro de 2015, p.16.

182 BARROCAL, A. Carta Capital, 16 de dezembro de 2015, p.23.

183 MARTINS, R. Carta Capital, 16 de dezembro de 2015, p.31.

“Ponte para o Futuro”, que acabou por se tornar sua plataforma de governo. Para ocorrer esse distanciamento, vemos Temer reforçar a constitucionalidade do processo e criticar abertamente Dilma: “A defesa de Temer [no processo de julgamento da chapa eleitoral] quer usar os depoimentos dos delatores da Lava-Jato [...] para se descolar de Dilma Rousseff”185. Entre as representações que ele encarna durante esse tempo, destacamos duas: a de vice e atual presidente. Na próxima subseção, veremos os valores e papeis que emergem a partir desses dois eixos e ajudam na caracterização das imagens públicas de ambos.

4.3.3 Valores e papeis sociais

Nos eixos anteriores, percebemos um presidente empossado defendendo o impeachment e se colocando como aquele que “unificaria” o país, arrumaria a casa. Outros agentes, ao falar sobre o político, criticaram sua falta de lealdade a Dilma durante o processo, destacando as atribuições esperadas de um vice e sua omissão. Mas Temer é elogiado pela capacidade de articulação e pelo capital político cultivado.

Seu papel como vice é questionado: “Qual é o papel do vice-presidente Michel Temer? Um Judas, um Iago? Não parece. Sabe, apenas, da simpatia de que goza nos ambientes graúdos e levanta o braço para dizer ‘estou aqui’”186. Cláudio Lembo diz que “o cargo nem deveria existir. [...] É um cargo de sofrimento contínuo, precisa ter equilíbrio emocional total, para não se sentir menosprezado”187.

O fato de ter faltado com Dilma vira uma forte marca na sua imagem pública: “O vice-presidente da República, Michel Temer, sofre de um problema de transparência. Não há dignidade em mergulhar na clandestinidade nos momentos de crise política. Salvo se estiver a favor da crise (leia-se golpe)”188. Goffman (2012) nos lembra que a dignidade é um dos valores da ordem expressiva que sujeitos em interação procuram manter a fim de preservar a fachada. Nesse caso, a dignidade de Temer é questionada e, com ela, sua fachada de um vice leal.

Em relação ao seu papel exterior às atividades do governo, ele é lembrado como pai e marido para receber críticas: “Nós, que ainda precisamos nos impor ao mundo forjando uma família perfeita que contenha: Um Senhor inescrupuloso, uma esposa silenciada e

185 LIMA, Veja, setembro de 2016, p.40.

186 CARTA, M. Carta Capital, 16 de dezembro de 2015, p.18.

187 BARROCAL, A. Carta Capital, 16 de dezembro de 2015, p.26.

infantilizada e uma criança exposta ao sair da escola – para forjar-nos a família ideal.”189 Apesar de possuir esses outros papeis sociais, o papel de pai e o de marido, por exemplo, aparecem muito menos nas falas de Temer e de outras pessoas falando sobre ele. É seu cargo como vice ou presidente que é destacado. Inclusive a predominância do cargo é evidenciada aqui:

O presidente Michel Temer disse ser “pessoalmente” contra a anistia tentada na semana passada no Congresso para os acusados do uso de caixa dois nas campanhas. Com todo o respeito, presidente, no cargo que o senhor ocupa não há “pessoalmente”. Sua pessoa foi revogada, engolida pelo cargo. Dizer-se “pessoalmente” contra equivale a indicar que o governo deixa. E se o governo deixa é porque é “institucionalmente” a favor”190 [grifos nossos]

As características e os adjetivos que se sobressaem nessa análise e ajudam a constituir a imagem pública das duas figuras políticas são relacionados ao momento, explorando a contextualidade que é central no conceito de imagem pública: em relação aos modos de governar, Dilma aparece como inflexível e sem traquejo político em oposição a Temer, que é reconhecidamente experiente nos meandros da política.

