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Microanálise da a vidade: Método para análise de dinâmicas em jogos de tabuleiro

No documento 1.2 Design de Jogos ( game design ) (páginas 78-85)

Capítulo 2 - Metodologia de pesquisa

2.2 Abordagem metodológica orientada pela teoria da a vidade

2.2.2 Microanálise da a vidade: Método para análise de dinâmicas em jogos de tabuleiro

Aqui são apresentados o experimento/debriefing e a análise dos dados empíricos para construir um método para analisar as dinâmicas de jogos de tabuleiro. Este método promoveu a microgené ca da a vidade. A Figura 2.2 ilustra a relação do métodos.

FIGURA 2.2 Esquema das relações do método de análise da dinâmica

(FONTE: A AUTORA)

A representação gráfica mostra. No lado esquerdo, o experimento que ocorre em três fases: primeiro a realização e gravação das sessões de jogo; segundo o debriefing cole vo com entrevista ao grupo par cipantes da a vidade; terceiro debriefing individual com entrevistas com cada par cipante. No lado direito, a análise dos dados ocorre em dois níveis: primeiro a observação direta da gravação para iden ficar a ocorrência dos elementos da a vidade; segundo as entrevistas com os par cipantes para promover a discussão sobre a a vidade de jogar e seus efeitos no desenvolvimento. No centro, a relação da gravação da sessão com a observação da dinâmica; e a relação dos debriefings com a análise ontogênica da dinâmica. A sessão de jogo é momento em que os jogadores

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experimentam a a vidade no tempo corrido do jogo (a microgênese); o debriefing cole vo é o momento em que ocorre o es mulo para a reflexão sobre a a vidade vivida; e o debriefing individual é o momento em se pode construir a ontogênese dos sujeitos da a vidade pela reflexão sobre as camadas gené cas.

Na parte de baixo da figura são indicadas as técnicas de gravação em vídeo, transcrição e entrevistas empregadas para realização do método.

Para uma formulação mais detalhada deste método são apresentados abaixo os fundamentos do experimento/debriefing e da análise dos dados empíricos.

2.2.2.1 Experimento e debriefing

O método inicia pela realização de experimento de duplo es mulo.

Experimento de duplo estímulo

O experimento de duplo es mulo tem o propósito de iden ficar como se dá a gênese de uma interação pela compreensão microgené ca da a vidade. Meira (1994) aponta para a origem da microanálise expondo que Vygotsky ampliou a perspec va de análises do desenvolvimento ao incluir os domínios sócio-histórico e microgené co de análise. O autor argumenta que, para Vygotsky, o domínio microgené co de desenvolvimento cogni vo está relacionado à formação de processos psicológicos, e que, ao ignorar esta forma de transição gené ca, estudos experimentais e de aprendizagem frequentemente falham no aproveitamento daquilo que pode ser seus dados mais interessantes (MEIRA, 1994).

Conforme Vygotsky, experimentos que se baseiam em caracterís cas externas (feno picas) resultam em mera descrição e não revelam as reais relações dinâmico-causais subjacentes ao fenômeno. Na análise geno pica, o fenômeno é explicado com base na sua origem e não na sua aparência. O autor argumenta:

“Quando me refiro a estudar um problema sob o ponto de vista do desenvolvimento, quero dizer revelar sua gênese e suas bases dinâmico-causais.”

(VYGOTSKY, 1999a, p. 82). Assim,

Para estudar o processo de gênese do conceito nas suas diferentes fases de desenvolvimento [...] Poderíamos descrevê-lo como o método do duplo es mulo:

apresentam-se ao indivíduo observado duas séries de es mulos, uma das quais como objeto da sua a vidade e a outra como signos que servem para organizar esta úl ma. (VYGOTSKY, 1999b, p. 70)

Em relação ao presente estudo, o experimento pode ser esquema zado no diagrama abaixo.

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FIGURA 2.3: Diagrama da sessão de jogo

(FONTE: Adaptação do diagrama de VAN AMSTEL, 2015, p. 13)

A representação gráfica mostra como primeiro es mulo a contradição entre os obje vos que devem ser a ngidos para vencer o jogo e as mecânicas que limitam as ações dos jogadores. O segundo es mulo é a dinâmica coopera va que emerge entre os jogadores, onde os jogadores estão compe ndo mas não são adversários. A mediação são as interferências dos jogadores no jogo, ou seja, uma forma dos jogadores par ciparem do projeto do jogo. A refração é o desenvolvimento psicológico dos jogadores.