Assim como a economia é um valor atrelado à imagem de Dilma, envolve também as discussões sobre Michel, servindo de argumento a sua posse: “Temer daria alívio aos mercados e facilitaria as reformas econômicas, mas também tem potencial para balançar a Lava-Jato”191. Depois de algum tempo de governo – e extrapolando o período definido para a análise específica aqui realizada –, a análise é um pouco diferente, e só a economia não é capaz de agregar valores positivos à imagem do político:

A presidente Dilma, ela assumiu depois de ser eleita, a inflação subiu muito, a popularidade dela despencou. Com o Temer não, melhora a economia, cai a inflação, a inflação dos pobres tá 2% nos últimos doze meses [...] e nada melhora a popularidade. Ele tem uma espécie de efeito Teflon ao contrário, nada de bom gruda.192

A imagem de Michel está relacionada, principalmente, a seus cargos políticos e sua vida nesse campo, ademais da tentativa de investigação da vida pessoal, do casamento com Marcela Temer e o papel de pai, esses ecos não se mantiveram constantes e não apareceram no corpus analisado. A reiteração desses papeis profissionais faz contraponto aos

189 DIAS, Carta Capital, 14 de setembro de 2016, s/p.

190 TOLEDO, Veja, 28 de setembro de 2016, p.106.

191 TOLEDO, Veja, 16 de março de 2016, p.98.

192 Transcrição de : 'Indicadores mostram a economia melhorando', avalia Miriam Leitão. Disponível em: <https://globoplay.globo.com/v/6303015/programa/>; acesso em 04 de janeiro de 2018.

papeis como o de mãe e avó Dilma, numa explicitação do machismo em nossa sociedade que ainda valoriza o papel provedor do masculino. Assim como na análise da ex-presidenta, a dimensão econômica despontou como um valor que norteia nossa sociedade, servindo de endosso ou crítica a depender da situação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Quando ingressei no processo de mestrado, meu projeto de pesquisa era direcionado a um acontecimento específico: a chacina ocorrida em Osasco, SP, que deixou vários mortos e voltou a discussão da opinião pública para a questão da violência e da segurança. Mas veio dezembro de 2015 e o processo de impeachment foi aceito pela Câmara. Durante todo o primeiro semestre de 2016, acompanhei o desenrolar dos acontecimentos até a votação que afastou Dilma da presidência. Ao refazer o projeto no segundo semestre, decidi que gostaria de analisar de perto o fenômeno do impeachment, mas com um enfoque não usual: eram as imagens públicas da presidenta deposta e do presidente golpista/legítimo que seriam buscadas em duas revistas, para, a partir delas, discorrermos sobre os valores e papeis sociais no contexto do Brasil.

Foram três os conceitos que nortearam a construção deste trabalho: 1) acontecimento que guia nossa compreensão do impeachment;

2) enquadramento, através do qual observamos o acontecimento ser posicionado nas duas revistas;

3) imagem pública, que em conjunto com representação, orienta os três eixos de análise baseados na proposta de Gomes (2004): discursos e ações de Dilma e Michel em foco; discursos e ações proferidos por outras pessoas; valores e papeis sociais.

Entender o impeachment como acontecimento é antes de tudo aceitar o poder de afetação (QUÉRÉ, 2012; 2011) do mesmo, ou a capacidade de agitar a experiência cotidiana e provocar reações, o que, sem dúvidas, este processo causou, para quem apoiava ou discordava dele. Segundo Koselleck (2006, p.141), o acontecimento não pode ser captado na narrativa, representado na história, sem alguma ficção envolvida, porque “a realidade propriamente dita já não pode mais ser apreendida”. O acontecimento em sua totalidade é impossível de ser capturado. Mas algumas pequenas partes podem ser analisadas e contribuem para a construção de conhecimento sobre nossa época e nosso lugar.

O capítulo 1 desta dissertação busca compreender o contexto do qual surgiu o pedido de impeachment, olhando para quatro eixos: a crise econômica que já vinha se agravando no país e gerando descontentamento; a polarização na sociedade que se acirrou