Três fases do experimento

Fase I: Realização e gravação de sessões de jogo: A primeira fase do experimento é promover sessões com jogos coopera vos de tabuleiro. Reunir pessoas em torno de um jogo com o propósito de realizar a a vidade de jogar, desde a aprendizagem do jogo (regras e mecânicas) até o desenvolvimento pleno da par da (dinâmica de jogo). Os par cipantes têm liberdade para escolher o jogo (jogo desconhecido pelos jogadores antes da par da) e u lizar livremente os recursos disponíveis para jogar, como, a caixa do jogo com seus componentes, o manual de regras e tutoria. A tutoria pode ocorrer de modo presencial, com jogadores experientes que instruem os novatos na par da, ou remota, por meio de consulta a gameplay no Youtube. O jogo pode se desenvolver em uma ou mais par das, até os jogadores considerarem concluída a experiência de jogar aquele jogo. Nas sessões de jogos, também são disponibilizados materiais auxiliares como quadro branco, papel, canetas e componentes genéricos (dados, tokens, cartas em branco) para livre u lização durante as par das, possibilitando a interferência dos jogadores no projeto do jogo.

Nas sessões de jogo ocorre a microgênese, os par cipantes imergem na a vidade

“vivida momento-a-momento”, deixam-se levar pela situação imaginária que transforma as dinâmicas em emoção, dando sen do à a vidade. Os par cipantes aprendem o jogo e jogam. Durante as sessões de jogo os jogadores assumem papéis, interpretam regras, negociam e realizam ações, em uma a vidade dis nta de outras a vidades da vida co diana. Nesta situação de jogo emergem comportamentos referentes às funções básicas humanas, ou psicológicas inferiores (filogênese), que geram material emocional para ser analisado posteriormente. A experiência da a vidade microgené ca fica na memória dos par cipantes.

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Fase II: Debriefing cole vo: O debriefing cole vo ocorre por meio de entrevista com o grupo de par cipantes da a vidade. Nesta entrevista, os par cipantes são es mulados a fazer relações da sessão de jogo (microgênese) com outras a vidades histórico-culturais (macrocontexto) e aspectos das funções básicas humanas (filogênese). Tendo suas experiências pessoais como fonte desta reflexão.

Nessa entrevista cole va, a va-se uma memória do grupo, das ações e conflitos que ocorreram com os par cipantes durante o jogar. São enfa zadas as questões comuns, aquelas que afetaram o grupo como um todo, como sujeito cole vo da a vidade. O debriefing é um momento para es mular os par cipantes a fazer relações da microgênese com outras camadas(histórico-cultura e filogené ca). A questão posta aos par cipantes no debriefing é “O que vocês aprenderam ao jogar?”.

Fase III: Debriefing individual. Antes das entrevistas individuais, cada par cipante havia sido es mulado a refle r sobre a a vidade no debriefing cole vo. Nestas entrevistas individuais são apresentadas as camadas gené cas (Tabela 1.2). Neste momento os par cipantes estabelecem relações entre as camadas de gené cas e mostram evidência da ontogênese.

O debriefing individual, ocorre posteriormente a experiência vivida (na microgênese), que permi u a emergência de comportamentos, emoções, ou funções psicológicas inferiores (filogênese). Na entrevista individual os par cipantes relembram as ações e emoções que emergiram nas sessões de jogo (fase I), que foram es muladas no debriefing cole vo (fase II), e agora (fase III), tornarem-se foco da reflexão visando a construção do desenvolvimento (ontogênese). Os par cipantes verbalizam a autoanálise e a análise da equipe. A discussão sobre a microgênese resulta em um entendimento da a vidade e de seus afetos e efeitos com outras camadas gené cas.

Gravação de áudio e vídeo e transcrições

As sessões de jogos foram gravadas em vídeo. A gravação foi u lizada como técnica capaz de captar os processos e os detalhes em termos de falas e ações dos jogadores durante a par da. A análise das gravações tem a possibilidade de verificar “história da experiência vivida momento a momento” (Cole, 2007, tradução nossa ), ou seja, a microgênese. 25

25 history of moment-to-moment lived experience ” (Cole, 2007, p.240).

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Como os jogadores não conhecem os jogos antes de começar a sessão de jogo, se faz necessário que eles desenvolvam meios para construir sua aprendizagem sobre o jogo.

A gravação das sessões de jogos tem caracterís cas importantes para a coleta de dados. Primeiramente, não se trata de um registro a posteriori de uma experiência e sim o registro da a vidade em curso, registro das falas e das ações dos par cipantes durante o decorrer da a vidade de jogar. O foco não está nem na palavra, nem no material sensível, nem nas ações isoladamente, mas na dinâmica do processo, que contém interações e relações entre falas, ações, instrumentos materiais, conteúdo instrucional, definições de papéis, intervenções e demais relações cons tuintes da a vidade.

As gravações das sessões de jogos foram transcritas em termos de tempo, fala e ações dos par cipantes (JORDAN; HENDERSON, 1995). A análise se deu por meio da observação atenta das múl plas falas e ações dos par cipantes dos jogos.

2.2.2.2 Análise dos dados empíricos

A gravação das par das permite analisar interações dos par cipantes reveladas por meio das falas e das ações que ocorrem durante as sessões dos jogos. Essas gravações mostram os par cipantes desempenhando seus papéis e ações no jogo e revelam seus comportamentos, e, os debriefings (cole vo e individual) promovem discussão sobre a microgênese e suas relações com filogênese e aspectos histórico-cultural. Assim, temos dois níveis de análise: a observação da dinâmica e a análise ontogênica, decorrentes da microgênese.

Observação da dinâmica - ocorrência dos elementos da atividade

A observação dos vídeos permite verificar a fala e ações dos jogadores que refletem a ocorrência dos elementos da a vidade. Os sujeitos em interação com as peças do jogo que mediam a transformação da situação imaginária em emoções, seguindo as ações pré determinadas pelas regras do jogo (mecânicas) e a divisão das tarefas (dinâmica), na comunidade dos jogadores.

A observação visa analisar as caracterís ca externas das sessões de jogo.

Iden ficar a ocorrência de elementos de jogo (dinâmica, mecânica e esté ca) dentro da a vidade de jogar, que abrange também os elementos da a vidade (sujeito, mediações, objeto e comunidade).

A gravação das sessões de jogo e a transcrição das falas e ações dos jogadores permite iden ficar essas ocorrências durante a par da. O procedimento desta análise ocorreu conforme abaixo.

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1. Transcrição das falas e ações.

2. Iden ficação das falas e ações vinculadas aos elementos da a vidade.

3. Codificação por legendas e cores para as ocorrências.

FIGURA 2.4: Codificação dos elementos da atividade observados nas sessões de jogo

(FONTE: A AUTORA)

A representação gráfica mostra. Na esquerda os elementos da a vidade posicionados no modelo sistêmico da a vidade de jogar (Figura 1.20). Na direita as legendas para iden ficar suas ocorrências das sessões de jogo.

Para a iden ficação dos elementos da a vidade é necessário declarar a função e evidências da presença destes elementos nas sessões de jogo. A tabela abaixo apresenta os critérios para observação e iden ficação destes elementos.

TABELA 2.2: Critérios para identificar elementos da atividade

Elementos da atividade

Função Evidências

Mecânicas Aspectos operacionais e

regras do jogo Sujeitos empenhados na aprendizagem interpretação das regras e internalização das mecânicas.

Ações dos jogadores com objetivo de aprender e dominar as regras e mecânicas do jogo. (ex. Consulta a manuais e tutoriais, uso de dispositivo para aprender o jogo.)

Falas sobre a interpretação das mecânicas e regras do jogo.

Dinâmicas Ações e interações durante o jogo ligadas à situação imaginária

Sujeitos empenhados no jogar propriamente dito.

Ações dos jogadores com objetivo de traçar estratégias para vencer o jogo.

Falas sobre o avanço do jogo e planejamento de ações (interpretações e negociações) entre os jogadores, visando a tomada de decisão e realização das ações no jogo.

Estéticas (Aesthesys)

Reações emocionais dos jogadores

Momento em que os jogadores expressam satisfação ou descontentamento.

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Intervenções Intervenção dos jogadores no projeto do jogo

Questionamentos sobre regras e mecânicas, discussão e negociações sobre mudança no jogo.

Jogador projetando o jogo.

Contexto histórico cultural

Relação com outras atividades

Momentos em que os jogadores expressam semelhanças entre o jogo e outras atividades externas ao jogo.

(FONTE: A AUTORA)

A tabela apresenta elementos da a vidade que se expressam por meio de falas e ações.

Análise ontogênica da dinâmica

O método de duplo es mulo se mostra eficaz para promover discussão sobre a a vidade de jogar e seus efeitos no desenvolvimento, visando a compreender a gênese da dinâmica de jogos de tabuleiro coopera vos

Foi feita análise das entrevistas em grupo e entrevistas individuais com os par cipante. Para Vygotsky, o domínio microgené co do desenvolvimento cogni vo está relacionado à formação de processos psicológicos no curso de alguns minutos ou segundos (cf. MEIRA, 1994, p. 1). A experiência vivida momento-a-momento (microgené ca) revela as interações e torna percep vel a aprendizagem a par r da a vidade.

Análise do debriefing ocorreu a par r dos relatos e reflexões dos par cipantes na a vidade. Visa a encontrar relações entre as camadas gené cas no sen do de buscar a origem dos aspectos psicológicos decorrentes da a vidade de jogar jogos de tabuleiro coopera vos.

Esta análise ocorreu por meio de entrevistas, posteriores às sessões de jogos, dando voz aos par cipantes, para refle r sobre a a vidade de jogar.

Os resultados do experimento/debriefing e da análise dos dados empíricos são apresentados no capítulo 5.

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